Negociação
Parecer da FENPROF

Projeto de “Regime do Pessoal Docente e de Investigação dos Estabelecimentos de Ensino Superior Privados”

18 de junho, 2021

Parecer da FENPROF

 

A FENPROF vem, desde há muitos, muitos anos, reclamando com insistência a negociação e as subsequentes aprovação e publicação de um diploma regulador do regime do pessoal docente e de investigação do ensino superior privado, que assegure a existência, em cada estabelecimento de ensino, de um corpo permanente de professores e de investigadores dotado de estabilidade de emprego e com reais perspetivas de promoção na carreira.

Esta grave omissão, da responsabilidade de sucessivos governos, tem provocado enormes prejuízos para os direitos de docentes e investigadores, mas também para as próprias instituições de ensino superior privadas, uma vez que a ausência de um corpo próprio permanente de docentes e de investigadores, adequadamente remunerados e integrados em carreiras com efetivas oportunidades de progressão salarial e de promoção às categorias superiores, se tem refletido, negativamente, como seria inevitável, na qualidade do serviço prestado, incentivando o pluriemprego e desmotivando o investimento na qualificação profissional e na melhoria do desempenho.

Finalmente, perante a crescente insistência da FENPROF, o MCTES decidiu-se a apresentar um projeto para a negociação de uma matéria que já era urgente e prevista na lei há 30 anos, na altura da explosão que se verificou, no final dos anos 80, início dos anos 90, no ensino superior privado e que tem estado bloqueada por falta de vontade política para resolver o problema desde 1989. Foi preciso passarem cerca de 14 anos sobre a entrada em vigor do RJIES, publicado em 2007, que reproduziu no seu art.º 53.º a exigência de um regime do pessoal docente e de investigação das instituições privadas aprovado por decreto-lei, para surgir um projeto de diploma.

Quanto ao conteúdo do projeto, a FENPROF tem defendido que aos docentes e investigadores do ensino superior particular e cooperativo devem ser aplicados, com as necessárias adaptações, estatutos de carreira idênticos aos que vigoram no ensino superior e na investigação públicos. A FENPROF procurará, nas negociações, aproximar o regime dos docentes e dos investigadores dos estabelecimentos de ensino superior privados ao constante dos estatutos das carreiras docentes do ensino superior públicas (ECDU e ECPDESP) e da investigação (ECIC), buscando, simultaneamente, a garantia do cumprimento, por parte das instituições privadas, dos requisitos necessários à acreditação dos ciclos de estudos, incluídos desde 2018 no regime jurídico dos graus e diplomas do ensino superior (DL n.º 74/2006).

Em particular, destacam-se os seguintes objetivos:

a) existência em todas as IES de um corpo próprio de dimensão mínima, idêntica à fixada para as IES públicas, composto por professores e investigadores, com contratos permanentes (sem termo), visando dar cumprimento ao disposto no art.º 50.º do RJIES e promover o fortalecimento de laços de pertença ao estabelecimento de ensino, bem como incentivar a profissionalização da função docente e de investigação;

b) redução concomitante da dependência das IES privadas de docentes e de investigadores contratados a termo certo com contratos indefinidamente renováveis, muitos deles impropriamente classificados como sendo em regime de tempo integral, para efeitos do cumprimento dos requisitos da acreditação de cursos;

c) existência de efetivas oportunidades de promoção às categorias superiores das carreiras, com o estabelecimento de números mínimos de professores e de investigadores com contrato sem termo nas duas categorias superiores de cada carreira, idênticos aos que vigoram para as IES públicas;

c) remuneração condigna de docentes e investigadores e reconhecimento do mérito com base em sistemas de avaliação justos, que incentivem a busca por mais habilitações e melhores desempenhos, com efeitos na progressão salarial;

d) respeito pela liberdade académica no ensino e na investigação.

 

A FENPROF reconhece que o projeto dá alguns passos de sentido positivo, como:

a) a fixação em 60% da percentagem de contratados sem termo, face ao número total dos docentes e investigadores em ETI (art.º 31.º);

b) a limitação a 60% da percentagem dos contratos dos docentes e dos investigadores especialmente contratados (n.º 3 do art.º 15.º e n.º 1 do art.º 19.º), que reforça os propósitos da alínea anterior;

c) a remissão das bases remuneratórias para acordos de empresa ou para convenções coletivas (art.º 32.º), dignificando esses instrumentos de negociação sempre recusados até agora pela associação representativa das entidades instituidoras;

d) a inclusão, entre os direitos dos docentes e dos investigadores, do relativo à participação na gestão (alínea d) do art.º 20.º), em correspondência com o estabelecido no n.º 2 do art.º 140.º do RJIES;

e) a explicitação do princípio da liberdade de orientação e de opinião científica (art.º 3.º), essencial a todas as instituições de ensino superior, públicas ou privadas, que, para a FENPROF, é condição para o cumprimento das missões de interesse público inerentes às primeiras e reconhecidas pelo Estado às segundas.

 

O projeto ora apresentado, sendo uma proposta de regulação do regime do pessoal docente e de investigação, aproxima-se, no já referido, dos estatutos de carreira docente e contempla a investigação e seus profissionais. Esta versão inicial do projeto não clarifica, porém, devidamente, o regime do pessoal de investigação, deixando-o numa zona relativamente cinzenta, mas com uma evidente intenção: a da atribuição de serviço docente aos investigadores. Para além desta questão, o projeto contém outros aspetos negativos ou insuficientes, entre os quais:

a) o valor relativamente reduzido da percentagem dos docentes e investigadores com contrato permanente face ao conjunto de todos os docentes e investigadores em ETI (art.º 31.º), que, no entender da FENPROF, deverá ser fixado nos 70% e não nos 60% propostos;

b) a carência de metas a atingir, idênticas às fixadas nos estatutos das carreiras do ensino superior público, no que se refere ao número de professores e de investigadores nas duas categorias superiores das respetivas carreiras (art.º 31.º), que deverá apontar do mesmo modo para o mínimo de 50%, com base num regime transitório;

c) a ausência de um limite máximo para o número de horas de aula por semana que pode ser atribuído a um docente, ou a um investigador, a tempo inteiro (art.º 18.º);

d) a não consideração de horas obrigatórias para atendimento a alunos, no âmbito do período de trabalho dos docentes, ou dos investigadores que lecionam (art.º 18.º);

e) a não fixação do número de horas/semana em que os investigadores de carreira podem lecionar, deixando-o ao critério da instituição, nos “termos do regulamento da prestação do serviço docente no estabelecimento de ensino superior” (art.º 5.º), mantendo-se essa indefinição, nos artigos 6.º, 7.º, 8.º e 10.º, abrindo, assim, caminho para a fixação de cargas letivas muito além das fixadas para as instituições públicas;

f) a previsão do convite, como forma de recrutamento para as carreiras (art.º 11.º), em vez de ser estabelecido que, em regra, deve ser por concurso;

g) a não previsão de um período de audição obrigatória da comunidade académica do estabelecimento de ensino, no que se refere aos projetos de regulamentos que afetem a condição profissional de docentes e investigadores (art.º 28.º).

 

Assim, a FENPROF considera que existem importantes aspetos a clarificar e a fixar no projeto, e entende que este ganhará em ser aperfeiçoado no sentido de ir ao encontro das propostas atrás formuladas, para se encontrar nas melhores condições para o arranque efetivo das negociações, que devem iniciar-se o mais rapidamente possível.

 

O Secretariado Nacional