Como todos sabemos, há muitos docentes do ensino superior e investigadores em situação de precariedade. O programa PREVPAP, para além dos processos hoje já regulados pelos regimes transitórios dos estatutos de carreira docente, surgiu como uma oportunidade para se conseguir a vinculação de muitos outros docentes e de investigadores.
Um dirigente da FENPROF tem participado na Comissão de Avaliação Bipartida da Ciência Tecnologia e Ensino Superior (CAB-CTES), em representação da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública (FCSAP). A constituição e o funcionamento destas comissões são regulados pela Portaria n.º 150/2017.
Até ao momento, ainda não houve qualquer análise de requerimentos. As reuniões desta comissão têm tratado quase exclusivamente de aspetos burocráticos relacionados com a recepção dos requerimentos e do relacionamento com as instituições do ensino superior e da ciência, em matéria da recolha de informações sobre a situação profissional dos requerentes e sobre o conjunto daqueles que se encontram em situação de precariedade, tenham ou não entregado requerimento. Neste momento, decorre o prazo para as instituições de ensino superior e unidades de investigação fazerem a indicação dos docentes e investigadores que, encontrando-se a desenvolver as suas atividades com base num vínculo precário, satisfazem necessidades permanentes dos serviços.
Paralelamente, foi já aprovada, na generalidade, pela Assembleia da República, a proposta de lei que irá fixar os procedimentos relativos à regularização propriamente dita dos vínculos.
Existem assim, neste processo, duas frentes de batalha:
- a do correcto funcionamento da CAB-CTES, a quem compete o reconhecimento das situações de exercício de funções correspondentes a necessidades permanentes; e
- a do processo legislativo que desembocará na aprovação final da lei do PREVPAP, que tem de ser bem melhor do que a proposta do governo.
Importa traçar estratégias de intervenção nestas duas frentes que irão desenrolar-se de forma paralela.
A FCSAP participa neste processo por direito próprio, em que os docentes e os investigadores estão representados na CAB-CTES através do dirigente da FENPROF, sendo que a sua participação só se compreende enquanto, dessa forma, contribuir para fazer um combate efetivo à precariedade e, portanto, incluir no programa os trabalhadores com vínculos precários que satisfazem necessidades permanentes dos serviços e não para os excluir. A FENPROF define, por isso, como objectivo, que o maior número de situações de precariedade sejam consideradas e reconhecidas como tal.
Entre os docentes do ensino superior, identificam-se em grande número os casos de docentes indevidamente convidados, muitos dos quais contratados a tempo parcial, sendo que muitos destes tempos parciais correspondem a distribuições de serviço docente que compreendem mais horas de aula semanais do que as que a percentagem definida nos seus contratos autorizaria se as cargas letivas estabelecidas nos estatutos das carreiras fossem respeitadas, aliás, conforme parecer emitido pela Provedoria de Justiça (de que deu conhecimento ao reitor da Universidade de Coimbra), em resultado de queixa do SPRC, organização que integra a FENPROF.
Atualmente, existem muitos professores detentores da habilitação de referência para a carreira que estão indevidamente contratados como convidados. Muitos destes colegas já desempenharam funções em regime de tempo integral, ou de dedicação exclusiva, durante o máximo de 4 anos que é permitido pelos estatutos de carreira, estando, por isso, agora contratados em regime de tempo parcial. Outros já conseguiram regressar ao regime de tempo integral, ou mesmo de dedicação exclusiva, depois de terem passado por um período de contratação em regime de tempo parcial.
Estas situações de docentes indevidamente convidados, que as instituições justificam com os cortes orçamentais e as limitações impostas ao crescimento da massa salarial, não podem deixar de ser consideradas no âmbito do PREVPAP, sob pena de este combate à precariedade ser uma oportunidade perdida.
É, assim, imperioso que as situações de tempos parciais correspondentes a docentes indevidamente convidados não deixem de ser consideradas como casos de exercício de funções permanentes.
A proposta de lei do governo pretende afastar, à partida, as situações de exercício de funções a tempo parcial, exclusão que a redacção final da lei não pode confirmar.
Não havendo ainda uma lei aprovada, a CAB-CTES deverá seguir o estabelecido na Portaria e, desde logo, também considerar elegíveis os tempos parciais. A FENPROF tem-se batido na comissão para que, antes de se passar à fase de análise de requerimentos e da subsequente tomada de decisões sobre situações individuais, sejam definidos critérios claros para a identificação das situações de satisfação de necessidades permanentes que nada tenham a ver com a natureza dos vínculos (há muitos bolseiros neste grupo), nem com o regime de contratação ser a tempo inteiro ou a tempo parcial.
Existem, também, muitos casos de docentes a suprir necessidades permanentes que não dispõem ainda de habilitação de referência para a sua carreira.
No entender da FENPROF, não compete à CAB-CTES excluir, nem os docentes com contratos a tempo parcial que estejam a satisfazer necessidades permanentes, nem aqueles que não disponham, ainda, da habilitação de referência, cabendo à lei que venha a ser aprovada, de preferência por intermédio de um decreto-lei específico, a ser negociado entre o governo e as organizações sindicais, definir as condições em que esses docentes poderão aceder a reais oportunidades de vinculação, à semelhança do que tem sido concretizado nos regimes transitórios das carreiras.
Entre os investigadores importa assegurar a integração em carreira dos que se encontram a exercer funções correspondentes a necessidades permanentes, há já muitos anos, assumindo em geral responsabilidades na direcção e coordenação de projectos inseridos nos planos estratégicos das suas instituições. Neste domínio, importa não esquecer que o Decreto-Lei 57/2016, de 29 de Agosto, mesmo com as alterações recentemente aprovadas na Assembleia da República, não promove um combate efetivo à precariedade na ciência, pois não prevê a integração na carreira de quem há muitos anos vem desenvolvendo a sua atividade com base em sucessivas bolsas e apenas proporciona o acesso a contratos a termo certo, o que, ainda assim, não deixa de ser muito relevante para a dignificação das condições de trabalho dos investigadores e o justo acesso às regalias socias disponibilizadas pelo Estado.
Para se obter êxito nestas duas frentes do PREVPAP (na CAB-CTES e na Lei), será indispensável que os docentes e os investigadores em situação precária se mobilizem. Essa será uma importante tarefa de toda a comunidade académica, pois a precariedade não afecta apenas os que são precários, mas também põe em causa a liberdade, a autonomia científica e pedagógica, e a democracia, que são pressupostos essenciais das missões confiadas pela sociedade ao ensino superior e à ciência.