Em véspera de realização da conferência de ministros dos países da UE responsáveis pela investigação e inovação, no quadro da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, a FENPROF denunciou o que nesta conferência, decerto, será omitido.
A FENPROF, através do seu Departamento de Ensino Superior, promoveu um questionário destinado a conhecer a situação socioprofissional dos investigadores portugueses, o qual resultou num estudo que foi hoje apresentado à imprensa.
- Apresentação da iniciativa pelo Secretário Geral da FENPROF [VER]
- Divulgação dos resultados do estudo, por Ana Ferreira, dirigente da FENPROF e investigadora do CICS.NOVA, FCSH [VER]
- Enquadramento político-sindical por André Carmo, dirigente da FENPROF [VER]
Os três principais objetivos deste trabalho, coordenado por Ana Ferreira, investigadora do CICS.NOVA, Faculdade de Ciências Socias e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, e dirigente do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa e da FENPROF, foram:
- Caraterizar uma população que se tem mantido invisível, apesar da sua grande importância, ainda maior no atual contexto de combate à pandemia;
- Caraterizar a atividade que os investigadores desenvolvem em Portugal;
- Caraterizar a relação que têm com o trabalho, com a sua situação perante o trabalho e as suas vivências subjetivas num quadro de enorme precariedade.
O resultado obtido decorre da participação de dois mil e setecentos e vinte e seis (2726) trabalhadores científicos e confirma que, apesar de um conjunto de alterações legislativas (Emprego Científico: DL 57/2016; Lei 57/2017; Lei 24/2018; PREVPAP) que permitiram alguma melhoria nas condições dos trabalhadores doutorados, os quadros legais aprovados e os programas desenvolvidos apenas promoveram de uma forma muitíssimo pontual a integração na carreira docente e científica, não resolvendo o problema da precariedade nem dos seus múltiplos impactos. De acordo com as respostas dos investigadores, é legítimo afirmar que, em Portugal, a Ciência é um edifício que assenta na precariedade de quem a desenvolve e que esses, os investigadores, adiam constantemente os seus projetos de vida em busca de uma estabilidade que não chega, e apresentam em pelo menos um terço dos casos, elevados níveis de burnout profissional.
Os percursos destes trabalhadores precarizados caracterizam-se por longas trajetórias laborais, onde alternam períodos com contratos de trabalho a termo, com períodos com contratos de bolsas e períodos sem qualquer remuneração pelo trabalho que continuam a desenvolver. Esses períodos de trabalho não remunerado são marcados por uma dependência das famílias que necessariamente reproduz desigualdades sociais.
Discursivamente, estes trabalhadores apresentam a “paixão pela ciência” como justificação para a manutenção de uma situação laboral que reconhecem como nefasta aos mais diversos níveis, incluindo o da produção de conhecimento científico. Revelam que a imensa pressão em publicar, as constantes candidaturas e busca de emprego mais estável, se traduz numa diminuição da profundidade do que é publicado.
A apresentação deste estudo, na véspera da reunião dos ministros europeus, ao mesmo tempo que pretende lançar alguma luz sobre um problema central que não será abordado nem discutido amanhã, constitui também uma chamada de atenção para a necessidade de continuar a lutar pela valorização e dignificação do trabalho científico. A FENPROF está hoje tão empenhada como sempre esteve para participar neste combate, em prol da ciência, e do futuro do país. Num mundo em que crescem discursos marcados por uma grande irracionalidade e pela total ausência de fundamentação científica, o papel social, cultural e económico dos trabalhadores científicos é cada vez mais importante, mas essa relevância não pode continuar a assentar na precariedade. Este é um caminho insustentável. Um caminho que contará com a oposição firme e determinada da FENPROF. Uma oposição, ela própria, assente num profundo conhecimento da realidade que pretende transformar como este estudo, aliás, demonstra.