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Por que razão os cortes nos salários e nas pensões atingem em 2013 níveis confiscatórios e chocantes?

09 de março, 2013

Muitos trabalhadores e pensionistas (reformados da Segurança Social e aposentados da CGA) têm-me pedido, por e.mail, que esclareça os cortes brutais que estão a sofrer nos seus rendimentos em 2013 pois, no caso dos pensionistas, nem a Segurança Social nem a CGA deram qualquer esclarecimento completo e compreensível ( a Segurança Social enviou um ofício que só referia a Contribuição Especial de Solidariedade, ou seja, a chamada CES e mesmo assim com erros.). Apesar da Lei do OE-2013 ter sido amplamente divulgada nos media assim como os seus efeitos dramáticos para os portugueses, mesmo assim muitos trabalhadores e pensionistas ficaram surpreendidos com os cortes nos seus rendimentos devido à lei aprovada pelo PSD/CDS

Procurando responder a esses pedidos, pois não é possível fazer individualmente, vamos analisar mais uma vez, em conjunto e de uma forma detalhada, essas medidas para que se possa ficar com uma ideia clara do seu impacto. Esperamos, no entanto, que o Tribunal Constitucional, que tem como obrigação defender a Constituição da República, declare inconstitucionais várias das medidas constantes da Lei OE-2013, que causaram uma redução brutal nos já baixos rendimentos disponíveis dos trabalhadores e pensionistas.

Para além do confisco do subsídio de férias aos trabalhadores da Função Pública (100% do subsidio) e aos pensionistas (90% do subsídio), a redução brutal dos rendimentos disponíveis resulta fundamentalmente do efeito conjugado de quatro medidas constantes da Lei 66-B/2012 (Lei OE-2013), que são as seguintes:
(1) Alteração das Tabelas de IRS (artº 68º) em que se verifica simultaneamente a redução da progressividade e um aumento significativo das taxas de imposto;
(2) Taxa adicional de solidariedade (artº 68º-A), que não deve ser confundida com a CES que incide apenas sobre os pensionistas, enquanto esta taxa incide sobre todos os rendimentos sujeitos a IRS;
(3) Sobretaxa em sede de IRS (artº 187) que incide também sobre todos os rendimentos sujeitos a IRS. Em relação aos pensionistas, para além de todas estas taxas, existe ainda a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (artº 78º), a chamada CES  que incide apenas sobre os rendimentos dos reformados da Segurança Social, dos aposentados da CGA e dos beneficiários de fundos de pensões
(não incide nem sobre os trabalhadores do setor privado, nem sobre os trabalhadores da Função Pública). Interessa portanto tornar claro quer cada uma destas medidas quer o efeito conjugado de todas elas, para que todos os portugueses possam ficar a saber por que razão os seus rendimentos diminuíram tanto em 2013 devido aos impostos.

AS MEDIDAS FISCAIS DA LEI OE-2013 (Lei 66-B/2012) QUE ATINGEM TODOS OS PORTUGUESES 
 E OS SEUS EFEITOS DRAMÁTICOS NA VIDA DOS TRABALHADORES E PENSIONISTAS 

As medidas fiscais do OE de 2013 que atingem todos os portugueses são a alteração da Tabela de IRS (artº 68º da Lei 66-B/2012)), a Taxa Adicional de Solidariedade (artº 68º-A da Lei 66-B/2006) e a sobretaxa em sede de IRS (artº 187 º da Lei 66-B/2012). Analisemos cada uma delas.

A primeira medida, ou seja, a alteração na Tabela de IRS traduziu-se na prática por uma diminuição do número de escalões, e por um aumento significativa nas taxas que é tanto maior quanto menor for o valor dos escalões de rendimento. O quadro 1, com os escalões e taxas que vigoravam até 2012, e com os escalões e taxas que passaram a vigorar a partir do inicio de 2013 mostra com clareza o agravamento brutal do IRS que atinge fundamentalmente os escalões intermédios e mais baixos de rendimento, ou seja, a maioria dos trabalhadores e pensionistas.

Quadro 1- Tabela de IRS que vigorou em 2012 e tabela de IRS que vigora em 2013 (artº 68º do CIRS)

TABELA DE IRS EM VIGOR EM 2012

TABELA DE IRS EM VIGOR EM 2013

Escalões de rendimento coletavel Em euros

Taxa

Marginal

Taxa ~

Média

Escalões de rendimento coletavel - Em euros

Taxa Marginal

Taxa Média

Até 4898€

11,5%

11,5%

Até 7.000€

14,5%

14,5%

Mais 4898€-7410€

14,0%

12,348%

Mais 7000€-20000€

28,5%

23,6%

Mais 7410€-18375€

24,5%

19,599%

Mais 20000€-40000€

37,0%

30,3%

Mais 18375€-42259€

35,5%

28,586%

Mais 40000€-80000€

45,%

37,65%

Mais 42259e-61244€

38,0%

31,504%

Mais 80.000€

48,0%

 

Mais 61244€-66045€

41,5%

32,221%

 

 

 

Mais 66045€-153300€

43,5%

38,645%

 

 

 

Mais 153.300€

46,5%

 

 

 

 

 

Entre 2012 e 2013, o número de escalões de IRS é reduzido de oito para apenas cinco, o que significa uma redução muito grande da progressividade do IRS prevista na Constituição da República, portanto em clara violação do disposto nesta.

Por outro lado, verifica-se um aumento significativo das taxas de IRS. A mais baixa, que atinge a esmagadora maioria dos trabalhadores e dos pensionistas sujeitos a IRS, passa de 11,5% para 14,5%, ou seja sofre um aumento de 26,1%. E tenha presente que os 4.898 euros da tabela de 2012 e os 7.000 euros da tabela de IRS de 2013, são valores anuais, e não são rendimentos ilíquidos. São rendimentos coletáveis, ou seja, os rendimentos anuais que se obtém deduzindo ao rendimento ilíquido anual do trabalhador e pensionista a dedução especifica, que são 4.104€. O que resta, que se chama rendimento coletável, até 7.000 euros anuais,  ou seja, um rendimento coletável de 500€ por mês por pessoa singular, está sujeito, em 2013. a uma taxa de IRS de 14,5% quando, em 2012, até 4.898€ por ano (350€/mês) estava sujeito a uma taxa de imposto de 11,5% . Interessa chamar a atenção para o facto que, entre2012 e 2013,  a taxa mais baixa de IRS subiu 26,1%, pois passou de 11,5% para 14,5%, enquanto a taxa mais elevada teve um aumento de 3,2%, pois passou de 46,5% para apenas 48%.

Por aqui se vê o espírito de classe que presidiu a estas alterações na tabela de IRS, e que interesses se pretendeu proteger. É evidente, que se fosse um governo preocupado com a diminuição das desigualdades fiscais e com a partilha mais equitativa dos sacrifícios a solução teria de ser necessariamente outra, sobrecarregando mais quem mais tem e aliviando quem menos recebe, ou seja, diametralmente o oposto do realizado pelo governo do PSD/CDS e pela “troika”.

A segunda medida aprovada pelo governo PSD/CDS que se traduziu por mais um corte, embora muito pequeno, nos rendimentos mais elevados, é a Taxa Adicional de Solidariedade que consta do artº 68º-A da Lei do OE-2013. Esta taxa adicional só se aplica aos rendimentos elevados de trabalho e de pensões (ex. administradores da banca, pensionistas do “movimento dos indignados” de Filipe Pinhal). E isto porque segundo o artº 68º-A, estão sujeitos a uma taxa adicional de apenas 2,5% a parcela do rendimento coletável (depois de se ter deduzido 4.104€) superior a 80.000 € até 250.000€ por ano, e a parte que ultrapasse os 250.000€ por ano está sujeita a uma taxa de 5%.

Finalmente, a terceira medida é a chamada sobretaxa de IRS, que consta do artº 187 da Lei do OE  de 2013 (artº 72º-A do CIRS), a qual atinge mesmo os rendimentos baixos. Segundo aquele artigo, sobre o rendimento coletável, portanto sobre o rendimento anual ilíquido do trabalhador ou pensionista depois de se ter deduzido a chamada dedução especifica (4.104 €) e um valor igual ao salário mínimo anual (6.790€), ao valor restante que se obtém, ou seja,  desde que o salário ou pensão ilíquida seja superior a 778€ por mês, ao que excede aplica-se uma sobretaxa de 3,5%, que corresponde a mais um imposto que todos os trabalhadores e pensionistas têm ainda de pagar, reduzindo ainda mais o seu rendimento.

A CONTRIBUIÇÃO EXTRAORDINÁRIA DE SOLIDARIEDADE (CES)
QUE APENAS ATINGE OS PENSIONISTAS
(reformados da Segurança Social, aposentados da CGA, e beneficiários de fundos de pensões)

Para além de todos estes cortes de rendimento impostos pelo governo PSD/CDS e “troika”, os reformados da Segurança Social, os aposentados da CGA, e os beneficiários dos fundos de pensões estão ainda sujeitos, por serem apenas pensionistas (o que abre a porta, a vingar, a impostos sobre mulheres apenas pelo facto de serem mulheres, ou sobre outros grupos da população por terem características raciais diferentes); repetindo, segundo ao artº 78º da Lei do OE de 2013, os pensionistas, apenas pelo facto de o serem, estão sujeitos àquilo que o governo designa, utilizando um eufemismo, por Contribuição Extraordinária de Solidariedade, também conhecida por CES. 

Este imposto de facto, porque não está associado a qualquer beneficio ou contrapartida recebida, aplica-se a todos os pensionistas da Segurança Social, da CGA e de fundos de pensões com pensões iguais ou superiores a 1.350€ (para este governo e para a “troika”, um reformado ou aposentado com uma pensão de 1350€ é já rico). E os cortes adicionais nas pensões são os seguintes:
(1) Pensões entre 1350€ e 1800€ a CES o corte é de 3,5%;
(2) Para pensões de valor superior a 1800€ até 3.750€, o corte é 3,5% sobre 1800€, e de 16% para a parcela entre os 1800€ e os 3.750 €;
(3) Para pensões de valor superior a 3750€, o corte na pensão é 10%. Para além de tudo isto, e em acumulação com todos estes e os anteriores, se o valor mensal da pensão for superior a 3.750 €, para a parcela que exceda 12 vezes o IAS (5.030€)  até 18 IAS (7.546€) a pensão sofre outro corte de 15%, e o montante que ultrapassar os 18 IAS (7.546€) sofre um corte de 40%. É a acumulação de todos os cortes (estes e os  anteriores) que determina, segundo o parecer do Prof. Doutor José Canotilho, que a “ taxa efetiva de tributação dos rendimentos de pensões chegue a ultrapassar os 80%” para pensões mensais de 40.000€/mês, o que não acontece com qualquer outra categoria de rendimentos para o mesmo valor de rendimento (por ex. os rendimentos do capital estão sujeitos a uma liberatória máxima de 28%).

OUTRAS MEDIDAS FISCAIS QUE DETERMINARAM TAMBÉM
CORTES NO RENDIMENTO DISPONÍVEL

Para além das medidas anteriores ainda existem outras constantes da Lei OE-2013 do PSD/CDS que se traduziram por mais cortes no rendimento disponível dos trabalhadores e pensionistas. O governo PSD/CDS diminuiu a chamada a dedução à coleta (imposto) por sujeito passivo que reduz o IRS a pagar de 261€ para 214€; reduziu também o que se pode reduzir de juros de crédito à habitação de 591€ para apenas 296€. E só se pode deduzir no IRS 10% das despesas com saúde até ao limite de 838€, e somente 30% das despesas com educação até ao máximo de 760€. Portanto, é conjugação de todas estas medidas e alterações que determina o corte brutal que os trabalhadores e pensionistas estão a sentir nos seus rendimentos.

Segundo o próprio governo (Relatório OE-2013), as medidas a nível de IRS (alteração dos escalões e aumento das taxas da Tabela de IRS, sobretaxa de IRS, Taxa adicional de solidariedade) determinam um corte nos rendimentos dos portugueses estimado em 2.810 milhões €; e a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) que atinge apenas os pensionistas, causou uma redução das pensões em 421 milhões €, a que se junta 90% do subsidio de férias.

Eugénio Rosa, edr2@netcabo.pt 
7.3.2013