Com o seu projeto alegadamente destinado a corrigir assimetrias na carreira decorrentes dos períodos de congelamento, o ME prepara-se para gerar novas discriminações, injustiças e assimetrias entre docentes. Há muito que se sabe que o Primeiro-Ministro António Costa decidiu que, enquanto governar, os professores não terão contado o seu tempo de serviço. O sinal maior deu-o em 3 de maio de 2019 ao ameaçar demitir-se se o Parlamento decidisse recuperar os 3411 dias em que a progressão na carreira esteve congelada. A partir daí, o governo foi procurando, com pequenos, mas enganadores bónus, baixar o nível do protesto dos professores ao mesmo tempo que iludia a opinião pública. Foram os 2 anos 9 meses e 18 dias de recuperação, para a qual arranjou uma explicação contabilística sem pés nem cabeça. Agora é o acelerador ou corretor de assimetrias que introduz na carreira situações ainda mais assimétricas, tantas são as exclusões e discriminações que provoca.
Para os professores, a luta pela carreira, pela sua recomposição, não é uma mania ou fixação, mas a luta de quem não aceita que lhe roubem o que é seu, no caso o tempo de serviço que foi cumprido a trabalhar em dois períodos muito difíceis. O projeto que foi apresentado pelo governo chega a ser provocatório ao colocar como critério para um professor ser abrangido ter cumprido, em pleno, os 3411 dias de congelamento, apesar de esse mesmo governo recusar recuperar 2393 daquele tempo, os tais 6 anos, 6 meses e 23 dias. Acresce que a recomposição da carreira docente passa, ainda, por eliminar as vagas para progressão aos 5.º e 7.º escalões e as quotas que criam tremendas injustiças na avaliação do desempenho. O projeto do ME não dá resposta a nenhuma destas reivindicações: não recupera um dia de serviço, não extingue as vagas e as quotas.
Em relação a todos os problemas que os professores querem ver resolvidos, já se percebeu que a estratégia do governo só tem dois caminhos: i) não resolver o problema e procurar, com um ligeiro retoque, criar divisões para diminuir o tom do protesto; ii) ignorar a existência do problema. No primeiro grupo inclui-se a alteração ao regime de concursos, a proposta que apresentou de correção de assimetrias na carreira e, pelo que tem sido afirmado, embora ainda sem proposta conhecida, as reduções de componente letiva para a monodocência; no segundo grupo, temos problemas como o regime de Mobilidade por Doença, os abusos e ilegalidades nos horários de trabalho, a burocracia, a aposentação tardia e tantos outros que os professores bem conhecem.
A luta dos professores em defesa da profissão vai longa, mas estes sabem que não podem e não vão desistir dela. É uma luta destinada a melhorar as condições de vida e de exercício da profissão de quem já nela se encontra, mas é uma luta de alcance muito mais amplo. Num momento em que o número de professores em falta nas escolas cresce, em que a situação só não é ainda mais visível porque milhares de diplomados em outras áreas a disfarçam e em que, olhando para o futuro, se percebe que o problema se irá agravar, a luta que os professores estão a travar não tem um horizonte imediato. É uma luta pela profissão, mas também pela escola, pelos alunos e pelo futuro. É por isso que a luta não vai parar.
Mário Nogueira
Secretário-geral da FENPROF