JF Online julho 2023
RANKINGS DE ESCOLAS

Mistificações e Contradições

30 de junho, 2023

Pelo 22.º ano consecutivo, os rankings de escolas encheram páginas de jornais e fizeram as manchetes das notícias do dia, com as escolas a serem catalogadas de “melhores” e “piores”, em função da posição relativa que ocupam no ranking. Pelo 22.º ano consecutivo, a FENPROF demarcou-se publicamente dessa iniciativa, reafirmando que é demagógico e ilegítimo reduzir os indicadores de qualidade das escolas aos resultados dos alunos em exames e comparar escolas cujas realidades educativas são distintas.

Ouvimos o ministro da Educação afirmar que os rankings são “uma operação comercial”. Estamos de acordo – eles existem para promover uma lógica de mercado na educação, num processo que acaba, inevitavelmente, por favorecer o ensino privado. Mas, então, por que razão continua o ministério da Educação a divulgar os dados para a sua elaboração? Porque não segue o exemplo de países como a Irlanda do Norte ou o País de Gales, em que os ministros da Educação anunciaram o fim da disponibilização dessa informação, após a verificação de que a publicação de rankings, para além de não ter produzido as melhorias esperadas, introduziu efeitos perversos no sistema de ensino, criando um clima pouco saudável de concorrência entre as escolas?

Em Portugal, as conclusões de vários estudos produzidos nesta área apontam no mesmo sentido. “Um Olhar sobre os Rankings”, editado em 2004 pelo Centro de Investigação das Políticas do Ensino Superior, da Fundação das Universidades Portuguesas considerou esta seriação “uma calamidade pública”. A elaboração posterior, e complementar, de mais dois tipos de rankings, para além de ter utilidade duvidosa (para que serve saber que uma determinada escola está em 735.º lugar no ranking dos exames, em 361.º  no ranking da superação e em 2.º no ranking da equidade...?), não altera a mensagem falaciosa que se quer fazer passar: as escolas privadas ocupam os lugares cimeiros (do ranking dos exames, é esse que conta), logo o ensino privado tem mais qualidade, logo há que avançar com políticas de livre escolha, alegadamente permitindo “o acesso dos pobres a uma boa escola”...

Sejamos claros: 50 anos depois do 25 de Abril, o debate relevante para o país não é o que os rankings alimentam. O paradigma de uma escola de qualidade numa democracia não pode ser uma escola privada cujas condições de acesso e de frequência só são acessíveis a uma minoria. Se, em Portugal, a condição de recursos é (ainda) o principal preditor do insucesso escolar, o que urge discutir é o que o país tem de fazer para acabar com a pobreza e, depois, o que o país tem de fazer para garantir uma escola pública da mais alta qualidade para todos, sem exceção. Continuaremos a dar o melhor de nós para esse combate, sublinhando o papel da educação pública na concretização dos valores e ideais de Abril e continuando a exigir que para ela sejam canalisados os recursos necessários à concretização dessa importante missão.

 

Manuela Mendonça
Presidente do Conselho Nacional