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Duas palavras

A nossa luta faz-se!

29 de dezembro, 2023

Manuel Guerra, membro do Conselho Nacional da FENPROF, dirigente do SPGL

Há largos anos que na Escola Artística António Arroio, em Lisboa, alunos, professores, demais trabalhadores e quem vier por bem encontram no átrio de entrada a inscrição «O nosso saber faz-se». Permito-me «refazer», no título deste artigo, essa inscrição.

Afinal, nos passados dias 15 a 21 de Dezembro de 2023, depois da longa e justa luta dos docentes de técnicas especiais da Escola Artística António Arroio (Lisboa) e da Escola Artística de Soares dos Reis (Porto), sempre em articulação com a FENPROF e os seus sindicatos, bem como da injustificada ausência de diálogo ou «espera» por parte dos Ministérios da Educação dos XXII Governo Constitucional (2019-2022) e XXIII Governo Constitucional (2022-2024), foi aberta — finalmente! — a aplicação do Concurso Extraordinário dos docentes de técnicas especiais do Ensino Artístico Especializado (Artes Visuais e Audiovisuais).

Relembre-se que, tal como sempre foi exigido pela FENPROF e pelos professores, a realização deste concurso extraordinário (que dará resposta no imediato a colegas com largos anos em situação precária) é ainda acompanhada da consagração de um modelo ordinário de selecção e recrutamento (cf. Decreto-Lei n.º 94/2023, de 17 de Outubro), o que permitirá, entre outros aspectos, que futuros docentes encontrem uma forma justa e previsível de vincular, sem estarem dependentes de novos procedimentos extraordinários. Na prática, o referido Decreto-Lei alarga o regime específico de selecção e recrutamento de docentes dos ensinos artísticos especializados da música e da dança aos docentes das artes visuais e audiovisuais, nos estabelecimentos públicos de ensino.

Mas a realização de tão aguardado concurso e consagração de modelo de selecção e recrutamento, não faz esquecer os passos trilhados ao longo de anos, designadamente os forjados nos núcleos sindicais das escolas, a verdadeira «sede» dos nossos sindicatos. Não faz esquecer, igualmente, quem esteve sempre ao lado dos docentes e não apenas no momento de assinatura de acordos ou à beira das eleições. Por estes dias são várias as promessas apregoadas de quem, tendo tido responsabilidades e possibilidades de inverter o estado a que chegámos, na prática e na clareza das acções fez exactamente o seu contrário. Sim, tal como várias outras situações tendo em vista a valorização da profissão docente e da Escola Pública que aguardam resposta, também esta há muito podia estar resolvida, designadamente se os sucessivos Governos tivessem escutado a FENPROF ou se o XII Governo Constitucional do PS tivesse, em 2021, cumprido a Lei da República (Lei n.º 46/2021, de 13 de Julho), no seguimento da aprovação dos Projectos de Lei n.º 660/XIV/2 (PCP) e n.º 762/XIV/2 (BE)].

Pelo caminho permanecerá o exemplo de quem sempre lutou até que a justeza dos anseios fosse uma realidade. Entre tantas referências que poderiam ser convocadas, lembrem-se bem, a título de exemplo, algumas das iniciativas realizadas pelos docentes e a FENPROF, tais como:

— as inúmeras conversas e reuniões sindicais promovidas nos núcleos sindicais das Escolas Artísticas, sempre em articulação com delegados e dirigentes sindicais do SPGL / SPN, e na qual cada colega teve a oportunidade de participar na discussão e definição de formas de acção;

— a elaboração da primeira tomada de posição e abaixo-assinado (2020), enviados ao então ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, e aos então secretários de Estado, João Costa e Inês Ramires, documentos que nunca obtiveram qualquer resposta, à semelhança de tantas outras missivas enviadas posteriormente;

— as concentrações realizadas à porta das Escolas Artísticas (16 de Fevereiro de 2021, 19 de Abril de 2021, 25 de Maio de 2022), como as levadas a cabo em plena pandemia e onde os docentes afirmaram que «Mesmo com máscara, temos rosto e direitos!»;

— as acções de luta realizadas em frente à Assembleia da República e à Residência Oficial do primeiro-ministro;

— a mobilização para as inúmeras iniciativas convocadas pela FENPROF e os seus sindicatos ou em acções de convergência com os demais trabalhadores, promovidas pela Frente Comum e pela CGTP-IN.

Perante a avassaladora falta de professores, como foi e ainda é afinal possível continuar a insistir na desvalorização e na precariedade de todos os homens e mulheres que já estão no sistema ou que abandonaram a profissão, em condições de vincular? A única resposta plausível, infelizmente, é a deliberada intenção de embaratecer e desvalorizar a profissão docente e, consequentemente, a Escola Pública nascida com Abril.

Permitam-me, pois, que entre tantas outras situações de precariedade injustas, lembre a situação específica vivida pelos nossos colegas do Teatro e da Expressão Dramática. Também neste domínio, como há muito a FENPROF reclama, os sucessivos Ministérios da Educação e Governos do PS e do PSD, com ou sem CDS-PP, poderiam ter feito mais, muito mais. Não é, pois, admissível que estes professores continuem a não estar abrangidos por qualquer processo justo de vinculação!

 

Colega,

Se foi pela luta e intervenção dos professores e dos sindicatos da FENPROF que se alcançou, em 2021, a referida Lei da República que o Governo não cumpriu e hoje finalmente é aplicada, será igualmente pela luta, alicerçada no profundo conhecimento da realidade e na disponibilidade de sempre para o diálogo, que teremos de continuar a bater-nos no âmbito da proposta reivindicativa mais vasta de erradicação plena da precariedade na Escola Pública.