Intervenções
15.º Congresso

Manuela Mendonça (presidente do Conselho Nacional): sobre gestão democrática das escolas

29 de maio, 2025

Congresso após congresso, enquanto responsável da FENPROF para a área da Gestão das Escolas, tenho vindo falar da importância da gestão democrática:

… a lembrar que o regime de gestão escolar não é meramente técnico nem pedagogicamente neutro: o modo de vida democrático aprende-se com experiências democráticas e a escola – onde as crianças e jovens passam cada vez mais anos das suas vidas – é o principal espaço de realização dessa aprendizagem;

… a lembrar que o atual modelo de gestão tem agravado as condições de trabalho na escola pública, constituindo hoje um fator favorecedor da erosão da vida democrática das escolas e do desgaste pessoal e profissional dos docentes. No estudo encomendado pela FENPROF à Universidade Nova de Lisboa, em 2018, sobre o Desgaste da Profissão Docente, a par de outros fatores (idade dos professores, burocracia, indisciplina...), o modelo de gestão é apontado como uma das causas dos elevados índices de cansaço e exaustão emocional. Os autores do estudo sublinham que as causas do mal-estar docente não são individuais, são problemas de organização do trabalho, pelo que se impõe alterar o modelo de governação da escola.

Por tudo isto, nos últimos 17 anos, foram muitos os momentos em que a FENPROF procurou colocar na agenda política a necessidade de uma alteração legislativa nesta área. O anúncio de que, no decurso deste ano letivo, o governo iria proceder à alteração do atual regime poderia ser uma boa notícia, não fora o caminho apontado no programa do governo para essa revisão. A FENPROF recusa qualquer caminho que leve à criação da carreira do diretor; que transfira a gestão dos professores para as escolas ou para as autarquias; que introduza no processo de recrutamento dos docentes critérios como o local de residência e a avaliação do desempenho; que desresponsabilize o Estado central pelo financiamento da educação pública; que prossiga com a municipalização da educação.

Considerando fundamental tornar clara a posição dos professores sobre o que defendem que seja mudado no atual regime e o que recusam que lhes seja imposto, a FENPROF realizou uma consulta, em que participaram 7168 professores, de centenas de agrupamentos de escolas ou escolas não agrupadas dos 18 distritos do continente. Importa a este respeito lembrar que nas regiões autónomas ainda existe um modelo de gestão democrática – outra das contradições que os partidos que têm assumido a governação do país nunca foram capazes de explicar…

Em conferencia de imprensa, realizada no dia 6 de fevereiro, a FENPROF divulgou as conclusões do inquérito. Destaco algumas das questões que obtiveram percentagens de resposta acima de 80%:

… 93% defendem que o órgão de gestão deve ser colegial;

… para 93%, o órgão de gestão deve ser eleito por todos os professores, funcionários e representantes dos encarregados de educação e alunos.

… para 95%, os coordenadores dos departamentos devem ser livremente eleitos pelos seus pares;

- 83% consideram os mega-agrupamentos unidades orgânicas desumanizadas e sem racionalidade pedagógica;

- para 90%, a descentralização na educação deve ser feita pela transferência de competências para Conselhos Locais de Educação e para as escolas, sendo residual o número dos que defendem mais competências para as Câmaras Municipais (apenas 2%);

- 86 % discordam do estabelecimento do estatuto de diretor de escola, que inclua um modelo especial de remuneração e de avaliação.

Já com este inquérito a decorrer, foi tornada pública a Recomendação n.º 01/2024 do Conselho das Escolas. Alguns dos pontos dessa recomendação, configurando o reforço das competências e autonomia do diretor, estão nos antípodas do que os professores defendem neste inquérito. Eis o que defende o Conselho das Escolas:

  • a manutenção de um órgão unipessoal e a possibilidade de ele vir a escolher toda a sua equipa com elementos externos à escola;
  • a seleção do diretor através de concurso, e não de eleição;
  • a possibilidade de o diretor recrutar diretamente uma percentagem do corpo docente;
  • a designação direta pelo diretor de todos os cargos de liderança intermédia.

Da resposta dada a perguntas corelacionadas, podemos afirmar que, a estas pretensões do Conselho das Escolas, os professores dizem inequivocamente NÃO! 

A FENPROF apresentará as conclusões desta consulta ao próximo ministro da educação, qualquer que ele seja, exigindo que elas sejam tidas em conta no processo de revisão do atual regime de gestão. E lembrará, mais uma vez, a importância das recomendações do Painel de Alto Nível das Nações Unidas sobre a Profissão Docente, quando apelam aos governos para que garantam que os professores e as suas organizações são chamados a participar no diálogo social e na negociação coletiva, e que este quadro de colaboração é o principal meio para desenvolver políticas na área da educação, do ensino e da profissão docente. Recomendações que estão em linha com o lema do Dia Mundial do Professor 2024, Valorizar a voz dos professores, que realça o papel fulcral dos professores na elaboração das políticas educativas.

É tempo de os decisores políticos reconhecerem que devem ser a experiência e o saber dos professores a informar e a desenhar as políticas que os afetam. Também no que respeita à gestão das escolas, nada sobre os professores sem os professores e, muito menos, contra os professores!

PELA GESTÃO DEMOCRÁTICA DAS ESCOLAS, VAMOS À LUTA!