Intervenções Gestão Democrática das Escolas
14.º Congresso

Manuela Mendonça (Pres. CN): Gestão Democrática das Escolas

16 de maio, 2022

Quando comecei a pensar no que podia dizer aqui hoje sobre a importância da gestão democrática e a luta que a FENPROF tem travado para a defender, questionei-me sobre o que é que poderia acrescentar de novo, ao que, sobre esta matéria, disse já noutros congressos.

E concluí que a resposta é: muito pouco!

- porque os problemas relativos ao atual regime de gestão escolar se arrastam desde 2008, sem que nada de significativo tenha sido alterado;

- porque a análise crítica que fazemos do cariz antidemocrático do modelo em vigor também não se alterou – apenas se reforçou;

- porque a defesa da gestão democrática sempre esteve na agenda reivindicativa da FENPROF e por isso, nos últimos 3 anos, continuamos a desenvolver iniciativas junto do Governo e da Assembleia da República, visando uma alteração legislativa nesta área;

- porque, tendo alguns partidos apresentado novas iniciativas legislativas para alterar o atual regime, essas iniciativas tiveram exatamente o mesmo resultado de outras idênticas no passado: o voto contra dos dois maiores partidos, inviabilizando qualquer alteração;

- e também porque – por razões que valerá certamente a pena aprofundar –, apesar de os professores se manifestarem recorrentemente preocupados com a falta de gestão democrática nas escolas, não tem sido possível mobilizá-los em grande número para desenvolver uma ação mais impactante, capaz de desequilibrar a correlação de forças a nosso favor, obrigando o governo a alterar o atual regime.

Registo que nos dois ciclos de debates promovidos pelo Centro de Formação Salvado Sampaio, em 2021 e 2022, em ambos, o primeiro tema em discussão foi em torno desta temática. Relembro aqui alguns tópicos abordados no primeiro desses debates, que teve justamente como lema “Pela democracia nas escolas!” e que contou com a participação do Professor Licínio Lima e de três deputadas - do BE, do PCP e do PAN – em representação dos grupos parlamentares que tinham apresentado iniciativas legislativas (dois projetos de lei e um projeto de resolução respetivamente), visando a alteração do DL 75/2008. 

Nesse debate, Licínio Lima, afirmando que a democracia e a participação nas escolas não são hoje preocupações políticas, educativas ou pedagógicas, antes estando subordinadas a lógicas de ação de tipo gestionário, apresentou algumas das principais conclusões de um estudo da Universidade do Minho, ‘Diretores Escolares em Ação’.

Destaco algumas:

- definido pelo legislador como o “rosto da escola”, o diretor mais facilmente pode ser transformado no rosto do Ministério junto de cada escola; 

- preside, por inerência, ao conselho pedagógico, hoje fortemente menorizado, e evidencia grande influência na composição do conselho geral, que tende a desvalorizar;

- apresenta-se como candidato ao cargo com um projeto de intervenção que, se em princípio se deve adequar ao Projeto Educativo em vigor, não deixa de poder ser tomado como referência para inverter aquela hierarquia;

- revela um poder de agendamento no interior do conselho geral que lhe garante uma grande influência nesse órgão, apesar de, formalmente, se encontrar impedido de votar.

Assinalando o facto de o diretor concentrar um conjunto alargado de poderes, num claro contraste com o modelo anterior, Licínio Lima lamentou a forma despolitizada como vários atores escolares inquiridos (professores incluídos) afirmam que, apesar de tudo, nada de essencial mudou, relevando o facto de, em muitas situações, o diretor ser o anterior presidente do conselho executivo, não compreendendo como o modelo de governação foi profundamente alterado, de resto um dos objetivos políticos assumidos pelo legislador.

Relativamente aos projetos legislativos à data em discussão, registo que, embora partissem de ângulos diferentes, as perspetivas defendidas eram, em muitos aspetos, convergentes, tendo a FENPROF, em parecer emitido por solicitação da Assembleia da República, expressado a sua concordância genérica com os motivos invocados nos três projetos, assim como com muitas das soluções propostas. Projetos que, sem surpresa, viriam a ser todos chumbados pelo PS e pelo PSD.

Aqui chegados, e reconhecendo todas as dificuldades, nesta como noutras matérias, só se perdem as lutas que se abandonam. E por isso, no início de uma nova legislatura em que o problema da falta de professores está na agenda política e mediática, este é também o momento de deixar claro que se o governo está preocupado e quer de facto inverter a situação dramática a que chegamos, a par da revalorização da carreira ou do rejuvenescimento da profissão, terá de melhorar as condições de trabalho nas escolas. E se há fator determinante para a qualidade das relações de trabalho e do próprio clima de escola, é o seu modelo de governação. Como é fácil constatar, e a investigação tem comprovado, o atual modelo tem inquestionavelmente contribuído para a deterioração do clima de trabalho e para a erosão da vida democrática das escolas, pelo que se impõe a sua alteração.

A LUTA CONTINUA!