Seminário Internacional
14.º Congresso

Manuela Mendonça: Abertura do Seminário Internacional

13 de maio, 2022

Manuela Mendonça

Presidente do Conselho Nacional e Secretária para as Relações Internacionais da FENPROF

 

Em nome do Departamento de Relações Internacionais da FENPROF, saúdo todos os participantes neste seminário (os que se encontram aqui presencialmente e os que nos acompanham à distância) e agradeço, de forma particular, a todos os convidados que nos honram com a sua presença, enquanto representantes de sindicatos com quem a FENPROF mantém laços de solidariedade, cooperação e até de amizade há muitos anos.

Nem sempre é fácil conciliar agendas, e foi o que aconteceu este ano, em que a data do nosso congresso coincide com a da Cimeira Internacional sobre a Profissão Docente (que está a decorrer em Valência) e da Assembleia Geral da Federação Mundial dos Trabalhadores Científicos (FMTC), que está a ter lugar em Marraquexe, iniciativas que impediram a presença no nosso congresso de representantes de algumas organizações, nomeadamente da Internacional da Educação (IE), do Comité Sindical Europeu da Educação (CSEE-ETUCE) e da FMTC, para além de representantes de outros sindicatos envolvidos nessas e noutras iniciativas, como o SNES-FSU, que realiza também nesta semana o seu congresso. Alguns fizeram-nos chegar mensagens em vídeo que projetaremos no decurso de seminário ou, no caso do secretário-geral da IE, amanhã, na sessão de abertura do congresso. 

Justificadas as ausências, quero sobretudo, nesta ocasião, dirigir-me aos presentes, valorizando o esforço que fizeram para estarem aqui hoje connosco, vindos de várias regiões do mundo – da Europa, de África, da América Latina. É com muita satisfação que vos recebemos, num congresso em que voltamos a estar face-a-face, depois de dois anos em que a pandemia só nos permitiu reunir de forma virtual e por isso só temos podido ver-nos num écran de um computador. Sejam bem vindos, também a este seminário internacional, que, como habitualmente, realizamos no dia anterior ao congresso, e que é um espaço de encontro dos convidados internacionais com dirigentes da FENPROF, de partilha de preocupações e experiências, de debate sobre problemas comuns e sobre a estratégia sindical para lhes dar resposta.

Uma breve informação sobre a organização do debate:  como pontapé de saída, eu partilharei convosco algumas notas sobre o tema do seminário, que é também o do nosso congresso, e a seguir passarei a palavra ao André Carmo, que, enquanto membro do Departamento do Ensino Superior e Investigação da FENPROF, completará esse enquadramento. Abriremos depois o debate, convidando para a primeira intervenção o Rob Copeland, em representação do Comité Consultivo do CSEE para o Ensino Superior e a Investigação (HERSC), a quem propusemos uma intervenção de 10 minutos. A partir daí, darei a palavra aos companheiros que o desejarem, e projetaremos também as mensagens em vídeo que nos chegaram, reiterando o apelo para que cada organização não ultrapasse os 5 minutos. No final das vossas intervenções, darei a palavra ao José Augusto Cardoso, membro do Conselho Nacional da FENPROF e secretário geral da CPLP-SE (estrutura que reúne as organizações sindicais da educação dos países de língua oficial portuguesa), e, por fim, para encerrar o seminário, passarei a palavra ao SG da FENPROF, Mário Nogueira.

Entrando então na temática que nos propomos discutir, o lema do 14.º Congresso Nacional dos Professores - “A educação não pode esperar! Combater desigualdades, valorizar a profissão” -   chama a atenção para dois dos graves problemas que afetam o sistema educativo português: a desigualdade de oportunidades educativas e a deterioração das condições de exercício da profissão docente.

Só um investimento continuado na educação pública permitirá melhorar as condições de exercício da profissão docente e, ao mesmo tempo, responder a défices de aprendizagem que a pandemia agravou e que empurram muitas crianças e jovens para percursos de insucesso. O reforço do financiamento da educação é uma questão central, que não pode esperar.

Esta questão coloca-se hoje ainda com maior premência, num contexto de crise económica e social, não apenas decorrente da pandemia, mas também do impacto da guerra na Ucrânia, que, para lá de uma dramática crise humanitária, está a provocar um aumento acentuado do custo de vida em muitos países, assim como uma tendência de reforço do investimento na área da defesa, em detrimento da área social.  Isto tornará a nossa reivindicação dos 6% do PIB para a educação porventura ainda mais difícil de alcançar, mas por isso mesmo também, ainda mais premente.

Uma das lições da pandemia prende-se com um maior reconhecimento social do papel insubstituível das escolas e dos professores. Ao revalorizar o papel da Escola – como espaço de aprendizagens diversas, mas também de socialização e de acolhimento –, a pandemia reforçou a exigência de escolas públicas mais fortes e de mais oportunidades para todos os alunos. Por outro lado, hoje é claro que o digital é um importante recurso ao serviço da pedagogia, mas não poderá substituí-la – a presença, a interação física de alunos e professores é basilar e decisiva no processo de ensino-aprendizagem.

Este é, por isso, também o momento de traduzir essa maior consciencialização da importância do trabalho docente em melhorias nas condições de trabalho dos professores. Exige-se o desenvolvimento de processos de negociação que permitam resolver problemas que vêm tornando a profissão docente cada vez mais desgastante e menos atrativa. São disso exemplo a desregulação das carreiras, a intensificação e burocratização da atividade docente, a sobrecarga de trabalho, a precariedade de emprego, a tecnocracia na gestão escolar, o envelhecimento da profissão. Problemas que afetam de forma transversal todos os setores, da educação pré-escolar ao ensino superior, do ensino público ao ensino particular e cooperativo.

Das questões que vão estar em debate no nosso congresso, quero destacar, pela sua importância e atualidade, a falta de professores – um problema grave que já hoje afeta mais de 20 mil alunos e que, segundo estimativas recentemente vindas a público, poderá vir a afetar 100 mil no próximo ano e 250 mil em 2025.

Este é um problema que tem sido negligenciado pelo poder político e que tenderá a agravar-se muito nos próximos anos, com a aposentação de milhares de professores. Até 2030, mais de metade do atual corpo docente terá saído das escolas por atingir a idade legal da aposentação (que é neste momento de 66 anos e 7 meses), sem que tenha sido acautelada a sua substituição ou uma progressiva e natural renovação, o que compromete a passagem de testemunho inter-geracional, aspeto relevante na cultura profissional docente.

Neste contexto, é urgente criar condições que permitam o regresso às escolas de milhares de professores qualificados que abandonaram a profissão na última década e se encontram atualmente a exercer outras atividades, por falta de perspetivas de futuro na área da docência.

É igualmente urgente aumentar o número de jovens a frequentar cursos de formação inicial de professores. Lembro que, no âmbito dos dados recolhidos pelo PISA, apenas 1,5% dos jovens portugueses de 15 anos admitem vir a ser professores, bem abaixo da média de 5% verificada na OCDE, importando, no entanto, sublinhar, que a baixa percentagem de jovens a desejar um futuro na docência não resulta de uma opinião negativa dos seus professores. Pelo contrário, os jovens portugueses são dos que neles depositam maior confiança.

Sabemos que a perda de atratividade da profissão é hoje um problema à escala mundial. O Relatório Global sobre o Estatuto dos Professores em 2021, divulgado pela Internacional da Educação, retrata uma profissão subvalorizada, mal remunerada e sobrecarregada de tarefas, constatando que a profissão docente já não consegue atrair novas gerações de educadores devido às condições de emprego e alertando para que a contínua falta de professores prejudica o direito de cada aluno a uma educação de qualidade.

Por outras palavras, não é só o futuro da profissão que está em risco. É também o futuro da escola e da educação, e a vida de todas essas crianças, jovens e adultos com quem, e para quem, os professores quotidianamente trabalham.

Reverter reste caminho é, assim, um desafio maior, em Portugal e em muitos outros países. Daí a necessidade de reforçarmos a nossa ação coletiva,  partilhando experiências  e potenciando a nossa luta. Num mundo globalizado, nenhum combate se trava apenas à escala nacional, sem uma articulação com o regional e o global. Por isso é tão importante o trabalho que realizamos juntos, especialmente no seio da IE, do CSEE e da CPLP-SE. E é também para prosseguir esse trabalho que aqui estamos.