Política Educativa Todas as notícias
Plano Escola+ 21|23

Escolas identificam dificuldades na concretização dos planos de recuperação

25 de fevereiro, 2022

O ministério da Educação apontou o ano letivo de 2021-2022 como o primeiro de dois anos em que as escolas desenvolveriam planos de recuperação, no âmbito do designado Plano Escola+ 21|23. Em devido tempo a FENPROF expressou as suas preocupações relativamente à eficácia deste plano, considerando que os défices que persistem nas escolas são estruturais, não decorrem dos problemas provocados pela Covid-19 (ainda que esta os tivesse agravado), devendo, por isso merecer outro tipo de respostas; ademais, duvidava que as escolas pudessem contar com os recursos necessários para porem em prática os planos que, ainda assim, viessem a elaborar.  

Foi neste contexto, e com o objetivo de acompanhar a concretização dos designados planos de recuperação das aprendizagens, que a FENPROF enviou aos diretores dos Agrupamentos de Escolas/ Escolas não Agrupadas (AE/EnA) um questionário destinado a recolher informação sobre as propostas apresentadas no âmbito do referido Plano, assim como do nível de acolhimento por parte da tutela. A FENPROF pretendia, assim, saber se as escolas tinham elaborado planos de recuperação das aprendizagens e se dispunham de recursos adicionais para os levar a cabo.

Das 114 respostas ao questionário (cujos dados são apresentados mais à frente), conclui-se que a esmagadora maioria (80% do total) elaborou um plano de recuperação das aprendizagens, mas não teve reforço nem de crédito horário, nem de pessoal docente, relativamente ao ano anterior. Foi apenas possível recrutar alguns técnicos especializados, em número irrisório face às necessidades.

Acontece que os problemas não se esgotam nesta insuficiência de condições sentida pelas escolas. A estes acrescem as caraterísticas, mais uma vez atípicas, de um ano letivo que teve um primeiro período com centenas de turmas em isolamento e milhares de estudantes, docentes e trabalhadores não docentes em intermitência presencial e um segundo período que se iniciou mais tarde e, devido à alta transmissibilidade da variante ómicron, com o número de novas infeções diárias a atingir as dezenas de milhar até meados de fevereiro, o que teve forte impacto nas comunidades escolares. 

Com efeito, apesar de, este ano, as escolas terem permanecido abertas, o trabalho realizado não foi o que se esperava e seria normal. A juntar à descontinuidade pedagógica decorrente  de um número anormal de ausências às atividades letivas, o processo de ensino-aprendizagem foi ainda afetado pelo sistema de aprendizagem híbrido/misto adotado em várias escolas, certamente para possibilitar que os alunos em isolamento pudessem assistir às aulas que decorriam presencialmente, mas com resultados pouco satisfatórios, quer para os alunos que estavam online, quer para os que estavam na sala de aula e não puderam ter os seus professores concentrados nessa relação pedagógica. Para além do prejuízo para os alunos, esta prática representou mais um acréscimo de desgaste para muitos professores, impedidos de fazer bem o seu trabalho e, não raras vezes, a terem de interromper as aulas ou de atrasar o seu início, devido às condições técnicas da transmissão ou à intromissão de pais e encarregados de educação que reclamavam da insuficiente atenção do professor(a) ao seu educando... 

Para a FENPROF, será importante que os Conselhos Pedagógicos das escolas que adotaram esse procedimento procedam a uma avaliação, junto dos professores envolvidos, das (des)vantagens dessa experiência que, segundo muitos professores(as) acrescentou problemas aos já existentes. Importa lembrar que há procedimentos legalmente previstos e aplicados há muitos anos, para quando um aluno está ausente das aulas durante um determinado número de dias. Esse aluno é objeto de um plano de acompanhamento e recuperação aquando do seu retorno à escola e isso sempre funcionou.

Face ao que antes se afirma, o ano letivo 2021/22 não pode ser considerado como o do regresso à normalidade e, como tal, o primeiro dos dois anos previstos para recuperar perdas acumuladas nos anteriores. Impõe-se, por isso, estender este período de recuperação dos défices de aprendizagem, mas, desta vez, garantindo o reforço de recursos para a sua concretização. Impõe-se também adequar as condições de realização dos exames e provas finais de ciclo às circunstâncias excecionais de mais um ano letivo.

Nesse sentido, a FENPROF defende a adoção, também este ano, do regime de exames no final do secundário que vigorou nos dois anos letivos anteriores, mantendo as mesmas disposições: no acesso ao ensino superior, os estudantes deverão fazer, apenas, os exames nacionais tidos como necessários.

Da mesma forma, constituindo a questão dos exames apenas uma parcela do processo de avaliação dos alunos, onde as dificuldades atuais se acumulam às dos anos letivos anteriores, a FENPROF reafirma que não tem sentido manter as provas de aferição nos moldes atuais, nem as provas finais de 9.º ano, já que os constrangimentos que têm marcado o ensino e a aprendizagem durante o período pandémico influenciarão, necessariamente, os resultados, retirando-lhes significado. 

A este propósito, a FENPROF lembra, ainda, a necessidade de avançar para outro regime de acesso ao ensino superior, como tem sido recomendado por diferentes entidades e organizações de que é exemplo o Conselho Nacional de Educação na sua Recomendação sobre o acesso ao ensino superior e a articulação com o ensino secundário (Recomendação n.º 6/2020). 

 

PLANO ESCOLA + 21|23

QUESTIONÁRIO PROMOVIDO PELA FENPROF COMPROVA INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS PARA RECUPERAÇÃO DAS APRENDIZAGENS

Resultados em gráficos

       

 OBJETIVO DO QUESTIONÁRIO

Como já foi anteriormente referido, no quadro das preocupações expressas na posição da FENPROF sobre o Plano Escola + 21|23e com o objetivo de acompanhar a concretização dos designados planos de recuperação das aprendizagens, a FENPROF decidiu recolher dados sobre os planos elaborados pelas escolas, assim como os recursos adicionais de que poderão dispor para os concretizar. Para esse efeito, elaborou um questionário que enviou para os diretores dos AE/EnA do continente.

 

        — UNIVERSO E CARATERIZAÇÃO DAS RESPOSTAS

FENPROF recebeu 114 respostas. Não correspondendo a uma amostra pré-determinada, as conclusões a retirar não podem ser generalizadas. Contudo, esta recolha de dados é significativa, não apenas pelo número de respostas, mas também pela diversidade do universo de AE/EnA, característica do nosso sistema escolar.

Destas 114 respostas, 105 correspondem a Agrupamentos de Escolas e 9 a Escolas não Agrupadas. Destas, sete são Escolas Secundárias, uma é Escola Básica e Secundária e outra é Escola Artística. Dezassete (17) dos Agrupamentos de Escolas que constituem este universo são Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP).

A nível geográfico, esta recolha de informação abrange Agrupamentos dos 18 distritos do continente (Aveiro, Beja, Braga, Bragança, Castelo Branco, Coimbra, Évora, Faro, Guarda, Leiria, Lisboa, Portalegre, Porto, Santarém, Setúbal, Viana do Castelo, Vila Real e Viseu), integrando escolas de 79 concelhos.

Relativamente aos níveis de educação e ensino ministrados, 103 AE/EnA integram a Educação Pré-escolar e o 1.º CEB; 104 o 2.º CEB, 105 o 3.º CEB, 64 o Ensino Secundário, 55 o Ensino Profissional e 14 o Ensino Artístico Especializado.

De referir ainda que os responsáveis pela resposta ao questionário são, na sua maioria, Diretores (78) ou membros da Equipa da Direção (30). Entre os respondentes, há ainda quatro membros do Conselho Pedagógico e um coordenador de Grupo de trabalho interno.

 

        NOTAS A DESTACAR DAS RESPOSTAS AO QUESTIONÁRIO:

1.  80% dos AE/EnA que responderam ao inquérito (91 em 114) dizem ter um plano para a recuperação das aprendizagens integrado no Plano Escola + 21|23.

Os 5% que dizem não ter elaborado um plano justificam essa opção quer por falta de expectativas em obter resposta positiva, quer por não terem sentido necessidade de mais recursos.

Estes Planos foram aprovados em momentos diferentes: apenas em 25% dos casos a aprovação teve lugar no final do ano letivo anterior.

2.  A esmagadora maioria dos AE/EnA (83%) respondem não ter tido reforço de contratação de pessoal docente relativamente ao ano anterior, o que desmente qualquer intenção séria, por parte do ministério da Educação, de investir na recuperação das aprendizagens dos alunos. Mesmo os 17% que responderam positivamente explicitam que, para além do aumento de crédito horário (que, como se viu no item anterior, foi diminuto), a dimensão desse reforço foi, na maioria dos casos, de um docente (do 1.º CEB, de Inglês do 1º CEB, ou da educação especial). Um caso houve em que o reforço foi de 2 docentes do 1.º CEB.

3. Ao nível dos recursos humanos, foi excecionalmente autorizada a contratação de alguns técnicos especializados e de outro pessoal não docente, situação referida por 55% dos diretores. Contudo, mesmo nessa situação, esse reforço ficou-se, na grande maioria dos casos (25 AE/EnA), pela contratação a tempo inteiro (ou a meio tempo) de apenas mais um técnico especializado: em geral, um psicólogo, noutras situações um assistente social, um terapeuta da fala, um educador social, um animador sociocultural, um formador de teatro, um mediador social ou um técnico de informática. 11 diretores referem ter podido contratar mais dois técnicos, registando-se apenas 2 AE/EnA que referem 4, e 1 que refere 5.  Mas, mesmo nestes (poucos) casos, há várias referências a que estas contratações tiveram lugar ao abrigo do Plano de Desenvolvimento Pessoal, Social e Comunitário (PDPSC) ou no âmbito do Plano Nacional para a Promoção do Sucesso Escolar (PNPSE), e não ao abrigo do Plano Escola + 21|23. Se tivermos em conta a dimensão dos mega-agrupamentos e a complexidade dos problemas que os carateriza, facilmente concluímos que, mesmo esta contratação extraordinária de alguns técnicos especializados, é manifestamente insuficiente.

4. De registar que um número significativo de AE/EnA (32) diz não ter apresentado propostas à tutela de medidas no âmbito do plano de recuperação de aprendizagens, quer por falta de expetativas em obter resposta positiva (“foi afirmado numa videoconferência com o ME que não existiriam reforços de meios”), quer por considerarem desajustado o momento em que a discussão foi lançada (“a data de lançamento do Plano 21|23 [julho/ 2021] sobreposta com a data do lançamento do ano letivo não permitiu à escola ponderar as medidas mais coerentes com a dinâmica do funcionamento da escola e das necessidades dos alunos, envolvendo todos os docentes nessa reflexão, a comunidade docente, no final do mês de julho”).

Contudo, há outros AE/EnA que referem terem proposto ao ME várias medidas, que não foram atendidas. Destas relevam: reforço do crédito horário e recursos humanos; coadjuvações; desdobramentos de turmas; complemento de horários; apoio tutorial específico; mais docentes de Educação Especial; mais apoios para alunos com dificuldades de aprendizagem, designadamente alunos com necessidades educativas especiais; oficinas/aulas de recuperação de disciplinas onde os alunos não obtiveram sucesso, mesmo tendo transitado de ano; oficinas de escrita, de leitura; turmas mais pequenas, entre outras.

5. De relevar as opiniões das direções dos AE/EnA quanto às medidas não tomadas e que consideram necessárias: 82% referem a importância de turmas mais pequenas para um ensino personalizado; 70% indicam a necessidade de mais professores para trabalho de coadjuvação; 52% reclamam mais apoios pedagógicos para alunos com necessidades educativas especiais; 70% defendem horários pedagogicamente adequados (com mais tempo para os professores trabalharem com alunos e menos tarefas burocráticas); 69% consideram necessário um maior reforço das equipas multidisciplinares (com psicólogos, técnicos de serviço social e animadores socioculturais, entre outros).

São medidas que a FENPROF vem defendendo há muitos anos, mas que continuam sem resposta por falta de vontade política de sucessivos governos. Como se comprova, ainda não será desta, com o Plano Escola + 21|23, que as escolas disporão de mais condições para ultrapassar os muitos obstáculos à promoção do sucesso educativo de todos os alunos. Por muito que a retórica governativa nos queira convencer do contrário…

 

Porto, 24 de fevereiro de 2022 

O Secretariado Nacional da FENPROF