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Uma Lei de Bases para a Educação retrógrada, elitista, perigosa e antidemocrática

07 de fevereiro, 2004

  UMA MAIORIA SOLITÁRIA QUER IMPOR AOS PORTUGUESES

UMA LEI DE BASES PARA A EDUCAÇÃO
RETRÓGRADA, ELITISTA, PERIGOSA E ANTIDEMOCRÁTICA

Numa altura em que os partidos que suportam o actual Governo na Assembleia da República se preparam para aprovar sozinhos uma nova Lei-Quadro para a Educação, fazendo vingar a força de votos que aí dispõem de uma maneira tão cega e autoritária que a palavra consenso aparece como irredutivelmente varrida do seu léxico político e as posições dos partidos da oposição são ignoradas de forma arrogante e prepotente, a Federação Nacional dos Professores, FENPROF, e a Direcção Geral da Associação Académica de Coimbra (DG.AAC) não podem deixar de tornar pública uma primeira posição sobre tal acontecimento, se mais não fosse pelo facto concreto de estarmos perante uma matéria de transcendente importância para o futuro do nosso país.

Com a autoridade de quem desbravou, antes de todos, os caminhos do debate público sobre a proposta do Governo, os projectos dos partidos da oposição e difundiu as suas próprias posições, a FENPROF provocou um agendamento de discussões que percorreu todo o país e estimulou outro tipo de iniciativas de cariz semelhante por parte de outras forças e organizações da sociedade portuguesa. Também a DG.AAC promoveu a reflexão e o debate na Academia de Coimbra, tendo assumido e divulgado posições próprias e em tempo oportuno. Com essa autoridade dizemos que a proposta final saída do crivo da Comissão de Educação, Ciência e Cultura da Assembleia da República e agora levada a Plenário pode ser tudo menos a resultante das discussões realizadas e muito menos uma aproximação a um consenso social alargado que seria legítimo esperar fosse gerado em torno de uma lei tão importante para os destinos do país.

Assim sendo, a primeira nota que a DG.AAC e a FENPROF fazem questão de agora registar é a de que esta Lei que a Assembleia se prepara para aprovar é uma lei de conjuntura, uma lei aprovada apenas pela direita parlamentar, uma lei incapaz de mobilizar em torno dela todas as sinergias de que o nosso sistema educativo necessita para combater mais eficazmente a exclusão, o insucesso e o abandono escolares, e enveredar por caminhos de equidade e democraticidade tanto no acesso como no sucesso escolar e educativo das novas gerações e muito menos adoptar caminhos que conduzam a uma melhor formação e qualificação da população activa.

Em síntese, estamos perante uma Lei que, pela maneira como foi elaborada, trabalhada e aprovada, não resistirá a qualquer mudança política que venha a registar-se num futuro próximo em Portugal, e que qualquer Governo resultante dessa mudança rapidamente lhe dará o destino que merece ? a sua revogação e substituição por outra que assente em diferentes metodologias e persiga objectivos bem mais consensuais e mobilizadores da sociedade portuguesa.

A FENPROF e a DG.AAC consideram que este Governo ficará associado à enorme responsabilidade de substituir uma Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada em 1986 por larguíssima maioria e assente num amplo consenso social, por uma Lei de Bases da Educação que é o seu oposto ? polémica, não consensual e aprovada pela curta margem de votos de quem conjunturalmente detém o poder neste país.

O texto final não é mais do que a primeira proposta retocada, na vã tentativa de limar algumas arestas e esconder mesmo algumas opções de conteúdo mais polémico. É o caso do retrocesso para um ensino básico com apenas 6 anos de duração e uma escrita diferente para ?enterrar? a gestão democrática das escolas, acompanhada da sua empresarialização como objectivo final. Assim, a FENPROF e a DG.AAC mantêm o essencial das críticas que vêm fazendo à proposta governamental, querendo no entanto voltar a salientar, pela sua profunda carga ideológica, a opção central desta maioria para a Educação em Portugal.

Não adiantam nada as habilidades eufemísticas quando se mantém o mesmo conceito. Uma ?rede de ofertas educativas? (texto inicial) e uma ?rede nacional de serviço público de ofertas de educação e formação? (texto final), são uma e a mesma coisa: colocam em absoluto pé de igualdade ensino público e ensino privado, a coberto do conceito de que um serviço público pode ser assegurado por iniciativas de cariz privado, como se a lógica da iniciativa privada e da iniciativa pública não fossem profundamente diferentes!

O artigo 75º da Constituição da República Portuguesa, que no seu ponto 1. prescreve: ?o Estado criará uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população?, leva-nos a admitir que esta proposta de Lei extravasa as margens da constitucionalidade e deverá, a ser aprovada, ser confrontada com tal opção pelas instâncias encarregues de assegurar a compaginação das Leis da República com a nossa Constituição. A DG.AAC e a FENPROF estarão atentas a esta perspectiva e tudo farão para que seja fiscalizada desta forma uma proposta que mais não visa do que a instalação do mercado da educação, através da progressiva desresponsabilização do Estado e do florescimento do sector privado. 

Por último, a Federação Nacional dos Professores, FENPROF, e a Direcção geral da Associação Académica de Coimbra, DG.AAC, exortam os docentes, os estudantes, os trabalhadores em geral e a sociedade portuguesa no seu conjunto, a não baixarem os braços perante a aprovação na Assembleia da República de uma Lei tão retrógrada e tão nefasta para o futuro da Educação no nosso país, continuando a opor-se veementemente ao elitismo e à fragmentação do sistema educativo que tal Lei visa provocar, admitindo que, apesar de tudo, este facto só será consumado se desistirmos de o denunciar, de o enfrentar e de o remover do caminho da democracia conquistado em Abril de 1974.

Lisboa, 20 de Maio de 2004


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