Diz quem sabe – e são os peritos da OCDE que afirmam – que o PISA (Program for International Student Assessement), pelos objectivos precisos e concretos que tem, não permite leituras políticas como as que têm sido feitas pelo actual Primeiro-Ministro. O PISA avalia a prestação de alunos de 15 anos em provas de literacia e leitura, matemática e ciências, provas que procuram perceber até que ponto aqueles jovens adquiriram alguns conhecimentos e capacidades (não competências), permitindo identificar pontos fortes e fracos do seu desempenho, mas nunca avaliar o desempenho das escolas e muito menos os sistemas ou as políticas educativas. Só por ignorância ou demagogia alguém pode afirmar que os resultados do PISA reflectem o sucesso de políticas e reformas que, no caso português, ainda por cima nunca saíram da mediocridade.
Na apresentação pública destes resultados, a própria ministra foi comedida no auto-elogio e atribuiu a melhoria verificada a quem efectivamente é por ela responsável: professores e alunos. Sócrates, contudo, optou por se embriagar com os resultados e deixou de dizer coisa com coisa.
Afirmou, por exemplo, que as medidas impostas à Educação mereciam o reconhecimento e elogio internacional. Não esclareceu, porém, que a fonte de informação da OCDE, incluindo no capítulo da avaliação das medidas, foi o governo português. Como não disse que a própria OCDE considera uma lacuna a não auscultação dos professores, apesar de estes serem, como se reconhece, actores principais do processo de ensino e aprendizagem.
Na divulgação de resultados do PISA, Sócrates deu como exemplo de importante medida para que se alcançassem tais resultados, uma que, disse, gerou muita polémica interna, mas recebeu elogios do exterior: a criação dos grandes agrupamentos de escolas a que os “estrangeiros” chamam de “school clusters”. Esqueceu-se, no entanto, de esclarecer como uma medida imposta em 2010 influenciou resultados de 2009! Terão sido enganados os “estrangeiros”?
Disse mais o Primeiro-Ministro, afirmou que o modelo de avaliação dos professores imposto pelo seu governo foi igualmente importante na obtenção dos resultados do PISA. Também isso é estranho, pois em 2007/2008 aplicou-se apenas a um reduzido número de professores e em 2008/2009, quando se generalizou, nunca se aplicou integralmente, resumindo-se a um pequeno conjunto de procedimentos globalmente designado por “simplificação”. Como poderia influenciar aqueles resultados?
Sabe Sócrates que, apesar da evolução registada na prestação dos alunos portugueses, tal não se ficou a dever às medidas que o seu governo tomou, pelo contrário, teve lugar apesar dessas medidas. Foi também por saber disso que o Primeiro-Ministro nem pensou duas vezes e decidiu dar como exemplos as medidas que, no plano político, eram para si mais interessantes, ainda que fosse verdadeiramente absurdo referi-las naquele contexto. Mais do que fazer demagogia em torno dos resultados, deveriam Sócrates e o seu governo perceber por que se mantém Portugal quatro pontos abaixo da média, apesar da melhoria verificada em relação a 2006.
Mas não é isso que interessa ao Primeiro-Ministro. Importa-lhe, isso sim, repetir incessantemente a sua mentira para que pareça verdade ainda que, para isso, fosse necessário inclui-la na sua mensagem natalícia em que apelou a (ainda) mais sacrifícios para se obterem frutos tão desejados como os que dizia ter colhido. Usar este exemplo para exigir ainda mais sacrifícios a quem trabalha e a tantas restrições tem sido sujeito é, no mínimo, imoral. Como exigir mais a quem viu ser-lhe roubado o abono de família, cortado o salário ou a pensão, enquanto assistia a injecções sucessivas de milhões num buraco negro de nome BPN?! Ou a quem ganha o mínimo, mas nem isso é suficientemente baixo que justifique um aumento de 25 euros, um grão (do imenso areal) face aos milhões, isentos de impostos, repartidos pelos grandes accionistas?!
É cada vez mais difícil aguentar a conversa fiada e falsa de quem acha que pode continuar a enganar o povo que governa, como também é cada vez mais difícil compreender os que se mantêm daquele lado e, com palavras, actos ou omissões, dão aval a políticas que são enganosas e não são justas nem solidárias.
Mário Nogueira
Secretário-Geral da FENPROF
(Texto publicado na edição do "Público" de 29 de Dezembro 2010)