Nacional
Entrevista a Mário Nogueira, Sec. Geral da FENPROF

Silêncio do ministro Crato é mau sinal...

10 de julho, 2011

Em entrevista que fizemos ao Secretário-Geral da FENPROF
este afirma que silêncio do Ministério da Educação é mau sinal!

Mas diz mais, diz que o tempo é de luta e não de resignação!

No final das Jornadas Sindicais do SPRC e antes da última reunião prevista, para 2011/2012, do Secretariado Nacional da FENPROF, colocámos ao Secretário-Geral da FENPROF algumas questões sobre o momento difícil que se vive na Educação e que vivem os trabalhadores portugueses e, também, sobre a forma como irá agir a FENPROF neste contexto tão complexo.

Preocupação primeira, neste momento, parece ser o silêncio de um Ministério da Educação que tem, como nenhum outro, necessidade absoluta de envolver os parceiros educativos na sua acção. É mau sinal este silêncio, considera.

O próximo ano lectivo está à porta, quais as medidas que ainda poderão e deverão ser tomadas com vista a garantir um arranque tranquilo?

MN: Há algumas que urgem, sob pena de o início do próximo ano escolar voltar a ser muito complicado. Apenas três exemplos: garantir que nenhum novo mega-agrupamento será criado, pois não há tempo para a sua instalação, aproveitando-se este ano para avaliação dos “mega” criados este ano; rever alguns aspectos do despacho sobre organização do ano escolar, nomeadamente em relação a normas de elaboração dos horários dos docentes e ao crédito global de horas a atribuir às escolas; suspender o regime de avaliação de desempenho, garantindo-se que não se iniciará novo ciclo avaliativo em Setembro. Pelo menos estas são medidas urgentes que justificavam que já se tivesse realizado uma primeira reunião com a nova equipa ministerial.

Que esperas do próximo ano lectivo?

MN: Estou muito preocupado com o que acontecerá. Como se sabe, o seu início será marcado pela aplicação de inúmeras medidas que visam apenas alcançar a redução orçamental prevista para a Educação, em 2011, que é de 803 milhões de euros; nos seus segundo e terceiro períodos, que terão lugar já em 2012, a redução imposta pela troika e que PSD e CDS aceitaram será de mais 200 milhões… as implicações na organização e no funcionamento das escolas far-se-ão sentir duramente, com prejuízo para as suas respostas educativas e sociais, para a estabilidade e condições de trabalho dos profissionais, para a qualidade educativa…

E quanto à avaliação de desempenho, estão finalmente criadas as condições para substituir de vez este modelo?

MN: Aparentemente sim, mas parece que alguém está a mudar o discurso. Recordo que no seu programa eleitoral o PSD fala na importância da urgente substituição do actual modelo que, em resposta dada aos professores, considera kafkiano. Também o CDS vai pelo mesmo caminho, apresentando até uma alternativa. Agora, lê-se o programa do governo e apenas se fala em reformar o modelo, enquanto Primeiro-Ministro e Ministro da Educação dão a entender ter mudado a opinião quanto à suspensão do actual modelo e até à sua substituição. Se assim for, denunciaremos veementemente a mentira e o oportunismo de posições anteriores, regressando à luta contra o modelo… gostaria que não fosse necessário, nem que fosse apenas para não desacreditar mais os políticos do “arco do poder”. Mas se for, cá estaremos.

O PSD falava também na necessidade de desburocratizar o trabalho dos professores. O programa do Governo reflecte essa intenção?

MN: De forma alguma. É omisso nessa matéria. De facto, antes das eleições afirmava, justamente, que os professores tinham excessivas actividades administrativas, reuniões e outras tarefas que não os libertavam para o que deles mais se espera: o trabalho com os seus alunos. Agora nada se diz e, pelo contrário, pretende-se avançar com o despacho herdado da equipa anterior que ainda agrava este problema. Aliás, é curioso que das primeiras declarações públicas de Isabel Alçada, enquanto ministra, foi precisamente a necessidade de libertar os professores para o trabalho com os seus alunos. Saiu impondo, sem qualquer negociação, regras ainda mais negativas do que as que criticara.

Nas preocupações que tens manifestado surge, frequentemente, o desemprego que pode disparar em Setembro. Será mesmo assim?

MN: O anterior governo tomou medidas nesse sentido, prevendo mais mega-agrupamentos, alterando as normas de elaboração dos horários e introduzindo alterações curriculares, entre outras medidas. Reduzir significativamente o número de docentes faz parte do plano de redução de mais de 800 milhões, este ano, na Educação. Este governo manteve todas as medidas e o que já hoje se sabe é que o ME, ilegalmente, está a fazer cessar contratos antecipadamente, pretende não indemnizar os docentes cujos contratos cessarem e já reduziu o seu subsídio de desemprego, tanto em valor, como duração. Combateremos essas medidas causadoras de desemprego, não só por razões sociais, mas porque as escolas necessitam dos professores que estão a ser postos fora. Há, neste processo, matéria jurídica que os professores deverão alegar e agir também nesse plano.

Como vês o programa deste Governo para a Educação?

MN: Um atentado à Escola Pública, um ataque aos direitos profissionais dos docentes, uma clara opção pelo desenvolvimento de dinâmicas de privatização, uma preocupação evidente de garantir que a escola continuará a ser reprodutora de desigualdades sociais, um somatório de dificuldades no acesso dos jovens aos patamares mais elevados do conhecimento e da ciência. É um programa assumidamente de direita que aponta políticas claramente neoliberais, logo, muito nefastas.

Salários, emprego, direitos… têm sido os ataques mais fortes desferidos pelos últimos governos contra os trabalhadores portugueses. Justificam-se pela crise que o país atravessa?

MN: Têm sido ataques violentíssimos e que tendem a agravar-se. Como sabemos, não foram essas políticas violentas contra quem trabalha que resolveram os problemas do país, pelo contrário, hoje são ainda mais graves. A especulação financeira, a ganância do capital nacional e internacional e as políticas de direita que têm e continuarão a ser desenvolvidas não pararão e terão sempre os trabalhadores debaixo de mira. Já temos quase 800.000 desempregados, 1.200.000 precários, 2.500.000 de pobres, 40% de crianças em situação de pobreza… onde vamos parar? Podemos aceitar este caminho? Claro que não e só há uma saída: lutarmos, lutarmos muito, lutarmos mais do que temos feito, darmos expressão pública e frequente à nossa indignação, à nossa revolta e à recusa de continuarmos a ser alvos e vítimas deste ataque. Se não o fizermos, outros não o farão por nós. Esses, quando nos comerem a carne, deitarão fora os ossos, como descartáveis que nos tratam.

Então, primeiro passo desse outro caminho?

MN: Sem dúvida, a renegociação da dívida. Se isso não acontecer, será a catástrofe.