Nacional
ENTREVISTA AO SECRETÁRIO-GERAL DA FENPROF

"Rescisões por mútuo acordo"

28 de agosto, 2013

A comunicação social tem adiantado a possibilidade de o governo avançar com o programa de “rescisões por mútuo acordo” também para os professores. Segundo um jornal de economia, uma fonte governamental teria admitido essa possibilidade ainda para o primeiro período do próximo ano letivo. A esse propósito, colocámos algumas questões ao Secretário- geral da FENPROF, nomeadamente se o MEC já falou dessa hipótese. As respostas foram esclarecedoras.

Tendo em consideração a notícia que agora a comunicação social avança, o MEC já apresentou alguma proposta no sentido de o programa de rescisões por mútuo acordo se aplicar aos docentes?

MN: Não, nunca apresentou. Porém, como o ministro nos disse em reunião que as rescisões por mútuo acordo não se aplicariam aos docentes, creio que a possibilidade de se aplicar é muito forte.

Como assim?

MN: Então recordo que a mobilidade especial se aplicou aos professores depois de o ministro ter dito que não aconteceria; recordo que as 40 horas afinal aplicam-se aos professores, apesar de o ministro ter garantido que isso estava fora de hipótese; portanto, se o ministro disse que as rescisões não se aplicariam aos professores, temos meio caminho andado para que isso venha a acontecer.

Mas o MEC comprometeu-se a só aplicar a mobilidade especial em 2015, dizendo que provavelmente nem seria necessário aplicar a qualquer professor. Isso não quer dizer que o MEC considera haver necessidade de todos os que já hoje estão nos quadros?

MN: É claro que não. E talvez a eventual aplicação deste programa de rescisões explique por que motivo a mobilidade especial foi empurrada para 2015, podendo não ser necessário aplicar a qualquer professor. É que, até lá, o MEC pretende encontrar outra forma de despedir os professores dos quadros e esta, na sua opinião, poderá ser perfeita.

Isso parece demasiado maquiavélico…

MN: Pois parece…

Então e que vantagens teria o governo em pôr fora os professores desta forma e não através da mobilidade especial?

MN: Desde logo, poder dizer que não os despediu, mas foram os professores que quiseram sair, dando o seu acordo. Depois por ter um efeito imediato, uma vez que a mobilidade especial obrigaria a manter o docente por um ano, ainda que com salário reduzido, mas teria de ser recuperado para o serviço se surgisse qualquer lugar. Ao ser recuperado iria ser reposicionado no seu escalão de vencimento, assim, se ele sair e depois abrir uma vaga no seu grupo ela será preenchida por um docente contratado que ganha abaixo do primeiro escalão da carreira. Depois, embora tivesse de ser indemnizado, como terá, o despedimento pela via da mobilidade especial obrigaria que fosse pago subsídio de desemprego. Por fim, porque há dúvidas quanto à constitucionalidade do despedimento por via da mobilidade e, assim, fica o assunto arrumado, uma vez que seria o professor a dar o seu aval.

E achas que há muitos professores considerados “a mais”?

MN: Lembro que em janeiro passado o FMI, em relatório conjunto com o governo, apontou para a necessidade de reduzir ao mínimo a contratação, como estão a fazer, e pôr fora 14.000 professores dos quadros. O ministro disse, na altura, que esse relatório só comprometia o FMI… vamos ver quem compromete e quem fará o papel de empregado do FMI. Hoje temos mais de 18.000 docentes dos quadros sem horário (7.000 dos quadros de escola e agrupamento e mais de 11.000 dos quadros de zona pedagógica) e mesmo depois de serem colocados os docentes da mobilidade interna ficarão milhares por colocar. Poderão não ser 14.000, mas os 10.000 que a troika, na sétima avaliação, falou. Seja como for estamos a falar de uma brutalidade.

E o que garante que os professores irão aderir a essas rescisões, pelo menos em número que fosse significativo?

MN: Nada garante, claro, mas o governo confia nos efeitos da pressão e da chantagem, no que o medo poderá provocar nas pessoas, na ilusão de que assim sempre se sai com qualquer coisa… É uma vergonha o desrespeito dos governantes por quem tanto tem dado ao país... É uma vergonha esta forma de governar que está a arruinar Portugal e a vida dos portugueses… É lamentável que a mentira seja forma de enganar os portugueses…

Entendes que os governantes têm sido politicamente desonestos na forma de imporem as suas políticas?

MN: Sim, entendo isso. Compare-se o que fazem com o que diziam, faziam e prometeram quando eram oposição. Criticavam as alterações curriculares de natureza economicista, os mega-agrupamentos, o desemprego e a precariedade. Prometeram que não cortavam subsídios, nem lhes passava pela cabeça dizer que cortariam salários ou que agravariam as condições de aposentação. Criticavam os cortes orçamentais na Educação. Isto é enganar o povo. Isto não é sério. Isto é desonestidade política…

Mas do discurso do governo não transparece essa ideia negativa…

MN: Claro que não e até manipulam indicadores para fazer crer que as coisas vão no bom caminho… só se for para eles, é de certeza. É repugnante assistir a tanta hipocrisia e tanto cinismo… como já afirmámos antes, se a hipocrisia e o cinismo fossem letais, o atual ministro, pelo menos numa coisa, teria cumprido a palavra: o ministério já teria implodido.