Nacional

Recessão e desemprego sem fim à vista

29 de outubro, 2011

As garantias do Estado relativamente ao poço sem fundo que é o BPN já ultrapassam os 8.500 milhões de euros (5% do PIB!). Se a isto se juntar o “caruncho” que continua activo na Madeira, o pagamento das “parcerias público privadas”, com crescimento exponencial nos próximos anos, e o “saneamento” das empresas públicas que se querem entregar “limpinhas e baratas” ao capital internacional, temos uma receita para a qual não chegará a “supressão” dos subsídios de férias e Natal dos funcionários públicos e pensionistas e a horrorosa carga fiscal que não pára de aumentar. Se esta lógica, inscrita na Proposta de Orçamento para 2012, não for travada, em meados do próximo ano teremos novas medidas de austeridade sobre as gorduras do estado e os gastadores inveterados, isto é, sobre os funcionários públicos, os pensionistas e os trabalhadores do sector privado.

O corte brutal no rendimento disponível dos portugueses – por via directa através da supressão dos subsídios de férias e Natal, e do aumento dos impostos, e por via indirecta através da imposição, empresa a empresa, do corte desses subsídios seguindo o exemplo do Estado – arrastará consigo uma quebra histórica do consumo privado em 2012 (valores da ordem dos 6% não estão fora de causa!) e levará a uma taxa de desemprego sem precedentes, agravada pela utilização de mais meia hora de trabalho gratuito no sector privado, que poderá tocar os 16% no próximo ano!

A juntar a isto, uma diminuição tão calamitosa do rendimento disponível das famílias conduzirá a uma distorção ainda mais vincada da sua aplicação pelos trabalhadores portugueses que serão obrigados, pela força das circunstâncias e para procurar sobreviver, a entregar os seus magros rendimentos a um conjunto de meia dúzia de grandes empresas (do sector da distribuição e do gás, combustíveis, água, electricidade e comunicações), a maior parte delas detidas pelo capital internacional, num movimento que acelerará ainda mais a espiral de falências das pequenas e médias empresas, o que continuará a produzir desemprego crescente para além de 2012.

Breve análise do OE para 2012

1.
A falácia do “desvio colossal”

A principal justificação para o confisco dos subsídios de férias e Natal aos trabalhadores da Administração Pública reside, segundo o governo, no desvio previsto para a execução orçamental de 2011 de 3.400 milhões de euros, cerca de 2% do PIB. Ora, se olharmos para os dados da proposta de OE para 2012, o que vemos? Uma falha de poupança de 300 milhões de euros, correspondente, segundo o ministro das Finanças, a uma menor redução de trabalhadores dos ministérios da Educação, Administração Interna e Defesa. Se nos lembrarmos da travagem do processo de constituição dos mega-agrupamentos e da manutenção do par pedagógico em EVT (com os votos da actual maioria de governo!) podemos aceitá-los como verdadeiros mas sem qualquer elemento de surpresa. Por outro lado, em termos de despesa, um acréscimo de 560 milhões de euros que na sua maior parte são atribuídos ao serviço da dívida. Mas há alguma surpresa nisto, com as taxas de juros elevadíssimas o país tem vindo a pagar?

Do lado da receita o ministro das Finanças salienta a quebra de 800 milhões euros, maioritariamente atribuída a um decréscimo das contribuições para a segurança social, provocadas pelo aumento do desemprego e falências de empresas (e ainda queriam cortar significativamente a Taxa Social Única?). Bom, mas isto soma 1.660 milhões de euros! Os restantes 1.740 milhões de euros, mais de metade, devem-se ao “buraco” do BPN (mais uma “pequena” camada que se tornou visível), gerido por gente do PSD, com o beneplácito do Presidente da República, no valor de 1.140 milhões de euros, e ao “buraco” da Madeira, governada pelo PSD, no valor de 600 milhões de euros. Portanto, e retirando os 800 milhões de quebra na receita atribuídos maioritariamente ao decréscimo das contribuições para a segurança social, o PSD está directa ou indirectamente comprometido com os restantes 2.600 milhões de euros (1,55% do PIB!) e a sua manifestação de surpresa é hipócrita e mentirosa!

2.
Cenário Macroeconómico para 2012

O cenário macroeconómico previsto na proposta de OE para 2012 (ver quadro abaixo) é aterrador! Quebra do PIB em 2,8 %, do consumo em 4,8%, do investimento em 9,5%. Desaceleração das exportações em 1,9%, relativamente a 2011, e aumento do desemprego para 13,4%. Contudo, atendendo às medidas recessivas previstas (cortes de salários e confisco dos subsídios na Administração Pública, aumento brutal dos impostos e “mecanismos automáticos” de desemprego, como o aumento de meia hora de trabalho gratuito, no sector privado) este cenário é, infelizmente, pouco credível.  

      Principais indicadores em variação percentual (%)

                                               2010                          2011                          2012

PIB                                         1,4                             -1,9                            -2,8

Consumo Privado               2,3                             -3,5                            -4,8

Consumo Público               1,3                             -5,2                            -6,2

Investimento                       4,9                           -10,6                            -9,5

Exportações                        8,8                               6,7                           4,8

Importações                        5,1                             -4,5                            -4,3

IPC(Inflação)                        1,4                               3,5                             3,1

Taxa de Desemprego     10,8                             12,5                           13,4

 

Convém lembrar que o OE para 2011 previa um aumento do PIB de 0,2% (prevê-se agora uma quebra de 1,9%!), uma quebra do consumo privado de 0,5% (prevê-se agora uma quebra de 3,5%!) e uma taxa de desemprego de 10,8% (prevê-se agora uma taxa de 12,5%).

Se as medidas previstas na proposta de OE para 2012 passarem a letra de lei, principalmente nos aspectos relacionados com o confisco dos subsídios aos funcionários públicos e pensionistas, ao aumento brutal do IVA e aumento da jornada de trabalho no sector privado, a recessão nunca será inferior a 4% do PIB o que implicará uma taxa de desemprego que tocará os 16%!

3.     
Medidas para a redução do défice em 2012

O ministro das Finanças sustenta, na introdução ao relatório que acompanha a proposta de lei do OE para 2012, que o défice orçamental irá ser reduzido de 5,9% do PIB em 2011 para 4,5% em 2012. Para conseguir este objectivo a proposta de OE para 2012 prevê:

Um corte na despesa equivalente a 4,4% do PIB

  • 1,6% do PIB com a redução de despesas com o pessoal;

      (confisco dos subsídios de férias e Natal dos trabalhadores)

  • 1,2% do PIB com a redução das prestações sociais;

      (confisco dos subsídios de férias e Natal dos pensionistas)

  • 0,6% do PIB com a redução das prestações sociais em espécie;

      (medicamentos e outros)

  • 0,4% do PIB com corte de 10% dos orçamentos de funcionamento;
  • 0,5% do PIB com cortes no investimento das empresas públicas;
  • 0,1% do PIB com outros cortes.

Um aumento da receita equivalente a 1,7% do PIB

  • 1,7% do PIB através do aumento do IVA, IRS, IRC, IMI

(apresentado de forma não desagregada)

Um primeiro olhar para estes números da proposta de OE para 2012 deixa-nos perplexos. Então para corrigir o défice orçamental em 1,4 % do PIB (de 5,9 para 4,5%) é necessário reduzir a despesa em 4,4% do referido PIB e aumentar a receita em 1,7% do mesmo PIB, num total de 6,1% do malfadado PIB? Quatro vezes mais! Independentemente de factores como o crescimento real do serviço da dívida pública, e não só nominal, independentemente de parte da correcção do défice deste ano de 2011 ser feito através de medidas extraordinárias, não repetíveis, (o ministro das Finanças já fala de um défice de 7,9% para 2011, sem medidas extraordinárias!), independentemente da brutalidade das medidas fiscais contribuir em si mesma para uma redução da receita, estamos a falar de uma assumpção, pelo ministro das Finanças, de que o défice real de 2011 se situará nos 10,6%! Ou então (ou o mesmo visto de outra perspectiva!) o ministro das Finanças, e o governo, propõem-se espoliar brutalmente os trabalhadores portugueses, quatro vezes mais do que é verdadeiramente necessário, prevendo mais “buracos” do BPN, da Madeira ou de algumas empresas públicas, para não falar da entrada em jogo do peso pesado que são as parcerias público-privadas!

Um segundo olhar educa-nos sobre aquilo que o PSD e o CDS consideram ser as “gorduras” do Estado: são os funcionários públicos e os pensionistas da função pública! Educa-nos também sobre o que é dispensável: os trabalhadores, os pensionistas e os doentes (estejam no activo ou aposentados)!

Num momento tão grave para o país e para os seus cidadãos é uma vergonha e um embuste actuar de forma preventiva, reduzindo de forma brutal os rendimentos do trabalho das famílias e as prestações sociais dos mais fragilizados!

 
4.   
A destruição dA escola pública

A proposta de OE para 2012 atira o orçamento da educação para 3,8% do PIB (contra 5 % em 2010 e os 4,7% previstos para 2011), representando, em termos nominais, a passagem de 8.559 milhões de euros em 2010 para 6.579 milhões de euros em 2012.

Para além do confisco de 463 milhões de euros, correspondentes aos subsídios de férias e Natal dos professores e educadores do quadro (do Pré, Básico e Secundário), do confisco de 27 milhões correspondentes aos mesmos subsídios dos professores contratados e da manutenção dos cortes salariais já efectuados em 2011, de 159 milhões de euros, o governo pretende cortar mais 257 milhões de euros através da supressão de ofertas não essenciais do Ensino Básico (102 milhões de euros), com a constituição de mega-agrupamentos (54 milhões de euros) e com outras medidas de racionalização (101 milhões de euros). A juntar a isto pretende cortar mais 147 milhões de euros no financiamento do Ensino Superior que somam aos mais de 100 milhões resultantes do confisco dos subsídios de férias e Natal.

Relativamente ao básico e secundário, o corte de 102 milhões de euros representará qualquer coisa como o despedimento de mais de 12.000 professores contratados e o envio para o quadro de mobilidade especial de mais de 5.000 professores do quadro. Por outro lado, o corte de 54 milhões, devido à constituição de mega-agrupamentos, terá como reflexo o despedimento da quase totalidade dos restantes professores contratados e do envio de mais dois ou três mil professores do quadro para a mobilidade especial. Convém compreender que quem for atirado para a mobilidade especial receberá o seu ordenado, na totalidade, por um período de apenas dois meses, depois terá mais dez meses a receber 66,7% e ao fim de doze meses passará a receber metade.

Quanto aos 101 milhões de euros de corte com outras medidas de racionalização permanece um mistério acerca da forma como serão executados. Certamente, para além dos cortes nos magros orçamentos das escolas, envolverão a saída de ainda mais professores para o quadro da mobilidade especial e para a aposentação antecipada. Quer pela via do aumento do número de alunos por turma, quer através do ataque aos direitos profissionais dos professores, que têm a ver com o desgaste inerente ao exercício da profissão, inscritos do Estatuto da Carreira Docente.

Este panorama enquadra um ataque sem precedentes à Escola Pública em estabelecimentos públicos, feito à custa do seu pilar essencial ao serviço dos futuros trabalhadores portugueses: os professores e educadores!

  1. 5.     O que é preciso fazer?

É preciso impedir a todo o custo que estas medidas se concretizem, nomeadamente o confisco dos subsídios aos funcionários públicos e pensionistas, o aumento brutal do IVA e o aumento da meia hora de trabalho gratuito no sector privado.

Devemos recorrer a todas as formas de luta disponíveis (plenários, concentrações, manifestações e greves), devemos fazer a maior Manifestação da Administração Pública de sempre no próximo dia 12 de Novembro e a maior greve geral de que há memória no dia 24 de Novembro, mas temos também de conseguir o mais amplo consenso público, sindical e político possível para travar o empobrecimento do país e a destruição do núcleo civilizacional moderno e solidário, que construímos arduamente ao longo de muitas gerações, que denominamos estado social!

                                                                    
António Nabarrete
Vice-Presidente do SPGL