«Quando nós metemos pessoas que são basicamente todas de rendimentos mais baixos a beneficiar do serviço público, nós sabemos que esse serviço público se deteriora. É assim nos hospitais. É assim nas escolas públicas.» | Fernando Alexandre
As declarações que o Ministro da Educação hoje proferiu, segundo as quais as residências universitárias se degradam porque são ocupadas por estudantes mais pobres, “de rendimentos mais baixos”, são profundamente graves, reveladoras e inaceitáveis num Estado democrático que se diz comprometido com a igualdade de oportunidades.
Em primeiro lugar, esta afirmação traduz um preconceito social explícito: associa a pobreza à degradação, como se os estudantes economicamente mais vulneráveis fossem, por natureza, causadores da deterioração dos espaços que habitam. Trata-se de um discurso estigmatizante. Estudantes pobres não degradam edifícios; o que degrada edifícios é a falta de investimento público, de manutenção regular e de políticas sérias de ação social no ensino superior.
Em segundo lugar, o ministro ignora — ou finge ignorar — que as residências universitárias são, maioritariamente, infraestruturas públicas, cuja conservação é da responsabilidade direta do Estado e das instituições que as gerem. Transferir essa responsabilidade para os estudantes, especialmente para os mais pobres, é uma forma de desresponsabilização política. Quando um hospital está degradado, não se culpam os doentes; quando uma escola precisa de obras, não se culpam os alunos. Porque razão haveriam os estudantes carenciados de ser responsabilizados pelo mau estado das residências?
Esta afirmação é ainda mais grave porque atinge diretamente o princípio da democratização do acesso ao ensino superior. As residências universitárias existem precisamente para garantir que estudantes de baixos recursos económicos possam estudar, viver e ter sucesso académico. Ao associar pobreza a degradação, o ministro passa uma mensagem perigosa: a de que os estudantes nesta condição são um problema a gerir, e não cidadãos com direitos a proteger.
Há, além disso, uma dimensão simbólica que não pode ser ignorada. Um ministro da Educação que fala desta forma legitima o desprezo social, reforça estereótipos e fragiliza a confiança dos estudantes nas instituições públicas. Num contexto em que o custo de vida, as rendas e as propinas já afastam muitos jovens do ensino superior, este tipo de discurso é não só irresponsável, como politicamente condenável.
O que se esperaria de um ministro da Educação seria exatamente o contrário: uma defesa clara do reforço da ação social, do investimento em residências dignas, bem mantidas e suficientes, e do reconhecimento de que a pobreza não é uma falha moral, mas uma desigualdade estrutural que o Estado tem a obrigação de combater — não de estigmatizar!
Estas declarações não são um simples lapso retórico. Na senda de outras declarações lamentáveis (designadamente as que pretenderam desvalorizar o direito à manifestação perante uma plateia de crianças e jovens), bem como de propostas governativas concretas (como é exemplo o descongelamento de propinas no ensino superior), estas declarações são, sim, um sinal preocupante de uma visão elitista do ensino superior, incompatível com uma sociedade que se quer justa, inclusiva e democrática.
Perante isto, o mínimo exigível é um pedido de desculpas público e uma mudança clara de discurso e de políticas. O silêncio ou a normalização deste tipo de afirmações seria, por si só, mais uma forma de degradação — não das residências, mas da própria política educativa.
Lisboa, 16 de dezembro de 2025
O Secretariado Nacional da FENPROF


