Como sublinha uma nota do Secretariado Nacional da FENPROF, "a razão principal que nos levou a pedir esta reunião foi a proposta de Orçamento do Estado para 2012 e o que nela se prevê para a Educação, o setor com maior redução prevista". O panorama, em nossa opinião, é assustador, salienta a nota da Direcção da FENPROF, divulgada na passada segunda-feira aos jornalistas e aos responsáveis políticos do Ministério da Educação e Ciência (MEC). Mário Nogueira, Secretário Geral; António Nabarrete (SPGL), Manuela Mendonça (SPN), Anabela Sotaia (SPRC) e Joaquim Páscoa (SPZS), além de João Cunha Serra, presidente do Conselho Nacional da Federação, integraram a delegação sindical que reuniu com o Ministro Nuno Crato, nas Laranjeiras, em Lisboa.
Aqui fica a tomada de posição da FENPROF, onde se sintetizam preocupações - com muitas e legítimas interrogações - e também um conjunto de propostas fundamentais no contexto atual da vida das escolas e dos professores e educadores portugueses:
Não acreditamos que as escolas, com menos, possam fazer mais, pois já se encontram a funcionar no limite. Aqui não há gorduras a cortar. Sem afetar gravemente a qualidade, a organização e o funcionamento não há nada onde cortar, pelo contrário, há a reforçar. Dada a situação crise, na pior das hipóteses, escolas poderiam fazer o esforço de fazer face a aumento generalizado de custos e a reforço de respostas a alunos e famílias mais fragilizados, com o mesmo, mas não é o que se prevê.
- Descer de 4,7% do PIB para 3,8%, ou seja 1.500 Milhões de euros (0,9% do PIB) assume até contornos de algum aventureirismo e alguma irresponsabilidade políticas. Como poderá o nosso país, que ficará em último nesta relação entre as verbas destinadas à Educação e o PIB, combater com sucesso os níveis de insucesso e abandono escolares (cumprindo metas definidas para 2015), aumentar a taxa de frequência e de sucesso no ensino superior, e garantir o alargamento da escolaridade obrigatória para 12 anos?
- Há explicações que se tornam necessárias para que se possa compreender a dimensão, extensão e consequência deste enorme corte, para se conhecerem os estudos de impacto que foram feitos para avançar estes números e para se saber que almofadas terá o governo para dar resposta a situações que venham a correr mal e a resvalar para o precipício.
- Consequências para os Educadores, Professores e Investigadores, que representamos; para as Escola, que são os nossos locais de trabalho; para a qualidade do Ensino; para os Alunos e as suas Famílias; para o País e o seu Futuro!
Assim,
EMPREGO E ESTABILIDADE DOS DOCENTES
- Qual o impacto no emprego dos docentes dos Ensinos Básico e Secundário dos 257 Milhões de euros que correspondem a 102 em alterações curriculares, 54 em encerramentos e mega-agrupamentos, 101 em outras medidas de racionalização (aumento do número de alunos por turma? Extinção de projetos? Fala-se, embora deva ser alarmismo, eliminar artigo 79.º do ECD?)
- Serão estes cortes de apenas 257 Milhões, ou, realmente, como admite o Ministro em entrevista recente, 450 Milhões? Nessa entrevista fala em:
- 100 Milhões em medidas já identificadas, quais são?
- 100 Milhões em medidas já estudadas, quais são?
- 150 Milhões compensados em fundos comunitários se forem conseguidos. Já foram? E se não forem, o que ficará em causa?
- 100 Milhões em medidas a estudar. Em que áreas? Há mais onde cortar?
Verificamos que, afinal, só 100 Milhões estão identificados. No restante, fixou-se a verba e agora é que se procuram as medidas para a atingir?
- Das medidas em curso e das previstas, quantos docentes dos quadros serão remetidos para a chamada Mobilidade Especial? Ou não serão em caso algum?
- E no Ensino Superior, o corte de cerca de 150 Milhões de euros, levará a quantos despedimentos? Há disso estudos? E que apoios existirão com vista à obtenção do grau de doutoramento no ensino Politécnico, sabendo-se, até, que há verbas comunitárias previstas nesse sentido… chegaram? Quando serão distribuídas?
- Como serão renovados os contratos dos Investigadores contratados?
- Há, decerto, estudos desse impacto ou o valor foi adiantado e os cortes, à sua medida, serão agora decididos?
ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DAS ESCOLAS
- Se for eliminado o artigo 79.º do ECD, como se organizarão as escolas, depois de lhes ter sido, praticamente, retirado todo o crédito de horas?
- Qual será, em 2012, o corte nos níveis de financiamento das escolas? Em 2011, foi da ordem dos 6%, qual será agora? Como farão as escolas face a aumentos tão violentos, como os da energia? Ficarão nos 6% ou receberão de volta o valor do IVA?
- Os cortes vão estender-se ao EPC, designadamente ao valor dos contratos de associação, ou estes irão aumentar no seu valor?
- Sem a Parque Escolar, o que substituirá o seu papel na requalificação de escolas que estão, em alguns casos, muito degradadas? As escolas continuarão a pagar renda à Parque Escolar? Quem assegurará a manutenção das escolas intervencionadas, evitando a degradação que está a acontecer, visto que a Parque Escolar está paralisada, não há alternativa e as escolas estão impedidas de o fazer?
- Ensino Superior, com perda de autonomia (uma situação que nos parece inconstitucional), que circuito burocrático será imposto a uma instituição para, por exemplo, contratar um porteiro ou mesmo um investigador cujo financiamento está assegurado?
- Foram celebrados “contratos de confiança” entre o anterior governo e as instituições. Este governo vai honrá-los ou pô-los em causa? Como serão cumpridos os objetivos previstos, tendo em conta os cortes propostos. E quanto a verbas das instituições que foram cativadas, serão entregues a quem pertencem ou ficarão definitivamente perdidas?
QUALIDADE EDUCATIVA E ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA
- Não sendo admissível que o governo pusesse em causa o alargamento da escolaridade obrigatória, como garantir o êxito do alargamento neste quadro de recessão (taxa de frequência, qualidade, sucesso escolar…)?
- Alterações curriculares, quais? Informática; EVT (desdobramento com o dobro das horas?); História e Geografia fundidos no 3.º Ciclo? 2.ª Língua Estrangeira eliminada no Básico? Que outras medidas? Que debate com a comunidade educativa, que debate social e político está previsto, em que tempos e que objetivos alcançar com estas alterações, para além do que nos parece único?
- Quais serão as restantes medidas de racionalização: Qual o número de alunos por turma, quando se considera já hoje excessivo os máximos estabelecidos? Que critérios para eliminar projetos? TEIP até quando? Turmas CEF e EFA: vão ou não abrir as de 1.º ano ou apenas abrem quando não for necessário contratar mais docentes?
- Rede de estabelecimentos públicos no Ensino Superior: que reordenamento da rede pública, para quando, que critérios e com que debate? Ou será por “decisão superior”?
RESPOSTAS SOCIAIS
- Ação Social Escolar: vai ou não haver cortes? Ainda que se mantenha nível, como responder ao aumento das necessidades das famílias?
- CAF na Educação Pré-Escolar, Prolongamentos no 1.º Ciclo (em que se integram as AEC): vão manter-se níveis de financiamento aos municípios para que garantam estas respostas? Hoje, com encerramento de muitas escolas, as pressões financeiras sobre os municípios aumentam no que respeita a transportes, alimentação dos alunos e ocupação dos tempos livres. Haverá reforço de financiamento para estes efeitos?
- Bolsas no Ensino Superior: vagas ficaram por preencher e muitos alunos estão a abandonar estudos, haverá reforço de verbas ou não?
12 PROPOSTAS DA FENPROF
PARA EVITAR RUTURAS NAS ESCOLAS E O COLAPSO DO SISTEMA EDUCATIVO,
MAS TENDO EM CONTA O ATUAL QUADRO DE CRISE
A Escola Pública Portuguesa vive problemas e confronta-se com exigências que exigem e justificam um forte investimento. Contudo, tendo em conta a situação de crise que se vive, a FENPROF apresenta as seguintes propostas que, não correspondendo a esse investimento, são alternativas às que foram apresentadas pelo governo, em sede de Orçamento do Estado de 2012, e que, a serem aprovadas, levarão a ruturas insanáveis e irreversíveis no sistema e na capacidade de organização e resposta da Escola Pública. Assim:
1.
Apesar da insuficiência das verbas destinadas à Educação em 2011, mas tendo em conta a crise, manter, em 2012, os níveis de financiamento da Educação: Esta já é uma “solução de crise”, pois os 4,7% do PIB, de 2011, correspondem a uma verba demasiado baixa, sendo uma percentagem inferior às recomendações e à média verificada na OCDE e na UE;
2.
Manter IVA da energia pago pelas escolas em 6% ou devolver a diferença entre este valor os 23% para que será aumentado;
3.
Libertar as verbas cativadas às instituições de Ensino Superior e distribuir das verbas comunitárias destinadas à formação de docentes;
4.
Realizar uma Reorganização Curricular que resulte de um debate a promover nos meses de janeiro e fevereiro, envolvendo toda a comunidade educativa, por iniciativa do Governo, Assembleia da República ou CNE. Prever um Dia D, nacional, sem atividade letiva nas escolas para que todos os docentes se envolvam no debate. Este Dia D deverá ser da iniciativa do MEC;
5.
Não alterar o número máximo estabelecido de alunos por turma e, no 1.º Ciclo, repor os 24;
6.
Autorizar as escolas a abrirem os cursos CEF e as turmas EFA que já se encontrem organizados mas ainda impedidos de funcionar;
7.
Garantir que quaisquer Movimentos de Rede, só terão lugar após garantido o acordo dos municípios e das comunidades escolares envolvidas, tendo em conta o conjunto de exigências que esse processo comporta, designadamente no plano social;
8.
Manter os níveis de autonomia das instituições de ensino superior, nomeadamente no que respeita a concursos e admissões, visando o cumprimento das metas mínimas legalmente estabelecidas para as diversas categorias da carreira;
9.
Fazer um levantamento das situações mais prementes e reiniciar, no máximo em janeiro, as obras de requalificação do parque escolar, sendo, até lá, criada uma alternativa à Parque Escolar. Definir a forma de garantir o processo de manutenção das escolas já intervencionadas, sem que daí resulte um aumento das suas despesas, que estas não poderiam suportar;
10.
Estabelecer um paralelo entre o financiamento do EPC com contratualização e o do público: reforço, estagnação ou redução na mesma proporção;
11.
Fazer um estudo sobre o eventual aumento de alunos a necessitarem de recorrer a ASE e aumentar as verbas na proporção necessária para não haver quebra dos níveis de apoio. Mesmo reconhecidamente insuficientes, no mínimo, manter esses valores;
12.
Relativamente aos Docentes:
- encontrar normas de vinculação que, ainda que sem aumento de custos em 2012, garantam a estabilidade, admitindo-se a negociação de soluções excecionais e transitórias no que respeita a carreira e área geográfica da vinculação;
- garantia de que serão encontradas soluções internas para docentes dos quadros que venham a ficar sem componente letiva atribuída devido à aplicação destas medidas, sem recurso à mobilidade especial;
- as duas medidas anteriores reforçam a necessidade de realização de um concurso em 2012 para mobilidade e ingresso nos quadros;
- não revisão do ECD, exceto no que respeita às questões da avaliação já negociadas, pelo menos até que o atual não seja completamente aplicado;
Por fim, a FENPROF considera que os cortes salariais e dos subsídios – matéria que contesta no âmbito geral da Administração Pública –, a par da quase completa desregulação e intensificação dos horários de trabalho, desmotivam, desincentivam e afastam muitos dos melhores num momento em que, ainda por cima, as exigências são maiores. Poderá o governo proferir palavras de grande elogio que a sua prática confirma não ser assim, pois não há qualquer sinal no sentido de, pelo menos, ser aliviado o garrote das condições de trabalho dos docentes nas escolas.
A FENPROF vê com muita preocupação esta redução de 1.500 Milhões de euros em 2012 que somam aos 800 Milhões de 2011. É nossa opinião que estamos perante mais do que um complexo problema financeiro, mas um forte atentado à Escola Pública que levará à sua desconstrução. A FENPROF não irá colaborar com tal processo, mas combater essa desconstrução.
Lisboa, 7 de novembro de 2011
O Secretariado Nacional da FENPROF