A grave situação a que o país chegou nas mais diversas vertentes da nossa vida colectiva, demonstra claramente a necessidade de se procurar um novo rumo que assegure o relançamento de um crescimento económico sustentado, possibilite a melhoria das condições de vida e de trabalho dos portugueses e a retoma da confiança no nosso futuro colectivo.
Tal objectivo exige uma firme rotura com as políticas que têm vindo a ser seguidas nos últimos anos e a afirmação de políticas alternativas, concretizadas numa efectiva estratégia de desenvolvimento económico e social.
Entretanto, observamos que, no actual momento político, o discurso dominante, quer no plano das mensagens de partidos, em particular daqueles que poderão ser o cerne do novo Governo e da nova maioria parlamentar, quer a nível das forças económicas mais poderosas e de algumas vozes influentes, vai no sentido de afunilar as propostas políticas para a continuação da exigência de mais sacrifícios aos trabalhadores e às camadas mais desfavorecidas da população, o que significaria o aprofundamento das desigualdades e injustiças sociais e a manutenção dos problemas estruturais do país.
Prioridades
No presente contexto, a CGTP-IN definiu já as orientações, conteúdos reivindicativos e propostas concretas, com vista à construção de uma efectiva alternativa política e ao desenvolvimento do país, realçando as seguintes prioridades:
1ª Revogação e ou revisão das normas gravosas do Código do Trabalho e respectiva Regulamentação, em particular: princípio do tratamento mais favorável; sobrevigência e caducidade das convenções; exercício da actividade sindical; direito de greve e serviços mínimos; contratos a prazo; adaptabilidade e mobilidade na medida em que as impõem fora do quadro da contratação colectiva; encerramento de empresas; não readmissão de trabalhador em caso de despedimento ilícito; pluralidade de infracções;
2ª Revisão do novo Regime do Apoio Judiciário e do Código das Custas Judiciais e atribuição à IGT dos meios necessários a um desempenho eficaz das funções de fiscalização e punição das infracções laborais, articulando os organismos de inspecção;
3ª Alteração da Lei de Bases da Segurança Social aprovada pelo PSD e PP e revogação das medidas que reduziram a protecção social (subsídio de doença; RSI, etc.)
4ª Aumento real dos salários e adopção de políticas que promovam uma justa distribuição do rendimento, actualização mais acentuada do salário mínimo nacional e políticas efectivas de inclusão social;
5ª Atribuição de prioridade ao sistema produtivo, fim das privatizações, qualificação e requalificação dos activos, política activa de inovação e concretização da regionalização;
6ª Combate ao desemprego e à precariedade, criação de mecanismos limitadores das deslocalizações, adopção de políticas de emprego de qualidade e concretização do direito à formação contínua dos activos;
7ª Fim aos hospitais S.A. e à gestão privada do Hospital Amadora - Sintra e revitalização do Serviço Nacional de Saúde;
8ª Alargamento da base tributária, articulado com o combate à fraude e evasão fiscais e quebra do sigilo bancário;
9ª Mais e melhor escola pública, garantindo a escolaridade obrigatória a partir dos 5 anos, alargamento do ensino profissional e desenvolvimento de uma Lei de Bases da Educação assente num amplo consenso social e político que tenha na valorização da Escola Pública referência estruturante;
10ª Fim das políticas de privatizações, directas e indirectas, no âmbito da Administração Pública, garantia do cumprimento das atribuições e objectivos constitucionais quanto aos deveres sociais do Estado e valorização profissional dos respectivos trabalhadores.
URGE REVOGAR E/OU REVER NORMAS DO CÓDIGO DE TRABALHO PARA GARANTIR O DIREITO À CONTRATAÇÃO COLECTIVA |
A situação da contratação colectiva ilustra as consequências de uma política toda orientada para impor sacrifícios aos trabalhadores.
O Governo e parte significativa do patronato pretendem substituir a contratação colectiva pela imposição unilateral de mecanismos de regulação das relações de trabalho.
Como se pode observar no quadro seguinte, entre 2003 e 2004 houve uma forte quebra de cerca de 50% dos contratos colectivos publicados e de 60% no número de trabalhadores cobertos. É a situação mais grave de sempre na contratação colectiva, ainda que o bloqueamento não seja generalizado, sendo muito mais grave nos sectores industriais.
É significativo que não haja um só contrato colectivo de trabalho publicado, com dimensão significativa, em toda a indústria e construção, em 2004.
Contratos publicados e trabalhadores abrangidos
|
|
2004 |
|
|
2003 |
|
|
Nº |
Trab. (mil) |
Variação tabelas (%) |
Nº |
Trab. (mil) |
Variação tabelas (%) |
Total |
162 |
600,5 |
3,0 |
342 |
1512,2 |
3,0 |
Janeiro |
3 |
40,2 |
3,0 |
7 |
30,8 |
3,8 |
Fevereiro |
5 |
1,7 |
2,7 |
16 |
109 |
3,6 |
Março |
3 |
44,2 |
2,0 |
18 |
110,9 |
2,7 |
Abril |
11 |
65 |
2,8 |
26 |
436,4 |
2,7 |
Maio |
12 |
29,4 |
3,3 |
40 |
151,2 |
3,1 |
Junho |
17 |
126,4 |
3,1 |
37 |
145,3 |
3,5 |
Julho |
31 |
104,9 |
3,2 |
59 |
243,1 |
2,8 |
Agosto |
22 |
103,8 |
3,0 |
59 |
48,4 |
2,9 |
Setembro |
18 |
35,6 |
2,7 |
23 |
54,3 |
3,2 |
Outubro |
17 |
24,4 |
3,0 |
18 |
64,1 |
3,1 |
Novembro |
12 |
2,6 |
2,4 |
22 |
100,5 |
2,6 |
Dezembro |
11 |
22,3 |
3,1 |
17 |
18,2 |
2,7 |
Fonte: MSST
Além disso, o Governo quase deixou de publicar regulamentos de extensão de convenções publicadas, cujo objectivo essencial é o de abranger empresas não filiadas em associações patronais, o que tem consequências também na concorrência desleal entre as empresas.
Há pois responsabilidades partilhadas do patronato e do Governo.
Os trabalhadores são as principais vítimas pois não vêm os seus contratos colectivos revistos, particularmente no que respeita aos valores salariais. Mas esta política também prejudica as empresas e o país.
Estamos hoje em Portugal num quadro muito complexo, caracterizado pela intensificação da concorrência internacional, por perdas de competitividade das empresas verificadas nos últimos anos, por baixas produtividades, pelos riscos resultantes do alargamento da UE, pela maior abertura do comércio internacional, pelas consequências da revolução científica e técnica.
O país precisa de diálogo social e da contratação colectiva se quer responder a estes desafios. A contratação colectiva é crucial para alcançar consensos necessários à qualificação dos trabalhadores, à inovação, à produtividade e à melhoria das condições de trabalho, objectivos que constam do acordo sobre a dinamização da contratação colectiva, subscrito pelas organizações sindicais e patronais a 7 de Janeiro passado.
A crise da contratação colectiva é inseparável das novas regras estabelecidas pelo Código de Trabalho, mesmo que seja inegável que já antes havia dificuldades e bloqueamentos. Só que o Código não resolveu os problemas, antes os agravou.
Por isso, é absolutamente imprescindível que o novo Governo, saído das eleições de 20 de Fevereiro, revogue e/ou reveja o Código de Trabalho em disposições fulcrais sobre o direito de contratação colectiva.
A manutenção das regras estabelecidas pelo Código do Trabalho pode conduzir a uma actuação patronal visando a eliminação, de facto, da contratação colectiva da generalidade dos trabalhadores, logo pondo em causa não só o processo de regulamentação das relações de trabalho e em consequência o próprio direito constitucional à contratação colectiva, como também o desenvolvimento económico e social.
Inevitavelmente, surgiria a conflitualidade incontrolada e a instabilidade no funcionamento das empresas e serviços.
Em nome dos interesses dos trabalhadores e, acima de tudo, da criação de condições para a evolução e progresso da sociedade portuguesa, impõem-se soluções políticas ponderadas, sérias e responsáveis para estes importantes problemas.
A Comissão Executiva do Conselho Nacional
Lisboa, 03 de Fevereiro de 2005