Nacional

Intervenção de Mário Nogueira no encontro nacional de professores de EVT

17 de janeiro, 2011

Não vou abordar os aspectos pedagógicos da disciplina que já foram muito bem abordados na sessão anterior. Essa deverá ser uma questão central na argumentação a fazer, mas não nos iludamos, essas não são as preocupações do Governo.

Está em marcha um tremendo e terrível ataque à Educação, às escolas e, em especial, à Escola Pública, aos profissionais de Educação e, em particular, aos professores.

No quadro de uma política de gradual mas progressivo desmantelamento do Estado Social, o governo ataca a Educação, área em que o Orçamento de Estado para 2011 cortou 803 Milhões de euros, ou seja, 11,2% em relação a 2010.

Para garantir que esse corte se obtém, o Ministério das Finanças, que elaborou as linhas mestras do orçamento do Ministério que Isabel Alçada aparentemente dirige, entendeu que a forma mais segura de não falhar a redução seria desferindo um ataque contra os professores em geral e alguns grupos em particular. Por isso decidiu:

- Reduzir os salários dos professores dos quadros, roubando-lhes qualquer coisa como 156 Milhões de euros ao longo de2011;

- Aumentar brutalmente a precariedade, garantindo, através da não abertura de concursos para ingresso nos quadros, que os professores aposentados seriam substituídos por contratados em que poupa 75%, porque têm salários mais baixos e um maior número de horas lectivas.

Mas estas medidas eram insuficientes. Queriam mais, muito mais e decidiram atirar-se ao emprego dos professores para reduzir o seu número. Pudessem fazê-lo a partir de Janeiro e talvez as coisas, sendo graves, fossem ligeiramente menos violentas. Mas como só o poderão fazer em Setembro, com o início do novo ano escolar, as medidas terão de atingir a violência máxima, pois será preciso, com a redução em apenas 4 meses, obter resultados que se reflictam de forma relevante no orçamento do ano todo. Um ano em que as escolas, em outras rubricas, terão mais despesas, por exemplo, pagando à Parque Escolar o aluguer de instalações e adquirindo materiais a uma central de compras que vende mais caro do que os fornecedores locais. Por tudo isto, a redução terá de ser necessariamente brutal.

Três medidas fundamentais e mais umas quantas avulsas contribuem para o problema: o encerramento de mais escolas e a criação de um maior número de mega-agrupamentos, que poderão levar à eliminação de cerca de 12.000 horários; a imposição de novas regras para a organização do próximo ano escolar, com uma enormíssima redução das horas de crédito global, que poderão levar a que mais 10.000 horários sejam eliminados; as alterações curriculares propostas – que de todos têm merecido rejeição e repúdio – que poderão provocar cerca de 12.000 horários eliminados, dos quais 7.000 são de professores de EVT.

Há depois um conjunto de outras medidas, aparentemente avulsas, como a alteração do número de adjuntos e das assessorias das direcções, o exercício das funções de bibliotecário ou do cargo de coordenador de estabelecimento, a alteração do horário nocturno para as 22 horas, enfim, um conjunto de medidas que, calculamos, provocarão a eliminação de cerca de 5.000 a 6.000 horários de trabalho.

Portanto, não se trata de trocos, estamos a falar de uma redução que ultrapassa largamente os 30.000 e se aproxima dos 40.000 horários, o que se reflectirá em quase outros tantos postos de trabalho e, por isso, num forte surto de desemprego e instabilidade. Eles querem reduzir entre 20 a 25 % o número de professores e eles não estão a brincar! E mais, ao retirarem da lei os critérios para a distribuição de serviço, dispensado poderá ser qualquer um e num contexto tão fortemente marcado pelas finanças, os que mais ganham e menos horas lectivas têm não deixam de ser alvos apetitosos, logo após terem sido dizimados os contratados.

Com estas medidas, Isabel Alçada ficará conhecida como a ministra do desemprego docente, alguém que, inclusivamente, destruiu algumas medidas de Lurdes Rodrigues que já eram muito restritivas e tinham, na altura, merecido fortes críticas pelas suas implicações negativas nas condições de organização e funcionamento das escolas. Sendo agora eliminadas, provocarão um revés ainda maior nas condições de organização e funcionamento das escolas e na qualidade do ensino.

Não há razões para, perante isto, exigir a demissão da actual a Ministra da Educação pela simples razão de que ela não existe, não conta, não risca, não tem qualquer peso ou influência política. Seria como usar corrector para apagar uma inexistência. Há razões, contudo, para contestarmos estas políticas que põem em causa o futuro do país e dos cidadãos e para não esquecermos quem no governo as desenvolve, quem na Assembleia da República lhes dá aval político, quem foi que as apadrinhou, promovendo o consenso necessário para que tivesse sido aprovado um Orçamento para o Estado que é verdadeiramente demolidor para o país. Um orçamento que corta nas pessoas e nem sequer para gastar no alcatrão, como em outros tempos, mas para pagar os devaneios dos bê-pê-énes e outras desgovernanças deste país.

Sobre a situação específica da EVT, a FENPROF desde logo contestou a medida junto do ME, por razões de ordem pedagógica, por razões que se prendem com a disciplina e a segurança nas salas de aula, por razões que têm a ver com os horários e o emprego dos professores. Contactámos desde logo a Senhora Presidente do CNE. Apresentámos o problema a todos os grupos parlamentares e à Comissão de Educação e Ciência da Assembleia da República. Denunciámos a situação em diversas tomadas de posição. Estamos hoje aqui convosco porque acompanhamos as posições da associação e defendemos os professores desta fúria economicista.

Por todas as razões antes referidas, continuaremos este combate, determinados, mas percebendo que a situação é muito complicada e exige alguns cuidados:

 - Nunca deixar isolar os professores de EVT em relação aos restantes docentes, na certeza de que o ataque que é desferido contra os professores deste grupo de recrutamento se integra num ataque muito mais vasto que pretende reduzir, em muitos milhares, o número de docentes. Deixar isolar os professores de EVT seria muito mau, porque o problema que se vive é dos professores todos;

 - Deixar claro que os professores de EVT não são pau para toda a obra e, portanto, se o ME está a realizar o levantamento que se conhece, com a intenção de encontrar saídas desvalorizadas, do tipo, pagamento em “géneros” às autarquias para o desenvolvimento das AEC, isso não será aceitável;

 - Exigir explicações pelo facto de a Resolução do Governo n.º 101-A/2010, de 27 de Dezembro, não referir a eliminação do par pedagógico na EVT, mas o ME estar a tentar impor essa medida no projecto que apresentou sobre alterações curriculares.

A FENPROF estará muito firme neste combate. Sabemos de que lado está a razão, e conhecemos bem o problema também porque muitos dos nossos associados, delegados e dirigentes são do grupo 240. Sabemos que a desvalorização dos professores e o seu desemprego contrariam objectivos maiores da Educação de que nunca deveremos desistir: a promoção do sucesso, o combate ao abandono, a elevação da qualidade do ensino e da formação, a formação integral do indivíduo que deverá ser competente, capaz, crítico e identificar-se com os valores da democracia. Não basta que saiba ler, escrever e contar, ainda que também isso deva saber fazer bem.

Este é o nosso compromisso com os professores, com a escola, com a educação e com a sociedade. Este é o compromisso convosco! Se outros desistirem, nós não desistiremos porque acreditamos no futuro e na Educação.

Mário Nogueira
Secretário-Geral da FENPROF

(15/01/2011)