Nacional
Um sério aviso ao Governo que, uma vez mais, reagiu com nervosismo e com os números do costume...

Greve Nacional da Administração Pública com forte adesão

12 de dezembro, 2003

Público, 22/11/2003 
 
A Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública estimou em 70 por cento a adesão média à greve na Função Pública, com os sectores da saúde, educação e autarquias a registarem níveis de paralisação mais elevados, entre 75 e 85 por cento (ver textos nesta página) (...) 
"Não entramos em guerras de números. O melhor juízo foi feito pelos cidadãos que se depararam com o lixo por recolher, actos clínicos adiados, escolas e creches encerradas, serviços da Segurança Social fechados e outros a funcionarem a meio-gás", disse ao Público Paulo Trindade, coordenador da Frente Comum afecta à CGTP-IN.  (...) 
 
A Frente Comum dos Sindicatos convocou a greve de 21/11 como forma de protesto contra as medidas governamentais para a progressão nas carreiras e avaliação do desempenho, novo regime de aposentações e generalização do contrato de trabalho individual na Administração Pública. Aumentos salariais de 5,5 por cento para o próximo ano fazem também parte do caderno reivindicativo.  
 
A jornada de luta vai prosseguir terça-feira, com a entrega de "dezenas de milhares de assinaturas" de protesto contra a reforma da Administração Pública na Assembleia da República, que discute os novos diplomas a partir de quinta-feira. Para dia 29 está marcada, pela CGTP-IN, uma mobilização de trabalhadores no Porto e em Lisboa que terá como mote "É necessário mudar o rumo".  
 
Carvalho da Silva, secretário-geral da Intersindical, afirmou que esta é a apenas a primeira fase dos protestos dos trabalhadores contra a política do Governo. "Estejamos no início de um protesto da Administração Pública em torno do qual ainda há muita mentira por parte do Governo e não só do Governo. Começa a haver uma forte consciencialização dos trabalhadores sobre aquilo que está em causa", defendeu.  
 
Balanço dos sectores mais afectados  
 
Federação Nacional dos Professores fala em milhares de escolas paralisadas  
 
Milhares de escolas do ensino pré-escolar ao secundário estiveram ontem encerradas devido à greve da função pública, de acordo com a Federação Nacional dos Professores (FENPROF). Numa apreciação sobre o efeito da paralisação, a que aderiram professores, educadores e restantes funcionários dos estabelecimentos de ensino, a FENPROF afirma que mesmo nas escolas que estiveram abertas "foi evidente o elevado número de docentes e não docentes" que aderiu à greve.  

A adesão à greve dos funcionários da administração pública encerrou escolas paralisou centros de saúde e encerrou repartições de finanças, criando ainda perturbações em praticamente todos os serviços da administração pública. Independentemente da taxa de adesão à greve - em que a guerra dos números entre sindicados e tutela voltam a avançar com números díspares - a verdade é que muitos cidadãos viram ontem a sua vida complicada.  
 
Muitos começaram o dia a depararem-se com o lixo que continuava à porta - os serviços de recolha do lixo foram dos mais afectados no âmbito dos funcionários da administração local - outros foram levar os filhos à escola e regressaram à mesma acompanhados. As questões adiáveis, foram deixadas para outro dia. As inadiáveis, "foram-se resolvendo". Outros chegaram mesmo a aproveitar o dia de greve para, prevendo uma menor adesão, enfrentar sem filas os serviços que permaneciam abertos.  
 
Cidália Fernandes, mãe de dois estudantes universitários, dava graças por ontem não ser quarta feira, a data em que tinha consultas marcadas no Hospital. A patroa tinha uma consulta no hospital de S. João, no Porto, e deu com o nariz na porta. "Esqueceu-se que havia greve, foi na mesma..", justificou. Mas saber que há greve não chega. Cidália sabia que havia greve e mesmo assim quis abreviar a ansiedade da filha, a quem roubaram a carteira durante a manhã, e tentou ir arranjar os papéis necessários para renovar os documentos que já dava por perdidos.  
 
Foi à Loja do Cidadão, no Porto, e também deu com o nariz na porta... mas só nalguns casos. Levou a documentação para renovar a carta, mas não pode dizer o mesmo em relação aos papeis para o Bilhete de Identidade. Esses serviços de identificação civil só atendiam para prestar informações gerais ou quem quisesse fazer o BI pela primeira vez. Mas não davam os impressos para quem quisesse pedir uma segunda via. "Os serviços estão em greve", lembravam. Mas nem seria preciso. À entrada da Loja do Cidadão, e nos serviços que estavam parcialmente afectados, recordava-se, em cada máquina para tirar a senha de atendimento, que a jornada era de luta.  
 
Com a greve anunciada, os que puderam tentaram evitar dirigirem-se a serviços públicos. É porventura isso que justifica o pouco movimento que se encontrava ontem no centro de Atendimento e Detecção Precoce (CAD) das doenças respiratórias do Porto. Os serviços de radiologia geral estavam fechados - mais por falta de pessoal administrativo do que de técnicos de saúde - mas o atendimento para efectuar as microradiografias não estava afectado.  
 
Segundo o coordenador geral do CAD-Porto, foram "algumas" as pessoas que procuraram aqueles serviços e que tiveram de procurar outro sítio para fazer as radiografias. "Têm essa possibilidade, podem fazer radiografias em outros locais. Já as micros só podem ser feitas aqui, mas esse serviço conseguimos tê-lo a funcionar", explicou. José Santos, 58 anos, foi dos que aproveitou: precisava de fazer uma microradigrafia, tentou a sorte e fê-la sem pressas. Mas tinha a vantagem de morar perto. "Se fosse em vão nunca, era uma viagem longa", anuiu. Mas nem todos dirão o mesmo.  
 
Minho sem recolha de lixo e transportes públicos  
  
No distrito de Braga, a greve dos trabalhadores da Função Pública afectou, como era esperado, o funcionamento de escolas, unidades de saúde, autarquias e tribunais. O Público tentou obter os números do Sindicato da Função Pública do Norte, mas quer na delegação de Braga quer na sede, localizada no Porto, não havia, ontem a meio da tarde, nenhum responsável disponível para os facultar. Ainda assim, foi possível apurar que a greve teve impacto num bom número de escolas e tribunais do distrito bracarense, como o de Guimarães, com diversos serviços encerrados ou a funcionar no nível mínimo.  
 
Nas repartições de finanças, metade dos trabalhadores terão faltado ao trabalho. Já o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local (STAL) de Braga avançava com "uma forte adesão" à greve. Segundo o dirigente Baltazar Gonçalves, nas recolhas de lixo, diurnas e nocturnas, registou-se uma greve entre 95 e 100 por cento e nos serviços das principais autarquias, como Braga, Guimarães, Famalicão e Barcelos os números da adesão à greve rondam entre os 60 e 90 por cento.  
 
A mesma fonte salientou ainda a paragem "quase total" dos Transportes Urbanos de Braga - um dado que não foi confirmado junto do vereador da autarquia de Braga que tutela o serviço, apesar das tentativas de contacto encetadas pelo Público - e o encerramento de diversos serviços municipais um pouco por todo o distrito.

"Público" (com "Lusa")