Todas as notícias
"Público", 28/03/2006

França: hoje Sindicatos esperam recorde de mobilização contra o "Contrato Primeiro Emprego"

28 de março, 2006

A França vive hoje um dia crucial na crise social detonada há oito semanas pela precipitação do primeiro-ministro, Dominique de Villepin, em impor uma reforma polémica do Código do Trabalho.

Greves e manifestações estão programadas em todo o país, tanto por organizações estudantis como por sindicatos de trabalhadores, em protesto contra o CPE (Contrato Primeiro Emprego), lei que permite o despedimento dos jovens com menos de 26 anos durante os primeiros 24 meses de trabalho numa empresa.
Em função do grau de mobilização atingido nesta jornada de acção, a natureza da crise social mudará: ou começa a diminuir de intensidade, por desgaste e desmotivação, ou evolui para uma crise de regime, como em 1995. Nesse ano, a França esteve paralisada durante três semanas, em pleno Inverno.

O movimento social obrigou o primeiro-ministro da época, Alain Juppé, a anular a reforma e 16 meses depois a direita perdia o poder em legislativas antecipadas. Ora, uma sondagem do instituto Ipsos, publicada ontem pelo diário Le Monde, indica que a oposição ao CPE é hoje maior do que a registada em 1995 contra a reforma da segurança social imposta por Juppé.

Durante o fim-de-semana, tornou-se perceptível uma radicalização do movimento estudantil. A demissão do primeiro-ministro foi reclamada pela coordenação estudantil, um comité de organização do movimento de greve nas universidades, cujos membros foram eleitos em assembleias gerais, há três semanas.

Paris é uma incógnita

Segundo o sindicato de estudantes UNEF, 69 das 84 universidades públicas francesas votaram ontem a favor da greve das aulas. Mas, também ontem, os reitores registaram uma escalada da violência entre estudantes grevistas e não-grevistas, em faculdades de Norte a Sul do país.

A segunda-feira foi assim um dia de preparativos quase guerreiros para a jornada de hoje. Os 12 sindicatos unidos numa intersindical anti-CPE lançaram todas as tropas na batalha. Os apelos à greve multiplicaram-se no funcionalismo público e até nas empresas do sector privado, cujos trabalhadores estão tradicionalmente menos presentes nos conflitos sociais. Os transportes públicos, parcialmente paralisados, prometem fornecer aquelas imagens já bem conhecidas, mas sempre espectaculares, de engarrafamentos monstros.

A manifestação de Paris constitui outra grande incógnita do dia, tanto pelo número de participantes, como pela perspectiva de mais uma escalada da violência na rua. A polícia, muito criticada pela sua inacção nas manifestações precedentes, promete estar presente, hoje, ao longo de todo o cortejo. O ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, deu também ordem para que os desordeiros violentos sejam detidos hoje nas estações de metro à volta de Paris e impedidos de chegar à capital. Mas, mesmo se esta medida tiver sucesso, resta sempre a "brigada" de militantes de extrema-esquerda, de anarquistas, hooligans e militantes de extrema-direita, que provoca combates com a polícia, nas noites de manifestações.

Sem solidariedade

O primeiro-ministro, que sofre com a ancoragem da hostilidade ao CPE na opinião, mantém-se, porém, firme na decisão de não aceitar a anulação do pacote laboral exigida pela rua. "Obcecado", segundo o diário Libération, pela ideia de "não deixar o seu rival, Sarkozy, tirar proveito da crise" na perspectiva das eleições presidenciais de 2007, Villepin sentiu-se ontem reconfortado na sua intransigência por um dos pontos da sondagem Ipsos: no eleitorado de direita, 74 por cento dos sondados apoiam sem reservas a acção do chefe do Governo.

Sarkozy, o "número dois" do Executivo, condiciona também toda a acção pessoal nesta crise em função das suas ambições presidenciais. No seu primeiro comício de campanha, marcado ontem para Douai, no Norte da França, Sarkozy ia tentar desatar o espartilho da solidariedade governamental, demarcando-se politicamente do primeiro-ministro, mas sem lhe virar as costas.

"Público", 28/03/2006