Nacional
Um Percurso com Rigor<br>Um Projecto com Futuro

FENPROF, 20 anos de vida e luta

15 de julho, 2003

Paulo Sucena

A Federação Nacional dos Professores (FENPROF) foi constituída num empolgante congresso realizado, em Lisboa, de 27 a 30 de Abril de 1983. Foi um momento alto de afirmação da unidade e da combatividade dos docentes portugueses e simultaneamente uma forte aposta no futuro no que diz respeito à democratização da escola, ao incremento da qualidade do ensino e à valorização sócio-profissional dos educadores e professores.
Foi um congresso aberto ao seu tempo cujas contradições, injustiças e precariedades foram objecto de atenta e lúcida análise. Foi um congresso em que a racionalidade crítica e objectiva permitiu abrir caminhos à FENPROF para um percurso seguro e esperançoso, trilhado por dezenas de milhar de educadores e professores do ensino oficial e particular e de todos os graus de ensino. Percurso exaltante que foi afirmando a FENPROF como uma das mais significativas e respeitadas organizações sociais do país, no decurso dos seus vinte anos de vida.
A constituição da Federação Nacional dos Professores pôs termo à Reunião Nacional de Sindicatos, herdeira da Reunião Nacional de Executivos surgida ainda em 1974 que foram formas inteligentemente encontradas pelos docentes para melhor coordenarem a sua reflexão e acção, com o contributo dos sindicatos de professores de todos os pontos do país. A FENPROF nasceu e cresceu mantendo e prolongando os traços essenciais que caracterizam o sindicalismo docente livremente organizado: a implantação directa nas escolas, a luta pela dignificação da profissão, a intervenção no plano da reflexão acerca de questões pedagógicas e de política educativa, o carácter democrático. Nove anos apenas passados sobre a Revolução de Abril poder-se-á dizer que, e o Congresso Constituinte o mostrou, a FENPROF perfilou-se na sociedade portuguesa como uma importante força antifascista tal como hoje, vinte e nove anos depois do 25 de Abril, constrói com afinco uma gramática contrária ao neoliberalismo mais selvagem e desumano, e contra o individualismo e a perda de valores, porque a FENPROF continua fiel às suas origens as da construção de uma escola democrática e de qualidade visando a preparação de cidadãos livres, intervenientes e críticos, possuidores e utilizadores dos instrumentos necessários à edificação de uma sociedade mais justa, mais igualitária e mais solidária.
Vinte anos passados sobre a constituição da FENPROF é terrível verificar que o sistema educativo continua sem ser capaz de responder às necessidades de desenvolvimento do país; que a escola permanece injustamente selectiva, continuando a fustigar os alunos oriundos das camadas mais desfavorecidas; que as condições de trabalho dos docentes se mantêm aquém do que era necessário; que a instabilidade e a insegurança profissional recrudesceram com o tempo; que o estatuto da carreira docente dos educadores e professores dos ensinos básico e secundário, objectivo reivindicativo fortemente defendido no Congresso Constituinte da FENPROF como aspecto central da valorização da profissão, continua a provocar graves e justificadas apreensões entre os seus destinatários; que o desbloqueamento das condições de progressão dos docentes do ensino superior na carreira que foi um dos principais objectivos estratégicos, definidos no Congresso de 1983, na acção reivindicativa do sector, continua hoje como um dos objectivos a alcançar pela FENPROF; que a luta pela elevação da qualidade do ensino se mantém com a mesma acuidade de 1983; que a luta pela revalorização salarial das carreiras tem sido uma constante durante os vinte anos que nos separam do primeiro Congresso da FENPROF, matéria que assume inquestionável relevância no presente, com a agressividade virulenta da política da Ministra das Finanças que degradou de forma brutalmente injusta o poder de compra dos docentes.

O que temos vindo a escrever mostra que o percurso da FENPROF tem sido e continua a ser um trajecto de resistência e de resistências, de proposição e de afirmação, de avanços e de recuos, de transformações, umas mais bem sucedidas do que outras, tudo plasmado num movimento extremamente complexo mas sempre fiel às grandes linhas orientadoras que tornaram, ao longo do tempo, a arquitectura da FENPROF cada vez mais nítida e mais sólida. Com as insuficiências que todo o espírito crítico e exigente pode encontrar e encontra no trabalho destes vinte anos, a FENPROF foi sempre muito mais do que os seus pontos fracos e por isso as sucessivas gerações dos seus dirigentes podem sentir-se orgulhosas pela riqueza reflexiva, energia, capacidade reivindicativa e de luta evidenciadas pela FENPROF que fazem da nossa Federação um foco de luz projectado nos caminhos do futuro.

Um futuro que ajudaremos a construir porque as nossas mãos estão limpas de ambições mesquinhas e motivadas para lutarem por uma Lei de Bases do Sistema Educativo que se adeque aos interesses de Portugal e do seu desenvolvimento harmonioso do ponto de vista da justiça social e das qualificações dos humanos, para pugnarem por estatutos de carreira que dignifiquem e revalorizem os docentes; pela gestão democrática das escolas, peculiar criação da classe docente portuguesa; pela estabilidade de emprego e a melhoria das condições de trabalho nas escolas; pela aproximação cada vez mais funda entre os sectores público e privado; pela escola inclusiva e multicultural. Para não tornar os princípios orientadores da acção reivindicativa demasiado extensos, poderia dizer a terminar que o projecto consubstanciado na FENPROF, levedado quotidianamente com os fermentos produzidos por cada um dos seus sindicatos constituintes, é um projecto que honra o seu passado e nele haure força e razão para criativamente enfrentar o futuro com convicção e esperança. Derrotados são só aqueles que desistem de lutar!

Paulo Sucena