Nacional
Factor estratégico para o desenvolvimento

Educação

03 de dezembro, 2004

Mário David Soares*

Se é verdade que com o 25 de Abril a Educação em Portugal registou importantes progressos, as políticas educativas seguida pelos sucessivos governos tornou a situação que hoje se vive quase dramática. Apenas alguns números para ilustrar esta realidade: um em cada dois portugueses com idades compreendidas entre os 15 e os 65 anos é analfabeto funcional; 31% da população empregada continua a possuir apenas o 1º ciclo do ensino básico ou ainda menos; 62,6% tem o 3º ciclo do ensino básico ou menos, sendo que destes apenas 7,3% concluiu este nível de escolaridade; somente 11,5 % da população empregada possui o ensino secundário completo e, apenas 7,8%, uma licenciatura completa.

Mas não se pense que estamos a falar dos trabalhadores mais idosos. Segundo os dados oficiais publicados pelo INE em 2001, 59,4% da população empregada possuía o ensino básico ou menos e 27,2% destes referem-se a trabalhadores com menos de 34 anos de idade!

Esta é a nossa realidade. Uma realidade que nos coloca, de acordo com o relatório da OCDE, publicado em 2002 e referente a dados recolhidos em 2001, na cauda dos 30 países da OCDE com a mais baixa taxa relativamente à percentagem da população que, entre os 25 e os 64 anos de idade, tinha concluído o ensino secundário ? 20%, muito abaixo da média dos países da OCDE que é de 64%!

E para vos citar um último dado: o "Plano de Acção da Comissão da U.E. para a Competência e a Mobilidade", publicado em 2001, afirma que em Portugal 43,1% dos "jovens com idade compreendida entre os 14 e os 18 anos abandonaram o ensino precocemente sem formação ulterior" o que é um número impressionante se comparado com a média da União Europeia: 18,5%!

Menos 216 milhões de euros para a Educação

Esse é o resultado das políticas educativas seguidas pelos sucessivos governos. No entanto, o actual governo PSD/PP pretende ir mais longe no ataque ao direito constitucionalmente garantido de acesso à educação de todos, sublinho, de todos os portugueses. Dois exemplos ilustrativos: o Orçamento de Estado para a Educação de 2004 e a proposta de Lei de Bases da Educação apresentada pela maioria neo-liberal e reaccionária que nos governa.

O Orçamento do Estado deste ano reduziu 216 milhões de euros na Educação, sendo o Ministério da Educação aquele que apresenta a maior quebra em relação a 2003: 4,2%. Em matéria de investimento a descida é de cerca de 23%.

Neste orçamento, em matéria de investimento, o Governo impôs um corte de 32,5% para a Educação Pré-Escolar e os Ensinos Básico e Secundário. A Educação Pré-Escolar e o 1º Ciclo do Ensino Básico têm cortes de dimensão muito significativa no campo do investimento (64,5% e 29,3%, respectivamente) o que levou o próprio Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses a afirmar que o desenvolvimento destes sectores "irá ficar paralisado". Isto porque, como se sabe, é ao poder local que cumpre assumir um grande número de responsabilidades nestes sectores de educação e ensino, incluindo ao nível da acção social escolar.

No que respeita aos ensinos básico e secundário, o corte orçamental, na área da Acção Social Escolar, atingiu os 59,2%.

Estes números revelam que o discurso governamental sobre a sociedade do conhecimento e a necessidade de qualificação da população portuguesa mais não é do que poeira atirada aos olhos dos cidadãos...

O que estamos é perante uma política que agrava as incorrecções e as desigualdades e que é contrária à construção de uma escola democrática e na qual os jovens tenham condições de sucesso efectivo.

Lei de Bases: as opções neoliberais do Governo

Quanto à proposta de Lei de Bases da Educação apresentada na Assembleia da República pelo PSD/PP ela assenta essencialmente na intolerável desresponsabilização do Estado na tão decisiva área da Educação e Ensino e na defesa das políticas de livre escolha educacional e de mercado na educação.

Modelando o conceito de "garantia de liberdade de aprender e ensinar" ao seu pensamento neo-liberal, o Governo aposta na criação de uma "rede de ofertas educativas" que obrigam o Estado a um apoio equitativo aos sectores público e privado.

Desse modo a responsabilidade do Estado pela expansão e qualidade da rede pública é substituída pela obrigação de apoiar financeiramente o ensino privado na mesma medida em que apoia o ensino público.

Por outro lado, o Governo propõe ainda uma nova organização dos ensinos básico e secundário, diminuindo o primeiro de nove para seis anos e aumentando o ensino secundário de três para seis anos, com a clara intenção de baixar o tronco comum de nove anos do actual ensino básico a fim de permitir que a partir do 7º ano de escolaridade se possam discriminar os alunos por diferentes vias, não explicitadas, podendo remeter jovens entre os 11 e os 12 anos para escolhas profissionalizantes precoces e avulsas, sem equivalência escolar e sem caminho de retorno para uma educação/formação contínua ascendente.

Uma opção dessa natureza só pode ser entendida como a expressão da vontade do Governo de degradar a formação de base que o sistema educativo deve oferecer a todos os jovens em idade escolar e obrigá-los a fazer precocemente a escolha do seu futuro.

Os riscos do aumento da exclusão social

Face a esta política temos que desenvolver uma acção decisiva nesta área, informando e mobilizando os trabalhadores para a exigência de uma escola pública, democrática e de qualidade. A Marcha Nacional da Educação, realizada no passado dia 23 de Janeiro foi um momento importante que urge continuar e aprofundar.

A chamada "sociedade do conhecimento" é uma expressão que revela a importância do conhecimento como factor propulsor do desenvolvimento. O mundo conhece uma revolução tecnológica e as tecnologias são mais baratas; mas a sua difusão e controlo é entravada pela dificuldade humana na sua utilização.

Está em crescimento o número de pessoas que usam o sistema escolar durante um maior tempo das suas vidas. A procura de trabalho nos países mais avançados desloca-se para empregos que exigem qualificações mais elevadas. Os riscos de exclusão social, particularmente para os trabalhadores com baixas taxas de escolarização e formação, são maiores nas sociedades modernas. Tudo isto demonstra o lugar chave da educação e da formação nos dias de hoje.

Em Portugal estas exigências são acrescidas devido aos problemas que enfrentamos. Para a CGTP-IN a resposta a estas exigências tem de passar por uma vontade política forte para a necessidade de um investimento na educação, pela mobilização de todas as partes envolvidas, por um exercício constante de avaliação face a países com resultados mais avançados, pela atribuição dos recursos necessários e pela aposta na qualidade do ensino.

O número de jovens que abandonam precocemente a escola sem terminarem os estudos, como afirmámos atrás, é mais de duas vezes superior à média verificada na UE. São estes jovens que alimentam empregos de má qualidade, particularmente no comércio e serviços, e que correm sérios riscos de exclusão social.

Para a CGTP-IN é urgente o debate público sobre a diversificação de novas vias de educação escolar nomeadamente o alargamento do ensino profissional com acesso efectivamente gratuito; a articulação entre a escola, os seus objectivos, os programas e as necessidades de competências do sistema económico e social; a articulação entre o sistema escolar e o sistema de formação profissional, nomeadamente no que diz respeito à formação contínua a desenvolver nas empresas.

Importa concretizar medidas constantes do acordo de concertação social sobre emprego, educação e formação, particularmente: assegurar que até 2006 todos os jovens até aos 18 anos de idade possam frequentar percursos de educação ou de formação que permitam a obtenção de níveis crescentes de escolaridade ou de formação profissional; o desenvolvimento de anos de formação pós-básico de natureza qualificante; a efectivação da cláusula de formação nos contratos de trabalho.

* Membro do Secretariado Nacional da FENPROF, da Direcção do Sindicato dos Professores do Norte (SPN) e do Conselho Nacional da CGTP-IN. Texto retirado da intervenção proferida no X Congresso da Central (Lisboa, 30 e 31 de Janeiro 2004). Subtítulos da responsabilidade do ?JF?

 

Educação ao longo da vida

Um caminho de futuro

A educação ao longo da vida deve constituir um direito de todos as pessoas, independentemente da sua idade, habilitações, origem étnica, percurso profissional, sector de actividade ou empresa onde trabalha, à aquisição de saberes e competências, que lhe permitam participar na construção contínua do seu desenvolvimento pessoal e profissional, proporcionando-lhes instrumentos para a compreensão das mudanças numa sociedade em rápida evolução, instrumentos para identificar os seus interesses e direitos e desenvolvimento de capacidades para intervir e agir adequadamente.

Esse direito pressupõe a disponibilização de condições para a actualização e domínio de novos saberes e tecnologias, a certificação das competências adquiridas por via formal ou informal, nomeadamente as adquiridas ao longo da sua actividade laboral.

A construção de uma sociedade e economia baseada no conhecimento requer a aplicação efectiva deste conceito. O diálogo social e a negociação colectiva constituem instrumentos essenciais. É imperativo concretizar os compromissos inscritos no acordo de concertação social sobre o emprego e a formação e que em todos os processos de negociação colectiva, nos sectores e nas empresas, se estabeleçam medidas sobre a formação contínua.

Uma estratégia de educação ao longo da vida tem de articular e dar coerência às suas várias vertentes: a formação inicial e a transição da escola para a vida activa; a acreditação e a certificação das competências, formais e informais; a educação e a formação de adultos; a formação contínua nos locais de trabalho.

São precisos programas e medidas específicas destinadas a combater o abandono e o insucesso escolar, erradicar o trabalho infantil e aumentar a qualificação dos jovens menores de 18 anos que ingressam no mercado de trabalho. Para a CGTP-IN importa que seja criado o Conselho Consultivo Nacional para a Formação Profissional atendendo à relevância que pode ter na avaliação de estratégias e de propostas no âmbito da formação profissional.

A formação contínua nos locais de trabalho constitui uma dimensão essencial da educação ao longo da vida. Importa concretizar os compromissos do acordo de emprego e formação de que a partir de 2002 pelo menos 10% dos trabalhadores de cada empresa devem participar em acções de formação contínua; e o direito de cada trabalhador a um mínimo anual de 20 horas de formação certificada em 2003 e 35 horas em 2006, também prevista no acordo.

Essa meta implica ainda a criação de condições para que os activos possam frequentar o ensino, nomeadamente garantindo a existência do ensino público pós-laboral e sendo acordadas com as empresas formas de organização do trabalho que permitam o acesso a todos os níveis de escolaridade e à certificação de competências com a consequente progressão na carreira.

MDS