O início de mais um ano lectivo fica marcado quer por um conjunto de medidas que o antecederam, quer por intervenções da administração educativa no primeiro mês, que são ilegais, prejudicam o funcionamento das escolas, agravam as condições de trabalho dos docentes, desvalorizam as aprendizagens dos alunos e transferem para os estabelecimentos de ensino um clima de insegurança profissional e educativa que resulta das políticas impostas por este Governo.
No entanto, o Governo e Ministério da Educação, numa tentativa de escamotear a realidade e ocultar as consequências desastrosas e inconsequentes das suas medidas, desdobraram-se em iniciativas públicas de propaganda e de auto-promoção da sua imagem, perante os portugueses e os governos da união europeia:
- Distribuíram algumas dezenas de computadores para as câmaras de televisão registarem e difundirem, apesar de haver professores que estão impedidos de os obterem, como é o caso dos professores contratados, precisamente na altura da sua vida em que, no plano profissional e pessoal, necessitam mais deste tipo de apoios.
- Anunciaram medidas de apoio social aos alunos mais carenciados do ensino secundário, esquecendo-se que muitas delas já estavam previstas em legislação.
- Defenderam a necessidade de uma profunda alteração na rede escolar como forma de combate ao abandono e insucesso escolares, através da construção de melhores equipamentos escolares e educativos, mas ficaram-se, genericamente, pelas palavras.
- Publicitaram a escola a tempo inteiro através da generalização e "normalização" das designadas actividades de enriquecimento curricular no 1.º ciclo do ensino básico como se de uma resposta de qualidade se tratasse.
- Consideraram muito positivo o processo de colocação de professores, apesar das ultrapassagens, do crescimento de desemprego, da não entrada de professores em quadro pela primeira vez desde há cerca de 20 anos, da manutenção de milhares de alunos sem um ou mais professores, nas suas escolas e, pasme-se, a transferência, à margem de qualquer regulamento de concursos, de professores de um para outro grupo de docência.
Mas a realidade é outra, bem diferente
daquela propagandeada pelo ME
Os concursos e colocações de professores estão ao nível do pior de há 5 ou 6 anos para cá, com a administração educativa a alterar as regras e prazos de concurso e a mudar os critérios para a colocação de docentes, particularmente com a aproximação do momento da abertura do ano. Cresce, por isso, o descontentamento dos professores e agrava-se, com o tempo, a situação. Algumas situações que não deveriam ocorrer:
- No distrito de Leiria, por exemplo, só no universo do 2.º e 3.º ciclos e do ensino secundário, faltam 51 professores
- Recrutamento de professores, em toda a região, para a leccionação de disciplinas específicas de cursos profissionalizantes, através das chamadas ofertas de escola, situação que só ocorre porque o ME extinguiu a distinção que existia no recrutamento nacional destes professores. Desta forma, surgem inúmeros horários a concurso neste âmbito que poderiam estar já preenchidos através do concurso nacional, situação agravada pelo facto desta modalidade de recrutamento permitir apenas contratar professores para horários com até 50% de um horário completo. Assim, face às necessidades, as escolas vêem-se obrigadas desdobrar horários completos em incompletos, sendo inúmeros os exemplos desta situação: Escola Secundária Martinho Áreas (Soure); ES Avelar Brotero; ES/3 Estarreja; ES/3 Gafanha da Nazaré; ES/3 Albergaria-a-Velha, entre muitas outras.
Anunciaram a criação da nova categoria de Professor Titular, como a solução para a resolução dos problemas das escolas, ou seja, através daquilo a que chamam lideranças fortes entregues aos mais competentes.
- No entanto, tal significou, na verdade e apenas, a distribuição de todo o serviço de coordenação educativa e supervisão pedagógica a estes docentes, para além da obrigatoriedade de leccionar nas suas turmas, quando tal serviço, antes, era dividido por todo o corpo docente de cada escola/agrupamento.
A alteração na rede escolar resume-se ao encerramento de dezenas de escolas do 1.º ciclo e de jardins-de-infância sem que, no entanto a transferência de alunos fosse acompanhada da necessária criação de condições: ocupação de tempos livres, com espaços adequados, transportes seguros e de duração média aceitável, serviço de refeições de qualidade e reforço alimentar ao longo do dia, colocação de pessoal auxiliar em número e com formação adequada, colocação de docentes especializados nos apoios educativos às crianças com necessidades educativas especiais...
EXEMPLOS:
- Em Condeixa-a-Nova, por exemplo, a componente de apoio à família do respectivo jardim-de-infância é feita numa sala para 25 crianças, onde são metidas 41;
- Perante a contestação de que o serviço de refeições pode não estar a ser realizado nas melhores condições, o SPRC considera que deverá competir à Administração Regional de Saúde e à ASAE proceder à verificação das condições de higiene e salubridade, bem como de funcionamento dos refeitórios das escolas de acolhimento.
- O mesmo em relação aos transportes, relativamente à incorrecta instalação de cintos de segurança ou à sua inexistência, ou mesmo à realização de transportes de forma atípica, como acontece, por exemplo de Montinhos para Pocariça, no concelho de Cantanhede. Neste caso é a auxiliar de acção educativa que faz o transporte, com o acordo da Junta de Freguesia. Também em Nelas (S. João da Serra é a Auxiliar que faz o transporte, numa carrinha de uma Associação, obrigando, neste caso, as crianças a acordar muito mais cedo, pois esta funcionária tem de estar no seu local de trabalho às 8.30 horas). A intervenção da Direcção Regional de Educação e da Direcção Geral de Viação é fundamental neste domínio
A construção dos chamados centros de média dimensão em número e em qualidade ajustados, ficou por se fazer. Conhecem-se meia dúzia. Na maioria dos casos improvisaram-se soluções ou as escolas de acolhimento dos alunos transferidos são piores do que as encerradas e empobrecem o património educativo, particularmente do interior do país.
UM CASO EXEMPLAR:
- No distrito de Viseu, um dos mais flagelados com o encerramento de escolas do 1.º ciclo, dos 54 concelhos apenas se conhece a construção de um centro escolar, em Resende. Todo o restante distrito ficou a zero, neste âmbito. Os restantes distritos da região integram essas alterações nas suas cartas educativas, mas os seus planos esbarram na falta de financiamento. O resultado é o improviso, quase sempre de má qualidade. Por vezes uma pior solução, comparada com a escola que foi extinta. É o caso de Gumiei (Viseu) que tem piores condições do que a escola encerrada de Ribafeita. Esta tinha merecido a intervenção da Câmara ? tinha salas boas, refeitório e cozinha, bem como aquecimento central. Em Gumiei, as crianças almoçam no átrio de entrada na escola e as obras necessárias são muitas.
No caso da educação pré-escolar, acusaram o SPRC de alarmista por alertar para este encerramento. Negaram-no, mas os resultados estão à vista:
- Encerraram 32 Jardins-de-infância, alguns com mais de 10 alunos ou mesmo com 20 alunos (como é o caso de Monte de Cima ? Agrupamento de Pardilhó, Aveiro, ou de Agualevada ? Agrupamento de Egas Moniz, Estarreja).
- Não sendo a educação pré-escolar obrigatória, há autarquias que não procuram soluções, deixando aos pais a resolução dos problemas, como acontece este ano em Aveiro (jardins de infância de Laginhas n.º 2 e Monte de Cima) e na Guarda (jardins de infância de Arrifana e Alvendre)
No 1.º ciclo do ensino básico prossegue o encerramento desenfreado, sem, contudo, conseguir abater tantas escolas quantas inicialmente estavam sinalizadas
- Encerraram 195 escolas do 1.º ciclo, das 525 sinalizadas pelo ministério da Educação. Apesar do encerramento de estabelecimentos prosseguir uma política de desertificação do país em matéria de serviços públicos, a luta do SPRC e das populações trouxe o recuo de autarquias e ministério da Educação em relação ao encerramento pretendido.
DREC |
Total de EB1 |
Total |
Encerramento EB1 (07/08) | |||||
01/02 |
04/05 |
05/06 |
06/07 |
06/07 |
Previstas |
Encerradas |
Em | |
AVEIRO |
308 |
298 |
279 |
251 |
52 |
44 |
19 |
232 |
C. BRANCO |
232 |
206 |
191 |
160 |
66 |
65 |
24 |
135 |
COIMBRA |
535 |
460 |
450 |
374 |
146 |
143 |
40 |
334 |
GUARDA a) |
401 |
323 |
318 |
199 |
124 |
114 |
40 |
157 |
LEIRIA |
429 |
399 |
390 |
337 |
88 |
89 |
34 |
300 |
VISEU b) |
786 |
737 |
708 |
496 |
223 |
159 |
38 |
311 |
TOTAL |
2691 |
2423 |
2336 |
1817 |
699 |
525 |
195 |
1469 |
- Sem V. N. de Foz Côa
- Sem Douro Sul
Muitos dos problemas detectados com a descontinuidade das actividades curriculares mantiveram-se este ano, designadamente com a imposição dos horários da componente de enriquecimento curricular à componente curricular, para servir interesses das autarquias e das empresas que prestam o serviço.
- Tal situação ocorre, por exemplo, nos concelhos de Soure, Condeixa-a-Nova, Seia e Nelas.
Há exemplos de escolas que, para garantirem as AEC, terão de instalar contentores (agora designados Salas Modulares Amovíveis), junto ao edifício da escola, ou que, até terem esses contentores, funcionarão em horário duplo, passando a horário normal no decurso do ano lectivo ? independentemente dos prejuízos que daí advêm para as famílias.
- É o que acontece nas EB1 de Areias de Vilar e Vilar, no agrupamento de escolas de S. Bernardo, onde a alternativa seria o encerramento desta última. Nestes casos, no entanto, as colocações anunciadas, ficam-se, por enquanto, pelas sapatas.
- No entanto, o regresso do contentor é uma realidade, espalhada por toda a região: há 3 contentores em Meridãos ? Cinfães para receber os alunos das escolas extintas de Aveloso, Vila de Mouros e Soutelo
- Em Ameal e Fermentãos (Cinfães) as refeições são servidas em contentores
- Em Coimbra estão a ser instalados contentores na Escola n.º 10, na n.º 39, na de Casconha, Assafarge e Antanhol, para funcionamento das AEC
Na educação pré-escolar encheram a boca com o alargamento da oferta, mas esconderam a recusa de autarquias em garantir a componente obrigatória de apoio à família por não terem pessoal auxiliar, situação cuja resolução não se sabe para quando, como acontece, por exemplo, na Figueira da Foz.
- Por outro lado, a autarquia de Belmonte que, para não gastar com a educação pública sugere que os pais coloquem os filhos em jardins-de-infância privados. A DREC não intervém, já desde o ano lectivo passado.
No concelho de Cinfães cerca de 300 adultos inscritos nos CEFA (cursos de educação e formação) dos 2 agrupamentos existentes, continuam a aguardar, mais de uma semana depois do início do ano lectivo a colocação de professores. O governo, no entanto, auto elogiou-se em relação ao combate ao abandono escolar, apesar da polémica em torno dos números que opôs OCDE e Ministra da Educação. Não embarcando nesse jogo de palavras, os dados oficiais da OCDE são os que prevalecem sobre os do governo.
Anunciaram uma "melhor gestão" do recrutamento de docentes, mas, de facto, o que aconteceu foi o aumento ilegal do horário de trabalho, o aumento ilegal do número de alunos por turma, a supressão do apoio às crianças e jovens com necessidades educativas especiais.
- Em relação a este último aspecto há falta de docentes de educação especial em quase todos os agrupamentos (exemplos: 2 na EB 2,3 Azeredo Perdigão, 1 na EB 2, 3 de Lamego, 1 no agrupamento de Sernancelhe, 2 no agrupamento Grão Vasco, em Viseu, etc) e estão constituídas muitas turmas com mais de 20 alunos e com crianças e jovens integrados com necessidades educativas especiais como encontrámos numa escola do 1.º ciclo de Sernancelhe, com 23 alunos e uma criança integrada com paralisia cerebral.
Não basta o discurso da normalidade para que, de repente, o que é inadequado passe a ajustar-se às necessidades e a cumprir os fins para que a educação e o ensino existem, nas suas vertentes pública, universal, inclusiva, de qualidade e com interesse estratégico para o país.
Para o Sindicato dos Professores da Região Centro, em primeiro lugar, importa criar as condições, nas escolas e jardins-de-infância, adequadas ao exercício de funções docentes e às aprendizagens pelos alunos, umas e outras indissociáveis.
É fundamental estabilizar o corpo docente, renovar a confiança no sistema educativo e nos seus profissionais e equipar e transformar as escolas em verdadeiros pólos educativos de interesse comunitário.
Coimbra, 25 de Setembro de 2007