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Conselho Nacional da FENPROF aprovou Plano de Acção. Administração Pública e E. Superior também estiveram em foco

CN Outubro 2003

01 de dezembro, 2004

Aprovado Plano de Acção


Reunido em Lisboa, nos dias 2 e 3 de Outubro, o Conselho Nacional da FENPROF, órgão máximo entre Congressos, aprovou um detalhado Plano de Acção, para além de outros documentos, nomeadamente sobre a Administração Pública e a abertura do ano lectivo do Ensino Superior (ver também noutras secções).


I. QUESTÕES GERAIS DOS TRABALHADORES PORTUGUESES

A política seguida pelo Governo, marcadamente de direita, tem vindo a determinar e a aprofundar as injustiças e as desigualdades entre os portugueses, a agravar o custo de vida, a precariedade dos vínculos laborais e o aumento do desemprego, a par de medidas que não viabilizam o desenvolvimento económico e social e que submetem o interesse nacional aos objectivos e estratégias de interesses políticos, económicos e financeiros.
A degradação da situação económica, os problemas decorrentes de opções de política orçamental restritivas, a sucessiva quebra dos salários reais, a influência negativa do baixo valor do Salário Mínimo Nacional, o crescente endividamento das famílias e o impacto do Código do Trabalho nas relações laborais, complementam um quadro inquietante que não se configura com o regime democrático-constitucional e que objectivamente o procura pôr em causa.
Quando afirma que vai reformar a Administração Pública, a Segurança Social, a Saúde, a Educação e o Ensino, o Governo é incapaz de propor soluções que tenham em conta os interesses do País, dos trabalhadores e das camadas sociais mais desfavorecidas. Na Administração Pública, tomou relevo a lógica de privatização de sectores importantes, a precarização e a alteração dos vínculos de trabalho. Na Segurança Social, o Governo quer reduzir o subsídio de doença, não transfere os descontos dos trabalhadores para o Fundo de Reserva e facilita o despedimento ou a reforma precoce, penalizando financeiramente o sistema. Na saúde, favorece-se o capital privado com o aparecimento dos Hospitais SA e não se solucionam os graves problemas que afectam esta área da governação.
Na Educação e no Ensino, conhece-se a proposta de Lei de Bases da Educação apresentada pelo Governo, a sua intenção de privilegiar o privado sobre o público, de demolir o edifício da gestão democrática das escolas, de procurar alienar responsabilidades para as autarquias, de reduzir o ensino básico de 9 para 6 anos, num ambiente de ditadura da maioria parlamentar sobre tudo e todos, que desconsidera e desvaloriza o papel dos professores, dos restantes profissionais do sector e, de uma forma geral, da comunidade educativa.
Retomando o efeito do Código do Trabalho sobre a vida dos trabalhadores e das suas organizações representativas, regista-se a violência da maioria das medidas que, a concretizarem-se, destruirão direitos dos trabalhadores conseguidos com grandes sacrifícios e lutas, impedirão os trabalhadores de se organizarem e defenderem, afastarão os Sindicatos dos principais processos negociais, reduzirão direitos constitucionais de dirigentes e delegados sindicais, atacarão os seus direitos e a protecção que precisam para exercer, com independência, as suas funções e desenvolver a acção sindical. Paralisarão, ainda, os órgãos de consulta, num completo desprezo pelo diálogo social e pela negociação.
Em síntese, com o seu mandato, o Governo iniciou uma cruzada a favor do grande capital e contra os direitos dos trabalhadores e das classes sociais mais desfavorecidas.
Para além deste aspecto, surge ainda o perigo de uma Constituição Europeia que dá uma machadada no designado modelo social europeu, reduzindo as conquistas democráticas e tudo o que é social e público.


II. QUESTÕES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A REFORMA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Desde sempre, a FENPROF tem defendido e proposto medidas para melhorar o funcionamento da Administração Pública, no entendimento de que esta sustenta a qualidade de vida das populações, tal como está consagrado no texto constitucional.
É neste quadro que a FENPROF defende uma Administração Pública forte, um aparelho de Estado operativo, moderno, descentralizado e desburocratizado, transparente e responsável.
A anunciada reforma da Administração Pública que o Governo pretende pôr em marcha, à revelia e contra os interesses dos trabalhadores, mais não visa que subverter a função social do Estado. Na verdade, esta reforma tem por principais objectivos a desresponsabilização do Estado pela gestão dos serviços públicos; a redução do défice orçamental à custa da qualidade dos serviços e do aumento da precariedade dos trabalhadores; o controle político e a partidarização da Administração Pública; a privatização dos serviços públicos e uma ofensiva cada vez maior contra os direitos dos trabalhadores e das suas organizações sindicais. É ainda intenção do Governo a concretização de uma estratégia que visa degradar e perverter os serviços públicos, introduzindo modelos ditos "empresariais" e lógicas predominantemente lucrativas que conduzam à subversão do modelo constitucional, por via do esvaziamento das funções sociais do Estado.
As medidas estruturais que a FENPROF considera indispensáveis para uma efectiva melhoria dos serviços públicos no quadro dos princípios consagrados na Constituição da República deverão ter em conta:
   As atribuições e objectivos constitucionais da Administração Pública e o rigoroso cumprimento das leis e das decisões dos tribunais, garantindo a legalidade, uma gestão rigorosa e pondo fim ao partidarismo, ao clientelismo e à corrupção.
   A descentralização administrativa e a defesa e desenvolvimento das autonomias regionais dos Açores e da Madeira;
   A valorização do Poder Local Democrático;
   O respeito pelos princípios da participação, da desburocratização e da responsabilização,
   O reforço da transparência da Administração e do acesso dos cidadãos às decisões que lhes digam respeito com plena aplicação do CPA;
   A desgovernamentalização da Administração Pública, conferindo adequada autonomia de gestão e estabilidade à direcção dos organismos, concretizando o balanço e avaliação sistemáticos da actividade dos organismos e do desempenho dos dirigentes;
   A assumpção de formação profissional como um investimento indispensável à modernização e qualificação da Administração Pública;
   A dignificação e qualificação das funções públicas e de quem as exerce.
NEGOCIAÇÕES SALARIAIS
A FENPROF não descurará a luta pela valorização salarial dos professores e educadores.
A FENPROF envolver-se-á no debate, na mobilização e na decisão das lutas que, no âmbito da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública, vierem a ser tidas como necessárias à defesa de uma actualização salarial justa, que considere não só os critérios básicos, como a inflação e a produtividade, mas também as perdas salariais acumuladas nos últimos anos.
A FENPROF exige como princípios a respeitar para o processo negocial para 2004:
Respeito escrupuloso da Lei da Negociação Colectiva;
Respeito pela anualidade da actualização salarial;
Actualização das tabelas salariais para o Ensino Português no Estrangeiro, tendo em conta que se mantêm inalteradas desde 31 de Dezembro de 1999;
Recuperação do poder de compra, o que implica a adopção de referenciais credíveis, nomeadamente as perdas salariais dos últimos anos relativamente à inflação.
Nesse sentido, a FENPROF aprova o seu contributo para a Plataforma Reivindicativa 2004:
- Garantia de uma actualização de salários e pensões e dos índices 100 das diversas carreiras, num intervalo situado entre os 5% e os 5,5%;
- Diminuição da diferença salarial entre as remunerações mais baixas e os vencimentos de topo dos trabalhadores no activo;
- Actualização do subsídio de refeição para 6 Euros;
- Actualização das restantes prestações pecuniárias num intervalo situado entre os 5% e os 5,5%;
- Consagração em sede do código do IRS de dedução de despesas relativas aos custos suportados pelos trabalhadores com acções de formação e com aquisição de materiais e equipamentos inerentes ao exercício profissional.

APOSENTAÇÃO
Em relação ao regime de aposentação na Administração Pública, o Governo sem negociação e ao arrepio da Constituição da República, decidiu, unilateralmente, em sede de Orçamento, impor uma alteração à forma de cálculo que se traduziria num aumento efectivo de vários anos de serviço ou em cortes de elevada expressão no valor das pensões.
Pelo Acórdão 360/2003 do Tribunal Constitucional, foi decretada a inconstitucionalidade dos nº s 1 a 8 do artigo 9º da Lei nº 32-B/2002, de 30 de Dezembro.
A Ministra das Finanças, no sentido de iludir a obrigação constitucional da participação das organizações sindicais na discussão da matéria regulada, publicou o Despacho 867/03/MEF, de 5 de Agosto.
Face à atitude da Ministra das Finanças a FENPROF tudo fará para que:

  • Seja declarada a ilegalidade, com força obrigatória, do citado Despacho, pelo que já entregou em Tribunal o pedido de declaração;
  • O Ministério Público (PGR) declare a ilegalidade do Despacho em causa;
  • Seja solicitada pelo Presidente da República, Presidente da Assembleia da República, Provedor de Justiça e Grupos Parlamentares a aferição da constitucionalidade das normas em questão;

A FENPROF empenhar-se-á, ainda, na impugnação das decisões proferidas nos casos concretos por aplicação do Despacho.
Simultaneamente, a FENPROF continuará a exigir que aos educadores e professores do Ensino Particular e Cooperativo e IPSS sejam aplicadas as mesmas regras que vigoram no Ensino Público.


III. QUESTÕES DO ENSINO, DA EDUCAÇÃO, DAS ESCOLAS E DOS PROFESSORES E EDUCADORES

UM ANO QUE SE INICIOU SOB O SIGNO DA PERTURBAÇÃO E DA INTRANQUILIDADE
O Ministério da Educação procurou fazer passar a ideia de que o ano lectivo 2003-2004 se iniciou de forma perfeitamente normal, tendo o Primeiro Ministro chegado a afirmar que tal normalidade seria um bom prenúncio do que iria acontecer ao longo do ano.
Em devido tempo, a FENPROF demonstrou que, pelo contrário, o ano lectivo se iniciou sob o signo da perturbação e da intranquilidade, fruto dos problemas gerados pelo atraso, ilegalidades e erros nas colocações; dos problemas decorrentes de imposição de agrupamentos verticais de escolas, em particular nas regiões Norte e Centro; da manutenção e agravamento de problemas crónicos no sistema educativo, nomeadamente os que se prendem com as deficientes condições de trabalho em muitas escolas.
Assumiu especial destaque neste início de ano a realidade brutal do desemprego docente, já que o balanço quase final do processo de concursos aponta para que mais de 30 mil docentes não tenham sido colocados, situação que poderá agravar-se com a plena entrada em vigor do novo regime de concursos.
No que diz respeito às colocações, o atraso é de tal ordem, que se pode afirmar que nunca no mês de Outubro de um ano lectivo estiveram por preencher quase 4 000 horários de professores, levando a que mais de 200 000 alunos continuem sem aulas em todas ou parte das disciplinas.
Por outro lado, tornou-se claro neste período que o ME opta cada vez mais pelo anúncio de medidas de impacto público que relevam de uma atitude em muitos casos puramente voluntarista, queimando etapas, acelerando timings, ignorando sistematicamente os alertas para as suas consequências negativas.
São exemplos sintomáticos desta postura os problemas vividos actualmente pelas escolas secundárias, tendo em conta a confusão criada pela aplicação de novos programas do 10º ano com uma carga horária inferior à necessária para a sua leccionação, e a publicidade demagógica em torno do denominado Programa de Qualificação do 1º CEB, em que fica claro que, para lá do anúncio do objectivo de um computador por sala, ficam promessas e medidas limitadas num contexto em que muitas escolas deste sector de ensino continuam a lutar com as carências mais básicas.
 
LEI DE BASES DA EDUCAÇÃO
O debate público em torno da revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) irá, certamente, marcar o 1º Período deste ano lectivo, sabendo-se que é objectivo do Governo encerrar este debate e proceder à votação final em sede de Assembleia da República até ao final de Dezembro.
Para a FENPROF, o actual Governo, com o seu projecto, pretende subverter profundamente o sistema educativo português, tal como se encontra configurado na actual LBSE.
Em nome da garantia de liberdade de aprender e ensinar e da necessidade de desenclausurar o ensino privado e colocá-lo em absoluto pé de igualdade com o ensino público, o projecto do Governo aposta na criação de uma rede de ofertas educativas que, sob a capa da prestação do mesmo serviço público de educação, obrigam o Estado ao seu apoio e financiamento, independentemente de se tratarem de oferta pública ou privada. Substitui-se, assim, a responsabilidade do Estado perante uma rede pública de educação pela preocupação de favorecer financeiramente o ensino privado, apoiando-o na mesma medida em que apoia o ensino público.
Em nome da propalada liberdade de aprender a ensinar, na sua inexorável caminhada para níveis cada vez mais altos de elitização e competitividade (sempre dirigida pelos omnipresentes objectivos de eficiência e eficácia) exclui, necessariamente, os cidadãos que mais precisam de medidas de discriminação positiva no processo educativo, como forma de compensação da desigualdade de oportunidades de que são vítimas dentro do espaço desta Escola, a escassa inclusão que se admite é uma inclusão mitigada, dispersa por espaços segregados.
Em nome de preocupação por pretensos objectivos de eficiência e eficácia para o sistema educativo, tendo em vista a sua sujeição à avaliação pública dos resultados, a proposta do Governo pretende pôr em causa a prevalência de critérios pedagógicos na gestão das escolas sobre quaisquer outros, como preconiza a actual LBSE. Nesse quadro, a aposta do governo é na chamada profissionalização da gestão, passo necessário para reforçar o controlo sobre a escola, postergando princípios desde sempre defendidos pela FENPROF, e aplicados positivamente pelas escolas, como a elegibilidade, a colegialidade e o funcionamento democrático dos órgãos de direcção e gestão dos estabelecimentos de ensino.
Em nome da necessidade de apostar na formação de novas gerações para o futuro, o Governo pretende investir em modalidades de formação vocacional e profissional, prevendo que a partir do 7º ano de escolaridade se podem instituir áreas vocacionais diversificadas, no quadro de uma redução da duração do ensino básico, o que a concretizar-se, se traduziria na introdução de vias de elitização, hierarquização e desvalorização da escolaridade e formação de base.
Em nome da necessidade de uma avaliação permanente, continuada e pública da eficiência, eficácia e qualidade do sistema educativo, o Governo pretende implementar uma avaliação que se constitua como instrumento de controlo político, pedagógico, administrativo e financeiro das escolas, através de medidas como a introdução de mais exames no percurso escolar dos alunos, a hierarquização das escolas através de rankings, o financiamento das escolas a partir dos resultados dos seus alunos.
Tendo em conta estes e outros objectivos materializados no projecto do Governo, a FENPROF considera fundamental o empenhamento e a intervenção dos professores neste debate decisivo para o futuro do sistema educativo português, de forma a que se possa enfrentar com sucesso esta ofensiva contra a Escola Democrática em Portugal.
 
GESTÃO E FINANCIAMENTO DAS ESCOLAS; CONSTITUIÇÃO DE MEGA-AGRUPAMENTOS
A FENPROF promoveu, no ano lectivo passado, uma campanha com o lema Promover e Aprofundar a Democracia nas Escolas, Contra a Nomeação de Gestores Profissionais, no âmbito da qual realizou um conjunto de iniciativas, de que se destacam um abaixo assinado que recolheu cerca de 40 mil assinaturas de professores e educadores, e um Fórum Nacional com a participação de diversos especialistas em administração escolar.
Na sua proposta de revisão da Lei de Bases, o Governo prevê a criação da carreira de gestor, que deixa de ser eleito, que não tem que ser professor, que elaborará o projecto educativo da escola/agrupamento e que será assessorado pelos órgãos de participação e representação da comunidade educativa. Neste quadro, importa junto dos professores e dos restantes parceiros educativos, continuar a denunciar as consequências das alterações propostas, de forma a alargar o movimento em defesa da democracia na gestão escolar.
A importância da criação de dinâmicas que agreguem os vários parceiros educativos ficou patente na denúncia conjunta do processo de criação de mega agrupamentos de escolas, impostos à revelia da opinião das escolas, autarquias e comunidades, na visão meramente administrativa e de gestão de recursos que preside à actual política educativa.
Sendo uma peça essencial de uma estratégia de reforço do controlo sobre as escolas e de empresarialização do sistema educativo, estes agrupamentos estão a provocar grandes constrangimentos na coordenação pedagógica das escolas, avolumando tensões e dificuldades no desenvolvimento dos seus projectos educativos.
Para lá da contestação à forma como se desenrolou todo este processo, materializada no plano jurídico com uma queixa no Tribunal Central Administrativo contra o despacho ilegal que impôs a criação desses agrupamentos, a FENPROF irá acompanhar a forma como está a decorrer o seu funcionamento, através de um levantamento exaustivo dos problemas que a reorganização da rede provocou neste início de ano lectivo. A FENPROF acompanhará todo este processo com as escolas envolvidas, desenvolvendo um balanço e análise sistemáticos da evolução da situação nesta área.
O anúncio de que será publicada brevemente uma Lei do Financiamento, Autonomia e Gestão das Escolas faz pressupor que, em coerência com o seu projecto e programa para a Educação, o Governo irá criar mais um instrumento da sua política de desresponsabilização do Estado face à escola pública.
A perspectiva de que, a breve prazo, os mega-agrupamentos irão englobar igualmente as escolas secundárias, poderá agravar as já crónicas dificuldades de muitas escolas, com especial incidência no 1º CEB e Educação Pré-Escolar, fazendo com que escolas que já apresentam problemas de vário tipo assumam responsabilidades em relação a outras, aumentando a quantidade e complexidade dos problemas.
No mesmo sentido preocupante, vão as intenções já declaradas de transferir para as autarquias competências acrescidas na área do financiamento o que irá, certamente promover o aumento das assimetrias.
A poucos meses da aprovação de um novo Orçamento do Estado, ganha, assim, ainda maior actualidade a reivindicação da FENPROF de uma Lei do Financiamento da Educação e do Ensino não superior.

CARREIRAS DOCENTES
Não restam dúvidas quanto ao que pretendem o Ministério da Educação e o Governo quando se referem à necessidade de revisão próxima do Estatuto da Carreira Docente: tornar mais instável a profissão docente, reduzir direitos sócio-profissionais, dificultar ou mesmo impedir o acesso aos escalões mais elevados da carreira, agravar as condições de exercício profissional e de aposentação. É nesse quadro negativo que são anunciados os contratos individuais de trabalho, a extinção das progressões e a introdução de regras de promoção na carreira ou o agravamento das regras gerais de aposentação. É neste quadro de ataque aos direitos que se mistificam os salários dos docentes em Portugal para que passe a ideia, na opinião pública, destes serem os mais bem pagos da Europa o que, como a FENPROF já provou, é falso.
Caso o Ministério da Educação concretize as intenções de revisão do ECD, que, tem repetido, deverá ser um processo encerrado até final de 2003, a FENPROF exigirá a salvaguarda de todos os direitos nele consagrados e apresentará propostas no sentido do seu alargamento. Sucessivas declarações de responsáveis do M.E. dão conta da sua pretensão de partir para as negociações de um ponto zero inexistente. De facto, o ponto de partida dos professores nesta previsível revisão do ECD será o actual diploma regulador da sua actividade profissional. Aos direitos nele consagrados só se admitirão alterações se o sentido da mudança for de alargamento desses direitos e de consolidação de outros, designadamente dos que se encontram por regulamentar.
Foi com muita acção e luta que os educadores e professores portugueses conseguiram, em 1990, um primeiro estatuto profissional e de carreira, tendo, na sua revisão, que teve lugar em 1997/98, melhorado alguns aspectos importantes quer do normativo, quer da estrutura de carreira. Não é, também por isso, aceitável qualquer nova revisão que contrarie o sentido positivo da anterior.
Por outro lado, as negociações dos Contratos Colectivos de Trabalho do Ensino Particular e Cooperativo, Ensino Profissional e das IPSS encontram-se bloqueadas por ausência de contrapropostas por parte das Associações Patronais respectivas.
A FENPROF mobilizará os docentes destes sectores no sentido de exigirem a retoma das negociações de forma a que o objectivo de equiparar as condições de trabalho e as remunerações destes docentes às dos colegas do ensino público para vir a ser uma realidade.
 
COMBATE AO ABANDONO E INSUCESSO ESCOLARES; CONDIÇÕES DE TRABALHO E AVALIAÇÃO DAS ESCOLAS
As mais recentes análises estatísticas convergem no reconhecimento de um elevadíssimo índice de abandono e de insucesso escolares em Portugal. Percentualmente e citando apenas os últimos estudos a média em Portugal é de 45% (de abandono mais insucesso) contra os 19% da U.E.. Estes valores não podem deixar de relacionar-se com os índices de desenvolvimento económico que têm vindo igualmente a lume, nomeadamente os que colocam o nosso país entre os mais baixos salários médios da U.E. e o que apresenta um maior fosso entre ricos e pobres. A conjugação destes diferentes dados sustenta a ideia de que as causas do insucesso no nosso sistema educativo deve ser menos procurado no seu interior e mais nos atrasos e distorções que caracterizam o nosso tecido social, cuja desagregação, de resto, se vai aprofundando na maré de falências, lay-off, sobreendividamento e crescente desemprego.
Esta asserção, contudo, não pode conduzir a que se ignore um vasto conjunto de situações, no interior da Escola que, no mínimo, contribuem para que a Escola não consiga amenizar estas inegáveis desigualdades de partida. Fácil foi ao sistema ignorar esta realidade enquanto a Escola se manteve como um feudo de classes alta e média como aconteceu até ao início da década de 70 do século passado. A democratização do acesso à Escola, iniciada em 73 e concretizada pela explosão escolar após 1975, tornou patente as dificuldades de mudar a Escola de modo a que ela respondesse de forma positiva às novas exigências da nova situação.
A FENPROF considera como absolutamente falsas as teses de alguma direita que, incapaz de conviver com uma Escola onde os seus privilégios não são tão visíveis como anteriormente e incapaz de aceitar que o novo modelo escolar deve responder a uma nova pluralidade de camadas e grupos sociais vai vociferando contra a Escola Democrática, acusando-a particularmente de ser pior que a de 74, de ser dominada pela indisciplina e de não cultivar os valores da exigência, do esforço e da seriedade valores que só as escolas privadas estariam em condições de salvaguardar. Os dados que confirmam o progressivo alargamento da frequência do pré-escolar (embora estejamos ainda longe de outros países da UE), a quase cobertura total no que respeita à frequência do 1º ciclo de 4 anos (mesmo denunciando que muitas escolas do 1º CEB não têm condições de trabalho), o incremento de inclusão de crianças com necessidades educativas especiais nas escolas de ensino regular constituem vitórias da escola democrática. No balanço do negativo, porém, pesará inexoravelmente o facto de muitas destas crianças com acesso à Escola não concluírem a Escolaridade Básica (ainda de 9 anos), o elevadíssimo número de jovens que não vão além do 10º ano de escolaridade e, pelo menos até há alguns anos, o número de alunos que por força do numerus clausus, ficaram à porta do Ensino Superior ou foram desviados para cursos que não eram as suas primeiras escolhas.
Neste contexto, o anunciado alargamento da escolaridade obrigatória para 12 anos que merece o apoio da FENPROF que já aprovara essa medida no seu Congresso de Braga (1998) -, não pode deixar de levantar a questão de como conciliar este alargamento com a ainda elevada taxa de insucesso e abandono na escolaridade obrigatória de 9 anos.
A progressiva e sustentada redução das taxas de fracasso escolar e educativo é indispensável para a qualificação da população laboral activa e para o desenvolvimento social e económico do país. Neste mesmo sentido, é impreterível o combate às baixíssimas taxas de escolaridade da população adulta portuguesa, quer ao nível do ensino básico, quer do ensino secundário, bem como a eliminação do analfabetismo e da iliteracia.
Consciente de que enfrentar esta situação exige a solução deste problema, como exige a solução dos problemas económicos com que o País se confronta, a FENPROF sublinha que há um largo campo de intervenção no interior da Escola e do Sistema Educativo capaz de atenuar este impossível estado de coisas. Nesse sentido, a FENPROF propõe:

que as Escolas disponham de uma bolsa suplementar de docentes que tenham como função o acompanhamento personalizado e em tempo útil das crianças e jovens  que revelam dificuldades nas aprendizagens, de modo a suprir esses atrasos;

que seja reforçado, em lugares de quadro, o número de docentes de educação especial e outros técnicos;

  • que seja revisto o garrote que constitui o despacho 10317, de modo a possibilitar às Escolas o recurso a diversas actividades de apoio educativo;
  • que os directores de turma sejam dispensados de trabalho burocrático facilmente executável a nível administrativo de modo a assegurarem o acompanhamento e apoio aos alunos;
  • que em todo o país, na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário, se caminhe para uma significativa redução do número de alunos por turma;
  • que a regulamentação do artigo 22º do Decreto-Lei 35/2003 assegure a colocação de docentes que garantam o funcionamento de equipas educativas e os apoios que anteriormente se encontravam previstos no artigo 4º do Decreto-Lei 35/88;
  • que as Escolas disponham de um número de auxiliares de acção educativa em função das suas reais necessidades;
  • que se aposte com rigor na requalificação das escolas do 1º CEB;
  • que se acelere o equipamento de todas as escolas com novas tecnologias de comunicação e se incentive o seu uso por parte dos professores, o que exige um investimento forte na sua formação;
  • que se aposte decididamente no desenvolvimento da experimentação científica e nas metodologias do ensino, designadamente nas áreas científicas, de modo a ultrapassar também nestas áreas, a situação de iliteracia denunciada por diversos estudos recentes;
  • que, ao contrário de continuar a diminuição da oferta do ensino recorrente para adultos nas escolas públicas, se aposte no seu aumento e imprescindível promoção;
  • que se alterem, de uma forma conjugada, os currículos e os modelos do Ensino Recorrente dos Ensinos Básico e Secundário.

Estas são necessidades do sistema, para as quais a FENPROF tem vindo a chamar a atenção e que o próprio programa de Avaliação Integrada das Escolas, em grande parte, evidenciou, cumprindo um dos principais objectivos de um sistema de avaliação externa das escolas: permitir diagnosticar problemas, comprometendo as instâncias responsáveis na sua superação.
A FENPROF denuncia vivamente a pretensa e demagógica tentativa de avaliar as escolas através dos resultados dos alunos em exames, sem ter em conta o contexto em que as escolas se inserem, os recursos de que dispõem e os processos que desenvolvem.
A recente divulgação de novos rankings das escolas secundárias representa uma enorme mistificação e não contribui para a melhoria do sistema nem disponibiliza informação rigorosa sobre o trabalho das escolas.
Estes rankings servem apenas para introduzir uma lógica de mercado na educação, pondo as escolas a competir umas contra as outras, numa concorrência desleal que favorece o ensino privado, descredibiliza o público e terá inevitavelmente como consequência o reforço de mecanismos de selectividade social e da exclusão dos que já estão penalizados à partida.
EM DEFESA DE UMA ESCOLA INCLUSIVA
A construção de uma Escola Pública de Qualidade para todos objectivo reiteradamente assumido pela FENPROF exige que cada escola disponha de condições adequadas às diferentes situações que os alunos apresentam, de modo a possibilitar o sucesso educativo destes.
De entre as modalidades especiais de educação, a educação especial merece uma referência destacada por duas ordens de razões: em primeiro lugar, porque a entrada das crianças e jovens com necessidades educativas especiais (e, de entre estes, as que decorrem da presença de deficiências) representou, no plano dos valores, um inequívoco avanço civilizacional e, no plano das concepções, uma verdadeira mudança de paradigma educativo; em segundo lugar porque a Escola Inclusiva é uma componente indissociável da Escola Democrática, Pública e de Qualidade que defendemos.
Neste universo que a Escola de Qualidade deve abranger, merece particular atenção e cuidado a situação das crianças portadoras de deficiência(s) que exigem respostas educativas diferenciadas.
A FENPROF mantém-se firme na defesa de que a Escola deve ser inclusiva, recebendo todas as crianças e jovens, criando as condições logísticas necessárias (quer no que respeite a condições físicas, quer de acompanhamento por parte de pessoal auxiliar). Devem ser-lhes proporcionadas as ferramentas adaptadas às suas condições específicas, apoiando-os com professores/educadores devidamente habilitados em educação especial. A inclusão destas crianças e jovens na vida quotidiana das escolas é pedagógica e humanamente útil para todos, numa lógica de educação para a cidadania plena.


IV. INTERVENÇÃO SINDICAL E ACÇÕES A DESENVOLVER

Os educadores e professores portugueses terão necessariamente de se envolver nas grandes acções e lutas de todos os trabalhadores no sentido de travarem a ofensiva geral do Governo contra os seus direitos sócio-profissionais e contra o desenvolvimento e reforço dos serviços públicos. Esse envolvimento será fundamental não só para impedir o retrocesso e a regressão de direitos sociais, laborais e cívicos que são comuns, mas também, de uma forma mais particular, para defender alguns dos direitos sócio-profissionais que caracterizam o desempenho da actividade docente.
É indispensável, em primeiro lugar, debater, esclarecer e mobilizar os professores para, de seguida, os levar a agir e a lutar, tornando-se esse movimento fundamental para a obtenção de avanços e vitórias que, por vezes, poderão traduzir-se apenas, e no imediato, na salvaguarda de direitos. A política muito negativa levada a efeito pela direita que domina a governação no nosso país, impôs aos trabalhadores portugueses novas exigências no plano da acção reivindicativa. Hoje não basta uma atitude passiva para resistir e salvaguardar os direitos, é necessário mais do que isso, é indispensável uma atitude activa de resistência que obriga à acção e à luta. Tal não significa um virar de costas à intervenção no plano institucional, que continuará a ser uma vertente fundamental na vida da FENPROF, mas traduzir-se-á, indispensavelmente, no reforço da intervenção, acção e luta de todos os educadores e professores, vertente cada vez mais importante para fazer face aos projectos e medidas anti-sociais do Governo.
É neste quadro que a FENPROF estabelece diversos patamares de acção e de luta, merecendo um especial destaque o trabalho a desenvolver nas escolas, junto dos professores. Assim:

INTERVENÇÃO SINDICAL JUNTO DOS PROFESSORES
Realização de Plenários de Delegados Sindicais, na primeira quinzena de Outubro, com vista a contribuir para uma melhor e mais rápida intervenção da organização nas escolas e a garantir o conhecimento das posições dos núcleos sindicais pela direcção sindical.
Realização de reuniões ou plenários em todos os núcleos sindicais (escolas, agrupamentos ou concelhos), durante os meses de Outubro e Novembro, com vista a informar, debater e mobilizar os professores para agirem.
Promoção, em todo o país, de um conjunto de debates, organizados pelos diversos Sindicatos, sobre a revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo e as suas consequências directas e indirectas, neste caso, através da regulamentação de diversos aspectos que dela resultarão. A FENPROF proporá ainda, ao Ministério da Educação, a criação de condições para que este debate se possa realizar em todas as escolas do país, através da libertação de um dia de actividade lectiva para este efeito.
Realização, de 27 a 31 de Outubro, de uma Semana de Luta dos Professores e Educadores contratados e desempregados, que revestirá a forma, entre outras iniciativas de plenários nos quais deverão ser eleitas comissões distritais para apoio dos Sindicatos no reforço da organização e no aprofundamento da acção destes docentes.

INTERVENÇÃO JURÍDICA
    Concursos de Professores: a FENPROF apoiará até às últimas consequências a contestação dos professores lesados, no sentido da reposição da legalidade e da correcção das irregularidades.
   Criação ilegal de mega-agrupamentos verticais de escolas: a FENPROF desenvolverá o processo de contestação jurídica ao despacho número 13313, do Secretário de Estado da Administração Educativa, que se iniciou com a apresentação de uma queixa no Tribunal Central Administrativo.
   Despacho ilegal da Ministra das Finanças sobre aposentação dos trabalhadores da Administração Pública: A FENPROF solicitará às entidades competentes a declaração de ilegalidade e a aferição da constitucionalidade do despacho, apoiando, ainda, a impugnação de todas as decisões proferidas devido à sua aplicação.

INTERVENÇÃO INSTITUCIONAL
A FENPROF envolver-se-á activamente em todas as frentes negociais, seja no âmbito da Administração Pública e, aí, no plano da intervenção da Frente Comum de Sindicatos, seja no plano das negociações directas com as entidades de tutela dos educadores e professores: Ministério da Educação, Ministério da Ciência e Ensino Superior e representantes das entidades patronais no ensino particular e cooperativo.
A FENPROF manterá um contacto estreito com os diversos órgãos de soberania, junto dos quais apresentará as suas posições em defesa dos interesses da Escola e do Ensino Públicos, bem como dos direitos dos profissionais docentes. Também no plano institucional, a FENPROF procurará reforçar e alargar os contactos, as tomadas de posição e as acções em conjunto com as organizações mais representativas de outros parceiros educativos, designadamente pais e encarregados de educação, estudantes, pessoal não docente e autarcas.

ACÇÕES E LUTAS A DESENVOLVER
Criação de condições, através do contacto e da mobilização da comunidade educativa e das mais representativas organizações sociais, para a realização, ainda no primeiro período lectivo, de uma Marcha pela Educação e pela Escola Democrática.
Intervenção de forma empenhada na Cimeira de Sindicatos da Administração Pública, a realizar no dia 8 de Outubro, contribuindo para a acção conjunta e articulada dos diversos sectores na rejeição das propostas muito negativas apresentadas pelo Governo no âmbito da designada reforma da Administração Pública, bem como na exigência de uma revisão salarial justa para 2004.
Participar de forma empenhada em formas de acção e luta que, a nível nacional ainda que concretizadas descentralizadamente, venham a ser desenvolvidas pela CGTP-IN, no âmbito da defesa dos direitos laborais, sociais e cívicos de todos os trabalhadores. Nesse sentido, o Conselho Nacional da FENPROF apela à participação dos professores e educadores portugueses na jornada de luta do próximo dia 30 de Outubro, que passa pela realização de concentrações e manifestações em várias cidades do país.
Neste quadro, serão assumidas como prioritárias as lutas contra a regulamentação do Código de Trabalho e em defesa de serviços públicos de qualidade Educação, Saúde, Segurança Social, entre outros exigindo do Governo o reforço do investimento público para que assim sejam respeitadas as suas obrigações na concretização das que são as efectivas funções sociais do Estado consagradas na Constituição da República Portuguesa.
Neste âmbito, a FENPROF proporá a realização de um Seminário, com a participação de intervenientes de outros países em que se registem fortes ataques aos serviços públicos.
Realização de uma iniciativa pública, no final de Outubro, para avaliação da situação que vivem os professores e as escolas integradas em agrupamentos criados à sua revelia e à margem do quadro legal vigente.
Em torno de todos os objectivos enunciados gerais e específicos admite-se a realização de Abaixo-Assinados, Concentrações, Vigílias, Manifestações e Greve(s), entre outras acções, devendo a sequência das acções a aprovar obedecer ao indispensável sentido crescente da luta que deverá envolver todos os trabalhadores. No caso concreto do recurso à Greve esta poderá revestir diversas formas, tal como a Greve em Carrossel.
O primeiro período lectivo, por coincidir com a apresentação do Projecto de O.E. 2004, pelo Governo, e posterior aprovação na Assembleia da República, será de elevada importância para os professores como, de uma forma geral, para todos os trabalhadores. Significativamente, todas as medidas que têm vindo a ser apresentadas pelo Governo e pelo M.E., no âmbito da aplicação do Código de Trabalho, da reforma da Administração Pública e também no domínio específico dos professores (aprovação da Lei de Bases da Educação, revisão do ECD ou aprovação de um regime diferente para a direcção e gestão das escolas) têm Dezembro de 2003 como prazo para se encontrarem concretizadas.
Assume, ainda, particular importância a participação da FENPROF nos movimentos sociais (designadamente, no Fórum Social Europeu e no Fórum Social Português) e nas diferentes iniciativas e campanhas que contribuam para a construção de um país e de um mundo mais justos, solidários e pacíficos e de que se salienta, pela sua actualidade, a campanha Um euro para a Palestina e a Marcha Global contra o trabalho infantil.
A FENPROF participará, ainda, na euromanifestação de 4 de Outubro, em Roma, por uma Constituição para uma Europa mais social.
Vivemos um período de intensa acção e luta reivindicativa gerado pela brutal ofensiva do Governo pelo que a direcção da FENPROF admite o recurso às mais variadas formas de intervenção político-sindical que serão sempre debatidas com os professores, no respeito pelos critérios de adequação e oportunidade.

Lisboa, 3 de Outubro de 2003

 

RESOLUÇÃO SOBRE
 
A REFORMA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E OS SEUS REFLEXOS
NAS ESCOLAS E NO EXERCÍCIO PROFISSIONAL DA DOCÊNCIA


Desde a primeira hora em que o Governo anunciou a designada reforma da Administração Pública que estiveram claros os seus objectivos principais: desvalorizar os serviços públicos, legislar no sentido de desresponsabilizar o Estado face às funções sociais que lhe estão atribuídas e tornar mais precárias e instáveis as relações laborais estabelecidas com os trabalhadores.
Uma verdadeira reforma da Administração Pública, que faz falta ao país, passa pela elevação da qualidade e a melhoria das respostas da administração pública passa pela aprovação de medidas estruturantes como a existência de melhores condições de trabalho, a consolidação dos vínculos laborais com os trabalhadores, o investimento público nos diversos serviços, designadamente na Educação, na Saúde e na Segurança Social.
Contudo, ao invés, o Governo Português aposta numa política de onde se destacam, como linhas fundamentais das medidas que anuncia, a redução do défice público, a privatização de serviços, uma forte ofensiva contra os direitos dos trabalhadores e a perversão dos próprios serviços públicos com a introdução de modelos de gestão e de organização ditos empresariais, bem como de lógicas de mercado que conduziriam, a concretizarem-se, à subversão do modelo constitucional e ao completo esvaziamento das funções sociais do Estado.
O serviço público de Educação, para o Governo, não deve ficar de fora desta inversão de valores. É nesse sentido que, através de medidas específicas, ou pela aplicação de medidas mais gerais, comuns a toda a administração pública, as escolas e os professores ficarão sujeitos aos mais ferozes ataques de um Governo cuja natureza assenta nos dogmas neoliberais da desregulação das relações de trabalho, da chamada economia de mercado, da livre concorrência, da prevalência do individual sobre o colectivo e da demagógica liberdade de opção entre respostas públicas e privadas.
É neste quadro que surge a proposta do Governo de Lei de Bases da Educação, que beneficia o privado, promove a designada gestão empresarial e reduz, até, a formação de base de todos os portugueses.
É na sequência desta lei que surgirá o já anunciado novo modelo de gestão das escolas, do qual se destaca apenas e quase só a existência de um gestor de mega-agrupamentos que goza de mega-poderes, exercidos através de um binómio que combina a míngua de competências delegadas com a unilateralidade do exercício autoritário do controle sobre as escolas. Uma lei que sujeitará os interesses pedagógicos aos desígnios administrativos, aos objectivos economicistas e à lógica empresarial.
Mas para que esta subversão resulte em pleno, é necessária uma mão-de-ferro sobre os trabalhadores. É preciso precarizar mais as relações de trabalho, tornar mais instável o desempenho da actividade profissional, reforçar as escalas hierárquicas, estabelecer relações de forte dependência, com reflexos na própria carreira dos profissionais.
É neste plano que surgem dois projectos de leis, que pretendem ser gerais, e que o Governo entregou na semana passada aos Sindicatos da Frente Comum, preparando-se para os entregar na Assembleia da República já no dia 15 de Outubro.
Um dos projectos destina-se a alterar o actual regime de contratação na administração pública e não deixa margem para dúvidas quando refere ter por objectivo proceder à adaptação do Código de Trabalho à realidade da Administração Pública. É nesse quadro que se abre a possibilidade de despedimentos colectivos no sector público, que se transforma o trabalho precário e a termo em regra para a prestação de serviço, que se permite o despedimento por alegada redução da actividade ou na sequência da extinção ou fusão de serviços, que se prevê a cedência de trabalhadores e, acima de tudo, este projecto tem um objectivo maior: permitir o recurso generalizado ao contrato individual de trabalho, a termo, que, agravando o que sucede no sector privado, em caso algum será convertido em vínculo laboral definitivo. Em nenhum caso o Governo admite o controle da relação laboral por parte de qualquer entidade fiscalizadora, como acontece no sector privado com a Inspecção de Trabalho. Ou seja, como se não bastasse a gravidade das medidas propostas, o Governo pretende ainda ser juiz em causa própria. É de registar que estas medidas de adaptação do Código de Trabalho estão a ser propostas antes mesmo de aquele diploma entrar em vigor.
O segundo projecto de lei, já acompanhado por uma proposta de diploma regulamentador refere-se à Avaliação do Desempenho dos Funcionários. O projecto do Governo também não deixa margem para dúvidas quanto às suas intenções com a criação do SIADAP (Sistema Integrado de Avaliação do Desempenho na Administração Pública). O regime proposto, em que se destaca uma entrevista anual, fala por si. Esclarecedoras são também as componentes da avaliação: objectivos, a definir, em última instância, pelo avaliador, competências comportamentais e atitude pessoal. Também a distribuição dos trabalhadores por categorias (Excelente, Muito Bom, Bom, Necessita de desenvolvimento e Insuficiente), a atribuição de quotas para a distribuição de trabalhadores pelas mais elevadas, a sua incidência nas carreiras e a generalização de mecanismos de promoção, tornam mais evidentes as intenções economicistas e de controle político do regime proposto.
A incidência destas e de outras medidas no sector profissional dos professores e educadores foi já anunciado e tem um prazo: 31 de Dezembro de 2003, prazo útil para que as medidas a aprovar tenham incidência no próximo Orçamento de Estado. É essa a data limite prevista, pelo Ministro da Educação e pelo Governo, para estar concluída a revisão do Estatuto de Carreira Docente, sabendo-se já da sua intenção de incluir no documento o contrato individual de trabalho, um novo regime de avaliação orientado pelos princípios gerais do SIADAP, a reestruturação da carreira com vista a comportar mecanismos de promoção, o aumento do horário de trabalho e o agravamento das condições de exercício profissional, a revisão das regras gerais e específicas de aposentação e, de uma forma geral, a redução dos direitos dos profissionais docentes.
É neste quadro, muito negativo, que o Conselho Nacional da FENPROF, reunido em 2 e 3 de Outubro de 2003, decide aprovar o seu mais veemente voto de repúdio pelas medidas anunciadas ou já propostas pelo Governo para a Administração Pública, que terão incidência e reflexos muito negativos também no funcionamento das escolas e no exercício da profissão docente.
O Conselho Nacional da FENPROF decide, por isso, reforçar o protesto contra estas medidas, promover uma ampla campanha de divulgação das mesmas, de esclarecimento dos professores sobre as verdadeiras intenções do Governo para o sector público e de mobilização da classe docente para as lutas específicas dos professores e educadores, para as lutas comuns no âmbito da Administração Pública e para as lutas gerais de todos os trabalhadores portugueses contra a política anti-social do Governo, de conteúdo anti-democrático e contrária à vontade e aos legítimos interesses de todos os cidadãos portugueses.

Lisboa, 3 de Outubro de 2003