1. A agenda política e social é hoje dominada pelo elevado défice orçamental e pelas medidas com vista à sua redução a médio prazo. É notória a pressão, vinda de sectores liberais, no sentido da urgente necessidade de se tomarem medidas radicais de cortes na despesa pública, incluindo salários e segurança social. Os mais influentes órgãos de comunicação social têm dado um grande destaque a estas medidas o que pode ter um efeito condicionador de escolhas políticas em assuntos de vital importância para a população e os trabalhadores.
2. A CGTP-IN não nega as dificuldades económicas, mesmo que considere que os problemas orçamentais continuam a não ter a mesma gravidade que outros problemas com que o país se debate. O desemprego assume um nível recorde nos últimos oito anos, prossegue a destruição do aparelho produtivo, há deslocalização de empresas, temos um elevadíssimo nível de endividamento dos portugueses, há um insustentável défice externo, são evidentes sintomas de corrupção em larga escala.
3. O défice orçamental é insustentável mas também não é sustentável reduzir o défice público à custa do desenvolvimento do país. Não haverá verdadeira saída se não houver uma ruptura com o actual modelo de crescimento, ou seja se não houver um corte com políticas económicas e sociais erradas.
4. O facto de a situação orçamental do país ser grave não autoriza que se faça tábua rasa da origem da situação actual nem que se não avaliem as políticas económicas erradas. O nosso aparelho produtivo está esmagado entre, por um lado, países avançados com quem não conseguimos competir em termos de qualidade e, por outro, países que apresentam tão baixos custos salariais que será um suicídio procurar competir em termos de baixar o valor da nossa força de trabalho.
5. Essa gravidade também não pode ser justificação para defender uma política de sacrifícios para alguns, como esmagadoramente vêm fazendo influentes fazedores de opinião. É sabido que esta perspectiva conduz a fazer incidir os custos dos ajustamentos nos trabalhadores e em geral nos que têm menos poder económico na nossa sociedade. Foi assim com o Governo PSD. Consideramos que não deve ser assim com o actual Governo.
6. A CGTP-IN reconhece existirem dificuldades financeiras na segurança social, mas isso também não autoriza a que não se faça qualquer reflexão sobre as causas dessa situação. Sempre dissemos que não é viável continuar uma política que faz recair todo o custo das reestruturações das empresas na segurança social com uma política de reformas antecipadas, o que passa pela pressão patronal para os trabalhadores aceitarem rescisões por mútuo acordo.
7. A CGTP-IN considera pois preocupantes os sinais de que se pretende fazer recair os sacrifícios sobre os trabalhadores e a população mais vulnerável.
É bom ter presente que a sociedade portuguesa é atravessada por profundas desigualdades. Somos um dos países da União Europeia com maiores desigualdades e não é a dimensão do défice que pode fazer esquecer esta realidade: há fuga e fraude fiscais, um elevado nível de economia clandestina, um excessivo peso de impostos indirectos, um fraco grau de eficácia da legislação de trabalho, um elevado peso dos empregos precários.
Calcula-se que a fuga e evasão fiscais envolvam 11,4 mil milhões de euros; e que os processos fiscais em tribunal abrangem 15 mil milhões de euros em 3 milhões de processos.
8. A CGTP-IN não está contra o aumento de receitas para combater o défice orçamental. Há que tomar medidas no âmbito do sistema fiscal bem como na segurança social e combater a sério a economia clandestina e informal.
Consideramos que, entre outras, se devem tomar medidas para: combater a fuga e a fraude fiscal; reduzir o nível de benefícios fiscais; tributar os sinais exteriores de riqueza; proceder ao englobamento dos rendimentos; terminar com o sigilo bancário; pôr ordem na actual situação de multiplicidade de taxas nos descontos para a segurança social; penalizar as empresas que recorrem às reformas antecipadas por via do subsídio de desemprego, sem qualquer justificação.
9. O que a CGTP-IN frontalmente recusa é uma política que, em nome da redução do défice orçamental, aliena o desenvolvimento do país, faz recair todo o custo dos sacrifícios sobre os trabalhadores e a parte mais vulnerável da população e enfraquece os valores da coesão e da solidariedade.
Lisboa, 23/'05/2005
CGTP-IN
A intervenção na A. R. do Primeiro Ministro
na abertura da discussão do problema orçamental do País
suscita os seguintes comentários da CGTP-IN:
1. O défice orçamental é insustentável, mas também não é sustentável reduzir o défice público à custa do desenvolvimento do país e insistindo-se quase só, em mais sacrifícios para os trabalhadores. Não haverá verdadeira saída para a actual situação se não houver uma ruptura com o actual modelo de desenvolvimento, ou seja se não houver um corte com políticas económicas e sociais erradas que têm sido seguidas.
2. O problema fundamental do país continua a ser o da economia real. O 1º Ministro não avançou compromissos para tratar este problema e algumas das medidas avançadas podem agravar a já débil coesão social que marca a nossa vida colectiva. E se tal acontecer não haverá desenvolvimento.
3. O facto de a situação orçamental do país ser grave não pode justificar em nenhuma situação, que se faça tábua rasa sobre a origem da situação actual. O nosso aparelho produtivo está cada vez mais esmagado entre, por um lado, países avançados com quem não conseguimos competir em termos de qualidade e, por outro, países que apresentam tão baixos custos salariais que será um suicídio procurar competir em termos de baixar o valor da nossa força de trabalho.
4. Sobre as medidas anunciadas queremos realçar:
4.1 - A CGTP-IN rejeita a subida do IVA de 19 para 21% porque penaliza os estratos de rendimentos mais baixos, quando se poderia recorrer a outro tipo de solução. Era possível e justo tributar mais intensamente os bens de luxo. Seria também de utilizar os impostos directos dado que a maioria esmagadora das empresas não pagam IRC e o Primeiro Ministro nada disse sobre esta questão. A CGTP-IN não deixa de registar a afirmação, que esperamos se cumpra efectivamente, de as receitas virem a ser consignadas à segurança social para suportar a defesa da mesma;
4.2 - Nos últimos anos, o IVA foi aumentado 17 para 19% e a taxa do IRC baixou de 39,6 para 27,5% e ainda assim mais de 50% das empresas continuam, ano após ano, a não pagar qualquer imposto e o Primeiro Ministro nada disse sobre este problema;
4.3 - Acresce que existe em Portugal, uma diferença muito significativa entre as taxas legais e as taxas efectivas nos impostos directos, em resultado de benefícios fiscais, muitos dos quais não têm justificação económica nem social. Em particular, no caso do IRC esta diferença chega a atingir cerca de 10 pontos percentuais em sectores que apresentam elevadas taxas de rentabilidade como é o exemplo do sector financeiro. O Primeiro Ministro não propôs medidas suficientes para resolver, com justiça, estas situações;
4.4 - Apesar de se aumentarem os impostos nada se diz sobre a actividade inspectiva por parte do Estado. Esta é indispensável para garantir que os valores pagos pelos consumidores, a título de IVA, sejam entregues na Administração Fiscal. Uma coisa é aumentar a taxa de IVA e outra é assegurar a cobrança desses valores, em particular em sectores mais permeáveis à evasão fiscal;
4.5 - O Governo propõe-se dar combate à evasão e fraude fiscais e as medidas propostas merecem a aprovação da CGTP-IN, nomeadamente, o cruzamento de dados, a eliminação do sigilo bancário, o evitar a prescrição de dívidas e a "lavagem dos dividendos", o dar a conhecer os valores declarados dos contribuintes como exigência ética no cumprimento dos deveres fiscais. Ainda que estas medidas sejam, desde há muito, reivindicadas pela CGTP-IN, não é menos verdade que elas têm sido prometidas pelos vários Governos ao longo das últimas décadas, sem que, no entanto, se tenha passado do discurso à acção.
4.6 - A CGTP-IN não pode aceitar que os trabalhadores da Função Pública sejam uma vez mais sacrificados, surgindo nestas medidas como as primeiras vitimas para resolver os problemas orçamentais do pais. Várias medidas anunciadas têm que ser analisadas com rigor e vão exigir resposta dos trabalhadores, designadamente não é admissível uma mudança da base de cálculo das pensões dos funcionários públicos admitidos antes de 1993, pondo em causa os direitos já adquiridos;
4.7 - É grave o agravamento do desemprego a que continuamos assistir e a retoma da economia continua incerta e muito débil. As acções prioritárias do Governo deverão ser dirigidas para estes problemas e é isto que o país e os trabalhadores, urgentemente, esperam.
5. Nas propostas do Governo de hoje, sobressaem mais sacrifícios para os trabalhadores e camadas mais desprotegidas. É indispensável uma total mobilização da atenção dos trabalhadores para analisarem, discutirem e responderem às medidas agora anunciadas pelo Governo, salvaguardando a essência dos direitos dos trabalhadores e exigindo coerência e justiça social
A Comissão Executiva do Conselho Nacional da CGTP-IN
25/05/2005