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Manuela Mendonça SPN e SN da FENPROF

AUTONOMIA E GESTÃO DAS ESCOLAS

04 de maio, 2004

Esta intervenção tem três objectivos:

§         explicitar as mudanças que o Governo quer introduzir nesta área da autonomia e gestão das escolas;

§         dar nota das iniciativas levadas a cabo pela FENPROF para contrariar estas medidas;

§         reafirmar os princípios que têm sustentado as posições da FENPROF nesta matéria.

 As mudanças que o Governo pretende introduzir na área da administração das escolas, genericamente enunciadas no programa do Governo, começaram, de facto, a ser explicitadas no próprio mês da sua tomada de posse. Fazem disso eco várias notícias na Comunicação Social, em que responsáveis do ME vão anunciando:

1º - a profissionalização da gestão das escolas, pondo fim à eleição dos Conselhos Executivos e criando a carreira de gestor escolar. ?O problema é que em muitos casos temos professores a gerir professores, tal como temos médicos a gerir médicos, não queremos que seja assim?? (Grande Reportagem, Setembro/02).

2º - a transferência progressiva de competências para as autarquias na área da educação, nomeadamente na gestão do pessoal docente e não docente e no seu processo de recrutamento. ?Não podem ser só os professores a mandar nas escolas. O ministro da Educação não nega que autarquias com responsabilidades reforçadas devem ter uma palavra a dizer sobre a contratação de docentes.?(Público, 24/04/2002) Ideia depois desenvolvida, adiantando o ministro ?não estar preocupado com eventuais reacções negativas dos sindicatos, que vão ter que perceber que a forma de recrutamento, de afectação e progressão de carreiras está ultrapassada?. (Diário Económico, 04/04/2002) 

 Em Janeiro de 2003, é publicado o DL 7/2003, que, no âmbito da transferência de novas competências para as autarquias, atribui aos Conselhos Municipais de Educação, onde os Jardins-de-infância e as escolas básicas e secundárias públicas não estão sequer representadas, as competências de ?apreciar os Projectos Educativos a desenvolver no município? e até ?analisar o desempenho do pessoal docente e não docente? ? competências abusivas que configuram os CME como novos órgãos de tutela das escolas.

 Em Maio de 2003, o Governo apresenta à Assembleia da República um projecto de revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo, onde propõe, como modelo para a organização escolar, uma espécie de democracia consultiva: os órgãos para os quais se elegem representantes dos professores, alunos, pais e pessoal não docente são órgãos consultivos de uma direcção executiva que deixa de ser eleita, que responde perante quem a nomeia e de quem se espera que apresente o projecto educativo da escola ou agrupamento a que se candidata.

 Esta perspectiva representa um retrocesso no funcionamento democrático da escola e contraria duas das mais antigas reivindicações dos professores ao longo de toda a sua história: a recusa da nomeação dos reitores e a defesa de mais amplos poderes para os Conselhos Escolares.

(A este respeito, é importante sublinhar que durante a 1ª República, os reitores foram eleitos pelos Conselhos Escolares).

 Antecipando-se à saída de legislação nesta área, a FENPROF desenvolveu uma campanha no ano lectivo passado, com o lema Defender e Aprofundar a Democracia nas Escolas, Contra a Nomeação de Gestores Profissionais, no âmbito da qual reafirmou, como princípios estruturantes de uma matriz de direcção e gestão escolar a elegibilidade e colegialidade dos órgãos, a participação efectiva dos intervenientes directos na vida da escola e a prevalência de critérios de natureza pedagógica sobre quaisquer outros.

 Desta campanha fizeram parte um Abaixo-Assinado, subscrito por 40 000 professores e educadores, entregue ao ME e à Comissão de Educação da Assembleia da República, a realização de um Fórum Nacional, com mais de 500 participantes, e a edição de um Caderno com textos de opinião de especialistas na área da administração escolar e outras individualidades, que representam um contributo importante na denúncia destas soluções tecnocráticas, de cariz empresarial, que nada têm a ver com a realidade da nossa escola e que chegam a Portugal com quase duas décadas de atraso.

 Sabemos que o Governo está à espera de ver aprovada uma nova Lei de Bases da Educação para avançar com a sua reforma da gestão escolar. Sabemos também que não estamos perante medidas avulsas, mas sim perante um conjunto de medidas articuladas que visam condicionar a autonomia das escolas e dos professores, que passam a estar sujeitos ao reforço do controle do Estado e da pressão do mercado.

 O espírito do tempo é a introdução de mais exames no percurso escolar dos alunos, a institucionalização de rankings de escolas a partir dos resultados dos exames, a avaliação dos professores com base nesses mesmos resultados, a municipalização da educação, a criação de mega-agrupamentos de escolas, com a finalidade de facilitar o seu controlo por parte da administração e, claro, neste quadro, a imprescindível profissionalização e empresarialização da gestão escolar.

 E é neste contexto difícil que temos hoje de reafirmar que, em nome dos princípios que defendemos para a direcção e gestão democráticas das escolas, estamos contra a criação de uma carreira de gestor escolar, estamos contra a abertura da gestão das escolas a não professores, estamos contra o concurso e a nomeação de gestores profissionais.

 É neste contexto difícil que a FENPROF ? a maior organização de professores e educadores deste país ? hoje reafirma a necessidade de revitalizar o potencial que a gestão democrática representou e representa para o aprofundamento da democracia e para a melhoria da escola pública e da qualidade da educação e do ensino que ela deve assegurar.

 Por muito que o Governo queira e por muito que o Governo faça, nós continuaremos a lutar pela descentralização da administração educativa, pela autonomia das escolas, pela democraticidade na organização escolar.

 Por muito que o Governo queira e por muito que o Governo faça, não desistiremos da democracia.