Nacional

Abertura do ano letivo confirma velhos problemas a que acrescem outros criados pelo MEC

02 de outubro, 2014

FENPROF PROPÕE DEBATE NACIONAL COM VISTA À REORGANIZAÇÃO DO 1º CEB

Na 4.ª Conferência Nacional do 1.º CEB, que, sob o lema “(Re)pensar a Escola, Dignificar o Professor, Respeitar a Criança”, reuniu cerca de  250 delegados, eleitos pelos professores em todo o país, incluindo as regiões autónomas dos Açores e da Madeira, e também no Ensino Português no Estrangeiro, muitos foram os temas em debate, e as propostas apresentadas:  condições de trabalho, horários, rede escolar, competências dos municípios, currículos, constituição de turmas, apoios a alunos com necessidades educativas especiais, mas também os salários a estabilidade do corpo docente ou a aposentação dos professores.  

No início de mais um ano letivo, constata-se que o setor da educação e, particularmente, no 1º ciclo do ensino básico, continua a ser alvo das políticas de redução do investimento, levados a efeito pelo atual governo, no âmbito de políticas mais gerais que visam a destruição do serviço público, incompatíveis com as propostas defendidas pela FENPROF.

A comprovar isto mesmo, a FENPROF foi saber junto dos professores e das direções dos agrupamentos qual a situação, um mês depois da data oficial do arranque do ano letivo, e verificou que as preocupações manifestadas no anterior ano letivo se mantêm e algumas delas se agudizaram.

Assim:

– A generalidade das turmas está nos limites máximos do número de alunos (mesmo quando existem crianças com NEE).

A proposta da FENPROF, assumida na 4ª Conferência Nacional do 1º CEB é que, As turmas do 1º CEB sejam constituídas no máximo por dezanove alunos de um único ano de escolaridade e, só excecionalmente, por dois anos de escolaridade; não devendo ultrapassar nesse caso os quinze alunos”

Do levantamento de dados feito no início deste ano letivo, constata-se que, a nível nacional, e de acordo com uma amostra de 134 agrupamentos de escolas de todo o país, pelo menos 1/3 das turmas tem 2 ou mais anos de escolaridade.

Verifica-se ainda que, no mesmo universo, existe um número elevadíssimo de alunos (cerca de 1938) com Necessidades Educativas Especiais, integrados em turmas do ensino regular, muitas das quais ultrapassando os limites legalmente estabelecidos na lei (com 20 ou mais alunos por turma) sem a afetação de recursos humanos especializados (para o número de alunos acima referido, existem apenas 136)

A FENPROF considera que, tendo em conta dois fatores essenciais nesta análise, e que são a necessidade de maior individualização do ensino, bem como a introdução de novos fatores de heterogeneidade da resposta a dar aos alunos, as turmas do 1º CEB que integrem crianças com necessidades educativas especiais devem ser constituídas por doze alunos.

Os horários dos docentes têm abordagens diferenciadas, consoante a interpretação das suas direções e não respeitam, as leis gerais do trabalho e o ECD

Em relação à prática anterior na organização dos horários dos docentes, verificaram-se alterações significativas. A aplicação do Despacho Normativo que regula a organização do ano letivo vem determinar a perda de um direito consagrado nas leis do trabalho relativamente às pausas, o que levou ao aumento efetivo do horário de trabalho, em 2 horas e 30 minutos semanais. Surgiram horários incompletos de apoio educativo, que decorreram da gestão flexível de recursos humanos, com a existência de “coadjuvações” sem qualquer tipo de coerência, mais dependendo da existência de recursos humanos disponíveis que das necessidades reais das turmas ou mesmo preceito legal. Esta alteração, que configura uma mudança quanto ao modelo de lecionação/regime de docência está a ser introduzida sem qualquer avaliação e controlo. Por outro lado, tendo em conta o consagrado na Lei de Bases do Sistema Educativo,  tal matéria deverá ser objeto de um amplo debate público, envolvendo toda a comunidade educativa, a comunidade científica e o Conselho Nacional de Educação, que poderá coordenar o processo de debate.

A FENPROF há muito que vem defendendo a discussão de outros modelos tais como as Equipas Educativas ou a Monodocência Coadjuvada, no entanto o MEC tem vindo a introduzir, alterações avulsas que não mereceram a devida reflexão. No início deste ano letivo, a confirmar todos os receios, o MEC convocou as organizações sindicais para a impor um novo grupo de recrutamento específico para o Inglês no 1º CEB, abrindo-se assim as portas para a criação de outros grupos de recrutamento, abandonando-se, paulatinamente, o modelo de monodocência vigente na LBSE, sem que tal seja objeto de debate e negociação.

Perante estas e muitas outras alterações, impostas pelo MEC, os docentes do 1º CEB veem os seus horários agravados, um quadro de completa desregulação, introduzindo comprovados fatores de instabilidade. A FENPROF defendeu, na 4ª conferência do 1º CEB que, “o horário dos professores do 1º Ciclo do Ensino Básico seja fixado em 22 horas semanais de componente letiva e até 3 horas de componente não letiva de estabelecimento”.

– Acrescem ainda as situações em que as Atividades de Enriquecimento Curricular surgem intercaladas com as atividades curriculares, desvalorizando esta componente de trabalho, já que se utiliza o período em que os alunos têm maior capacidade de concentração, em prol de atividades de caráter essencialmente lúdico, empurrando para o final do dia, áreas curriculares como a Matemática ou o Português.

– A FENPROF defende ainda que os processos de coadjuvação sejam regulados de forma objetiva e não fiquem dependentes da existência de recursos humanos em cada agrupamento de escolas

Do levantamento realizado, constatou-se que há uma grande discrepância na atuação dos Agrupamentos, conforme a existência ou não de recursos e que o entendimento relativamente ao conceito de coadjuvação, também diverge, conforme a interpretação dos diretores, pelo que se propõeque “Seja desenvolvido um processo de debate, em torno da forma de organização de equipas educativas para a lecionação do currículo do 1º Ciclo do Ensino Básico e que seja garantido o princípio da autonomia no exercício do ato pedagógico, tal como prevê o ECD, o que implica garantir condições que permitam aos docentes planear e gerir o trabalho com os seus alunos;

Relativamente à colocação de docentes, apurou-se que existiam, até ao primeiro dia de aulas (15 de setembro) muitas turmas sem professor de entre o universo da amostra, com particular incidência na área da Grande Lisboa. Estes atrasos e disfuncionalidades do sistema de colocação dos docentes que impediram as escolas de terem os professores de que necessitam desde o início do ano letivo, o qual ocorre a 1 de setembro e não a 1 de outubro. Nos casos dos agrupamentos TEIP e das escolas com contrato de autonomia (mas não apenas aqui), ainda se encontram por colocar docentes até à presente data. Do apuramento feito, constatamos que existem cerca de 150 turmas sem professor.

Há muito que a FENPROF vem defendendo que sejam instituídas regras claras e objetivas para a afetação dos docentes às escolas de cada agrupamento, o que deve decorrer de um processo de concurso nacional, tendo como critério de colocação a graduação profissional, e que sejam colocados docentes para substituições em faltas de curta duração, evitando prejuízos para os alunos e para os professores do apoio educativo, utilizados como recurso para toda e qualquer situação.

– A FENPROF propõe ainda que sejam substancialmente reduzidas as tarefas burocráticas que hoje ocupam boa parte da atividade dos docentes do 1º Ciclo do Ensino Básico

A imposição sistemática de medidas que comprometem o bom funcionamento e a qualidade das escolas  públicas, são da inteira responsabilidade deste governo/MEC  que, ano após ano, insiste em agravar a já precária situação neste setor de ensino.

Encerrou milhares de escolas e criou mega agrupamentos, impôs alterações curriculares que não têm em conta a especificidade do 1.º Ciclo, burocratizou a atividade docente, impôs AEC, sem qualquer enquadramento na organização do sistema educativo e confundindo resposta social com atividade curricular, aumentou a instabilidade na profissão docente com concursos absurdos e alegadas provas de avaliação de conhecimentos e capacidades (PAAC), agravou as condições de exercício da profissão, já de si precárias, ao ponto de descaracterizar o sector do 1º CEB e, dessa forma, o ingresso na escolaridade obrigatória, momento primordial na formação de todas as crianças, tão desvirtuado pelos sucessivos governos.

Face à situação apresentada urge desenvolver uma profunda reflexão sobre a reorganização do 1º CEB, enquadrado num debate mais global sobre o sistema educativo, num contexto de 12 anos de escolaridade obrigatória. Tal torna-se pertinente já que o 1º CEB é a base para a construção de um percurso educativo de qualidade.

Neste sentido a FENPROF realizou a 4ª Conferência Nacional do setor, da qual resultaram propostas que serão apresentadas ao Ministro da Educação e Ciência, à Assembleia da República e ao Conselho Nacional de Educação, dos quais esperamos respostas conducentes à melhoria do setor e de todo o sistema educativo.

O Secretariado Nacional da FENPROF