PRÁTICAS, CONTEXTOS E PROBLEMAS
Estudo realizado pela Associação para o Planeamento Familiar (APF) com o apoio do Inovation Fund da IPPF International Planned Presenthood Federation (Federação Internacional de Planeamento Familiar)
CONCLUSÕES
- As mulheres inquiridas são utentes regulares dos serviços de saúde e mais de metade recorre pelo menos uma vez por ano às consultas existentes e realiza exames médicos.
- A grande maioria das mulheres inquiridas usa contracepção segura e eficaz e, por isso, está posta de parte a utilização do aborto como forma regular de controlo de fecundidade.
- A grande maioria das mulheres que não utilizam contracepção ou não têm actividade sexual, ou estão grávidas ou à espera de engravidar, ou têm problemas de infertilidade ou estão na menopausa. Mas há uma franja minoritária mas significativa de mulheres - 29% das não utilizadoras de contracepção, correspondente a 8% do total da amostra, que estão em risco de gravidez não desejada, porque sendo sexualmente activas e não se encontrando em nenhuma das situações anteriores, não usam contracepção.
- O estudo revela ainda que há um uso moderado da contracepção de emergência, que não substitui o uso regular de outro tipo de contraceptivos.
- O aborto provocado é um problema que afecta centenas de milhares (cerca de 354 000 segundo o estudo) de mulheres portuguesas, ainda que seja praticado por uma minoria das mulheres (14,5%).
- O aborto ocorre em mulheres de todas as idades e, tomando como indicador social o grau de instrução, acontece em mulheres de todas as condições sociais e sobretudo em mulheres casadas. Portanto o aborto não é um fenómeno que toca somente as mulheres mais jovens, sós, e mais pobres.
- A grande maioria das mulheres abortou uma vez, confirmando-se aqui de novo, a ideia de que actualmente o aborto não é uma forma regular de controlo da natalidade, antes acontecendo de forma esporádica e pontual na vida de uma mulher.
- Na sua grande maioria, em mais de 70% dos casos, os abortos foram realizados até às 10 semanas (89% até às 12 semanas) pelo que, mesmo em condições de clandestinidade, estamos perante uma situação de abortos precoces.
- As mulheres mais religiosas, recorrem menos ao aborto mas, quando tal acontece, fazem-no mais tardiamente.
- A maior parte das mulheres engravidou sem o desejar porque não estava a usar contracepção ou não estava a usar um método seguro pelo que existe aqui uma margem possível de prevenção e de redução do aborto.
- As dificuldades no acesso à contracepção não são indicadas como um motivo significativo de não uso. Apenas 6% das mulheres que não estavam a usar contraceptivos estavam à espera de uma consulta.
- Mas 1 em cada 5 mulheres que abortaram estava a usar contracepção, o que contraria a ideia de que, hoje em dia, "só engravida quem quer".
- A maior parte das mulheres - mais de 90% - que decide abortar fá-lo por motivos não contemplados na actual legislação e declara que foi uma decisão muito difícil, contrariando-se aqui a ideia de que, no caso de a IVG vir a ser despenalizada a pedido da mulher, as mulheres vão facilmente abortar.
- O estudo revela que a grande maioria dos abortos provocados aconteceram em Portugal (85%), em estabelecimentos ou locais não autorizados para a prática de IVG como casas, clínicas ou consultórios particulares, e foram realizados por profissionais de saúde. As mulheres avaliam de forma razoável as condições da prática da IVG e o desempenho dos profissionais envolvidos. Pelo que estamos em situações não satisfatórias, mas também que parecem não ser caracterizadas por elevados níveis de precaridade característicos de épocas anteriores.
- O estudo revela ainda que as mulheres fazem abortos com muito pouca informação prévia, sobretudo assente em pessoas amigas e pagando preços que consideram muito caros.
- 1 em cada 5 mulheres que aborta teve complicações graves após o aborto. Aplicando as percentagens encontradas ao universo estimado de abortos verificamos que cerca de 19 000 mulheres tiveram de ser internadas devido a complicações de aborto cirúrgico. Comparando estes dados com países onde o aborto é legal, comprovam-se aqui maiores níveis de insegurança na prática do aborto em Portugal.
- Os sentimentos referidos logo após a realização do aborto são diversos - alívio, dúvidas, culpa e outros sentimentos de tipo negativo. Mesmo assim, a grande maioria (cerca de 93%) das mulheres afirma que não ficou com problemas por ter realizado o aborto, o que contraria a ideia por vezes apresentada de que as mulheres que abortam ficam "traumatizadas para o resto da vida".
- Por último, só uma minoria de mulheres recebeu aconselhamento contraceptivo após o aborto pelo que as condições em que se realizam os abortos não previnem a sua potencial repetição.
- Sendo sobretudo favoráveis a ocorrência de IVG nos casos já previstos na lei, mais de metade das mulheres concordam com a IVG quando a mulher "não deseja a gravidez". Esta última posição aumenta nas mulheres menos religiosas ou que já fizeram um aborto.
- Em consonância do que atrás foi referido, mais de 60% das mulheres defende o alargamento das condições legais da prática de IVG, a maioria das mulheres - cerca de 56% - votará SIM no próximo referendo, 22% votará NÃO e 21% não tenciona ir votar.
Nota: Há alguns anos, e em consequência do referendo de 1998, a Assembleia da República aprovou a realização de um estudo sobre o aborto e a saúde reprodutiva em Portugal. Mas de forma incompreensível, este estudo nunca foi sequer objecto de concurso e, portanto nunca chegou a ser realizado.