1. POR UMA EUROPA SOCIAL
1.1. O crescimento económico na União Europeia, apesar de se encontrar em recuperação, mantém-se débil nalguns países, incluindo Portugal, e o desemprego mantém-se inaceitavelmente alto, penalizando sobretudo os jovens. A Europa do pleno-emprego, da economia do conhecimento e da coesão social, afirmada na Estratégia de Lisboa, não está a ser alcançada, enquanto se têm privilegiado as vertentes da Estratégia respeitantes à competitividade e à liberalização. O que exige uma reflexão sobre o rumo da UE.
Para a CGTP-IN, a Estratégia de Lisboa não deve privilegiar a competitividade à frente da coesão social e do ambiente e as políticas económicas devem ter na devida conta a situação dos países que têm um menor nível de desenvolvimento.
A CGTP-IN espera que a Presidência europeia defenda, nos planos europeu e nacionais, politicas que assegurem um desenvolvimento sustentável, do ponto de vista económico, ambiental e social. Neste quadro, consideram-se serem factores essenciais:
- As políticas macroeconómicas devem assegurar o objectivo do desenvolvimento sustentável, incluindo o pleno-emprego. Em particular, a política monetária deve ter também em conta a necessidade de reduzir o elevado volume de desemprego;
- A melhoria da produtividade tem uma importância estratégica no contexto do envelhecimento da população, o que exige: promover a inovação; alcançar objectivos definidos em termos de investimento na investigação e desenvolvimento (3%, no mínimo, do produto); investir na educação e na aprendizagem ao longo da vida;
- O apoio a uma dinâmica de crescimento suportada não só pelas exportações, o que torna as economias mais vulneráveis aos choques externos, mas também pela procura interna, o que exige a melhoria dos salários e uma distribuição mais equitativa do rendimento;
- A valorização do papel que têm as instituições, os serviços públicos e uma boa regulação económica e social, para assegurar o desenvolvimento. Neste contexto, considera-se que deve ser dada particular atenção à necessidade de lutar contra a economia clandestina e o trabalho não declarado.
1.2. A qualidade do emprego tem uma importância acrescida num quadro de globalização económica. Encontra-se no centro do modelo social europeu, como salienta a Comunicação da Comissão Europeia de Junho de 2001 sobre o investimento na qualidade. Mas não tem sido essa a preocupação essencial na UE. Um elevado número de trabalhadores vive na precariedade, cuja tendência tem sido de agravamento.
A Presidência portuguesa deve, na sequência da presidência alemã, repor a qualidade do emprego como questão essencial das agendas no plano europeu e nacionais.
Para a CGTP-IN os elementos centrais desta agenda são:
- Garantir o trabalho com direitos para todos os trabalhadores;
- A limitação da precariedade de emprego aos empregos que são, por natureza, temporários e a luta contra o trabalho clandestino;
- A melhoria da protecção social no desemprego e a publicação de legislação europeia que assegure a portabilidade dos direitos nas pensões profissionais;
- A limitação do tempo de trabalho, pelo que expressam a sua preocupação pelo bloqueio da directiva sobre o tempo de trabalho devida à persistência de alguns governos na manutenção de derrogações ao tempo máximo de trabalho ("opting out") e no incremento da flexibilidade dos horário de trabalho;
- Investimento em políticas activas de emprego e de formação profissional, tendo-se como referências as melhores práticas ao nível europeu;
- A aprendizagem ao longo da vida;
- A conciliação da vida profissional e familiar;
- A saúde e a segurança ao longo da vida continuando o trabalho de avaliação das directivas europeias e retirando as devidas consequências;
- O reforço dos direitos de informação e de consulta.
A CGTP-IN considera que o Livro Verde sobre o direito do trabalho e a Comunicação sobre a flexisegurança pretendem abrir caminho a uma maior flexibilidade dos mercados de emprego. O objectivo do Livro Verde não é de facto discutir a evolução do direito do trabalho europeu procurando e confrontando várias soluções possíveis, mas pressionar os Estados-Membros a alterar a respectiva legislação laboral, tornando-a cada vez mais flexível e menos protectora, o que, no limite, conduzirá à aniquilação do direito do trabalho enquanto direito de protecção dos trabalhador. Por sua vez, a Comunicação sobre a flexisegurança visa enfraquecer a legislação de protecção de emprego.
A CGTP-IN exprime a sua preocupação sobre os termos do debate que se vem realizando sobre a flexisegurança. A compatibilidade entre segurança e flexibilidade tem de ser garantida, na sua definição e aplicação, reforçando o papel dos parceiros sociais, da negociação colectiva e do diálogo social. A CGTP-IN exprime a sua total oposição a que a conclusão do debate aponte para a necessidade de desregular as condições de trabalho e reduzir a protecção de emprego, já que existem hoje nos nossos países elementos suficientes de flexibilidade e um excessivo volume de precariedade que importa reduzir. Por isso, espera que a presidência portuguesa apoie esta abordagem.
1.3. A política de inclusão social constitui um dos instrumentos essenciais para atingir o objectivo de uma maior coesão social. A UE tem em curso, desde 2000, um processo de coordenação das políticas de inclusão social e em 2006 reafirmou o compromisso de que tais políticas tenham um impacto decisivo na erradicação da pobreza e da exclusão social até 2010. Mas é pouco provável que tal aconteça sem uma vontade política mais forte. A população que vive abaixo do limiar de pobreza continua elevada, está-se bem longe do pleno-emprego e o próprio processo de globalização económica tende a acentuar as desigualdades se não forem tomadas medidas ambiciosas através de uma maior articulação das políticas económicas e sociais.
O envelhecimento da população - com a emergência da dependência como problema central -, as transformações do mercado de emprego - em que os jovens e os trabalhadores não qualificados são já hoje as grandes vítimas - e uma sociedade mais complexa colocam novas exigências às políticas de inclusão social.
Por estas razões, a Presidência portuguesa da UE deve dar um significativo destaque à política de inclusão social para que a Europa seja socialmente mais coesa e solidária. Para isso, é necessário que as políticas de inclusão social: respondam às necessidades; estejam focalizadas na prevenção; tenham visibilidade social; sejam direccionados para os grupos sociais mais desfavorecidos; estejam articuladas com as outras políticas, sobretudo com as económicas; tenham recursos adequados; envolvam as populações, os sindicatos e as organizações sociais. A CGTP-IN defende que a Presidência europeia da UE desenvolva iniciativas com vista a: dar mais visibilidade e criar condições para uma maior eficácia da política de inclusão social; lutar contra a pobreza e a exclusão social e o direito dos cidadãos a padrões sociais mínimos (rendimento mínimo, recursos mínimos, salário mínimo); dar maior visibilidade, eficácia e garantir uma adequada monitoragem do Plano de Acção Europeu para a Deficiência.
1.4. A igualdade de oportunidades, a igualdade de género e a acção contra as discriminações devem constituir um tema relevante da Presidência portuguesa. Não só por se tratar do Ano Europeu para a Igualdade de Oportunidades. O tema é hoje mais actual na medida em que as sociedades são mais multi-étnicas e os mercados de trabalho têm uma composição mais diversificada.
Neste contexto, a CGTP-IN defende como aspectos essenciais:
- Garantir a aplicação das legislações nacionais, das directivas europeias e das normas da OIT sobre a igualdade de tratamento e a não discriminação;
- Erradicar discriminações e reforçar a integração das pessoas com deficiência e dos imigrantes;
- Garantir a aplicação das normas relativas à igualdade entre homens e mulheres;
- Tomar medidas com vista à eliminação do desvio salarial entre homens e mulheres (15% em média na UE);
- Tomar medidas com vista a assegurar a reconciliação entre vida profissional e familiar dos trabalhadores.
1.5. Os serviços públicos constituem uma componente essencial do modelo social europeu. A privatização e a liberalização destes serviços têm consequências na limitação da acessibilidade e, em vários casos, na degradação da sua qualidade. A CGTP-IN defende o reforço dos serviços públicos o que, entre outras medidas, passa por um enquadramento jurídico dos serviços públicos, o que exige:
- Garantir os princípios da universalidade, acessibilidade, solidariedade, continuidade, responsabilidade, durabilidade e disponibilidade financeira;
- Assegurar a transparência e o controlo democrático;
- Assegurar a não discriminação e a igualdade de tratamento;
- Confiar aos serviços públicos uma base legal sólida e, deste modo, imune em relação aos ataques ideológicos do mercado livre.
1.6. As migrações são hoje uma realidade que é necessário tratar de uma forma positiva e não como uma componente da política de segurança. A imigração clandestina não deixa de colocar problemas complexos, mas estes devem ser tratados num quadro preventivo, ligando a agenda das migrações à agenda do desenvolvimento.
A CGTP-IN discorda que, no interior da UE, existam derrogações à livre circulação das pessoas, aplicáveis apenas aos trabalhadores assalariados, por considerarem que se trata de uma medida discriminatória.
Defende que seria necessário elaborar políticas mais activas na Europa a fim de combater a exploração no trabalho, particularmente dos imigrantes irregulares, exigir o reconhecimento e o respeito dos seus direitos humanos e sindicais e dar-lhes portas de saída da ilegalidade. Essas políticas devem estar associadas às políticas externas (comércio, desenvolvimento) que favoreçam o aumento dos níveis de vida e de oportunidades nos países de origem.
Entende que a Presidência portuguesa deve ter uma intervenção activa neste dossier , até pelo facto de Portugal ser tradicionalmente um país com forte incidência de migrações (primeiro de emigração e hoje, simultaneamente, de emigração e de imigração).
1.7. A ratificação pelos Estados-Membros da revisão do Tratado da UE abriu uma grave crise com a rejeição, em referendos, do novo Tratado na França e na Holanda.
Os sindicatos são de opinião que na base desta rejeição está a percepção de que a construção europeia está divorciada de interesses essenciais dos cidadãos; de que a Europa está mais liberal, os mercados de trabalho mais desregulamentados, a segurança social mais enfraquecida; de que a UE tem impulsionado a liberalização e a privatização de serviços públicos, quando estes constituem uma componente essencial do modelo social europeu; de que a Comissão Europeia tem impulsionado a desregulamentação, como o mostram as iniciativas sobre a directiva de serviços, o Livro Verde sobre o direito de trabalho e a Comunicação sobre a flexisegurança.
O compromisso político obtido na Cimeira de Bruxelas, ainda que represente um importante revés para aqueles que defendem a UE como uma entidade de natureza estatal e federal, não significa uma ruptura com o carácter neoliberal e supranacionalista da construção europeia. A CGTP-IN considera que não pode ignorar neste processo, que está ainda longe do seu fim, razões reais de descontentamento sobre o carácter da construção europeia, devendo ser antes um meio para fortalecer o modelo social europeu e a Europa Social. E defende que não pode ser defraudado o compromisso político de realizar em Portugal um referendo sobre a ratificação da revisão do novo tratado.
2. POR UM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
2.1. Sem uma coerente e efectiva estratégia de desenvolvimento sustentado o crescimento económico e o desenvolvimento social estão hoje já em risco e a situação agravar-se-á no futuro. Os riscos acumularam-se e a situação é hoje extremamente perigosa: mudança climática; crescente extinção das espécies; escassez de água potável; risco de pandemias globais; pesca excessiva. Uma eficaz cooperação internacional, um reforço d instituições globais, a aprovação de estratégias de desenvolvimento sustentáveis são hoje os requisitos fundamentais para enfrentar estes problemas globais. É de primordial importância que os países desenvolvidos e a UE tenham um papel de liderança na resposta aos problemas ambientais.
A UE reviu em
Para a CGTP-IN, o primeiro requisito é o empenhamento político, incluindo o da Presidência portuguesa, para alcançar os objectivos definidos na Estratégia de Desenvolvimento Sustentável. Salientam que muitos objectivos (um exemplo claro é a transição do transporte rodoviário para outros modos, como o ferroviário, e para o transporte público de passageiros) não têm sido concretizados. O segundo, é o da adequação desta Estratégia de forma a ser mais eficaz e ambiciosa, com vista a assegurar a transição para uma economia de baixo carbono e a responder aos riscos ambientais. A CGTP-IN espera que a presidência portuguesa apoie esta abordagem.
2.2. A mudança climática emergiu como o maior risco global. O Relatório Stern, publicado na Grã-Bretanha em 2006, e a reunião do Grupo Intergovernamental de peritos sobre a evolução do clima, realizada no início de 2007, vieram demonstrar que a situação era pior que a até então, pensada; que é mais forte a urgência de se adoptarem medidas mais efectivas, abrangentes e ambiciosas; que a dimensão social da mudança climática é de capital importância; que já não se está perante um problema científico., mas antes político - actuar para evitar os piores cenários. Mas não há da parte dos países mais ricos uma resposta adequada, como mostra a recente Cimeira do G8 na Alemanha.
A CGTP-IN exige todo o empenhamento da Presidência portuguesa. A emissão de gases com efeito de estufa está em aumento (cada ano são injectados 7.2 mil milhões de toneladas de carbono face a 6 mil milhões em 2001). A eficiência energética tem aumentado mas está longe de responder às necessidades. A UE definiu objectivos que não serão alcançados como obter uma quota de 10% no uso de energias renováveis em 2010. E é de esperar que, a manter-se um mais elevado crescimento económico, a pressão ambiental seja ainda maior.
3. POR UMA GLOBALIZAÇÃO JUSTA
3.1. Uma globalização justa é um imperativo para corrigir as consequências desastrosas do actual processo de globalização (pobreza, desigualdades crescentes, exaustão de recursos, etc.) o que exige ultrapassar um grave défice de regulação. A expansão dos mercados globais não tem sido correspondida pelo desenvolvimento de instituições económicas e sociais. Uma globalização justa implica uma forte dimensão social, o que exige, segundo a OIT: um foco nas pessoas; um Estado democrático e efectivo; desenvolvimento sustentável; mercados produtivos e equitativos; regras jutas; solidariedade; maior responsabilização com as pessoas; aprofundamento das parcerias; um efectivo sistema das Nações Unidas.
A União Europeia pode ter um papel fundamental para atingir os objectivos de uma globalização justa atendendo à sua dimensão económica; abranger um elevado número de países desenvolvidos; ser a primeira potência comercial no mundo; ao seu modelo social que, mesmo apresentando importantes diferenças nacionais, a diferencia doutros espaços económicos.
A CGTP-IN exige à UE e, neste quadro, à Presidência portuguesa, o seu empenhamento para que uma globalização justa seja alcançável, ressaltando em particular:
- A necessidade de serem realizados objectivos e metas acordados a nível internacional, como os Objectivos do Milénio (erradicar a pobreza extrema, garantir a educação primária para todos, combater a SIDA, malária e outras doenças, etc.);
- O impulso da negociação sobre o desenvolvimento sustentável;
- O respeito pelas normas da OIT, no mínimo pelas Convenções Fundamentais Internacionais de Trabalho, e a realização da agenda da OIT sobre o trabalho digno;
- A subordinação do comércio internacional a uma regulação social (dimensão social).
- A continuação da negociação multilateral sobre comércio internacional, procurando retomar o processo do Ciclo de Doha;
- O apoio a um desenvolvimento global equilibrado, com destaque para os países menos desenvolvidos;
- O apoio à negociação de quadros multilaterais com vista à regulação dos fluxos financeiros mundiais e do investimento directo estrangeiro;
- O apoio a um maior papel das Nações Unidas e a uma maior representação dos países em desenvolvimento nas suas instituições;
- A conclusão pela UE do processo relativo à criação de um quadro jurídico para a negociação colectiva transnacional, com salvaguarda do papel dos sindicatos.
A CGTP-IN defende uma política de desenvolvimento solidário que, ao permitir a melhoria das condições económicas e sociais, crie as condições para a fixação das populações, evitando a deslocações massivas, como está hoje a acontecer. Neste sentido, considera adequada a realização de uma Cimeira UE/África pela presidência portuguesa.
3.3 O desenvolvimento humano, social e económico na Região Euro-Mediterrânica é crucial tanto para a União Europeia como para o mundo. Porém, doze anos volvidos sobre a Conferência de Barcelona, constata-se que os resultados estão bem longe das ambições proclamadas. O partenariado consistia em estabelecer uma ligação entre desenvolvimento económico, paz e democratização. Mas os problemas agravaram-se, particularmente no Médio Oriente.
Para a CGTP-IN, a paz, o respeito dos direitos do homem e o respeito dos direitos dos trabalhadores, baseado nas normas da OIT, estão estreitamente ligados às políticas económicas que promovem o desenvolvimento e o progresso social.
A CGTP-IN espera que a presidência portuguesa valorize devidamente esta parceria. Neste sentido, propõem que seja realizada uma Conferência Euro-mediterrânia sobre emprego, migrações e desenvolvimento durante a presidência portuguesa.
28.6.07