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Francisco Almeida SPRC e SN da FENPROF

A ESCOLA, SA e a nomeação de comissários políticos

18 de março, 2004

 A ameaça estava feita desde a primeira entrevista que David Justino deu após a direita ter chegado ao poder. Foi em Abril de 2002 que o Ministro da Educação afirmou claramente a ideia de levar para as escolas a gestão de tipo empresarial.

Não cabe nesta intervenção deixar a argumentação que demonstra que tal opção nada tem que ver com a qualidade das escolas e do sistema educativo. A FENPROF já editou vasta documentação sobre esta questão. Está publicada em caderno temático a nossa própria reflexão e o pensamento de diversos académicos e especialistas.

 Como cedo dissemos o Governo para alcançar tal objectivo teria que avançar com medidas em dois domínios: a alteração do modelo de direcção e gestão das escolas e a reorganização da rede de estabelecimentos de educação e ensino.

 No primeiro domínio aí está a revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo e diversas ameaças feitas pelo Ministério da Educação. Mas, esta questão foi/será abordada pela camarada Manuela Mendonça.

 Vamos então à questão da reorganização da rede de estabelecimentos e constituição de mega agrupamentos de escolas.

Em primeiro lugar, é preciso realçar que, do nosso ponto de vista, estes mega agrupamentos são peça importante no processo que visa alcançar os objectivos políticos definidos pelo Governo : acabar com o que resta da democracia na direcção e gestão das escolas, nomeando ou contratando gestores ditos profissionais (sejam ou não professores), impor nas escolas (como em toda a administração pública) um modelo de gestão empresarial em que as questões administrativas e financeiras são dominantes. A pedagogia, as relações humanas, a participação comunitária, a relação pedagógica e a escola contextualizada não fazem parte das preocupações do neoliberalismo. Por outro lado, a direita e a extrema-direita que hoje ocupam o poder incorporam no seu ideário uma concepção de Estado centralizado e centralizador que é incompatível com a possibilidade de as escolas e as comunidades tomarem localmente decisões sobre o funcionamento das escolas e sobre a educação das crianças e jovens.

Recordem-se as declarações do SEAE ? Abílio Morgado - sobre a extinção do Centros de Área Educativa (CAE) e a institucionalização de um corpo comissários políticos, a que o ME chama coordenadores escolares, e com facilidade se compreende que a centralização de todas as decisões é o objectivo de todo este processo.

 A coisa começou aí pelos meses de Fevereiro/Março de 2003.

Foram umas primeiras reuniões onde a constituição e recomposição de agrupamentos era abordada de forma leve, tentando as DRE?s e CAE?s fazer passar a ideia de que estavam ali para ouvir opiniões e discutir.

Mais tarde tomámos conhecimento de um documento orientador do ME onde ficava claro que o Governo se preparava para impor mega agrupamentos de escolas, da educação pré-escolar ao ensino secundário.

 O resto do processo resume-se a um somatório de autoritarismo, mentiras do SEAE na Assembleia da República, ilegalidades, falta de respeito pelos órgãos do poder local e das escolas e até falta de vergonha por parte de muitos dirigentes da administração educativa.

 Do ponto de vista da organização das escolas, o resultado são enormes disparates.

Agrupamentos com mais de 2.500 alunos e quatro centenas de professores e trabalhadores não docentes. Agrupamentos com escolas que distam entre si quase setenta quilómetros.

Na maioria dos casos, os agrupamentos constituídos são um mero emparcelamento ( a expressão não é minha ? é de João Barroso) administrativo de escolas e uma carga de trabalhos para os professores e para os órgãos de gestão.

 O SEAE disse na Assembleia da República (14 de Julho de 2003) que não homologaria agrupamentos sem o parecer favorável das autarquias. Mas, a FENPROF tem na sua posse ofícios de dezenas de câmaras municipais que dizem que deram parecer negativo ou que nem sequer foram consultadas. Mas isso é pouco importante ?. o Ministério da Educação deve encontrar uma qualquer justificação para este incumprimento da palavra dada.

Centenas de escolas e agrupamentos, através dos seus órgãos, manifestaram o seu desacordo para com as soluções que as DRE?s e CAE?s, de forma autoritária, iam impondo. Aparentemente, ao ME, isto pouco importou. Creio que eles já perceberam que o seu projecto político para a educação só pode ser concretizado contra os professores, contra os pais, contra os estudantes ? contra o país.

 Ainda assim, o Governo não teve condições para concretizar completamente o seu projecto: não conseguiram incluir as escolas secundárias nos mega agrupamentos e foram obrigados a mudar a configuração destes disparates em muitas localidades. Importa dizer que a inclusão das escolas secundárias está prevista no tal documento orientador.

 A FENPROF, os seus Sindicatos, as escolas e os professores estiveram à altura deste combate. Desenvolvemos, de facto, uma intensa luta em torno desta questão: dezenas de reuniões, conferências de imprensa, posições aprovadas pelas escolas e pelos professores, uma queixa na Procuradoria da República, um processo no Tribunal Central Administrativo, a apresentação das nossas razões ao Provedor de Justiça e à Assembleia da República.

 Até agora, não conseguimos barrar em definitivo o caminho que o Ministério da Educação e o Governo traçaram, mas é justo afirmar que os professores e a FENPROF não têm deixado que a vida lhes seja fácil.

 A vida só nos ensina um caminho: continuar a luta. Neste caso, em defesa da democracia na direcção e gestão das escolas. Nós vamos ser capazes de afastar a direita que governa o país: com uma moção que se aprova numa reunião de professores, com a manifestação ou concentração à porta do ME, com a greve nacional que realizámos a 23 de Janeiro, com a Marcha pela Educação no mesmo dia, com o esclarecimento junto de todos os professores e educadores, com tomadas de posição nas escolas, recorrendo novamente à greve se as circunstâncias o permitirem, combatendo ? Nós vamos derrotar esta política porque temos razão, porque o país precisa e exige uma Escola Pública, Plural, Democrática e de Qualidade