Nacional
Contra o bloqueio negocial!

FENPROF protesta no Rossio com uma "Feira dos problemas com soluções bloqueadas"

25 de junho, 2021

Várias dezenas de professores juntaram-se, esta sexta-feira à tarde, no Rossio, em Lisboa, para protestar contra o bloqueio negocial imposto pelo Ministério da Educação que, há quatro anos, impede a resolução de problemas, como a precariedade, a melhoria das condições de trabalho dos docentes, a recuperação do tempo de serviço congelado e a recomposição da carreira, o rejuvenescimento da profissão e a criação de um regime específico de aposentação.

Na sua intervenção, o Secretário-geral da FENPROF afirmou que este bloqueio só poderá ser ultrapassado com a luta dos professores e deu como exemplo o facto de os poucos avanços conseguidos nos últimos meses terem sido resultado de ações de luta promovidas pela FENPROF. Mário Nogueira fez também uma primeira apreciação do despacho das vagas para a progressão de professores e educadores aos 5º e 7º escalões, publicado esta sexta-feira pelo Governo, quase seis meses depois da data devida.

Moção aprovada pelo professores e educadores

"Marcha popular para o Brandão escutar" 

Letra da "Marcha popular para o Brandão escutar"

Intervenção do Secretário-geral da FENPROF [PDF]

 



“FEIRA DOS PROBLEMAS COM SOLUÇÕES BLOQUEADAS”

 

Mário Nogueira

Secretário-Geral da FENPROF

 

- Estamos aqui para denunciar publicamente a falta de consideração e de respeito com que os professores têm sido tratados. Não é a ação de massas que pretendíamos inicialmente, porque decidimos reduzir a participação e cortar no desfile, respeitando desta forma as recomendações de segurança sanitária. Mas não anulámos a ação, pois se os professores continuam, e de forma exemplar, a trabalhar nas suas escolas, não faria sentido os seus representantes entrassem em confinamento. Estamos aqui, trouxemos os nossos certificados de vacinação, respeitamos as regras de segurança sanitária, mas não deixamos que a Covid-19 seja trincheira em que se escondem os governantes para não resolverem os problemas dos professores.

- Reconhecimento do trabalho dos professores, em pandemia e também fora dela, faz parte do discurso do poder político, o problema é quando chega o momento de traduzir as palavras em ações concretas, a inércia é aquilo a que temos assistido.

- Os professores são exímios cumpridores dos seus deveres profissionais, até muito para além do que estariam obrigados, mas, até por isso, têm legitimidade reforçada para reclamar respeito pela profissão, efetivação dos direitos socioprofissionais e melhoria das condições de trabalho.

- Estão aqui representados não todos, mas os quatro aspetos em que o desrespeito mais se tem sentido, em que a falta de respostas é mais evidente, quisemo-los destacar no espaço público, para que se saiba, para que a opinião pública, os pais e mães dos alunos, os portugueses em geral conheçam as condições em que os professores exercem a sua atividade profissional.

- São eles, concursos, com destaque para a precariedade e as injustiças nas colocações; carreiras, com destaque para o roubo de tempo de serviço, as vagas e as ultrapassagens; condições de trabalho, com destaque para os horários, entre outros aspetos; envelhecimento, que resulta do agravamento dos requisitos para aposentação ou da não aplicação da pré-reforma, a par de políticas que afastam cada vez mais os jovens.

- Não é por falta de propostas que o ME não negoceia, pois já por 4 vezes, nos últimos dois anos, apresentámos propostas concretas sobre estas 4 matérias; é por falta de vontade política do governo e falta de investimento na Educação e nos seus recursos, incluindo os humanos.

- Aliás, tirando os primeiros dois anos em que o atual ministro esteve no governo, nos quais se resolveram alguns problemas – fim das BCE e da PACC, reposição dos salários na íntegra ou descongelamento das carreiras – nos últimos 4 anos o diálogo consequente, isto é, de que resultassem processos negociais e soluções para os problemas, apagou-se. É por isso que assinalamos esses 4 anos com as velas apagadas. Foi-se a chama e ficaram as trevas que, inclusivamente, ameaçam a democracia, pois não há democracia sem diálogo social e tanto este como a negociação coletiva há muito que não existem.

- Foi agora marcada uma reunião, para dia 30, às 9:30, uma vez mais sem a presença do ministro, destinada a discutir a revisão do regime de seleção e mobilidade dos professores. Nada que não interessasse aos professores, claro, mas sabemos ao que vamos e não vamos ao engano, alertando, desde já, que a FENPROF não separa seleção de recrutamento e que ambos terão de corresponder a processos transparentes, objetivos e concursais.

- Ouvimos as declarações do SEAE no sentido de as escolas poderem escolher os seus professores; ouvimos o que dizem alguns diretores, que aplaudem essa possibilidade; ouvimos o resultado de um estudo promovido pela fundação Belmiro de Azevedo e apresentado por três ex-ministros num colégio privado: os alunos ganham se tiverem melhores professores.

- Aquela é uma afirmação com que concordamos, agora a questão é saber como se garantem melhores professores nas escolas e, em nossa opinião, não é pondo os diretores a escolher os “seus” professores, como alguns gostam de dizer. Sabemos como daria jeito a muitos que o emprego, a carreira e a vida dos professores dependesse de si e ainda ninguém se esqueceu do que foram as BCE, mas, fique claro, a FENPROF rejeita esse caminho e repudia esse tipo de propostas, às quais dará combate se surgirem.

- Melhores professores conseguem-se com melhor formação inicial, com estabilidade de emprego e profissional, com uma carreira valorizada, com direitos respeitados, com boas condições de trabalho, menos alunos nas turmas, por exemplo, menos burocracia e com horários de trabalho que não ultrapassem os limites que a lei estabelece, mas para isso é necessária vontade política por parte dos decisores, desde logo os governantes, e estes, como os seus representantes nas escolas, preferem a submissão e a dependência, porque fica mais barato e faz com que se sintam mais poderosos. Não contem com a FENPROF para esse peditório.

- Nem para esse nem para outros que estão aí, como o da municipalização, prestes a generalizar-se dentro de alguns meses, ou o do atual regime de gestão das escolas que não respeita os mais elementares requisitos que lhe garantiriam democraticidade, só para dar dois exemplos.

- Também em outros planos, a Educação, as escolas e os alunos, principalmente, precisam de muito mais do que palavras aparentemente bem intencionadas, mas que, espremidas deitam pouco ou nenhum sumo.

- Já tínhamos alguns exemplos, como era o caso da educação inclusiva que patina por falta de recursos e veremos a que velocidade andarão as prioridades – parcas, esclareça-se – que o chamado Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) define para a educação.

- Temos agora o vulgarmente conhecido plano de recuperação de aprendizagens, oficialmente chamado de Plano Escola+ 21/23. Nada do que ali se refere se contesta, mas o que fica sem se saber, embora se adivinhe, é se as escolas, entendendo que as turmas deverão ter dimensão mais reduzida as poderão reduzir; se, precisando de mais professores para apoios, coadjuvações e outras respostas, os podem contratar; se, necessitando de reforçar as equipas multidisciplinares ou o número de assistentes operacionais, podem concretizar essas decisões; se, tendo turmas do 1.º ciclo com vários anos de escolaridade, as podem dividir; se, sendo necessário organizar os horários de trabalho de acordo com o disposto na lei, poderão reforçar o número de docentes que são necessários às escolas. As respostas penso que todos as antecipamos: é aos professores que se exigirá mais na atividade direta com os alunos, será a eles que se imporá a participação em mais formações que acumularão a outras formações, serão eles os convocados para mais reuniões em horas que deveriam ser suas.

- É preciso dar resposta aos problemas, é preciso atrair jovens para a profissão, blindando-a de curiosos não qualificados que já vão pululando por salas de aula de algumas escolas, é preciso dialogar e negociar para que se encontrem soluções, é preciso que o Ministério da Educação compreenda que concursos, contratação, carreira, horário e condições de trabalho, aposentação e outros aspetos são objeto de negociação coletiva e que esta, nos termos da lei, só tem duas partes: a entidade empregadora, neste caso pública, e os representantes dos trabalhadores que são os seus sindicatos.

- Não pode o Ministério da Educação fingir que esquecer-se que, naquilo que à negociação coletiva diz respeito, os sindicatos não podem ser substituídos por associações de diretores, confederações de pais, ex-ministros ou comentadores políticos de domingo à noite ou de qualquer outro dia da semana. Por muito jeito que desse ao governo, nem a lei o permite, nem a FENPROF delegou a sua representação.

- É evidente que satisfaz os professores, como qualquer trabalhador, ouvir palavras de reconhecimento pelo seu seu trabalho; mas atenção, palavras que não se traduzam em atos e em respeito e efetivação dos direitos, soarão sempre a oco, quando muito, com recheio de hipocrisia.

- Estamos aqui hoje para nos fazermos ouvir: pela população, pela comunicação social, pelos decisores políticos. Convidámos, por isso, todos os grupos parlamentares e alguns aceitaram o nosso convite e estão ou estarão aqui connosco ao longo desta ação (citá-los). Agradecemos a presença e pediremos que deste palco se dirijam aos professores

- Termino lembrando que estamos no mês de junho, no mês dos Santos Populares, pelo que quisemos, com música, associar a nossa ação de hoje a esta quadra tão portuguesa e às marchas populares que, tal como o diálogo social, estão suspensas. A diferença é que aquelas foram suspensas por razões de segurança sanitária; a suspensão do diálogo social teve na origem razões de natureza política: a valorização dos professores, o respeito pelos seus direitos e a melhoria das suas condições de trabalho não têm sido prioridade para o atual governo, como não eram para anteriores. Se a pandemia se combate com medidas de segurança sanitária, o bloqueio negocial combate-se com luta e será a luta dos professores que hoje, como no passado, determinará a resolução dos problemas que os afetam

- Já de seguida daremos a palavra aos representantes dos grupos parlamentares presentes e a seguir teremos um conjunto de quatro sketches sobre concursos, carreira, condições de trabalho e aposentação. No final, simbolicamente, derrubaremos o Muro do Bloqueio, sendo essa a principal obrigação dos professores e educadores não no plano simbólico, mas no real. Nesse sentido, esta é apenas mais uma iniciativa entre outras que, ainda este ano e no próximo, levaremos por diante, começando já a trabalhar para que, mais uma vez, este ano, o Dia Mundial do Professor, a manter-se ou agravar-se a situação que vivemos, seja um enorme dia de afirmação da Profissão de Professor.

 

Lisboa, 25 de junho de 2021