Negociação Gestão Democrática das Escolas Carreira Docente
Entregue no Ministério e divulgada à comunicação social (29/11/2007)

Declaração final global da FENPROF sobre o primeiro processo de regulamentação do ECD

29 de novembro, 2007

"Isto é um absurdo! O Ministério da Educação quer, agora, recuperar a Prova de Candidatura, realizada entre 1992 e 1995. Quem a fez, segundo a proposta do ME, passa automaticamente a titular. Com a ponderação atribuída aos currículos profissionais, nem três doutoramentos chegavam para atingir tal pontuação... E mais absurdo ainda é que esta Prova tenha sido realizada, como disse, entre 1992 e 1995, e, no entanto, qualquer cargo desempenhado pelos docentes só vale a partir de 1999", destacou Mário Nogueira no encontro com os jornalistas realizado, ao fim da tarde de 29 de Novembro, à porta do ME. Uma delegação da FENPROF, dirigida pelo seu secretário-geral, entregou, entretanto, na 5 de Outubro uma declaração final global sobre o primeiro processo de regulamentação do ECD, documento que seria também divulgado aos jornalistas e que aqui deixamos já de seguida:


Ao longo de três meses, e com reuniões praticamente semanais, decorreu o primeiro processo de regulamentação do ECD que deu prioridade à regulamentação dos seus aspectos estruturantes que são, igualmente, os que melhor servem os propósitos do Ministério da Educação no que respeita à alteração profunda e muito negativa das anteriores regras de carreira: regime de avaliação do desempenho, regime de acesso à categoria de professor titular, prova de ingresso na profissão docente e dispensas para formação. Foram, ainda, alvo de regulamentação, as licenças sabáticas, a aquisição dos graus de mestre e doutor e o exercício de funções técnico-pedagógicas.

A FENPROF avalia de forma muito negativa este processo que deveria ter sido, de facto, negocial. Todavia, a negociação esgotou-se nos aspectos formais e no número de reuniões realizadas, não passando, como deveria ter acontecido, pela alteração da atitude e disponibilidade dos responsáveis do Ministério da Educação. Ou seja, a sua intransigência em relação às posições de partida sobre cada uma das matérias agora regulamentadas impediu que houvesse aproximação com as posições sindicais, mesmo quando estas não colidiam com princípios estabelecidos no Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro, que contém o ECD. Essa atitude fechada do ME impediu que, mesmo sem chegar a acordo, se convergisse em aspectos pontuais.

Através deste processo de regulamentação, o ME não só tornou mais explícitas as suas intenções negativas face à revisão do ECD, como as concretizou de uma forma que, na opinião da FENPROF, agravou alguns aspectos com opções que, entretanto, veio a tomar.

1. Avaliação do desempenho dos docentes - para além de todas as críticas já manifestadas, acresce, agora, uma inaceitável concentração de poderes no presidente do órgão de gestão, que avalia não só os docentes, como o seu parceiro de avaliação (o coordenador de departamento ou de conselho de docentes), designadamente a forma como este co-avalia os mesmos docentes! Por outro lado, a manutenção das "cotas", de parâmetros como "resultados escolares dos alunos" ou "abandono escolar", a falta de clareza em relação a alguns aspectos importantes como, por exemplo, o conceito de assiduidade, ou o conjunto de procedimentos generalizados e frequentes (observações, entrevistas, inúmeras fichas?) que tenderão a burocratizar-se são aspectos que continuam a merecer a rejeição da FENPROF. Preocupantes são, ainda, o conteúdo proposto para as fichas de avaliação, a ausência de algumas e a necessidade de serem regulamentados aspectos relevantes das próprias regulamentações?

Confirma-se que o principal objectivo deste regime de avaliação é garantir o controlo dos ritmos de progressão dos docentes, relevando, também nesta matéria, a perspectiva eminentemente economicista de um processo que deveria ser de natureza formativa.

2. Prova e concurso de acesso à categoria de professor titular - confirma-se o cenário mais negativo. Esta dupla exigência (aprovação na prova e existência de vaga) tem por único objectivo a criação de um obstáculo no acesso aos escalões de topo da carreira que será intransponível para mais de 2/3 dos docentes. Isto apesar de ser já hoje evidente que esta divisão da carreira em categorias hierarquizadas e a concentração de funções nos titulares cria, a estes docentes, ainda maiores dificuldades no seu exercício profissional, constrange a organização pedagógica das escolas e dificulta o seu normal funcionamento. As disposições transitórias constantes no projecto de diploma, confirmam a natureza discricionária de grande parte das medidas que têm vindo a ser impostas no âmbito da carreira docente.

3. Prova de ingresso na profissão docente - a FENPROF rejeita-a por a considerar desajustada ao conjunto de exigências e requisitos que, hoje, já se colocam aos docentes para poderem exercer a profissão: formação científica, formação profissional, período experimental e período probatório. Na opinião da FENPROF este é apenas um artifício criado pelo ME com o intuito de reduzir a elevada taxa de desemprego docente que tem vindo a agravar-se neste país que continua a apresentar défices muito graves no que se refere à educação, ensino, formação e qualificação.

4. Dispensas para formação -Na prática, o ME revoga este importantíssimo direito que, como tal, deveria ser reconhecido aos docentes. A formação contínua dos professores e educadores é fundamental para a sua valorização profissional e obrigatória para efeitos de avaliação do desempenho e consequente progressão na carreira docente. Por outro lado, a frequência de acções ou de outras iniciativas de formação é parte integrante da sua componente não lectiva, logo, faz parte do seu horário de trabalho. Só que, com o regime que foi imposto pela tutela, a formação contínua terá de ser, para a generalidade dos docentes, uma actividade pós-laboral a somar a todas as que, ilegalmente, vão sendo para aí remetidas, tal a sobrecarga de trabalho e tarefas que são hoje exigidas aos docentes no seu horário de trabalho.

Relativamente às restantes matérias que foram alvo de regulamentação, as posições da FENPROF são as que constam dos documentos oportunamente entregues no ME.

Pelas razões expostas, a FENPROF reafirma e reforça o seu desacordo em relação ao actual ECD. A ele subjaz a intenção de retirar aos docentes as suas capacidades de autonomia, pedagógica e organizacional, esvaziar o lado reflexivo, crítico e autocrítico, interveniente, propositivo, solidário e participativo, por inclusão, ao contrário, de uma postura tutelada, vigiada, hierarquizada, controlada por vários, que são peças de um controlo remoto e centralizado, uma postura, portanto, sobredeterminada, selectiva, cercada e dirigida ao fim da exclusiva e alegada eficácia quanto a resultados que, por sua vez, são uniformizados e descontextualizados.

A FENPROF considera que este tipo de professor é a antítese do que a Lei de Bases do Sistema Educativo configura, do que estava consagrado no Estatuto da Carreira Docente que o actual Governo revogou, e do que melhor se ajusta a um enquadramento da Escola Pública como eixo central do desenvolvimento do sistema educativo português no sentido da elevação generalizada da formação de todos os portugueses.

A FENPROF reafirma que a revogação do actual ECD e a sua substituição por outro que recupere os princípios antes enunciados como positivos, respeite a natureza da profissão docente e valorize e dignifique a respectiva carreira, é um dos objectivos prioritários da sua acção reivindicativa e da luta que os professores e educadores portugueses continuarão a desenvolver.

Lisboa, 29 de Novembro de 2007
O Secretariado Nacional da FENPROF