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Resumo de um recente estudo do economista e investigador Eugénio Rosa

Injustiça fiscal, défice orçamental e a necessidade de um imposto sobre as grandes fortunas

25 de maio, 2005

Neste momento, utilizando os grandes órgãos de informação, a que têm acesso fácil, os defensores do pensamento económico de cariz neoliberal procuram criar a ideia a nível da opinião pública que é necessário e inevitável aumentar os impostos indirectos (IVA, IA, ISP) em Portugal. Mas isso não é verdade como provamos neste estudo utilizando apenas dados oficiais.

Assim, contrariamente ao que muitas vezes se afirma ou pretende fazer crer a carga fiscal em Portugal não é a mais elevada da União Europeia. De acordo com dados publicados pelo Eurostat, em 2003, a carga fiscal representava em Portugal 38,1% do PIB enquanto a média na União Europeia rondava os 41,6%.

O que é mais elevado em Portugal é o peso dos Impostos Indirectos, que são os impostos mais injustos porque não atendem ao rendimento do contribuinte (pobres ou ricos quando adquirem o mesmo maço de cigarros pagam a mesma importância de imposto).

Em 2003, as receitas que tiveram como origem os impostos indirectos representaram em Portugal 41,9% das receitas fiscais do Estado, quando a média na União Europeia foi  apenas de 33,8% do PIB. Depois de 2003, esta situação agravou-se mais em Portugal, pois em 2005 em cada 100 euros de receitas fiscais 62,3 euros terão como origem impostos indirectos.

Mesmo a nível dos Impostos Directos, que são impostos mais justos pois atendem, em principio, ao rendimento dos contribuintes, a injustiça tem aumentado em Portugal. Em 2002, em cada 100 euros de receitas de impostos directos, 63,3 euros tinham como fonte o IRS, enquanto o IRC, pago pelas empresas, contribuía apenas com 35,9 euros. Em 2005, em cada 100 euros de receitas fiscais com origem em impostos directos, 70,3 euros terão como origem o IRS e apenas 27,8 euros o IRC pago pelas empresas.

A nível do IRS a injustiça fiscal é também assustadora. Em 2003, por ex., 87,5% dos rendimentos declarados eram rendimentos do trabalho por conta de outrem e de pensões de reforma. Os rendimentos auferidos por pessoas singulares de empresas, profissões liberais, rendimentos de capitais, rendimentos prediais, mais valias, etc, representavam apenas 12,5% do total de rendimentos declarados naquele ano para efeitos de pagamento de IRS.

Entre 2001 e 2003, o numero de contribuintes que declararam rendimentos superiores a 250.000 euros por ano diminuiu de 26.802 para apenas 2.144 , o que indicia um forte aumento da evasão e fraude fiscal, feito perante a passividade dos sucessivos governos.

Só no período compreendido entre 2001 e 2003, o Estado perdeu receitas que têm como origem o IRC, devido aos benefícios fiscais concedidos às empresas assim como à possibilidade que estas têm de deduzir nos anos em que têm lucros os prejuízos de anos anteriores, cerca de 5.020 milhões de euros (o que correspondente a mais de 1.000 milhões de contos). Uma redução dos benefícios e uma limitação significativa dos prejuízos que podem ser deduzidos pelas empresas determinaria um acréscimo importante de receitas fiscais do Estado que contribuiria para reduzir o défice orçamental. 

Em Portugal, de acordo com um estudo divulgado pelo INE, os 10% mais ricos da população apropriam-se de 29% do rendimento do País, enquanto 50% da população portuguesa recebe apenas 24% do rendimento do País. Um imposto sobre as grandes fortunas, à semelhança do que já existe em França e no Luxemburgo, lançado temporariamente sobre os 10% da população mais rica permitiria obter uma receita que contribuiria também para reduzir o défice orçamental.

Um combate eficaz, e não apenas mediático, contra a evasão e fraude fiscal, que a própria Administração Fiscal reconhece situar-se entre os 4% e os 7% do PIB (nós estimamos em 10% do PIB) permitiria obter um importante acréscimo de receitas fiscais.

A proposta defendida pelos defensores do pensamento económico de cariz neoliberal de aumento de impostos indirectos agravaria ainda mais a já grave injustiça fiscal existente no nosso País e violaria o nº 1 do artº 103 da Constituição da República. As propostas que apresentamos prova que existem outras soluções para aumentar as receitas fiscais que não determinariam um aumento da carga fiscal para as classes trabalhadoras e que respeitaria o preceito constitucional. Fazemos votos para que, desta vez, o Sr. Presidente da República não se esqueça que o sistema fiscal visa não só a satisfação das necessidades financeiras do Estado, mas também "uma repartição mais justa dos rendimentos e da riqueza" como estabelece a Constituição da República e que explique isso principalmente aos mais ricos e ao governo.