Nacional
FENPROF presente numa conferência em Berlim

"Desenhar a área europeia do ensino superior e da investigação"

11 de dezembro, 2003

?Há uma recomendação da Comissão Europeia que aponta para uma taxa de investimento nacional em investigação e desenvolvimento na ordem dos 3 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010. O nosso país tem actualmente uma taxa de 0,8 por cento, prevendo-se, segundo as declarações do Secretário de Estado, um valor de 1,2 por cento em 2010, o que é, no mínimo, ridículo?.

As palavras são de Manuel Pereira dos Santos, do Departamento do Ensino Superior da FENPROF, em conversa com o ?JF/Sup?, no regresso da conferência internacional, que decorreu recentemente em Berlim. ?Desenhar a área europeia do ensino superior e da investigação? foi o tema geral que presidiu aos trabalhos deste encontro, ?com características académicas e sindicais?, promovido pela IE, pelo GEW (sindicato alemão) e pelo Comité Sindical Europeu, e que envolveu cerca de 150 participantes.

Na abertura dos trabalhos registaram-se as comunicações de Eva-Maria Stange, presidente do GEW; Edelgard Bulmahn, ministro federal da Educação e Investigação da Alemanha; David Coyne, Director para a Educação da Comissão Europeia; Eric Froment, presidente da Associação Europeia Universitária; e Fred van Leeuwen, secretário-geral da IE.

?A atractividade das carreiras e as condições de trabalho? e a ?creditação dos graus?, uma matéria fundamental para a mobilidade dos estudantes e dos profissionais, estiveram em foco na conferência de Berlim, dando origem a duas secções temáticas de debate que enquadraram estudos científicos elaborados por especialistas de uma vintena de países europeus (membros da União e candidatos).

As delegações sindicais, explica Manuel Pereira dos Santos, tiveram oportunidade de comentar esses relatórios.

?No caso português quem ficou com a questão da acreditação/verificação da qualidade foi o Prof. Alberto Amaral, que se fez representar em Berlim pela Drª Maria João Rosa; na parte correspondente à atractividade académica e das condições de trabalho na Europa foi o Prof. Virgílio Meira Soares, apoiado pelo Dr. Rocha Trindade?, refere Pereira dos Santos que integrou com João Cunha Serra, coordenador do Departamento do Ensino Superior, a delegação da FENPROF a este encontro de Berlim, a que se seguiram seminários nacionais e regionais para aprofundamento do debate, como sucedeu em Málaga, num seminário organizado pelas Comissiones Obreras (CC.OO), iniciativa em que também estiveram representantes do GEW (Alemanha), da FENPROF (a delegação de Berlim) e do SNESup de França.

Em Málaga, houve ainda oportunidade para um encontro dos sindicalistas portugueses, franceses e espanhóis, que analisaram pormenores da situação do ensino superior e da investigação nos respectivos países.

?Preocupados com a concretização da agenda neo-liberal, os argumentos e as linhas de orientação dos governos, adaptadas às condições e às realidades de cada país, acabam por ser semelhantes, sendo, assim, útil a troca de experiências entre os sindicalistas, tendo em vista o reforço da cooperação, da definição de propostas e da acção conjunta?, observa Manuel Pereira dos Santos.

O ensino superior não é uma mercadoria

Voltando ainda ao debate de Berlim, João Cunha Serra, comentando preocupações que ali se registaram, sublinha que ?há quem aposte na comercialização do ensino superior; com o processo de Bolonha no centro das atenções, há vozes (e forças) claramente apostadas em transformar o ensino superior numa mercadoria, como têm alertado não só representantes sindicais e académicos, como também representantes dos reitores?.

Acrescenta, nesta breve conversa com a reportagem do JF/Sup:

?Cabe-nos intervir neste processo de forma activa. Em Portugal ainda não se dá a atenção devida a esta matéria. Arriscamo-nos a ver o ministro definir por decreto como vai ser Bolonha. É fundamental uma intervenção activa dos sindicatos e das instituições. Só assim se evitarão  situações de ameaça de comercialização, de descaracterização e de imposição de um ensino transnacional, sujeito às regras do mercado?.

A propósito dos ?critérios de avaliação?, o responsável do Departamento do Ensino Superior da FENPROF refere  que ?é natural que em cada país haja um sistema de avaliação próprio, embora possa funcionar uma coordenação a nível europeu através de um organismo que reconheça no cenário europeu o que cada país estabeleceu a nível nacional, de acordo, naturalmente, com índices e padrões aceites?.

Outro tema que Cunha Serra destaca da reunião de Berlim é a necessidade de incentivar a participação das mulheres no ensino superior, nomeadamente no Norte da Europa e na zona anglo-saxónica.

Uma palavra final para lembrar que a FENPROF é a única organização sindical portuguesa a participar nas reuniões internacionais sobre ensino superior e investigação.                                                                             José Paulo Oliveira

*

?No âmbito da Internacional de Educação/Europa e do Comité Sindical Europeu, a FENPROF tem feito um esforço significativo para acompanhar, o mais perto possível, os debates que têm decorrido sobre Bolonha. Numa primeira etapa, as organizações representativas dos docentes, os sindicatos, não tiveram lugar nos debates. A IE esteve representada nos trabalhos preparatórios da reunião de Salamanca, mas em Praga não. E aqui estiveram outros sectores, como os estudantes, os ministros e os reitores. Desde logo dissemos que faltava ali um pilar ? a representação sindical dos docentes e investigadores, que certamente têm uma palavra a dizer sobre Bolonha.?

Sindicatos atentos

?Os ministros do Comércio (com esta ou com designações parecidas) andaram durante um período significativo a discutir, entre eles, as questões do Ensino Superior e os ministros da Educação não sabiam, pelo menos oficialmente, que os seus colegas andavam a discutir e a negociar, no âmbito da organização mundial do comércio, matérias relevantes do Ensino Superior.

Aqui há uns tempos a Comissão Europeia acordou e então estes ministros começaram a conversar uns com os outros (...).

O sistema europeu, apesar de tudo, está a resistir, embora não totalmente, à gula mais radical que, via organização mundial do comércio, quer vender universidades empacotadas e criar outras offshore, como sucedeu na Austrália.

Entretanto, há a preocupação de começar a juntar, em termos de debate, de reflexão e de tomada de medidas, a área da Educação e a área da Investigação.

A tudo isto, as organizações representativas dos docentes e dos investigadores têm de estar atentas.?

Manuel Pereira dos Santos