Nacional
David Justino, Abílio Morgado e Mariana Cascais foram reprovados: não têm condições para se manter à frente da Educação

Avaliação da política educativa e do desempenho da equipa do ME em encontro da FENPROF

18 de junho, 2004

No final de mais um ano lectivo (2003/2004), a FENPROF avalia de forma muito negativa a política e a prática na área da Educação e reafirma a posição aprovada no VIII Congresso Nacional dos Professores: a actual política educativa não serve e a equipa ministerial composta por David Justino, Abílio Morgado e Mariana Cascais não tem condições para se manter à frente da Educação em Portugal.

1. DESENVOLVIMENTO DE UMA POLÍTICA MUITO NEGATIVA

A política educativa, este ano, fica marcada pela recente aprovação da Lei de Bases da Educação. Nela se reflectem as posições do Governo e da maioria parlamentar de direita que, à margem de qualquer consenso social e político, pretende:

a) colocar em pé de igualdade o ensino público e o privado, a coberto do conceito de que um serviço público pode ser assegurado por iniciativas de cariz privado, como se a lógica da iniciativa privada e da iniciativa pública não fossem profundamente diferentes.

b) reduzir em três anos o ensino básico, enquanto tronco comum do percurso educativo de todos os portugueses.

c) acabar com a organização democrática e participada das escolas, impondo-lhes uma gestão de cariz empresarial, prevendo, para o efeito, a possibilidade de serem colocados gestores nas escolas/agrupamentos, admitindo até que não sejam docentes.

d) desvalorizar a Educação Pré-Escolar, atentando contra a existência de uma rede pública e subalternizando a função educativa face à de guarda, contrariando o estabelecido que define este sector como a 1ª etapa da educação básica.

e) constituir agrupamentos de escolas, ainda de maior dimensão, com a inclusão das escolas secundárias, o que não é compatível com qualquer critério de natureza pedagógica.

f) criar dois sistemas nacionais de educação: um para a educação especial e outro para a educação regular, negando os princípios orientadores da Declaração de Salamanca e da educação inclusiva.

g) promover uma pretensa avaliação pública das escolas, com os resultados dos alunos, nomeadamente em exames nacionais, a servir de base a ?rankings? de escolas, redutores, injustos e perversos.

h) exercer controle político sobre a Inspecção Geral de Educação e Ensino.

2. AUMENTO DA PRECARIEDADE E DO DESEMPREGO DOS PROFESSORES

A política anti-social e de desvalorização dos serviços públicos desenvolvida pelo Governo reflecte-se na escola portuguesa de forma agravada. Acomodando-se ao decréscimo da população escolar, o Governo insiste em considerar como naturais e inevitáveis o desemprego, a precariedade e a instabilidade dos docentes. A FENPROF denuncia esta atitude, considerando que a abertura de lugares de quadro de acordo com as necessidades efectivas das escolas, a redução do número de alunos por turma (com o consequente e imperativo investimento nas instalações escolares), o alargamento da rede pública de educação pré-escolar, a existência de medidas concretas que combatam, de facto, o analfabetismo, o abandono e o insucesso escolar em Portugal, contribuiriam para a melhoria da educação e do ensino e responderiam a situações de desemprego e instabilidade. Releva ainda o incumprimento de compromissos assumidos, como o que permitirá a profissionalização dos docentes com habilitação própria com mais de 6 anos de serviço. Os desempregados são hoje mais de 30 000, número que, a manter-se a política do Governo, se agravará, o que consubstanciará um verdadeiro escândalo nacional e um drama vivido por milhares de famílias portuguesas.

Também os professores do ensino particular e cooperativo continuam a ser vítimas de discriminação em relação aos restantes colegas, designadamente devido à não aplicação das normas constantes do Estatuto da Carreira Docente.

3. CRIAÇÃO DE GRAVES PERTURBAÇÕES E INSTABILIDADE NAS ESCOLAS

Neste âmbito, o ano fica marcado por:

a) Agrupamento forçado de escolas, ignorando a vontade das comunidades escolares e também das autarquias.

b) Aplicação antecipada dos novos programas de 10º ano, apesar da designada reforma curricular do ensino secundário só se iniciar no próximo ano lectivo.

c) Transferência para as escolas da responsabilidade pelo preenchimento dos horários deixados vagos na 2ª Parte do Concurso, primeiro através de telefonema e depois por oferta pública de emprego, provocando o atraso da colocação de professores e do início das aulas para milhares de alunos.

d) Decisões não negociadas com as comunidades educativas sobre o encerramento de estabelecimentos ou de cursos e transferência compulsiva dos alunos de umas escolas para outras.

e)    Aumento muito significativo do número de horários-zero nas escolas, devido, entre outros aspectos, ao encerramento de cursos, à não autorização de desenvolvimento de projectos pedagógicos, ao número insuficiente de horas para o crédito global a que as escolas teriam direito e à não redução do número de alunos por turma, à redução do número de docentes responsáveis pelas actividades no âmbito da área de projecto e de estudo acompanhado e à atribuição ilegal de turmas com contrato de associação a colégios privados.

f)      Prolongamento de parte das aulas dos alunos das escolas secundárias até 25 de Junho, sem condições para que tal aconteça e contra as decisões tomadas pelas próprias escolas.

4. ASFIXIA FINANCEIRA DAS ESCOLAS

O Governo decidiu cortar no financiamento dos serviços públicos, o que concretizou no duodécimo de Dezembro de 2003, com consequências muito negativas para as escolas que foram obrigadas a anular compromissos assumidos.

Para além deste problema, aumentaram as dificuldades financeiras das EB 2.3 que se transformaram em sede de agrupamento, pois não foram compensadas financeiramente pelas despesas acrescidas que passaram a ter.

As escolas do 1º Ciclo continuam a viver sem um orçamento próprio e aos jardins de infância foi reduzido 10% da verba que lhes é atribuída pelo M.E., de acordo com o disposto na Lei Quadro de Educação Pré-Escolar.

Também as escolas profissionais vivem graves problemas de funcionamento devido ao regime de financiamento vigente, situação que se agravou com o novo modelo aprovado para as escolas da área de Lisboa e Vale do Tejo.

5. FALTA DE TRANSPARÊNCIA EM ACTOS ADMINISTRATIVOS

a) Os favorecimentos ocorridos na colocação de alguns educadores e professores foram o exemplo mais flagrante de falta de transparência em actos administrativos, tendo o M.E. sido obrigado a demitir e suspender alguns dirigentes da administração educativa. Continuam por se conhecer os contornos exactos de diversas situações sem que o M.E. tome as medidas necessárias a que se esclareçam e, a provarem-se as ilegalidades/irregularidades denunciadas, sejam tomadas as medidas jurídicas, judiciais e políticas que sancionem os seus autores.

b) Desde há cerca de dois anos que o ME mantém em segredo as conclusões dos processos disciplinares instaurados a colégios privados por utilização indevida de dinheiros públicos. Urge a divulgação dessas conclusões e a penalização dos seus responsáveis.

6. DESRESPEITO PELOS QUADROS LEGAIS VIGENTES

Neste domínio, o ano lectivo fica marcado por:

a) Constituição de agrupamentos de escolas sem que estas subscrevessem a sua criação, sem que as autarquias emitissem o parecer positivo e sem que as associações de pais fossem ouvidas, apesar desses serem requisitos legais.

b)Imposição de normas ilegais na candidatura dos professores aos concursos nacionais (transferência de candidatos da 1ª para a 2ª prioridade do concursos externo).

c) Manutenção ou celebração de novos contratos de associação com colégios privados, apesar de não se verificarem os requisitos legais estabelecidos, alguns dos quais há menos de um ano.

d) Divulgação de interpretações restritivas e ilegais da legislação, designadamente no âmbito da gestão das escolas, no sentido de limitar ainda mais a candidatura apenas a alguns docentes.

7. INCOMPETÊNCIA TÉCNICA E FALTA DE RESPONSABILIDADE POLÍTICA

Independentemente de outras situações que ocorreram ao longo do ano, este fica marcado pela forma desastrada e incompetente como decorreram todos os concursos de docentes e pela não assunção de responsabilidades políticas que já deveriam ter levado o Ministro da Educação e o Secretário de Estado da Administração Educativa a demitirem-se.

Estes concursos públicos de professores, pela forma como decorreram, traduziram-se na criação de momentos de grande instabilidade para as escolas e para os professores, na prática sucessiva de ilegalidades, na existência de processos pouco rigorosos e menos transparentes e num aumento indeterminado mas muito significativo da despesa pública. Tudo sem que tivesse havido a indispensável assunção de responsabilidades políticas.

O cronograma é esclarecedor:

i) atraso nas colocações da 2ª Parte que deveriam ter ocorrido antes de Setembro, mas só foram divulgadas já no decorrer desse mês;

ii) irregularidades, ultrapassagens nas colocações e ilegalidades naquelas colocações, que foram devida e oportunamente denunciadas pela FENPROF;

iii) transferência de milhares de colocações para a responsabilidade das escolas, por incompetência do M.E. para o conseguir fazer;

iv) conhecimento público de diversos casos de eventual favorecimento na colocação de professores, estando dois já esclarecidos como correspondendo, efectivamente, a ?cunha?;

v) atraso no concurso que não teve lugar em Janeiro, mas apenas em Março;

vi) ilegalidades nas instruções divulgadas sobre as candidaturas, dificuldades na apresentação da candidatura electrónica, requisitos obrigatórios não satisfeitos pelo M.E. (códigos de cursos e de estabelecimentos, por exemplo);

vii) saída, em 3 de Maio, de listas provisórias de ordenação completamente erradas (pelas listas calculou-se que houvesse 40 000 candidatos atingidos pelos erros do M.E.. Após a distribuição dos verbetes estimaram-se em mais de 100 000);

viii) falta de informação no que respeita à saída de novas listas ordenadas;

ix) possibilidade de atrasos graves nas colocações com repercussão no início do próximo ano escolar.

8. DETURPAÇÃO DE FACTOS COMO ARMA POLÍTICA

O exercício de funções governativas exige rigor e seriedade nas palavras. Nem sempre tal aconteceu com os actuais responsáveis do Ministério da Educação. Estes não hesitaram em mentir na Assembleia da República quando foram questionados sobre a constituição dos agrupamentos de escolas, afirmando que não seria homologado um único agrupamento sem o parecer favorável da respectiva autarquia. A mentira ficou a descoberto quando dezenas de autarquias assumiram, por escrito, não terem emitido esse parecer.

Em Dezembro de 2003 acusou de má-fé aqueles que perante situações de eventual favorecimento na colocação de alguns professores exigiram o seu esclarecimento, fazendo-o publicamente devido ao silêncio do M.E. quando foram directamente questionados os seus responsáveis. A difamação ficou a descoberto quando os dois únicos casos até agora alvo de processo de inquérito pela IGE, e cujas conclusões se conhecem, deram razão à denúncia.

Mais recentemente, no âmbito do processo falhado de concursos, responsáveis do Ministério da Educação começaram por faltar à verdade quando publicamente desvalorizaram os erros e acusaram a FENPROF de estar a criar um foco de instabilidade com o problema. A mentira ficou a descoberto com o retorno do processo de elaboração de listas provisórias ao ponto zero.

CONCLUSÃO SOBRE A AVALIAÇÃO REALIZADA

Outros itens de avaliação poderiam ser também considerados. Contudo, estes são os que marcaram de forma mais forte a política educativa e a prática da actual equipa do Ministério da Educação neste ano lectivo que se aproxima do seu termo.

A avaliação negativa que é feita assenta em critérios objectivos e claros e tem em conta, também, um discurso ministerial que desde a primeira hora tem repetido palavras como rigor, competência, responsabilização, eficácia, eficiência, estabilidade, qualidade e transparência. Palavras pronunciadas repetidamente por um ministro que se diz defensor de uma cultura de avaliação mas que não a aplica dentro dos serviços centrais, nem aos responsáveis políticos do Ministério que superintende.

Assim, tendo em conta os itens considerados:

§            POLÍTICA(S) PARA A EDUCAÇÃO

§            ESTABILIDADE E EMPREGO DOS PROFESSORES E EDUCADORES

§            ESTABILIDADE NO FUNCIONAMENTO DAS ESCOLAS

§            FINANCIAMENTO DAS ESCOLAS PÚBLICAS

§            TRANSPARÊNCIA DOS ACTOS ADMINISTRATIVOS

§            RESPEITO PELOS QUADROS LEGAIS VIGENTES

§            COMPETÊNCIA TÉCNICA E RESPONSABILIDADE POLÍTICA

§            SERIEDADE E RIGOR NAS POSIÇÕES ASSUMIDAS

o Encontro Nacional de Quadros Sindicais promovido pela FENPROF em 28 de Maio de 2004, em Lisboa, reprova esta equipa ministerial e a política educativa de cariz mercantilista e neoliberal por ela prosseguida.

A sua penalização social e política, quer pelo acentuar da acção e da luta reivindicativas, quer pelo voto dos portugueses, será determinante para a mudança que é urgente e indispensável ao nosso país.

 

Lisboa, 28 de Maio de 2004

O Encontro Nacional de Quadros Sindicais da FENPROF