Nacional
Que eixos para a intervenção no problema do (des)emprego docente?

A importância de estarmos organizados (intervenção de João Louceiro)

22 de fevereiro, 2008

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FÓRUM SOBRE O EMPREGO DOCENTE

Que eixos para a intervenção no problema do (des)emprego docente?

João Louceiro

Membro do Secretariado Nacional da FENPROF

Cordenador do Grupo de Trabalho para a Instabilidade de Emprego

A IMPORTÂNCIA DE ESTARMOS ORGANIZADOS

Nota prévia:

  • para uma organização como a FENPROF e para os sindicatos que a compõem, o eixo fundamental para agir sobre o problema do (des)emprego docente é o da intervenção sindical!

  • para a FENPROF, a denúncia e discussão pública do desemprego docente e da proliferação e agravamento de condições de exercício profissional em situações precárias é uma obrigação inalienável;

  • mas mais do que isso, a movimentação dos professores - a sua luta! - será o elemento decisivo para contrariar e resolver os problemas que se expressam nos altíssimos níveis de desemprego docente e na crescente incerteza e condições depauperadas em que milhares de professores e educadores fazem o seu trabalho;

  • uma precariedade que, fruto de opções políticas que a promovem, tem vindo a ameaçar, progressivamente, sectores mais vastos da profissão, trazendo novas e justificadas preocupações mesmo para aqueles que há algum tempo não se sentiam tão ameaçados por este tipo de problemas?

O título da comunicação:

A IMPORTÂNCIA DE ESTARMOS ORGANIZADOS

Tem uma referência, um sentido:

  • o êxito da luta!

  • o êxito da luta traduzido na alteração das políticas que contribuem para ou que estão na origem dos difíceis problemas que se colocam hoje em torno do emprego docente;

  • este desejado êxito exige:

  • a pressão - natural em democracia! - que leve à adopção de políticas diferentes, partindo do condicionamento das actuais opções do poder político e favorecendo a opção por políticas verdadeiramente alternativas;

  • a reivindicação de medidas concretas que, no imediato, atenuem as dificuldades associadas aos problemas da precariedade e do desemprego;

  • (dificuldades em diferentes planos: no da identidade e valorização da profissão, no da organização da própria escola, no dos impulsos que ela pode dar para que se resolvam problemas estruturais que comprometem o desenvolvimento do país e, claro, na atenuação das dificuldades vividas nos planos individual, laboral e social - dificuldades concretas! - daqueles que têm sido as vítimas reais - de carne e osso! - de erradas opções prosseguidas por sucessivos governos e agravadas pelo actual.)

Quando falamos do "êxito da luta" e da importância de estarmos organizados para o conseguir, não nos colocamos num patamar de abstracção.

A FENPROF tem formulado um conjunto de reivindicações que, traduzindo uma opção deliberada pelo necessário investimento que a Educação em Portugal exige, trariam inegáveis reflexos positivos em termos de emprego docente:

  • a diminuição do número de alunos por turma;

  • a redução do número de níveis e de turmas atribuíveis a cada docente;

  • a viabilização de condições para que as escolas possam desenvolver os seus próprios projectos de combate ao insucesso e ao abandono escolares;

  • o reforço do apoio e acompanhamento dos alunos com NEE;

  • a valorização dos quadros de escola, de acordo com as suas verdadeiras necessidades;

  • o alargamento da rede pública de estabelecimentos do pré-escolar;

  • a constituição de equipas educativas no 1º CEB;

  • o desenvolvimento de um plano nacional de combate ao analfabetismo;

  • o comprometimento sério com o aumento das qualificações académicas e profissionais da população activa;

  • estes são exemplos de reivindicações para as quais se orienta a luta que a FENPROF organiza e promove!

Mas também no combate contra medidas que concretizam as opções políticas aprofundadas pelo actual governo se situam as referências da luta que a FENPROF lidera:

  • o encerramento cego de escolas;

  • o aumento da idade para a aposentação;

  • a sobrecarga dos horários dos professores que se encontram a trabalhar;

  • a extinção do carácter inclusivo da Escola Pública;

  • a entrega de respostas educativas a interesses privados;

  • a introdução de novas e mais graves formas de precarização do trabalho;

  • ou o corte no financiamento de universidades e politécnicos;

É preciso que se perceba:

O combate contra medidas como estas é também um combate contra a degradação das condições de emprego e de vida dos profissionais docentes.

No património de lutas da nossa profissão são muitos os exemplos da força colectiva que soubemos usar e para a qual a organização foi factor indispensável.

  • a título de exemplo, lembremos aqui:

  • a conquista de um ECD - agora destruído pelo governo de José Sócrates e do PS - que foi uma conquista ímpar da profissão e, no concreto, de todos os que por ele lutaram;

  • o melhoramento daquele ECD, através, por exemplo, da revalorização salarial da profissão, da abolição da prova de candidatura para acesso ao 8º escalão ou da contagem integral do tempo de serviço;

  • a conquista do elementar direito ao subsídio de desemprego que só recentemente deixou de ser negado ainda a alguns professores.

E nunca é demais sublinhá-lo: as grandes movimentações colectivas, os grandes momentos de luta que os professores protagonizaram, foram possíveis porque agiram organizadamente, porque criaram e reforçaram vontades individuais através da organização que potenciou o envolvimento de muitos mais nas acções de que a luta foi feita.

A importância de termos organização

Estarmos organizados é condição indispensável para agirmos colectivamente, tanto mais indispensável quanto os desafios que enfrentamos exigem persistência e acção prolongada.

  • a dispersão individual conduz ao isolamento daqueles que anseiam por ver os seus problemas resolvidos;

  • fomenta alheamentos, sentimentos de impotência;

  • é terreno fértil para leituras fatalistas da realidade que se gostaria de transformar, sentimentos profusamente inculcados pela ideologia dominante;

  • é campo aberto para impulsos erráticos de sobrevivência individual, de competição desenfreada, que não resolvem os problemas que sofridos colectivamente e que, na maior parte das vezes, nem chegam a adiar o confronto com a penalizadora realidade que urgia transformar;

  • a dispersão individual não deixa ver quem são os aliados para enfrentar e resolver as dificuldades;

  • não deixa ver com clareza, sequer, quem são os adversários que é preciso afrontar;

  • quantas vezes a frustração compreensível não acaba até a ser erradamente dirigida contra os sindicatos que persistem na luta para construir uma realidade melhor?!

Referir, neste Fórum, a importância de estarmos organizados, tendo em mente os professores e educadores contratados e desempregados, obriga-nos a distinguir a ideia de organização da de constituição de uma espécie de getho, em que este grupo de docentes se fechasse para congeminar formas de lutar pelos seus objectivos mais imediatos.

  • é preciso perceber e fazer perceber que há lutas cujos objectivos confluem para a solução de diferentes problemas que se colocam àqueles docentes;

  • estar organizado é uma necessidade para disseminar esse entendimento e para que ele se traduza em envolvimentos significativos nas lutas que, sendo também de outros, ou de todos até!, maior potencial de transformação e de resolução de problemas apresentam;

  • a participação dos docentes contratados e desempregados em acções de luta de âmbito largo, marcando presença com os problemas que têm, tornando visíveis para fora as suas razões e a sua movimentação, será um contributo importante para atingir também as suas reivindicações próprias; e para o conseguir de forma mais expressiva, vai ser indispensável o aprofundamento de uma organização que os afirme e que traga mais gente à luta, tanto mais quanto são reconhecidas as dificuldades que marcam o actual momento histórico e político.

Dos registos das lutas que têm sido travadas em torno das questões que afectam os docents contratados e desempregados poderiam ser enunciados muitos tipos de acções que a FENPROF tem organizado:

  • desde a participação em manifestações;

  • concentrações centralizadas em Lisboa ou multiplicadas pelo país;

  • esperas a governantes para lhes apresentar o descontentamento e reivindicações;

  • ocupação, lembrar-se-ão, de Centros de Emprego;

  • a dinamização de uma petição dirigida à Assembleia da República;

  • plenários e reuniões com tomada pública de posições;

  • diferentes acções de denúncia, diríamos de carácter mais simbólico, como a Feira do Desemprego realizada no final do ano lectivo passado e a acção junto a Centros de Emprego, repetida com assinalável impacto mediático no início do presente ano escolar;

  • ...mais recentemente tem sido muito comentada no âmbito sindical a dificuldade em mobilizar gente para dar maior dimensão e força às acções desenvolvidas;

  • tem-se revelado difícil a constituição de comissões de luta de professores contratados e desempregados.

Mesmo em acções de dimensão mais restrita, a presença e envolvimento dos colegas contratados e desempregados é imprescindível para que através de testemunhos na primeira pessoa se ganhe visibilidade:

  • a importância disto reforça-se pelo interesse normalmente demonstrado pela comunicação social perante os problemas e as situações de vida destes professores;

  • as dificuldades reforçam a importância de estarmos organizados para podermos chegar a mais gente com o apelo à participação e para garantir mais gente a intervir nas acções e iniciativas;

  • na preparação das acções, a participação directa dos próprios contratados e desempregados é importante para aumentar a capacidade de mobilização e de apelo da própria estrutura sindical.

Os tempos não estão fáceis, sabemo-lo!

As dificuldades enfrentadas por quem quer ser professor e não o pode ser, ou por quem o é em condições de ameaçadora precariedade, em vez de espicaçar a combatividade, levam ao desalento e à desatenção. O desencanto tem-se instalado perante um futuro incerto na docência.

  • a formatação de consciências produz resultados e a percepção de que é possível transformar a realidade politica e social tem-se esbatido;

  • esbate-se a ideia de que partindo do contributo e da participação individual, mas agindo colectiva e organizadamente, é possível, como no passado, influenciar o rumo dos acontecimento;

  • o ideologia dominante inculca sentimentos de impotência que nascem na imagem virtual de um mundo em trajecto inevitável;

  • o discurso político dominante fabrica alegadas fatalidades;

  • a opinião publicada apresenta o rumo político de quem governa como percurso sem alternativa;

  • os valores e as atitudes de intervenção cívica e política afirmam-se com dificuldade num contexto que lhes é adverso.

Neste quadro desfavorável, difícil!, em que nos encontramos quão importante é encontrarmo-nos para estarmos organizados para a continuação e o aprofundamento da luta!

Talvez a necessidade de estarmos organizados não fosse tão decisiva se os momentos históricos que atravessamos fizessem apelo aos valores da participação cívica e política!

  • a espontaneidade da participação poderia, quem sabe?, colmatar melhor as fragilidades de organização!

  • mas a dimensão dos problemas que decorrem do desemprego e da precariedade, as situações de vida que eles determinam, o nosso futuro colectivo comprometido nestas voragens, não permitem o desânimo;

  • é preciso encontrar maneira... maneiras!... de dar a volta à situação;

  • e os problemas não param de aumentar: o ataque que o actual governo tem em curso contra a capacidade de organização dos sindicatos obrigará a novos esforços e soluções, envolvendo mais e mais contributos para além dos que vêm das direcções sindicais;

  • envolvendo uma responsabilização ainda maior dos docentes nos seus locais de trabalho, na sua esfera de conhecimentos;

  • contrariando a apatia e o desânimo que parece(!) ter vindo para ficar!

Tenhamos consciência das limitações e dificuldades que se colocam, temporariamente, no plano da acção sindical com os docentes contratados e desempregados.

  • provavelmente, no imediato, teremos que centrar a luta em acções, como há pouco dizíamos, de carácter mais simbólico;

  • não obstante este carácter, requerem o envolvimento organizado de contratados e desempregados na sua preparação, com a criatividade que lhes acrescentem, e na sua concretização onde, como referimos, para o efeito de denúncia e de mobilização da atenção da sociedade, é imprescindível a sua presença;

  • sem perder de vista as questões gerais do desemprego e da precariedade, é preciso organizar e dar respostas a docentes que se defrontam com problemas concretos, como ainda recentemente aconteceu com várias "tropelias" feitas no âmbito das colocações de professores...

  • é preciso, entretanto, organizar e trazer à luta outros colegas que experimentam novas e "requintadas" versões precariedade de emprego, como sucede com os milhares de professores que trabalham hoje nas Actividades de Enriquecimento Curricular do 1º Ciclo, a maior parte a recibo verde;

  • ... aliás, novas facetas da precariedade e de exploração apenas possíveis e, espantemo-nos, por vezes até tornadas "apetecíveis", com o pântano do desemprego e da ausência de perspectivas que é produto da acção de sucessivos governos;

  •  é preciso organizar e trazer para a luta, percebendo diferenças e particularidades, os colegas em situação precária a leccionar no Ensino Superior (que serão perto de 70% dos docentes daquele nível de ensino e que, ultimamente, se encontram sob a ameaça crescente de desemprego);

Mas importa perceber que, sendo importantes, as pequenas acções, os objectivos pontuais, as denúncias que impedem que os problemas desapareçam de vez, não por estarem resolvidos mas por acabarem esquecidos, não será "só" com isto que travaremos a imposição crescente da precariedade e que atacaremos de vez a imposição do desemprego docente.

  • iremos precisar de outro patamar na dimensão de acções de luta; outro patamar que requer mais e melhor organização dos intervenientes em luta;

  • falamos de verdadeiras acções de massas;

  • depois de conseguir a atenção da sociedade, precisaremos, se quisermos efectivamente dar uma volta à situação, precisaremos de criar dificuldades incontornáveis a este governo e a outros que lhe queiram seguir o rumo e isto vai lá com movimentações sociais vastas que tornem preferível para o poder político atender às justas reivindicações que lhe dirigimos;

  • são muitos os professores e educadores desempregados que aspiram, legitimamente, a exercer a profissão para a qual se qualificaram e de cujo contributo o país precisa;

  • são muitos os que aspiram a exercer a profissão de forma estável, podendo dedicar-se de corpo inteiro à profissão e podendo olhar com confiança o futuro - têm direito a isto!;

  • são muitos os que, ao lado, conhecem, compreendem e acompanham a situação destes nossos colegas;

  • são muitos os que vivem com eles as incertezas, as decepções, o desencanto...

  • Irá ser preciso organizar este descontentamento, trazê-lo ao cimo, dar-lhe visibilidade; não podemos ter a certeza de que o vamos conseguir, mas tenhamos a certeza de que o não conseguiremos se não estivermos organizados para tal. E esta não é uma responsabilidade delegada nas direcções sindicais: é uma responsabilidade que começa na decisão, na vontade, no empenhamento de cada um.

Aquilo por que lutamos justifica-o!

Contem com a persistência e a combatividade da FENPROF mas acrescentem-lhe a vossa voz.

Organizados, teremos êxito na luta!