Nacional
Conferência de imprensa, em Ponta Delgada, 15 de Junho

FENPROF defende a descentralização do sistema educativo, mas recusa a municipalização da educação e a transferência do pessoal docente

24 de junho, 2007

Conferência de imprensa, em Ponta Delgada, 15 de Junho

A transferência de competências para os municípios, também na área da Educação, volta a marcar a agenda política nacional. A comunicação social relata, com algum pormenor, as negociações secretas entre o Governo e a ANMP; a ANMP coloca o tema no centro do debate que promove no seu Congresso; o partido do Governo realizou um Fórum Autárquico no passado sábado em que o tema foi dos principais; a FENPROF promoveu, na passada sexta-feira, um Seminário sobre "Municipalização", que contou com a participação da CONFAP e de todos os grupos parlamentares; a Ministra da Educação desdobra-se em declarações, não colocando de lado a possibilidade de, em breve, transferir o pessoal docente para os municípios.

A FENPROF, que sempre defendeu a descentralização como forma de adequar as respostas educativas aos contextos locais e de combater as desigualdades que decorrem das diferenças económicas e sociais entre as diversas regiões, considera que o caminho para a municipalização pode vir a traduzir-se, como noutros países, no acentuar das assimetrias regionais.

Para a FENPROF, não está em causa o papel das comunidades locais e, em particular, das autarquias no processo educativo. A questão está em encontrar soluções que, garantindo o papel do Estado na consecução dos grandes desígnios da Educação e no assegurar da equidade e igualdade dos cidadãos, possam igualmente descentralizar um conjunto de atribuições que se traduzam na melhoria das respostas educativas.

A experiência do que tem sido a gestão das actividades de enriquecimento curricular, que mostra à saciedade um país com profundas assimetrias, deveria fazer reflectir sobre a pertinência da municipalização como resposta à realidade do país que é o nosso e não à realidade de países que se pretende erigir como modelos a seguir, mas que têm percursos históricos, económicos, sociais, culturais e educacionais muito diferentes do nosso.

De resto, a progressiva transferência de competências para os municípios, sem a criação de condições para a sua concretização, tem tornado patentes estas assimetrias, sendo ainda frequente encontrar:

  • escolas e jardins de infância que nunca mereceram uma intervenção adequada que permitisse a sua adaptabilidade às novas exigências da escola e da educação;
  • estabelecimentos que têm vivido em verdadeira penúria de recursos materiais e financeiros e cuja solução parece ser, agora, o seu encerramento;
  • transportes escolares desadequados aos horários e ao regime de funcionamento das escolas, obrigando as crianças e os jovens a grandes sacrifícios;
  • carência de pessoal auxiliar de acção educativa;
  • insuficiência de uma acção social escolar que não responde de forma satisfatória às necessidades crescentes de um país em que o empobrecimento das famílias tem crescido muito.

Neste contexto, a FENPROF defende que a passagem de mais competências para as autarquias deve ser antecedida de uma avaliação séria sobre a concretização das anteriormente transferidas. Simultaneamente, a FENPROF reafirma que:

  • A descentralização do sistema educativo e da sua administração exigem a criação de Conselhos Locais de Educação que sejam espaços de participação de toda a comunidade educativa e dos órgãos autárquicos, com efectivos poderes e meios para a gestão de importantes aspectos do sistema educativo;
  • O caminho da descentralização exige a aprovação de uma Lei sobre a autonomia e financiamento das escolas que transfira efectivos poderes para os órgãos próprios dos estabelecimentos de ensino e dos Conselhos Locais de Educação, delimite claramente competências e estabeleça regras claras, universais e transparentes para o financiamento das escolas;
  • A descentralização do sistema educativo não pode ser um processo em que o ME e o Governo tentam desresponsabilizar-se do financiamento das escolas, passando para outros o odioso das dificuldades, mas continuando a concentrar as decisões relativas à organização das escolas. Essas sim, assumidas localmente, podem induzir melhorias no sistema educativo e na qualidade das aprendizagens das crianças e jovens;
  • A transferência de competências para as autarquias locais, no domínio da educação, deve sempre prosseguir o objectivo de melhorar a resposta da Escola Pública e ser acompanhada das condições financeiras adequadas à sua concretização;
  • Rejeita em absoluto a transferência de qualquer competência para os municípios relativa ao pessoal docente, designadamente o seu recrutamento, salários, carreiras, avaliação do desempenho, o exercício da acção disciplinar, ou qualquer outra tutela.

É de recordar que foi na sequência de grandes acções de luta desenvolvidas pelos professores e educadores contra a possibilidade de os municípios virem a tutelar a sua actividade, que a Assembleia da República retirou da Proposta de Lei do Governo para o Orçamento de Estado de 1983, o artigo que previa a transferência de competências para as câmaras municipais relacionadas com o pessoal docente, em que se incluíam o pagamento de salários e o exercício de acção disciplinar.

Por fim, a FENPROF manifesta a sua discordância pela forma como o actual processo está a ser discutido entre o ME e a ANMP, exigindo participar nas negociações em curso, enquanto legítima representante dos professores e educadores e organização empenhada em melhorar o funcionamento, a organização e a qualidade das múltiplas respostas que deverão ser dadas pela Escola Pública. A FENPROF declara-se, ainda, disponível para mobilizar os docentes caso se torne necessário lutar contra qualquer tentativa de transferir a sua tutela para as Câmaras Municipais.

O Secretariado Nacional