Nacional
Conferência de imprensa

Financiamento das IPSS e das Misericórdias

29 de janeiro, 2013

FENPROF, a FNSTFPS e o SEP denunciam, em conferência de imprensa realizada em Lisboa, nesta terça-feira, dia 29 (foto), os atropelos e as sistemáticas violações aos direitos laborais dos profissionais que exercem funções nas IPSS e Misericórdias, instituições de solidariedade social que, recorda-se, são financiadas, em grande parte, pelo Orçamento de Estado. Estão em causa muitos milhões de euros e não se conhece qualquer fiscalização e auditoria à utilização destas verbas públicas.

A nota divulgada aos jornalistas refere:

Estabelece o artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa, que todos têm direito à segurança social, incumbindo ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado, com a participação das associações sindicais, de outras organizações representativas dos trabalhadores e de associações representativas dos demais beneficiários.

O mesmo artigo determina, que, em complementaridade com o sistema público, «o Estado apoia e fiscaliza, nos termos da lei, a actividade e o funcionamento das instituições particulares de solidariedade social e de outras de reconhecido interesse público sem carácter lucrativo, com vista à prossecução de objectivos de solidariedade social consignados, nomeadamente», na «promoção e garantia de acesso a uma rede nacional de creches e outros equipamentos de apoio à família», no «aproveitamento dos tempos livres da juventude», e em «políticas de apoio de desenvolvimento das pessoas com deficiência e da terceira idade», nos termos constitucionais.

O Estado, tem-se demitido da sua responsabilidade e desta função social de crucial importância, tem vindo a transferir completamente as suas competências para as IPSS e Misericórdias, não na perspectiva da complementaridade, mas para que estas assumam o desígnio constitucional.

Ao mesmo tempo, não fiscaliza o dinheiro atribuído, que provém anualmente do Orçamento do Estado, sendo muitas vezes insindicáveis as quantias e a sua aplicação e os impactos nas famílias, nomeadamente nas prestações mensais, e nos direitos dos trabalhadores.

Estas instituições, IPSS e Misericórdias que assumiram e prosseguem aquela que seria a tarefa primordial do Estado, não reveem ou aumentam os salários aos seus trabalhadores seguindo uma política de destruição total dos seus direitos: mais horas de trabalho, “bancos de horas” e “pseudo adaptabilidades”, diminuição das férias, incumprimento no pagamento dos salários, violação das tabelas salariais, subsídios de refeição e de turno, horários dos turnos e trabalho suplementar e mesmo despedimentos, eufemisticamente chamados de “dispensáveis, obrigando a que estes trabalhadores, que lidam com camadas da população particularmente fragilizadas, muitas vezes trabalhem voluntariamente, a troco de nada.

A título de exemplo, o subsídio de alimentação dos trabalhadores das IPSS é de €2,38 (valores de 2009) e as já baixas tabelas salariais não são negociadas e actualizadas desde 2009, sendo que o custo de vida tem aumentado consecutivamente – transportes, alimentação, água, electricidade – só para mencionar os bens mais básicos.

Tais violações dos direitos destes trabalhadores são normalmente justificadas pela não existência de meios financeiros, sem que se consiga perceber se tal se deve a má gestão do dinheiro público, dada a inexistência de controlo por entidades auditoras e fiscalizadoras.

O Sector social e Governo assinaram, a 8 de Novembro, o Protocolo de Cooperação para 2013 e 2014. O documento prevê um aumento de 0,9 por cento para a generalidade dos acordos com a Segurança Social. Este aumento representa cerca de 30 milhões de euros, não estando claro, contudo, o valor total da comparticipação.

As transferências, provindas diretamente do Orçamento do Estado, têm vindo a conhecer um aumento anual de cerca de 1% (cerca de 17 milhões de euros), ao valor total de financiamento, sem que, contudo, seja possível desagregar essa despesa ou tão pouco sindicá-la.

Os últimos relatórios do Tribunal de Contas específicos sobre o assunto datam de 2004 e de acordo com o Relatório sobre a Conta Geral do Estado de 2011 elaborada por esta entidade, o subsistema de ação social foi essencialmente financiado (em 82,5%) por “Transferências correntes da Administração Central” (€ 1.470,1 M) e também por € 163,6 M (9,2%) de receitas consignadas transferidas pela SCML. Na despesa, 84,1% (€ 1.373,9 M) respeitam a transferências e subsídios para as IPSS e 5,4% (€ 88,8 M) a transferências e subsídios para as “Famílias”. 

No Orçamento do Estado para 2012, a dotação orçamental para as instituições sem fins lucrativos era de €1.549.439.343,00.

São portanto muitos milhões de euros, a que se somam benefícios fiscais, diferenciações na taxa social única, entre outros, que urge que a sua aplicação seja fiscalizada e transparente por forma a que se garanta uma boa utilização dos dinheiros públicos e se respeitem os direitos dos trabalhadores destas instituições dos quais dependem os seus utentes.

Não se garante, ainda, que o dinheiro atribuído seja utilizado para o aumento salarial destes trabalhadores, verdadeiros garantes da prossecução da função social do Estado.

Reiteramos a importância destas instituições como complementares no apoio essencial e fundamental à infância, juventude, terceira idade e pessoas com deficiência, sublinhando o papel imprescindível de todos os profissionais que diariamente, e muitas vezes voluntariamente, garantem que esse papel seja cumprido.

Nesse sentido, exigimos do Governo uma fiscalização e transparência dos dinheiros atribuídos a estas instituições, designadamente:

  • auditorias às contas das IPSS e Misericórdias com o objectivo de monitorização dos montantes atribuídos via Orçamento do Estado;
     
  • garantia de que parte da verba atribuída é utilizada também para aumentos salariais dos trabalhadores das instituições e outros complementos remuneratórios;

  • garantia da existência de mecanismos de transparência e controlo da utilização dos dinheiros públicos, designadamente pelas entidades representativas dos trabalhadores;

  • cumprimento integral dos direitos dos trabalhadores;

  • cumprimento integral dos direitos definidos nas convenções colectivas aplicáveis ao sector.

 

Pela Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais – FNSTFPS

Pela Federação Nacional dos Professores – FENPROF

Pelo Sindicato dos Enfermeiros Portugueses – SEP 

Lisboa, 29 de Janeiro de 2013