Nacional
Livro de Carvalho da Silva, editado pelo Círculo de Leitores, será apresentado no dia 13, em Lisboa

"Trabalho e sindicalismo em tempo de globalização - reflexões e propostas"

09 de novembro, 2007

O trabalho como factor de produção, actividade socialmente útil, essencial à socialização, expressão de qualificações, fonte de direitos sociais e de cidadania, direito universal e espaço de valorização, factor de alienação económica e ideológica, condição de acesso a padrões de consumo e estilos de vida, actividade humana que se adapta às novas preocupações ambientais e ecológicas.

Nestas nove dimensões assenta a análise de Carvalho da Silva à centralidade do trabalho, tema da sua tese de doutoramento em Sociologia, agora convertida em livro, sob o título "Trabalho e sindicalismo em tempo de globalização - reflexões e propostas".

A obra, editada pelo Círculo de Leitores e a Temas e Debates, será apresentada terça-feira próxima (13/11/2007) em Lisboa, numa sessão em que participa D. Januário Torgal Ferreira. No dia 15 é a vez de Braga e 16 do Porto.

Ao longo de mais de 500 páginas, o secretário-geral da CGTP-IN procura demonstrar que o trabalho não deve ser apenas encarado como factor de produção, ao serviço de estratégias gizadas por multinacionais e subordinado a objectivos de produtividade e competitividade. Carvalho da Silva recusa a neutralidade axiológica.
Assume que se trata da leitura de um "sociólogo-sindicalista", que alia a investigação à experiência acumulada em 30 anos de sindicalismo, num "constante vaivém metodológico entre teoria e empiria". Contudo, admitiu ao JN ter tomado "precauções, para não entrar em contradição" com as funções que exerce.

Para uma análise assente nas premissas clássicas do marxismo - perspectiva classista, confronto trabalho-capital - lança como hipótese a ideia dos sindicatos como actores colectivos fundamentais para o desenvolvimento e transformação da sociedade, embora sujeitos a readaptações estruturais, organizacionais e estratégicas.

A tese teve como instrumentos essenciais a observação participante, 250 conversas informais, 80 entrevistas, três mil questionários (1497 validados) e três estudos de caso - do complexo industrial Grundig/Blaupunkt, em Braga, da têxtil Nova Penteação e da Portugal Telecom - com características diferentes, mas também traços comuns.

Democracia a perder

"Não há soluções políticas à Esquerda sem a retoma, por parte das forças progressistas, da centralidade do trabalho", declarou Carvalho da Silva ao JN. Na obra, o panorama traçado ajuda a perceber por que faz aquela afirmação. E outra : "As multinacionais são hoje o factor determinante na estruturação social e política, até dos estados. E não apenas pelo poder económico que detêm".

Crescente precariedade laboral - detectável na evolução da Grundig e da PT -, imposição de modelos de mobilidade, polivalência e flexibilidade, individualização das relações de trabalho, com a correspondente desvalorização das convenções colectivas, menorização do direito laboral, tomado como obstáculo a estratégias de matriz neoliberal, assentes no livre funcionamento do mercado - eis alguns dos traços dominantes da globalização em curso, a que se junta a perda de eficácia das instituições reguladoras. Desde logo, o Estado, mas também a Organização Internacional do Trabalho, a do Comércio (OMC), o FMI ou o Banco Mundial.

Carvalho da Silva não tem dúvidas à medida que se consolida, este modelo de globalização enfraquece a democracia. Como devem posicionar-se os sindicatos, neste novo contexto, carregado de desafios? Por um lado, batendo-se pela instituição de regras mínimas na actuação das multinacionais perante os estados e pela adopção de mecanismos de fiscalização, como as cláusulas sociais a introduzir nas normas da OMC. Por outro, valorizando a contratação colectiva, conscientes dos enormes bloqueios que a afectam.

Um deles, a segmentação do mercado de trabalho, impõe outra pergunta: ainda é válida uma atitude classista por parte dos sindicatos? Responde o "sociólogo-sindicalista": é, numa "perspectiva de acção" - não conceptual - em busca da reconstrução de solidariedades. Assumindo que os trabalhadores "se situam, na estrutura social, em graus e formas muito diferenciadas". Ter em conta apenas os posicionamentos políticos dos trabalhadores "não é o caminho". Um erro que também a Esquerda tem cometido, avisa Carvalho da Silva.

Paulo Martins, JN, 9/11/2007