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2000 professores doentes sem redução de horário

04 de novembro, 2007

Perto de dois mil professores com doença temporária não podem pedir a dispensa para dar aulas ou a redução do horário de trabalho, de acordo com Mário Nogueira, dirigente da FENPROF. Os números foram confirmados ao "DN" por uma fonte do Ministério da Educação. Em causa está o decreto-lei 15 de 2007, que revogou os artigos que previam este mecanismo. Juntas médicas confirmam, mas os processos são devolvidos. A alternativa é a baixa, o que afecta vencimento e carreira dos professores.  
A professora Ana Cristina Pereira, que sofre de insuficiência renal crónica, tem de fazer oito horas de diálise por dia, mas viu recusado um pedido de redução de horário por já não estar previsto na lei. A situação é comum a perto de dois mil docentes, segundo a FENPROF.

8 horas de diálise/dia e 35 de trabalho/semana

Ana Cristina Pereira tem 40 anos e uma insuficiência renal crónica que a obriga a fazer oito a nove horas diárias de diálise. Apesar de ter pedido a redução de horário até fazer um transplante, o pedido foi negado, porque a lei que o permitia foi alterada. Há perto de dois mil docentes na mesma situação, de acordo com Mário Nogueira, dirigente da Federação Nacional dos Professores. A alternativa à baixa é continuar a dar aulas e parar o tratamento sempre que o corpo não aguentar.

Professora de matemática e ciências de Setúbal, optou pela redução de horário ou da componente lectiva, mas foi surpreendida pela resposta da Direcção Regional de Educação de Lisboa, que refere que os artigos que permitiam fazer este pedido foram revogados.

O vazio na protecção à doença deixa Ana Cristina indignada, por estar "há 20 meses a fazer diálise". A doença foi detectada em 93, quando teve um crise renal, mas esteve estabilizada até 2006. Nessa altura, iniciou a diálise e tinha 10% de capacidade renal. "A minha qualidade de vida foi reduzida", diz. Foi aí que começaram os problemas. Optou pela diálise peritoneal, menos lesiva que a hemodiálise, mas mais demorada. "Todas as noites faço oito a nove horas com a máquina que tenho em casa".

Um especialista da junta médica do Serviço Nacional de Saúde atestou a sua incapacidade em 75% que, mais tarde, foi corrigida para 85%. Porém, "ao abrigo do novo estatuto", tem de trabalhar 35 horas. "Só pedi redução de horário! Não pedi aposentação nem meti atestado", desabafa. Hoje, dá aulas de ciências e alfabetização na escola e na junta de freguesia. São quatro níveis distintos.

A segunda parte dos problemas começa com o pedido de transplante, com espera de três anos, em média. A solução estaria na família. "O meu filho ofereceu-se, mas detectou um problema e não pôde ser dador". O marido é totalmente compatível e já tem o processo clínico concluído desde Junho. Porém, a regulamentação da lei, que permite a doação entre casais e amigos, tarda em sair (ver caixa ao lado). Apesar de ter apelado ao hospital, à Autoridade dos Serviços de Sangue e Transplantação, primeiro-ministro e Presidente da República, a resposta apenas chegou da Comissão de Saúde: "a regulamentação é da competência do Governo".

Até a portaria ser aprovada, Ana Cristina vai continuar a ter "noites mal dormidas, com a máquina a apitar e a precisar de trocar os sacos de soro. Tenho dores quando é feita a drenagem e a máquina tem de ser preparada às nove, porque tenho aulas cedo. Por vezes, tenho de parar o tratamento e descansar". A sua rotina é tão fechada que nem pode ir a um jantar. "O meu dia acaba e ainda tenho tanto para fazer... mas já consegui o mais difícil , que é encontrar dador compatível."

DN, 4/11/2007