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"Parece ser o professor o principal alvo a abater"

O EPE e a investida drone

15 de junho, 2014

Longe vão os tempos em que, para o Ensino Português no Estrangeiro, eram nomeados coordenadores para esta modalidade especial de ensino, através de processos devidamente previstos na lei, como é o caso do convite à manifestação de interesse para o exercício de funções de coordenador do ensino português no estrangeiro. Corria o ano de 2010 e o verão era promissor!

Quatro anos decorreram e grandes alterações se produziram. A alteração de 31 de agosto de 2010, saudada pelo Sindicato dos Professores no Estrangeiro como necessária,  criou legítimas expetativas nos professores a trabalhar no EPE e permitiu uma lufada de ar fresco. 

Os professores criaram expetativas positivas, acreditaram e empenharam-se no desempenho das suas funções, com profissionalismo, com lealdade… e ousaram sonhar! Sim, sonhar, porque a realidade é outra. Certamente, de olhos abertos, sonharam que lhes seria reconhecido o valor do seu trabalho, que lhes seria garantido o sustento digno das suas vidas.   

Terão colocado a fasquia um pouco elevada, já que, salvo raras exceções,  aquilo a que se assiste é ao desmoronar de todos os sonhos, é ao ceticismo, à descrença, às incertezas quanto ao futuro.  

Somos, diariamente, confrontados com um extremar de posições, de tomadas de decisões unilaterais e atentatórias, por vezes, dos mais elementares direitos dos professores. Parece ser o professor o principal alvo a abater. Aqui poderemos introduzir a figura do drone!

Esta tecnologia foi preparada para resistir a trabalhos “pesados” e a ambientes “hostis”!

Sobre os trabalhos pesados e os ditos ambientes hostis muito haveria a dizer, questionar se eles realmente existem ou se são cenários criados pelos gabinetes em Lisboa que, com controle remoto os vão “guiando” para a prossecução dos seus objetivos.

Por um simples exercício de entendimento e para amenizar o assunto podemos mesmo associá-los a “brinquedos” de controle remoto. E o conceito é simples: com o controle via internet ou outra tecnologia, logo remota, o drone pode ser manobrado sem necessidade de comprometimento do seu “operador”. Para se ser drone é necessária toda uma preparação para o desempenho de tarefas “arriscadas”, tais como, colocar o professor na primeira linha de ataque e, porque não, proceder à sua eliminação…? basta cumprir as ordens enviadas por quem tem o controle remoto na mão.

Após a tomada da decisão, o drone realiza a sua missão de uma forma tão eficaz que mostra mesmo que valeu a pena o investimento efetuado na escolha e na decisão da sua manutenção. Os custos, embora elevados satisfazem na plenitude os objetivos para a sua criação.

Mesmo que, por vezes, seja necessária a sua substituição por outro, as perdas não são tão significativas e um novo “aparelho” aparece para ocupar o lugar deixado vago.

O que perdura são os danos colaterais causados. É que eles são máquinas programadas para a destruição, e se uma ordem for mal dada, a sua execução faz correr riscos. Não para o veículo mas sim para o alvo! Mas os efeitos serão minimizados com as mais díspares desculpas de ordem económica. Por este facto, a perda de um professor atingido por um drone não representa qualquer custo acrescido mas sim o enaltecer do trabalho realizado pela “máquina”, que abateu mais um alvo reduzindo encargos. Assim sendo, vale a pena investir em drones. Fazem o trabalho que lhes é encomendado, de forma cruel e eficaz e a sua atividade perdura e rentabiliza-se para outras “missões” enquanto houver alvos a abater!

Quando os alvos acabarem e já não houver nada para abater serão recolhidos e abandonados no esquecimento, encarcerados nas memórias dos seus “mentores” que experimentarão uma sensação doce de uma tarefa cumprida em nome de uma gestão irrepreensível de efetivos, ou melhor, de recursos considerados obsoletos!

Mudam-se os tempos e mudam-se as vontades. O Ensino Português no Estrangeiro está moribundo. Não por falta de esforço e empenhamento dos professores e da comunidade imigrante que, mesmo tendo reagido de forma elevada aos primeiros bombardeamentos convencionais efetuados através das propinas, nunca pensou que as novas tecnologias se virassem contra eles. O bom usos destes “aparelhos” deveria traduzir-se por um trabalho de equipa, por uma atitude de cooperação, de identidade, de divulgação da língua e da cultura portuguesas. Mas não! O EPE acabará por sucumbir vítima do “fogo amigo” que as tecnologias permitem e os dirigentes usam a bel-prazer na prossecução de uma política de terra queimada. Nunca a máquina substituiu o Homem, pode ser-lhe útil, facilitar o seu trabalho, mas jamais o tornou indispensável.

Poucos anos serão contados até que se assista ao fim deste sistema especial de ensino. Das memórias constarão as boas vontades, o reconhecimento de todos os pais e mães que, estoicamente, resistiram a todas as ofensivas desta tutela impiedosa. Constarão ainda o esforço e a dedicação dos profissionais de educação que, além de professores foram amigos, orientadores e educadores que transmitiram os valores de uma sociedade que se quer justa e igualitária baseada nos mais sãos conceitos de civilidade. Os alunos, essa juventude pujante de vida, interrogar-se-ão ao percorrer os escombros que restaram das últimas ofensivas tutelares, quanto às causas de toda esta sanha destruidora! Sentirão as suas consequências!

Mas tudo isto poderá sobreviver a um clima de “guerra fria” que tudo subjuga aos interesses económicos? Todas estas vertentes não produzem efeito imediato. Os drones lançam engenhos com retardador, que não destroem no imediato, pois isso era visível. Melhor é ficar a corroer as bases do edifício para que este não se desmorone imediatamente.

Os professores, esses, formarão fileiras com as suas famílias e irão calcorrear os passeios, as ruas que levam aos centros de emprego na ânsia de encontrar um subsídio minguado que lhes permita sobreviver, já que, habituados a isso estão eles, com os salários miseráveis que lhes são pagos.

Será assim tão difícil deixar viver as pessoas em paz? Será assim tão difícil permitir às pessoas a manutenção dos seus postos de trabalho? Será assim tão oneroso para o erário viabilizar cursos onde os alunos estão com prazer a colher as informações de um país com séculos de história e cultura, com tradições que lhes proporcionam tanta alegria quando delas tomam conhecimento? Será assim tão custoso conviver com as realidades da diáspora ou o vocábulo só pode ser usado em discursos demagógicos?

Tantas perguntas sem resposta. Docentes que somos, habituados ao mundo dos porquês, interrogamo-nos: “porquê ?”

Carlos Pato
SPE/FENPROF