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Almiro Lopes - Comissão Coordenadora do Departamento de Aposentados da FENPROF

Pensar o envelhecimento e a longevidade hoje - Contributos para um enquadramento renovado

21 de junho, 2019

O tema que aqui vos trago tem a ver com o envelhecimento e os avanços da longevidade, fazendo deles um pano de fundo sobre alguns dos equívocos que se movimentam nos terrenos da aposentação. Sendo a longevidade um fenómeno positivo, e tendo ela naturalmente uma indiscutível relação com o envelhecimento, ambas arrastam consigo desafios humanos e culturais de merecimento social e político inquestionável. Assim sendo, a questão demográfica daí resultante, agravada pelo declínio das taxas de natalidade, basta para legitimar o destaque e, em especial, um alcance mais completo à sua natureza política, e, como tal, acrescer ao dever sindical uma maior exigência e responsabilidade. No fundo, um apelo a uma cidadania mais acentuada e solidária de, e para todos nós.

Compreender esta realidade hoje, carece assim de um olhar que oriente o futuro, no sentido de melhor conjeturar respostas adequadas e coesivas à premência dos impasses do presente. Daí, o despontar de um peso político acrescido que se impõe considerar e estruturar, preconizando-se o envelhecer como um continuum ao longo de todo o ciclo vital. Apenas assim entendendo o fenómeno da longevidade ela se pode tornar um tempo de todos, discernindo o amanhã do inevitável envelhecimento. Logo, não somente dos aposentados de hoje, mas, igualmente, dos que desejavelmente, da aposentação, aguardam futuro.

Neste contexto, uma breve chamada de atenção para a compreensão que vamos elaborando sobre os fenómenos sociais e humanos e que, logicamente, inspiram os nossos olhares, os nossos entendimentos e os nossos comportamentos. Ou seja, reconhecer essa peculiar conformação a que não escapam, naturalmente, as ideias que vamos formando sobre o envelhecimento e a longevidade. Trata-se, portanto, de processos indutores de práticas e representações que, para além da sua função modeladora, acabam por validar leituras e interpretações dos fenómenos em geral, enquanto objetos de análise. Os valores do tempo, dos lugares e das situações do imediato, na sua relação com a imperiosa urgência e compromisso com o tempo futuro, pressupõem acrescentadas exigências políticas que interessa identificar e considerar no comum de uma diversidade marcada por desigualdades e multiplicidades de variadas feições.

Neste quadro, importa criticamente referir que o conceito de envelhecimento, nomeadamente entre nós, encontra-se sobremaneira colado ao momento da reforma, fazendo deste um tempo simbólico que anuncia uma particular abertura à velhice e às suas malvadas implicações. Deste modo, vincula-se esta infeliz e simplificada significação aos mais diversos domínios da vida, desconceituando um processo que deveria ser compreendido como natural e ativo, embora, como se reconhece, e todos nós sabemos, irreversível nas suas alterações prenunciadas, sobretudo as biológicas. Todavia, é apropositado ter bem presente que o envelhecer é um fenómeno pessoal, progressivo e que se modaliza diferentemente de pessoa para pessoa.

Disse já que o envelhecimento e a longevidade são, no seu todo, um fenómeno positivo. Ele resulta de múltiplos progressos concretizados em domínios, acima de tudo, relacionados à melhoria das condições de vida das pessoas. Assim sendo, estamos perante uma das transformações sociais mais importantes dos últimos tempos. Todavia, assiste-se a uma contração da fecundidade que, em conjunto com o envelhecimento da população, gera um conjunto de consequências complexas, social e politicamente pertinentes. Deixando para uma fase posterior o debate e a discussão desses efeitos, importa sublinhar – neste enquadramento genérico, destinação desta minha intervenção – a necessidade de se trabalhar na arquitetura e sistematização de um agregado de ideias que nos permita elaborar posições claras e coerentes, ou seja, ideias que consubstanciem um pensamento estruturado e alicercem uma ação sindical convenientemente referenciada, naturalmente nele respaldada.

Conforme o documentado apresentado, a apreensão deste todo, desta integralidade, reclama assim uma extensiva compreensão, uma visão que esclareça o presente e oriente o futuro, de modo a definir-se opções políticas, como atrás referi, adequadas e coesivas à premência das exigências que hoje se nos colocam. A longevidade será, então, mais facilmente depreendida como um tempo de todos, desse inevitável amanhã do natural envelhecimento. Daí, a necessidade de trabalhar esse entendimento, conferindo-lhe um outro e acrescido peso político, preconizando-se o envelhecer como um processo contínuo ao longo de todo o ciclo vital. Em síntese, diria que a equação do assistencialismo, de feição paternalista, deve ser por todos nós, considerada uma equação politica e ideológica falsa, por falseada que é. Humana e matematicamente.

Repito - o tempo da problemática do envelhecimento e da longevidade é hoje, mais do que nunca, um tempo de todos. Para tal, é inadiável significar os tempos sociais como uma das dimensões determinantes da qualidade de vida das pessoas, a começar pelos trabalhadores hoje no ativo. Dessa consideração, dessa significação, de certo surgirão saberes e conhecimentos que clarificarão a questão do tempo, designadamente do tempo de trabalho e do tempo de não trabalho. Ora, o envelhecimento, dito ativo, enraíza-se nesse seu outro tempo passado e na sua qualidade. Nestas circunstâncias, e em concordância com esse todo, o tempo de aposentação/reforma será não um constrangedor tempo de rutura, mas provavelmente um tempo marcado por uma continuidade mais nossa. Ou seja, desse tempo passado o aposentado/reformado colherá dele a sua qualidade. Aprender a viver o tempo de aposentação/reforma passa por compreender, na sua profundidade, esta complexa questão dos tempos sociais e o lugar que neles ocupam aquele que pode ser o nosso verdadeiro tempo.

Obrigado. Viva o Congresso da FENPROF!

 

Almiro Lopes

Comissão Coordenadora do DA/FENPROF