Todas as notícias
Documentos aprovados

Resolução

08 de abril, 2014

 (Re)pensar a Escola, Dignificar o Professor, Respeitar a Criança

Resolução

 

A auscultação realizada junto dos professores do 1º Ciclo do Ensino Básico

Os temas em debate na 4ª Conferência Nacional do 1º Ciclo do Ensino Básico que integram a presente resolução resultam de um processo de auscultação desenvolvido pelos Sindicatos membros da FENPROF durante o primeiro período do ano letivo 2013/14. Com a utilização do questionário não se pretendeu realizar um trabalho científico de investigação, mas tão somente proceder a uma auscultação das opiniões dos professores do 1º Ciclo do Ensino Básico.

Nas reuniões em escolas e agrupamentos foram recolhidos 1.633 questionários. A idade média dos docentes que responderam é de 47 anos. E a média de tempo de serviço dos colegas que responderam ao questionário é de 24 anos. O questionário solicitava que cada professor atribuísse “numa escala de 1 a 4, a importância que reconhece” a um conjunto de doze matérias para o debate e intervenção sindicais [ 1- muito importante; 2 – importante; 3 - pouco importante; 4 – muito pouco importante].

A questão mais importante referida pelos professores é o “ - elevado número de alunos por turma e de anos de escolaridade por professor”, com 1420 respostas a considerar este aspeto como muito importante e 94 assinalando-a como importante – a soma destas duas respostas totaliza 1514.

Mas, utilizando esta solução de leitura dos resultados – somar as respostas que assinalam “muito importante” e “importante” – as diferenças não são muito significativas:

- Elevado número de alunos por turma e de anos de escolaridade por professor – 1514 respostas

- Condições para a aposentação dos professores – 1488 respostas;

- Alunos com NEE integrados nas turmas e adequação do apoio a esses alunos – 1481 respostas;

- Ajustamento dos currículos às necessidades educativas e formativas – 1477 respostas;

- Distribuição de horas da componente letiva e não letiva – 1464 respostas;

- Organização interna das escolas e sua adequação à atividade docente – 1448 respostas;

- Redução da componente letiva por idade e tempo de serviço – 1444 respostas;

- Participação dos professores nas decisões no agrupamento/escola – 1442 respostas;

- Condições de formação inicial, científica e profissional dos professores – 1434 respostas;

- Condições materiais e físicas de exercício da profissão – 1431 respostas;

- Regime de docência e coadjuvação dos professores – 1377 respostas;

- Condições para a realização de formação contínua adequada às necessidades – 1376 respostas.

Em face destes resultados, o Secretariado Nacional da FENPROF decidiu colocar em debate na 4ª Conferência Nacional do 1º Ciclo do Ensino Básico todas as matérias que constam do questionário utilizado no processo de auscultação, agrupando-as em seis capítulos.

 

Introdução

Diversos governos têm vindo a desenvolver um conjunto de medidas que alterou o funcionamento e a organização das escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico.  

Aparentemente desconexas, essas medidas assentam, no entanto, em opções políticas que visam no essencial: reduzir o investimento na educação; reduzir o currículo para algo próximo do saber ler, escrever e contar amputando-lhe áreas essenciais; transferir para o poder local despesas e responsabilidades; colocar nas escolas a responsabilidade de resolução de problemas sociais criados pelas opções políticas e ideológicas dos governos; estabelecer uma rígida cadeia hierárquica que contribua para transformar os profissionais de educação em funcionários acríticos/meros cumpridores de normativos; criar mecanismos de grande seletividade social logo a partir dos primeiros anos de escolaridade.

No desenvolvimento destas opções políticas, merecem especial destaque:

- O encerramento de milhares de escolas e a criação de mega agrupamentos que geraram estruturas educativas descaraterizadas e de gestão pedagógica difícil, por vezes próxima do impossível;

- As alterações curriculares e programáticas e as metas de aprendizagens disciplinares definidas em função dos conteúdos dos programas e não das aquisições, saberes e competências dos alunos. Trata-se de alterações desajustadas e desfasadas da realidade e do desenvolvimento cognitivo e da maturidade dos alunos.

- A exclusão de áreas curriculares não disciplinares e a obrigatoriedade de tempos mínimos de lecionação noutras áreas, com a organização de horários estanques, dificultando a inter e a transdisciplinaridade e empobrecendo o currículo, com o intuito, claramente restauracionista, de reforçar o papel da Escola como reprodutora das desigualdades sociais;

- A introdução das atividades de enriquecimento curricular (AEC), escolarizando o tempo lúdico das crianças, alterando e interferindo com o desenvolvimento do currículo escolar e misturando de forma incompreensível o que é e o que não é curricular;

- A criação de processos de coadjuvação condicionados à existência de recursos humanos nas escolas, por forma a evitar a colocação de docentes;

- A iniciação à língua inglesa - ora curricular ora não curricular, ora obrigatória ora facultativa e, recentemente, transformada em oferta complementar, em função dos recursos existentes, numa clara discriminação e violação dos princípios da equidade e igualdade de oportunidades;

- A introdução dos exames no 4º ano, que nada avaliam no que respeita aos percursos de aprendizagem, com o agravamento de se realizar num cenário de grande formalismo, ignorando o trabalho continuado feito por alunos e professores, quer ao nível das aprendizagens, quer da própria avaliação.

Do ponto de vista da FENPROF, importa refletir e discutir uma renovação da Escola do 1º Ciclo do Ensino Básico que, em alguns casos, faça reverter medidas de diversos governos mas, essencialmente, contribua com propostas alternativas para a renovação da escola e a melhoria das aprendizagens dos alunos.

Porque mantém inteira disponibilidade para encontrar as melhores soluções, a FENPROF apresenta aos professores e ao país alguns eixos para esse debate.

No seio da FENPROF e dos Sindicatos que a constituem, essa reflexão não se inicia com a 4ª Conferência Nacional do 1º Ciclo do Ensino Básico. Este trabalho ganhou maior visibilidade a partir de 2001, quando a FENPROF realizou, em conjunto com outras organizações, nomeadamente do movimento associativo de pais, diversas iniciativas: visitas a escolas do 1º Ciclo para dar a conhecer a realidade; Manifesto “Por uma Nova Escola do 1º Ciclo do Ensino Básico”, que reuniu o apoio de 2009 organizações de todo o país; realização de um Fórum Nacional, que terminou com a aprovação de uma Declaração Pública; Declaração Conjunta a propósito do Programa PER 1º CEB….

Reduzir o número de alunos por turma

Horários de trabalho pedagogicamente adequados

As condições de exercício da profissão no 1º CEB têm-se agravado, de ano para ano, com um cada vez mais elevado número de alunos por turma, com o retorno, em número significativo de turmas com diversos anos de escolaridade, com uma errada, porque pedagogicamente desadequada, distribuição de horas das componentes letiva e não letiva e com um cada vez mais débil apoio a alunos com necessidades educativas especiais.

Este agravamento do exercício da docência – pelo elevado número de alunos por turma, pela maior diversidade dos alunos tanto ao nível etário (com reflexos notórios no seu desenvolvimento cognitivo e comportamental), como étnico, ou cultural - assumiu proporções ainda há poucos anos inimagináveis. Este agravamento dificulta, não só o desenvolvimento do ensino e aprendizagem, como as respostas pedagógicas, nomeadamente em termos de pedagogias ativas e diversificadas, do apoio individualizado (fundamental neste nível de ensino), agravando também as próprias condições de funcionamento e de salubridade dos espaços, tendo em conta que as áreas/salas têm hoje múltiplas utilizações, foram feitas para serem utilizadas por um número inferior de alunos e por menos tempo, não permitindo sequer o seu arejamento.

A FENPROF reitera a exigência, já afirmada em 2002, no Fórum Nacional “Por Uma Nova Escola do 1.º Ciclo do Ensino Básico”, de que as turmas do 1º CEB sejam constituídas no máximo por dezanove alunos e, em casos excecionais, no máximo dois anos de escolaridade, sendo que as turmas que integrem crianças com necessidades educativas especiais, ou mais do que um ano de escolaridade, não devem ser constituídas por mais de doze ou quinze alunos respetivamente.

Neste domínio das condições de exercício da profissão, assume também particular importância o horário de trabalho, nomeadamente devido ao elevado número de horas de componente letiva, à sobrecarga de trabalho administrativo, às funções decorrentes da atividade de coordenação e supervisão, bem como à necessária atualização científica e pedagógica e ao elevado tempo despendido com a produção de materiais de apoio à atividade letiva. A componente letiva do horário deve ser fixada em 22 horas letivas semanais e a componente não letiva de estabelecimento até 3 horas. A organização e funcionamento da escola do 1.º Ciclo do Ensino Básico em regime que rompa com a monodocência pura e dura permitirá aplicar plenamente as reduções de horário previstas no ECD, o que será extremamente importante para profissionais que estão sujeitos a um acentuado e reconhecido desgaste psíquico e físico.

Com os Despachos Normativos n.º 7/2013 e n.º 7-A/2013, o governo/MEC instituiu a possibilidade de os intervalos serem excluídos da componente letiva dos  professores do 1º CEB, tendo a esmagadora maioria das direções dos agrupamentos e as ações inspetivas realizadas no início do ano letivo, imposto esta solução que, na prática, constitui um aumento do horário de trabalho. A exclusão dos intervalos da componente letiva suscita grande indignação entre os professores, na medida em que empobrece a continuidade da relação pedagógica, desenvolvida entre professores e alunos, diferencia o 1º CEB no plano socioprofissional dos restantes setores de ensino/educação e aumenta a sua componente letiva, agravando-se, desta forma, globalmente, o horário semanal de trabalho.

Uma outra organização curricular.
Um novo regime de docência

A reorganização do 1º CEB que se defende, exige o seu funcionamento em equipas educativas, hoje facilitadas quer pela diversificada formação dos docentes, quer pela concentração dos alunos em estabelecimentos de ensino de maior dimensão. Esta reorganização curricular com base em equipas educativas implica o fim do regime de docência com um único professor para todas as áreas curriculares. Na organização curricular que os governos desenharam unilateralmente, as atividades que hoje integram as AEC são parte integrante do currículo legalmente estabelecido para o 1º Ciclo – não são áreas de enriquecimento curricular - e devem ser lecionadas no tempo curricular previsto para os alunos deste ciclo da escolaridade básica (25 horas semanais) por professores com formação adequada para as áreas a lecionar neste setor de ensino.

O funcionamento das escolas do 1º CEB com base em equipas educativas permitirá às escolas e aos professores uma mudança efetiva na organização e dinâmica pedagógicas. Abrir-se-á caminho a um trabalho mais cooperativo, articulado e sustentado entre os professores, com ganhos significativos para as aprendizagens dos alunos.

Este modelo permitirá conjugar a exigência da competência disciplinar - face ao crescente desenvolvimento do conhecimento - sem relegar para segundo plano a importância do vínculo pedagógico, da relação de proximidade e do conhecimento interpessoal, fundamentais nesta faixa etária.

Uma resposta adequada à diversidade de alunos que frequentam o 1º Ciclo do Ensino Básico exige que a escola conte também com outros profissionais que permitam identificar e colmatar os problemas e dificuldades o mais precocemente possível.

A FENPROF e os seus Sindicatos reconhecem a necessidade e importância da resposta social às necessidades das crianças e das famílias. Assim, defende-se uma efetiva oferta de atividades de ocupação de tempos livres em período pós letivo, organizada conjuntamente pelos agrupamentos de escolas, municípios e outras organizações sociais que rendibilizem e valorizem as valências culturais e desportivas das comunidades.

Neste domínio, a primeira questão que se deve colocar é a de que a resposta social devida às crianças e as famílias não pode obedecer a um modelo nacional único, antes se exigindo a organização de soluções multidisciplinares, social e culturalmente localizadas, que possam utilizar diversos equipamentos comunitários.

A ocupação de tempos livres não pode ter um caráter escolarizante, antes devendo assumir uma forte componente lúdica e cultural.

É aos poderes central e local que cabe assegurar a resposta a esta crescente necessidade das crianças e das famílias, mas não pode aceitar-se que fique dependente da existência de maiores ou menores recursos das autarquias, sob pena de poderem ser discriminadas as famílias e crianças de muitas regiões do país.

O que os governos têm vindo a decidir neste domínio está a colocar áreas do currículo, a que se decidiu chamar “atividades de enriquecimento curricular”, no lugar de outras que deveriam ser destinadas a ocupação de tempos livres, muitas vezes “armazenando” crianças nos mesmos espaços onde decorre a atividade letiva, com recurso aos professores, desvalorizando, também por essa via, a profissão docente.

A reorganização curricular do 1º CEB exige ainda que se ponha fim aos exames no 4º ano de escolaridade. Trata-se de uma inutilidade para as aprendizagens dos alunos, sem qualquer validade científico-pedagógica e contrária a um processo continuado do ensino e da aprendizagem. Os seus únicos objetivos são discriminar de forma negativa e selecionar precocemente, elitizando a educação e reforçando o controlo administrativo e pedagógico ao serviço de lógicas de competitividade.

Um regime de aposentação que respeite
a especificidade do trabalho docente

As alterações impostas nas condições para a aposentação foram aplicadas de forma inexorável, sem qualquer respeito pelas justas expetativas de quem, ao longo da sua vida profissional, cumpriu com o contrato estabelecido e viu, de um momento para o outro, sem qualquer atenção às especificidades do exercício da profissão docente, alterar-se todas as expetativas profissionais e pessoais, alargando, em muitos casos, em mais de dez anos o tempo de atividade profissional!

Estas medidas atingiram todos os docentes mas, em particular, aqueles que trabalharam e trabalham em regime de monodocência!

A proposta de lei do Orçamento do Estado para 2013 pretendia pôr fim aos regimes especiais de aposentação em monodocência, nomeadamente os consagrados na Lei 77/2009 e no Decreto-Lei 229/2005. Com a aprovação deste OE, acabou por manter-se em vigor a Lei 77/2009, tendo sido revogado o Decreto-Lei 229/2005.

Atualmente, aos docentes que lecionam em regime de monodocência, não enquadrados na Lei 77/2009, aplica-se o regime geral da aposentação, regulado pela Lei 52/2007, com as alterações introduzidas pela Lei nº 66-B/2012, recentemente agravadas pela maioria PSD/CDS, com a Lei 11/2014. Estas sucessivas alterações deixaram de contemplar as especificidades do 1º Ciclo do Ensino Básico. Neste sentido, a 4.ª Conferência Nacional do 1.º Ciclo do Ensino Básico defende a aprovação de um regime transitório que preveja, para os docentes que exercem ou exerceram funções em regime de monodocência, uma bonificação de tempo de serviço, para efeito de aposentação até 20%.

Por outro lado, as alterações aos regimes de aposentação configuram uma violação do princípio da confiança e uma quebra de contrato. Neste domínio, a 4ª Conferência Nacional do 1º Ciclo do Ensino Básico reafirma as posições assumidas no 11º Congresso da FENPROF quando afirma a necessidade de lutar:

- Pela criação de condições, nomeadamente através da eleição de equipas de saúde e segurança no trabalho, que levem à identificação de doenças profissionais na profissão docente, permitindo que estes usufruam quer das proteções legais, quer de terapeuticas, quer ainda financeiras existentes para outros trabalhadores. 

-Pelo reconhecimento do caráter de elevado desgaste físico e psíquico da profissão docente e, consequentemente, reduzir a idade e os anos de serviço necessários para a aposentação com cálculo de pensão completa.  

- Pelo direito à aposentação antecipada aos docentes com 30 ou mais anos de serviço e 55 ou mais de idade, revogando as disposições de agravamento da aposentação antecipada.

Uma formação de professores que responda
às necessidades da escola

As transformações sociais, culturais, científicas e tecnológicas exigem professores inovadores, empenhados e reflexivos, capazes de pensar modalidades de educação mais flexíveis que redefinam os seus projetos pedagógicos, as suas práticas e competências, no sentido da promoção da formação para a participação democrática dos cidadãos e de aprendizagens significativas, bem como da melhoria do sucesso educativo. Neste sentido, a formação de professores, seja ela inicial ou contínua, deve ser concebida com o propósito de instruir e formar, e deve incidir sobre duas vertentes fundamentais:

- A científico-pedagógica com a valorização do conhecimento, procurando estabelecer novas relações estratégicas com os saberes e entre eles;

 - A socioeducativa, tendo esta por objetivo apetrechar o professor de competências para o exercício de funções, nomeadamente, em contextos problemáticos existentes nas escolas e nas comunidades onde se insere.

As mudanças constantes nas políticas educativas promovidas pelos diferentes governos têm vindo a acentuar o desfasamento entre a realidade e as necessidades de formação e a sua regulamentação.

Considerando a formação de professores – seja ela inicial (como ponto de partida para o exercício profissional) ou contínua (como desenvolvimento e crescimento profissional) – como um vetor estratégico para a melhoria do sistema educativo, a FENPROF tem defendido que os cursos de formação de professores devem ter como princípios orientadores:

- A garantia da mais alta qualidade científica e pedagógico-didática;

- A consideração do exercício de todas as funções inerentes à docência;

 - Uma reflexão sobre a natureza ética e deontológica da profissão e sobre os seus direitos e deveres profissionais.

Na certeza de que esta é uma área determinante na condição do pessoal docente e na melhoria da qualidade do ensino, a FENPROF defende:

 - A tomada urgente de medidas que permitam acabar com a confusão e o experimentar constante de soluções na formação de professores, tendo lugar um investimento sério numa formação que se exige de qualidade e adequada aos tempos atuais;

 - Nesta formação deverão ser considerados os aspetos científico-didáticos, mas deverá ser igualmente integrada a aquisição de competências para lidar com fenómenos sociais que se repercutem na escola e, ainda, para o desempenho de cargos e funções de gestão;

 - As escolas devem fazer prevenção de violência de género, também ela causa de violência e indisciplina, devendo os professores ter formação nesta área;

- A reformulação dos estágios pedagógicos e a substituição do período probatório por um período de indução.

No que respeita ainda à formação inicial, e tendo como referência as intenções do MEC, expressas no projeto de revisão do regime jurídico de habilitações profissionais para a docência, a FENPROF, para além de outros aspetos negativos que o documento comporta, considera inaceitável:

- A desvalorização da formação inicial para o 1º Ciclo do Ensino Básico, por via da determinação de um número de créditos inferior ao determinado para a formação inicial de outros setores da educação básica;

- A desvalorização da função de professor cooperante da prática de ensino supervisionada, não lhes sendo atribuídas competências no processo de avaliação dos estagiários e não estando previstas condições para o exercício desta função nomeadamente a redução da componente lectiva;

- A introdução de dois momentos de prova de ingresso – o primeiro momento consubstanciado em portaria própria, que prevê uma prova de português e matemática, para admissão ao curso de licenciatura em educação básica; o segundo momento, com uma prova prevista para ingresso no ciclo de estudos conducente ao grau de mestre. No caso específico desta prova, no período de transição entre a licenciatura e o mestrado, grau exigido para a profissionalização, a FENPROF exige que o MEC esclareça quais as soluções que prevê para quem possa vir a não obter avaliação positiva e, portanto, fique impedido de completar o processo normal de formação inicial em educação básica.

A formação contínua de docentes tem de ser considerada como fator de valorização pessoal e profissional e deve compatibilizar o desenvolvimento do docente com o do sistema educativo no seu conjunto.

Nesse sentido, a FENPROF reafirma o princípio de que a formação contínua é um dever e um direito. Direito de todos os professores que se traduz na salvaguarda de condições adequadas à sua realização, incluindo a gratuidade, espaços e tempos de formação próprios e dispensa da componente letiva para a sua realização, entre outras.

Para a FENPROF, é responsabilidade do Estado garantir a qualidade dos cursos ministrados em todas as instituições que formam professores, públicas ou privadas, pelo que recusa uma iníqua prova de acesso à profissão como alegada condição de garantia da qualidade, já que é a montante que esta tem que ser garantida. No que à formação contínua de professores diz respeito, a FENPROF tem denunciado os sucessivos bloqueios a que tem estado sujeita: cortes no financiamento, exiguidade de recursos humanos e materiais, redução e concentração dos centros de formação, imposição, pelo Ministério da Educação, da formação disponibilizada, sobretudo por via das prioridades de financiamento.

Uma gestão democrática e participada

Recusar a municipalização da educação

A FENPROF tem propostas assumidas no domínio da direção e gestão das escolas e agrupamentos. Nesta Conferência, importa referir alguns traços das posições da FENPROF que se relacionam com as condições de participação dos professores na direção e gestão dos agrupamentos de escolas.

O atual modelo de direção e gestão das escolas e agrupamentos não é reformável. Importa, portanto, lutar por um outro modelo de direção e gestão das escolas

As escolas precisam de democracia, participação e colegialidade na sua direção e gestão.

Este princípio exige um órgão colegial de gestão eleito pelos professores e educadores, pelos trabalhadores não docentes e por representantes dos pais e dos alunos, neste caso do ensino secundário e da educação de adultos. A participação qualificada de todos os intervenientes da comunidade educativa exige a existência de um órgão de composição alargada dotado de reais poderes de direção que funcione em plenário e em secções – uma secção técnico-científica, composta exclusivamente por docentes e outra secção sócio/educativa com participação dos pais e da comunidade.

Uma efetiva participação dos professores na vida das escolas e agrupamentos exige, desde logo, a eleição direta de todos os responsáveis e/ou coordenadores de estabelecimentos e de estruturas intermédias.

Neste domínio do funcionamento das estruturas intermédias de gestão, a FENPROF exige que, nos agrupamentos de escolas, o crédito global de horas seja calculado na base de uma fórmula que inclua também o número de turmas do 1º Ciclo do Ensino Básico.

O que existe hoje nos agrupamentos de escolas é um órgão unipessoal de gestão selecionado [e não eleito] por processos onde os poderes políticos locais pesam quase sempre mais do que a vontade da comunidade escolar. Os coordenadores de estabelecimento são nomeados e os responsáveis pelas estruturas intermédias são, na prática, igualmente nomeados uma vez que o processo se inicia com uma seleção prévia pelo diretor.

O atual modelo de administração das escolas alcançou plenamente um dos seus primeiros e mais nefastos objetivos – afastar os professores dos processos de decisão na direção e na gestão. O processo de seleção do diretor, a nomeação do subdiretor, dos adjuntos e dos responsáveis pelas estruturas intermédias, a obsessiva centralização de poderes no diretor, a composição do conselho geral e a menorização do seu papel, a infindável regulamentação por parte do MEC de todos os aspetos da vida das escolas e a sufocante burocracia criaram as condições para esse afastamento. No caso do 1º Ciclo do Ensino Básico esse afastamento é ainda mais evidente. As escolas deste setor de ensino estão colocadas numa situação completamente periférica. Em muitas situações, a escola sede do agrupamento é a antiga delegação escolar e a participação dos professores do 1º Ciclo do Ensino Básico é praticamente inexistente, sobretudo após as limitações estabelecidas pelo Despacho 7/2013 quanto ao número de adjuntos do 1º CEB e Educação Pré-Escolar.

Para esta situação contribuem certamente razões históricas – o fim da gestão democrática no ensino primário/1º Ciclo a partir de 1976 – mas, num tempo mais recente, sucessivos governos fizeram o resto com a imposição de modelos de direção e gestão recusados pelos professores.   

O governo não para de falar de autonomia, mas a verdade é que as escolas e agrupamentos são governados de fora – a partir da estrutura político-administrativa do MEC e também a partir dos poderes políticos locais. Às escolas e agrupamentos está conferido “o poder” de executar o que externamente é decidido. Aliás, sempre que o governo avança e refina no discurso sobre a autonomia [por exemplo, com os ditos contratos de autonomia], dá, simultaneamente, mais um passo normativo ou de controlo sobre o funcionamento e a vida das escolas.

Recentemente, o governo veio acrescentar mais umas páginas ao discurso sobre a autonomia das escolas, mas continua a centrar no aparelho político-administrativo, entre outras, as decisões sobre o número de turmas de cada escola, o número de alunos por turma em todas as escolas do país, a organização dos apoios aos alunos com necessidades educativas especiais ou dificuldades de aprendizagem e quais as escolas do 1º CEB a encerrar.

As escolas e os professores precisam de menos burocracia. Hoje, de forma intolerável, boa parte da atividade docente é preenchida por inúteis formalismos burocráticos e por tarefas que assistentes administrativos e operacionais, em falta nas escolas, podiam e deviam desempenhar.

Há muitos anos que a FENPROF defende o desenvolvimento de um processo de descentralização na área da Educação. Uma verdadeira descentralização exige a criação de órgãos de administração educativa a nível local - estruturas de participação alargada da comunidade educativa local, tendo em vista a territorialização das políticas educativas e a gestão integrada dos recursos. Para estes Conselhos Locais de Educação, devem ser transferidas competências do poder central, nomeadamente as relativas à organização da rede escolar, à definição de componentes curriculares locais, à ocupação de tempos livres ou à criação de cursos do ensino secundário. Esta transferência de competências para os Conselhos Locais de Educação tem, necessariamente, de ser acompanhada dos recursos necessários para o seu exercício.

O governo do PSD e do CDS ensaia caminho diferente – transferir para as autarquias e para as Comissões Intermunicipais todas as responsabilidades com o ensino básico, a educação pré-escolar o ensino secundário, com os exclusivos objetivos de alijar responsabilidades e continuar a abrir caminho para a privatização da educação.

A FENPROF sempre recusou e continuará a recusar que as matérias relacionadas com o exercício da profissão docente, nomeadamente salários, concursos, avaliação do desempenho, poder disciplinar, organização e funcionamento das escolas, sejam transferidas para os municípios.

O que se passa hoje, em muitos concelhos do país, com as AEC bastaria para os professores afirmarem a sua oposição a este processo: subfinanciamento crónico, atraso na transferência de verbas do poder central para o poder local, atraso no pagamento de salários aos docentes, precariedade extrema e miseráveis salários, entrega daquelas atividades a empresas privadas. Se outras razões não existissem, estas situações, hoje vividas com as AEC, servirão para os professores e educadores portugueses recusarem as soluções de municipalização da educação avançadas pelo governo.

No passado, diversos governos tentaram impor a municipalização da Educação. Contaram com a firme oposição e a luta dos professores.

Na Primeira República, em 1983 e em 1985 os professores e educadores portugueses souberam, pela luta, contrariar tal caminho. Em novembro de 1983, o Orçamento de Estado previa que, no início do ano seguinte, fossem transferidas para as autarquias “todas as competências no respeitante à educação pré-escolar e ao ensino primário, incluindo os vencimentos e a ação disciplinar”. A reação dos professores e a ação da FENPROF levou a que o artigo 43º do OE’83 fosse alterado na Assembleia da República. Em 1985, o Governo faz nova tentativa também derrotada, nomeadamente, com a realização de uma greve com quase todas as escolas encerradas.

A 4ª Conferência Nacional do 1º Ciclo do Ensino Básico


Aditamento 

Pelo reforço da autonomia e da democracia
nas escolas da R.A. Madeira

A escola do 1ºCEB, na Região Autónoma da Madeira, confunde-se com o modelo de Escola a Tempo Inteiro (ETI), já que, desde o ano letivo 95/96, o modelo de ETI foi, paulatinamente, sendo introduzido como um modelo acabado, a adotar a todas as escolas do 1º CEB. Primeiro como um modelo experimental; depois, sem que tivesse acontecido uma avaliação consistente e imparcial, como um modelo extensivo a todas as escolas. As escolas foram sendo reestruturadas, de forma a reunirem o mínimo de condições para que este modelo pudesse ser implementado.

Este modelo assumiu-se como uma alternativa pedagógica e social e como forma de responder aos desafios que se colocavam na altura, indo ao encontro das necessidades sociais das famílias porque, supostamente, impulsionava a criação de condições que contribuíam para a igualdade de oportunidades de acesso e sucesso escolares, mediante a superação de desigualdades económicas, sociais e culturais.

Um modelo que conjuga, para além das atividades curriculares (AC), atividades de enriquecimento curricular (AEC) e atividades de OTL, sendo que estas últimas foram adquirindo, sucessivamente, um caráter obrigatório, escolarizado e rotineiro, adulterando a filosofia de base com que haviam sido criadas. Acresce dizer que mesmo as OTL’s e as refeições fornecidas pela escola tiveram, desde sempre, um caráter totalmente gratuito o que teve como consequência inevitável a hipervalorização da função do apoio social às famílias em detrimento da função educativa, didática e pedagógica aos alunos. Só a asfixia financeira conduziu ao desenvolvimento de estratégias sub-reptícias por parte do governo no sentido de aligeirar as suas responsabilidades efetivas no modelo de ETI que ele próprio criou.

Por outro lado, não se aplicando as escolas do 1º CEB um modelo de gestão democrática, digna deste nome, as delegações escolares funcionam ainda como órgãos intermédios da administração educativa regional, não eleitos e condicionadores/redutores de uma efetiva autonomia dos Conselhos Escolares.

Urge, pois, repensar a Escola do 1º CEB na Região Autónoma da Madeira, numa perspetiva estruturada e estruturante em que a ação pedagógica se constitua como o principal fundamento de uma ESCOLA PÚBLICA de qualidade, INCLUSIVA e, verdadeiramente para TODOS.

Assim, a 4ª Conferência Nacional do 1º CEB defende e reivindica:

1. 
Reforço da autonomia democrática das Escolas, não apenas do ponto de vista pedagógico mas também financeiro com a consequente extinção das delegações escolares.

2. 
Avaliação do modelo ETI por uma entidade externa e independente da Administração Educativa com a participação das escolas e da comunidade educativa.

3. 
Organização da oferta extracurricular e das OTL’s por forma a responderem às especificidades de cada escola e respetivos projetos educativos, de forma contextualizada e articulada com as comunidades locais, aproveitando as potencialidades dos recursos existentes e respondendo, da melhor forma possível, aos interesses e aptidões dos alunos.

4. 
Organização dos horários de acordo com as condições físicas de cada escola, tentando sempre que possível que as atividades curriculares se realizem no turno da manhã.

5. 
Reavaliação dos fundamentos e da filosofia de base com que foi criada a Liga de Pais, assumindo-se esta como um órgão de participação democrática na vida das escolas. 

Nos Açores

Sobre a experiência dos Açores, uma pequena nota de partilha. Em 2007, é publicado o Despacho n.º 130/2007, que cria o projeto “Interciclos”, na Escola Básica Integrada das Flores e ao qual aderem outras escolas da Região. O projeto teve uma vida curta, dois anos, essencialmente devido aos custos associados ao regime de pluridocência que instituía, pois os professores do 1º Ciclo lecionavam as disciplinas de Português, Matemática e Estudo do Meio, ficando as Áreas das Expressões, Educação Física, Inglês e TIC, a cargo de outros docentes. Os professores do 1º Ciclo cumpriam um horário de 25 horas em apoios noutras turmas e nas áreas curriculares não disciplinares.

Lamentavelmente, o projeto não se concretizou nos 4 anos do ciclo de ensino, por razões económicas, e nunca foi avaliado.

Atualmente o número máximo de alunos por turma é de 23, tendo os docentes um horário de 26 horas, cujas 25 são letivas (onde se incluem intervalos) e uma de estabelecimento para atendimento aos pais/encarregados de educação.

A Expressão Físico-Motora é lecionada em coadjuvação com um docente especializado na área, docente do grupo 260.

Em algumas unidades orgânicas, dependendo dos recursos humanos das escolas, as outras áreas das expressões - Expressão Musical, Expressão Plástica e Expressão Dramática - são lecionadas em par pedagógico, com docentes especializados do 2ºCEB ou do ensino secundário.

O Inglês é parte integrante do currículo, com 2 tempos semanais de 45 minutos, acrescidos às 25 horas letivas dos alunos, lecionados por docentes especializados.

Os Açores mantêm uma gestão democrática nas escolas (baseada no Decreto-Lei n.º 115-A/98) sendo os órgãos eleitos democraticamente e colegialmente por um período de 3 anos: Assembleia de escola, Conselho Executivo, Coordenadores de Departamentos, Coordenadores de Núcleo e Encarregados de Estabelecimento.

Para além das exigências de âmbito nacional para o 1º CEB, essencialmente a uniformização de horários, reduções da componente letiva, reivindica-se que todas as experiências pedagógicas a realizar neste setor, exemplo do projeto Inter-Ciclos, tenham, pelo menos, a duração do respetivo ciclo de ensino e sejam objeto de avaliação e reflexão por toda a comunidade educativa.

Uma vez que as expressões musical, dramática e plástica, lecionadas por docentes especializados, estão dependentes dos recursos disponíveis em cada unidade orgânica, exige-se que a tutela uniformize esta oferta e, assim, possa colmatar as desigualdades que existem entre as escolas, permitindo um sistema educativo regional igual para todos!

Para um trabalho pedagogicamente adequado
bem como um novo regime de docência no EPE

1) O Ensino Português no Estrangeiro, sendo um subsistema especial de educação, reveste-se de caraterísticas específicas que não se compadecem com as medidas preconizadas pela tutela. A heterogeneidade das turmas leva a uma dispersão em termos da prática letiva. É uma situação que poderá ser perfeitamente ultrapassada com a introdução do par pedagógico ou a implementação da figura de coadjuvação, bem como a atribuição de tempos letivos que contemplem a especificidade dos ritmos de aprendizagem dos alunos dado o caráter específico do ensino da língua.

2) No domínio específico da introdução de uma propina a pagar pelas famílias, estabeleceu-se um regime de exceção verificável em diversos países, o que vem criar fraturas e tratamento desigual para com os alunos que residem nos países onde este subsistema está implantado. A tutela não soube acautelar o facto de ter acordos prévios estabelecidos com as autoridades nacionais, o que dificultou a implementação da medida, já de si odiosa, mas que cada vez mais vai levando ao abandono dos lusodescendentes do ensino da língua portuguesa.

3) Uma política cega de obrigatoriedade de aplicação de exames é, em si própria, uma medida que mais não representa que um propósito camuflado de controlar o trabalho dos professores ao exigir a prestação de provas/exames mesmo para os alunos que, no seu percurso de aprendizagem, avançam de nível de proficiência linguística. O exame mais não é que um artefacto, dado que a real intenção é a do controlo do trabalho desenvolvido pelos professores. O que se exige é uma real autonomia pedagógica do ensino conferindo ao professor o papel e o respeito que lhe é devido.

4) Luta-se por uma real e efetiva promoção da formação contínua e não a prática institucionalizada da formação à distância. Promessa da tutela como medida justificativa da propina, mas que, até hoje não passou da fase inicial: a promessa.

5) Vive-se um momento massivo de imigração com as atuais convulsões sociais, culturais, científicas e tecnológicas, tudo é exigido aos professores que, apesar do seu empenhamento e flexibilidade de adaptação aos novos tempos, ficam asfixiados nas suas perspetivas de acompanhamento da evolução ao serem vítimas de cortes brutais operados nos seus salários o que o os inibe de investirem em novas tecnologias e na aquisição de materiais de apoio à prática letiva, dado que a tutela não lhes proporciona rigorosamente nada.