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Concentração do ensino artístico especializado, junto ao MEC, na "5 de outubro"

"Um país sem cultura é uma árvore sem raízes"

10 de setembro, 2015

"Um país sem cultura é uma árvore sem raízes" - esta foi uma das notas salientes da concentração do ensino artístico especializado, que decorreu no passado dia 18 de setembro, entre as 11h00 e as 14h00, junto às instalações do MEC na placa central da "5 de Outubro", em Lisboa.

Depois de uma conferência de imprensa realizada na passada quarta-feira, na Academia de Música de Almada (polo da Sobreda), a grave situação que se está a viver no ensino artístico especializado - autêntica asfixia motivada pelos cortes impostos pelo governo -  voltou à rua para um criativo protesto que mobilizou centenas de pessoas, entre alunos, pais e encarregados de educação, técnicos, docentes, sindicalistas e outros cidadãos em solidariedade com esta luta. Chegaram à "5 de Outubro" representantes de conservatórios, escolas e academias de praticamente todas as regiões do país.

Os manifestantes empunhavam cartazes onde se liam expressões como "O professor Nuno Crato chumbou nas provas de aptidão musical" ou "Ensino artístico... mas só para alguns" ou ainda "Sem música não há felicidade"  e "Desistir agora? Nunca!"

Da parte do Ministério não houve "agenda" para receber uma delegação dos manifestantes. 

Alunos e professores de fora...

A poucas semanas do início das aulas, como alertou Mário Nogueira em declarações às equipas de reportagem presentes na "5 de Outubro", os resultados provisórios das candidaturas ao financiamento revelaram que milhares de alunos deixarão de ser financiados (7 586 alunos afastados), podendo levar ao despedimento algumas centenas de professores em todo o país (ou à redução do seu horário na ordem dos 30%, com correspondente impacto salarial) e gorando as legítimas expetativas de encarregados de educação e alunos, que, na maioria dos casos, serão forçados a desistir.

Além disso, os critérios para atribuição de verbas às escolas não foram claros e não respeitaram nem a continuidade do percurso escolar, nem a sustentabilidade e estabilidade das escolas. Esta realidade, ilustrada pelas situações concretas que se vivem em um pouco por todo o país, foi abordada nos depoimentos prestados por docentes, alunos, pais e encarregados de educações e diretores de diferentes escolas.

As palavras, os cartazes, a música e a dança foram as expressões de um protesto de três horas, que deixou um duplo desafio ao MEC de Nuno Crato: 

  • "Honrem os compromissos que assumiram, garantindo que todos os alunos financiados no ano letivo transato, quer no ensino articulado, quer no supletivo, manterão a possibilidade de terminar a sua formação musical nas condições que vigoravam aquando do seu começo. Nesse sentido, é essencial que as escolas possam, no mínimo, manter o número de alunos de 2014/2015";
     
  • "Sendo estes resultados provisórios (as listas definitivas do financiamento apenas serão conhecidas a 28 de setembro), incitamos o MEC a alterá-los, sensibilizando-o para a necessidade de preservação do ensino artístico, que é um importante pilar na educação dos jovens do nosso país, que estarão assim mais preparados para se assumirem como cidadãos capazes de garantirem o futuro de Portugal."

Palavras solidárias

Excelentes intérpretes de piano, de violino, de violoncelo e de viola (com o canto "clássico" representado por Conceição Sousa) deram o ritmo e a harmonia a um protesto enriquecido também pelas palavras solidárias de representantes do Bloco de Esquerda, do PCP e do Partido Livre.

"Não podemos aceitar que retirem o ensino artístico da escola pública", realçou Catarina Martins, do BE. "Isso é tão absurdo como retirar a matemática ou as ciências dos percursos de aprendizagem", acrescentou. 

"Os cortes anunciados, nomeadamente ao nível da iniciação, mostram que este governo quer cortar o ensino artístico pela raíz. Afinal, o que eles pretendem é que só entre quem tem dinheiro para pagar...". 

"O ensino artístico deve estar contemplado no Orçamento de Estado", sublinhou Catarina Martins, que chamou a atenção para a importância da solidariedade com os professores, os alunos e as famílias.

Rita Rato, do PCP, deixou uma saudação especial aos representantes das escolas que tiveram de fazer centenas de quilómetros para participarem nesta ação de luta e protesto em Lisboa. "São quilómetros que vale a pena fazer em defesa do ensino artístico especializado, em defesa da educação e da cultura".

A deputada comunista apontou a necessidade de um "financiamento que garanta dignidade" e recordou a importância da resposta oferecida por estas escolas nas diferentes regiões do país, em particular no interior.

Rita Rato saudou ainda a decisão das escolas, alunos, professores, pais e encarregados de educação, no sentido da participação nestas e noutras ações de protesto e luta, em defesa dum direito fundamental - o direito à educação.

Rui Tavares, do LIVRE/Tempo de Avançar, recordou "o país que sonhámos em 25 de Abril," destacando a força da unidade nesta luta do ensino artístico especializado. "Estamos todos juntos!".

O dirigente do LIVRE referiu, noutra passagem, que "é incompreensível que este governo, que tanto tem apostado na privatização da educação, com o apoio tão expressivo aos colégios privados, tenha criado esta situação tão grave, de asfixia financeira, ao ensino artístico especializado". Rui Tavares falou ainda da qualidade da formação e das brilhantes carreiras internacionais de vários músicos e bailarinos que começaram o seu percurso no ensino artístico especializado em Portugal.

Exigência de outras políticas
também para a cultura

Ao longo da concentração registaram-se ainda as breves intervenções de Alexandre Delgado, compositor, instrumentista e docente da Academia de Música "Amigos das Crianças" e Joana Raposo, diretora do Conservatório de Minde ("vivemos tempos difíceis", "custa muito tomar medidas que atingem as pessoas").

O "Manifesto em defesa da Cultura" também esteve representado nesta ação. Pedro Penilo lembrou que o ensino artístico é um pilar fundamental da cultura e uma garantia da sua democratização.

As forças da cultura, sublinhou, devem dar um sinal forte e claro de exigência de outras políticas para o setor. Lembrou, a propósito, a reivindicação de 1 por cento do PIB para a cultura.

Porque "o sonho comanda a vida"...

Ponto alto desta concentração foi a atuação de um coro e de uma orquestra que, sob a direção do maestro Vitorino de Almeida, interpretaram "Acordai" (F. Lopes-Graça/José Gomes Ferreira), estando também em "palco" duas alunas da Academia de Dança Contemporânea de Setúbal, numa interessante coreografia. Expressivas foram também as palavras de ordem ouvidas logo a seguir: "O povo unido jamais será vencido!" e "As artes unidas jamais serão vencidas!".

A concentração terminou com uma breve intervenção de Mário Nogueira e com a entoação, por todos os participantes, da "Pedra Filosofal", de António Gedeão, que deixaram assim na "5 de Outubro" uma mensagem final repleta de atualidade:
Porque "o sonho comanda a vida", vamos todos defender o ensino artístico especializado!
/ JPO

 

Mário Nogueira: "Para este Governo basta o ler, escrever e contar"

Por um novo modelo de financiamento, pelo direito à estabilidade, pelo direito ao ensino

7 586 alunos afastados do ensino artístico especializado!

À espera do 28 de setembro...

JN: Professores e alunos protestam contra cortes no ensino artístico

RTP: Cortes de verbas motivam protesto

TVI: Corte de verbas motiva manifestação

SIC: Protesto contra cortes

Reportagem da conferência de imprensa de 16/09, na Sobreda (Almada)