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Romper o Cerco

Moção Global apresentada por Ana Paula Amaral (1ª subscritora)

16 de fevereiro, 2007

ROMPER O CERCO

Documento apresentado nos termos do Artº 9º, 2. b) do Regulamento do Congresso, por professores sindicalizados.

Primeiro Subscritor: Ana Paula Amaral - SPGL

 

Em que situação se encontram a Escola e os seus profissionais?

 

- Professores contratados directamente pelas escolas, com total desrespeito pela lista graduada nacional;

- Professores a trabalharem, a recibo verde, contratados por empresas privadas;

- Milhares de colegas contratados continuam em situação precária, muitos com mais de 10 e 15 anos de serviço;

- Aumento do horário e trabalho lectivo;

- Congelamento da progressão na carreira;

- Anúncio da existência de 20 mil professores ?excedentários? nos Ensinos Básico e Secundário, dos Quadros de Zona Pedagógica, e previsão do despedimento de 4 mil contratados;

- Ameaça de despedimento de quase 2 mil docentes no Ensino superior, em consequência dos cortes orçamentais e da implementação do Processo de Bolonha;

- Abaixamento em 10% dos salários reais dos professores, nos últimos 8 anos (tal como os restantes funcionários públi­cos);

- Aumento da idade e do número de anos de trabalho necessários para a aposentação;

- Destruição do Estatuto da Carreira Docente, para dar lugar a um regime jurídico que só permite o acesso de 30% à categoria de ?professor titular?;

- Fomento do individualismo e da ?competitividade?;

- Fecho de centenas de escolas, em particular de escolas do 1º Ciclo, sobretudo nas aldeias e zonas do interior, no quadro de um plano para encerrar 4500;

- Campanha pública de descrédito do conjunto dos professores, considerados como os bodes expiatórios de tudo o que de mau se passa nas escolas.

Eis um retrato do corpo docente e da situação nas escolas portuguesas que, ainda há poucos anos, podiam trabalhar num quadro de cooperação, com base numa gestão democrática decorrente de Con­selhos Escolares (no 1º Ciclo e nos Jardins-de-infância) e de Conselhos Directivos e Pedagógicos (nos Ensinos básico e secun­dário).

Como foi possível chegar a este estado de coisas?

Para onde se caminha?

Como romper o cerco onde fomos metidos?

 

Um processo de destruição da Escola pública e dos seus profissionais

Baixar os gastos com a Educação ? à custa da redução do número de professores e do abaixamento dos seus salários ? é um objectivo do Governo, para cumprir a exigência de redução do défice do Orça­mento do Estado, imposta pela Comissão Europeia.

Mas, destruir o Estatuto da Carreira Docente (ECD) visa mais objectivos. Se olharmos para a situação de trabalho precário e desregulamentado que tende a generalizar-se em todos os locais?? em nome da competitividade e do aumento da taxa de exploração ? poderemos prever o sentido das políticas contra os professores. Poderemos prever a gravidade das conse­quências de uma soma de docentes indivi­dualizados, acríticos, disciplinados pelo medo de uma avaliação negativa, em relação à sua capacidade de encontrar e pôr em prática respostas educativas coerentes, como o exige a população escolar.

Poderemos prever como será mais fácil aos Conselhos Executivos impor as políticas de privatização, de destruição dos currí­culos, de desmantelamento do Ensino público.

Não será para isto que se caminha, quando é privatizada uma parte do currículo nacional do 1º Ciclo, entregando as respectivas disciplinas a empresas privadas contratadas pelas autarquias?

Não será isto que está a ser preparado também no 2º Ciclo, quando se anuncia que o ?tronco fundamental? das disciplinas será da responsabilidade de um único professor-tutor (a ser coadjuvado nas restantes por outros), ou se obriga os professores dos 2º e 3º Ciclos e Ensino Secundário a garantirem ?aulas de substituição? em áreas que nada têm a ver com as disciplinas que leccionam?

Não terá toda esta política a ver com o compromisso assumido pelo Governo português ? em conjunto com outros governos da União Europeia ? de substituir os programas e o currículo nacional por um conjunto de ?competências-chave?, no âmbito do Quadro Comum Europeu de Competências?

Não implica esta política um processo de destruição da qualificação do ensino e da coesão nacional ? e, por aí mesmo, avançar na destruição da nação portu­guesa?

Destruir o Sistema de ensino, para destruir a nação portuguesa, no mesmo processo de desmantelamento de todos os serviços públicos e da organização do Estado onde estão integrados.

O processo de destruição da carreira docente, condição necessária para desman­telar a Escola pública, integra-se no processo geral de desmantelamento dos serviços públicos e de ataque aos seus trabalhadores, no quadro da aplicação do Plano de Reestruturação da Administração Central do Estado (PRACE), da Lei da Mobilidade e de uma nova lei que está na forja, que visa retirar o vínculo a todos os funcionários públicos, de acordo com o Parecer da Comissão para a Revisão do Sistema de Carreiras e Remunerações da Função Pública.

Trata-se de uma ofensiva geral ? que está a ser levada à prática em todos os países da União Europeia ? com o epicentro nas directivas emanadas da Comissão Europeia.

 

Uma política que vem de longe, que tem uma linha de continuidade

Há 3 anos ? aquando da realização do nosso VIII Congresso ? a moção global subscrita pela direcção da FENPROF denunciou as políticas do governo de Durão Barroso, que iam da imposição de Agrupa­mentos de escolas à municipalização do ensino, bem como da revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo à ameaça de um novo Estatuto da Carreira Docente.

Nesse Congresso, foi apresentada outra moção global ? subscrita por mais de 200 sindicalizados ? que analisava a mesma política, mas a relacionava com as exigên­cias da União Europeia, e defendia que a FENPROF propusesse uma acção unida com todas as outras organizações sindicais da Administração pública e se dirigisse publicamente às Centrais sindicais, para que fosse organizado um plano de acção conjunto capaz de unir todos os trabalha­dores para derrotar a política emanada de Bruxelas. O Congresso recusou esta moção global.

Os delegados que tinham sido eleitos com base nesta moção global ? em conjunto com muitos outros presentes no VIII Congresso ? propuseram, numa moção sectorial, a exigência de revogação do Dec.-lei nº 115/98 e da Lei nº 24 /99 de 22 de Abril, para acabar de vez com o processo de agrupamento de escolas construído sobre uma matriz que a FENPROF vinha denun­ciando.

O Congresso não aceitou aprovar a exigência da revogação dessa legislação, e os agrupamentos de escolas continuaram a ser implementados.

Passado um ano, constituiu-se o governo de Sócrates que se propôs levar ainda mais longe, e de forma mais célere, os planos de Bruxelas.

A actual Ministra da Educação apoiou-se nesses agrupamentos e nos seus Con­selhos Executivos para poder impor aos professores ??através dos Despachos 17387 e 16795, publicados em 2005 ??o aumento do horário de trabalho dos professores do 1º Ciclo e dos educadores de infância, bem como as ?aulas de substituição? nos 2º e 3º Ciclos e (neste ano lectivo) também do Ensino Secundário, preparando a poliva­lência de funções dos docentes e a criação do ?ensino das competências? em lugar dos programas nacionais.

 

Não é por falta de mobilização dos professores que estamos nesta situação

 

Muitos milhares de professores e educadores participaram em mobilizações fortíssimas, aspirando à revogação dos Despachos de ?regulamentação da com­ponente não lectiva?.

A direcção da FENPROF ? nunca assu­mindo a exigência dessa revogação ? pediu a sua ?suspensão? e negociação?.

Entretanto, os Despachos continuaram a ser implementados.

Em seguida, a Ministra da Educação apresentou um projecto de ?Estatuto da Carreira Docente?, que os dirigentes de todas as organizações sindicais dos pro­fesso­res consideraram tratar-se de um dispositivo para destruir a carreira pro­fissional dos docentes.

Dezenas de milhar de professores e educadores encheram a Avenida da Liber­dade e o Rossio, em Lisboa, exigindo a retirada desse projecto.

No seguimento desta mobilização, as escolas paralisaram a nível nacional.

E, no entanto, as direcções sindicais da FENPROF jamais exigiram esta retirada. Jamais assumiram a defesa do ECD exis­tente, antes exigindo ?negociar, negociar, negociar?? a proposta de ECD da Ministra.

O resultado desta ?negociação? está à vista: a publicação do ataque central aos professores, com a designação de ?Regime jurídico da carreira docente?.

Agora, para que este ?regime? seja aplicado, terá ainda que ser ?regula­mentado?.

E, de novo, as direcções sindicais se sentam à mesa do Ministério da Educação, para regulamentar a ofensiva destruidora do Estatuto da Carreira Docente.

O que vão ganhar a FENPROF e os professores com esta ?regulamentação??

 

O que fazer? Como romper o cerco?

 

A experiência já mostrou para que serviu não exigir a revogação do Dec.-lei e da Lei da Assembleia da República que institu­cionalizaram a chamada ?autonomia? das escolas e dos agrupamentos. Para que serviu aconselhar os professores a candidatarem-se para os Conselhos Executivos (como o fez a FENPROF), em nome da demo­cratização dos mesmos.

A experiência já mostrou para que serviu não exigir a retirada do Dec.-lei dos Quadros e Concursos, cuja primeira versão foi da autoria dos governos de Durão Barroso e de Santana Lopes; tal como o mostrou o facto de não ter sido dada uma continuidade à mobilização nacional para exigir a revogação dos despachos que instituíram o aumento do horário lectivo, no 1º Ciclo e jardins-de-infância, e a exigência das aulas de substituição nos outros graus de ensino.

Não foi a aplicação de todas estas medidas ? num quadro de continuidade assumido pelos sucessivos governos, todos subordinados às directivas da UE, ao mesmo tempo que os professores e educadores iam ficando desarmados, sem uma linha de orientação para uma resistência firme e lúcida ? que levou ao constante desconten­tamento dos professores com os seus sindicatos, a começar pelos nossos? 

Sobre este plano ? e num quadro de uma campanha mediática contra os professores e contra os funcionários públicos ?, o Governo achou reunidas as condições para fazer um salto qualitativo na aplicação das suas medidas, através do novo Regime Jurídico da Carreira Docente, para liquidar o nosso ECD.

Jamais exigindo a sua retirada, reivin­dicando antes a negociação do golpe que se prepara, nunca colocando o processo de destruição dos serviços públicos e do Estado Nacional ? e, portanto, da necessidade de uma acção em comum, a começar pelos outros trabalhadores imprescindíveis nas escolas (os auxiliares da acção educativa) ?, eis a situação de armadilha a que se chegou.

A experiência mostra que o caminho para obrigar o Governo a recuar não passa por negociações de pacotes de ataques, passa pela mobilização unida dos pro­fessores e dos outros trabalhadores da Educação, na base das nossas reivin­dicações, assegurando neste processo a independência e  o reforço dos nossos sindicatos.

É assim que, em consequência, os professores e educadores abaixo assinados ? conscientes da gravidade e da comple­xidade da situação para os docentes e para os seus sindicatos ? consideram que o IX Congresso da FENPROF deve aprovar o seguinte:

- Retirada do novo Regime Jurídico da Carreira Docente dos educadores e pro­fessores dos Ensinos Básico e Secundário. Abandono da mesa das negociações para a ?regulamentação? deste Regime, rejeitado massivamente pelos professores. Retoma do ECD;

- Revogação dos despachos 17387 e 16795 de 2005, que aumentam o horário de trabalho e criam as aulas de substituição;

- Revogação da Lei dos Quadros e Concursos de Durão Barroso. Reposição do concurso anual e nacional, com total respeito pela lista graduada nacional;

- Revogação dos decretos e leis da ?autonomia das escolas?. Reorganização das escolas, com base na gestão democrática assente nos Conselhos Directivos e nos Conselhos Escolares;

- Reorganização das equipas de ensino especial;

- Revogação dos Despachos que insti­tuíram a passagem das actividades de Expressão Artística e Educação Física, da Música e do ensino da disciplina de Inglês para a responsabilidade de empresas privadas contratadas pelas autarquias. Manutenção destas disciplinas no currículo nacional, asseguradas por professores colocados pelo ME;

- Defesa de todos os postos de trabalho ameaçados pelo fecho de milhares de escolas. Defesa do direito das crianças a terem uma escola perto da sua área de residência. Fim ao encerramento de escolas;

- Apelo aos professores e educadores para que se reúnam, por toda a parte, para debaterem a situação e encontrarem formas de acção que levem à organização da resistência e mobilização, que ponha um travão nos ataques e leve à retirada do novo Regime Jurídico da Carreira Docente dos educadores e professores, bem como de todas as leis e despachos contra a Escola Pública;

- Apelo às direcções das Centrais sindicais para que concertem um plano de mobilização nacional que imponha a retirada das reformas do Estado ? nomea­damente do PRACE e da Lei da Mobilidade ? de forma a serem devidamente asse­gurados todos os serviços públicos consi­gna­dos na Constituição da República.