Nacional
Mário Nogueira no encerramento do encontro de Coimbra:

"O papel dos professores e das suas organizações de classe é insubstituível"

08 de outubro, 2016
Nada substitui um bom professor, foi hoje aqui repetido! Podem querer subestimar-nos, desvalorizar-nos profissional e socialmente, substituir-nos… podem tentar tudo que nunca conseguirão apagar os professores do mapa das sociedades que se querem desenvolvidas e de progresso, porque as escolas nunca serão apagadas desse mapa. 
O papel dos professores e das suas organizações de classe, de que a FENPROF se orgulha de ser a mais representativa em Portugal, é insubstituível e porque o sabemos, não desistiremos de exigir o respeito que a nossa profissão merece, o reconhecimento que lhe é devido e que aos professores seja dado o valor que, em todos os domínios (profissional, social, laboral ou material) o seu importante papel justifica. 
Este ano, em todo o mundo, o Dia Mundial dos Professores assinalou-se sob o lema “Valorizar os professores; Melhorar a sua condição profissional”, uma consigna de grande importância e atualidade, tendo em conta o tempo que vivemos.
Em Portugal, os professores têm sido bodes-expiatórios do que corre mal no sistema educativo e na vida das escolas. Há insucesso, a culpa é dos professores que não sabem ensinar; há abandono, então, como alguém responsável acusava, é porque, antes, os professores abandonaram os seus alunos; faltam apoios a alunos com NEE, mas diz-se que as suas dificuldades não são superadas porque os professores não desenvolvem estratégias de diferenciação pedagógica no seu desempenho profissional; as escolas dão respostas sociais insuficientes às necessidades dos alunos e suas famílias e logo se culpam os professores por, alegadamente, serem pouco disponíveis; há escolas em que, muitas vezes, faltam professores durante semanas e logo estes são os culpados porque, dizem, mas dizem mal, que estes só querem trabalhar à porta de casa…
Percebe-se a intenção deste discurso que pretende branquear a incompetência, a impreparação, o experimentalismo e também a natureza das opções ideológicas de quem tem a responsabilidade de governar a Educação, mas os professores não podem admitir que a desresponsabilização dos governantes e o branqueamento das suas políticas se façam à custa da injusta culpabilização dos profissionais do setor que são, com toda a certeza, dos menos responsáveis.
O Dia Mundial dos Professores, acontecimento que assinalamos, foi proclamado pela UNESCO em 1993. Frederico Mayor, então Diretor-Geral da organização, declarou que os professores são um grupo profissional fundamental “sem o qual não pode haver nem desenvolvimento durável, nem coesão social, nem paz”. Este reconhecimento continua a constituir um fortíssimo desafio aos professores, pois atribui-lhes elevadíssimas responsabilidades.
A escolha de 5 de outubro não foi um acaso. Foi em 5 de outubro de 1966 que, em Paris, UNESCO e OIT adotaram a Recomendação relativa à condição dos Professores, dando, dessa forma, um passo fundamental para a valorização da profissão docente de uma forma nunca antes assumida. Após 1993, a Recomendação foi consagrada como documento orientador das políticas educativas, no que ao pessoal docente diz respeito, sendo complementada em 1997 por outra Recomendação, esta relativa à situação dos docentes do ensino superior.
A Recomendação aprovada há 50 anos é de uma notável atualidade, parecendo estranho como, há meio século, se falava de um futuro tão distante. A questão, porém, é outra. É que, apesar de reconhecida e alegadamente respeitada pelos diversos estados, na verdade, nestes, mesmo quando o poder político destaca os professores nos discursos oficiais, o que não aconteceu por cá neste Dia Mundial dos Professores, por norma, as práticas não acompanham as palavras ditas. A quantos governantes, membros dos mais diversos governos, não ouvimos dizer que os professores deverão ser respeitados, valorizados, dignificados? Contudo, ao longo dos anos e dos governos não faltaram políticas orientadas precisamente em sentido contrário. Vejamos:
UNESCO e OIT recomendam uma elevada formação de professores; no nosso país, porém, a ausência de políticas nesse sentido levou à criação e aplicação de uma iníqua prova (a PACC) que apenas serviu para afastar alguns milhares do acesso à profissão.
Recomenda-se respeito pela liberdade académica no desempenho profissional dos docentes; o que tem acontecido, contudo, é que a máquina de controlo político, que se estende do ministério ao gabinete de cada diretor, condiciona o exercício dessa liberdade, impondo um modelo único orientado para a estatística e para a promoção de uma escola que favoreça as elites dominantes.
Recomenda-se a criação de boas condições de trabalho aos professores, devendo estes ser libertados das múltiplas tarefas burocráticas a que estão sujeitos; porém, os seus horários são cada vez mais esmagadores, da deliberada confusão entre componente letiva e não letiva resulta uma tremenda sobrecarga de trabalho e as tarefas burocráticas, a par de diversas reuniões de utilidade duvidosa, retiram tempo aos professores para se dedicarem em pleno aos seus alunos.
Recomenda-se, como necessária, a melhoria da situação económica e social dos docentes, para que contribuirão a estabilidade dos vínculos laborais e o acesso a carreiras dignas; ora, os professores sabem bem como lhes tem sido negada esta recomendação, pois, sobre si, continua a abater-se um fortíssimo desemprego, uma elevadíssima taxa de precariedade, na ordem dos 15%, as suas carreiras encontram-se “congeladas” há seis anos, foram-lhes retirados mais de 8 anos de serviço comprovada e zelosamente cumpridos, tendo sido ainda dos grupos profissionais mais castigados pelos cortes salariais e continuando a ser das grandes vítimas da enorme carga fiscal que tarda em ser aliviada.
A existência de medidas de compensação do desgaste profissional é também recomendação que parece esquecida. Um desgaste que resulta do exercício continuado da profissão e se acentuou muito com o reconhecido, mas não resolvido envelhecimento do corpo docente das escolas.
As escolas estão hoje privadas dos mais jovens – são menos de 500 os professores com 30 ou menos anos, isto num universo com mais de cento e dez mil profissionais – e são milhares os que, durante décadas, já deram o melhor de si à escola (e um grande contributo à segurança social), mas continuam impedidos de se aposentar com uma pensão justa e que garanta uma velhice vivida com dignidade. Este é um sério problema de uma profissão que se afirma e consolida na cooperação entre gerações e no encontro das dinâmicas que resultam da criatividade e capacidade inovadora dos jovens com o saber-fazer dos mais experientes; mas é também um problema de uma escola que definha quando não se renova. Um problema cuja resolução a FENPROF manterá no topo das suas exigências junto dos decisores políticos, deixando claro que não irá conter este justo anseio dos professores que, provavelmente, mais cedo do que tarde, voltará a mobilizá-los para voltarem à rua. Refiro-me, obviamente, à indispensável criação de um regime especial de aposentação para os professores.
Colegas,
Estamos ainda no início de um ano letivo em que a colocação de professores foi reconhecidamente mais atempada e limpa de confusões que têm sido habituais. Não houve candidatos desaparecidos, não houve documentos falsificados para favorecer candidatos conhecidos, não houve colocações múltiplas, não se fala de discricionariedade em critérios de seleção fixados por diretores e o ministro não teve de pedir desculpa ao país no dia seguinte a ter garantido estar tudo a correr bem.
Convém assinalar, no entanto, que a falta de problemas maiores nas colocações, não tornou justo o diploma de concursos, pelo que, no processo de revisão que vai iniciar-se este mês seremos firmes na defesa de um concurso único, nacional, em que os candidatos se ordenem pela sua graduação profissional. Queremos acabar com a norma travão para, finalmente, travar uma precariedade que se prolonga anos a fio; não aceitaremos qualquer processo de seleção que se subordine aos interesses e à discricionariedade de quem gostaria de escolher uns e afastar outros, de acordo com as suas preferências, tornando reserva sua uma escola que é de todos.
A já referida ausência de problemas relevantes na colocação de professores não consegue, contudo, disfarçar problemas que continuam a atingir, alguns de forma muito forte, as escolas e os seus profissionais.
Faltam assistentes operacionais, problema grave que continua por resolver e põe em causa a higiene, o acompanhamento, a segurança e todo o apoio que é devido a alunos e professores no espaço escolar.
O 1.º Ciclo continua a ser um mar de problemas, com milhares de turmas onde se misturam alunos de diversos anos de escolaridade, muitas vezes ultrapassando os limites legais de alunos na totalidade e também de alunos com NEE; com AEC a interromperem o normal desenvolvimento da atividade letiva; com uma carga letiva para os docentes que chega a atingir as 27,5 horas semanais; com aulas de inglês que juntam no mesmo espaço, à mesma hora e com o mesmo docente, dois anos de escolaridade em atividade letiva e mais um ou dois em AEC. Estes problemas foram já todos apresentados a responsáveis do ME, antes e agora, mas já se percebeu que continua sem haver vontade política para mudar, pois a mudança tem custos que não se querem suportar. 
A indisciplina na sala de aula é outro problema que está, há muito, sinalizado mas nada que, pelo menos o atenuasse foi ainda feito, nem que fosse, este ano, uma simples e primeira redução do número de alunos por turma. Felizmente, soubemos hoje, a Assembleia da República acaba de dar um passo muito importante para começar a resolver este problema.
Também a insuficiência dos apoios a alunos com necessidades educativas especiais é problema que se mantém, em alguns casos de forma agravada, neste arranque de ano letivo. Manter a atual falta de recursos e continuar a sobrevalorizar, na referenciação, a vertente clínica em detrimento da pedagógica, será pôr em causa o trabalho dos professores, as aprendizagens e o sucesso dos alunos e, ainda, os princípios da educação inclusiva.
Estes são apenas alguns dos problemas que persistem. Escondê-los seria prestar um mau serviço à Escola Pública. A sua resolução exige investimento, é certo, mas essa é opção que o Orçamento do Estado para 2017 não poderá deixar de fazer, depois de anos de corte que depauperaram, e muito, o setor da Educação, sendo que na última Legislatura, o governo do PSD e CDS só teve olhinhos para os colégios privados, como aqui neste concelho de Coimbra nós bem sabemos.
Colegas,
Faltaram ao debate dois partidos: o PSD, que nunca teve agenda; o CDS que deixou ontem de ter agenda. Poderia afirmar que só faz falta quem cá está, mas não é assim. Deveriam vir aqui defender as suas posições junto dos professores e até prestar contas pelos ataques que desferiram à Escola Pública e aos profissionais nos anos em que governaram. Lamento a ausência e não a respeito pois revela um profundo desrespeito pelas centenas de professores aqui presentes e pela maior organização de professores em Portugal, a FENPROF; mas não me surpreendo, pois daqueles de quem não rezará a história não se pode esperar coragem. Esta ausência é a natural forma de agir de quem tem telhados cuja resistência é inferior à do vidro. E será sempre mais simples, nas costas, desferir acusações e ataques à FENPROF e aos seus dirigentes do que, olhos nos olhos, assumir o debate franco, aberto e democrático.
Os dirigentes e delegados, como todos os que se reveem na FENPROF são professores e professoras, homens e mulheres que têm dedicado anos da sua vida à causa da Educação e da Escola Pública e à defesa da profissão, seja ela exercida no público ou privado, resistindo e impedindo uma desvalorização ainda maior, conseguindo, em determinados processos, alguns ganhos que, de outra forma, não seriam obtidos e revelando uma grande entrega à causa que abraçam, não desistindo de reivindicar e lutar mesmo em tempos muito difíceis. 
Foi essa forma de intervir que permitiu, há duas décadas, acabar com a prova de candidatura ao 8.º escalão da carreira, há meia dúzia de anos acabar com a divisão da carreira em professores e titulares e, já este ano, acabar com a PACC, com as BCE ou com o regime de requalificação onde a direita já despejara alguns professores. Será com esta atitude firme e lutadora que obteremos novos resultados, tais como: a aposentação de quantos, ao longo de décadas, deram o melhor de si à escola e aos alunos; a vinculação de quem, há anos, vive uma precariedade que parece não ter fim e a muitos despejou na vala comum do desemprego; a aprovação de um horário de trabalho adequado à vida, profissional e não só, dos professores; o direito à progressão nas carreiras; uma gestão democrática que envolva todos os professores, comprometa toda a comunidade educativa em níveis adequados de participação e assente em princípios como os da elegibilidade, colegialidade democrática e participação. Enquanto a gestão continuar a contemplar a figura do diretor, a autonomia não passará de uma farsa.
Uma última nota para o que ontem aconteceu na Assembleia da República onde foi discutida uma proposta do CDS-PP, visando uma profunda alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo. Tratou-se de uma iniciativa integrada na estratégia da direita de ataque à Escola Pública e defesa de interesses privados que não se resignam com o facto de, finalmente, ter sido posto travão a uma prática que vinha violando a Constituição da República, a Lei de Bases, os direitos de todos os portugueses e os fundamentos de uma Democracia que, apesar de diversas vicissitudes, não perdeu o cheiro a cravo.
É significativo como alguém que diz que a Educação deve viver de consensos avança com uma proposta destas sem antes ter promovido qualquer diálogo, procurando, numa operação relâmpago de menos de uma semana, levar por diante a revisão de uma lei que mereceu um amplo debate e consenso social e político, daí completar 30 anos de hoje a uma semana, mantendo-se em vigor. Podemos até considerar que o debate sobre o Pré-Escolar ou a duração dos ciclos de ensino está atrasado, a questão, porém, é que os principais objetivos da proposta que o CDS apresentou são outros, designadamente considerar público e privado como se fossem uma e a mesma coisa, de prosseguir o processo de municipalização das escolas e dos professores, de abrir as escolas públicas à concessão a privados ou promover a segregação dos que apresentam diferenças relevantes. Não é novo este projeto do CDS, pois os seus aspetos mais negativos já constavam do guião da reforma do Estado aprovado pelo governo anterior. Acontece que, sobre esse governo e os seus guiões já os portugueses se pronunciaram em 4 de outubro do ano passado, daí resultando uma nova maioria que tem assumido a defesa da Escola Pública de matriz democrática.
Neste tempo que continua a ser dos professores, e sem perder de vista a Recomendação que atingiu a bela idade de 50 anos, a FENPROF continuará, firmemente, a defender os direitos e legítimos interesses de todos os professores, e não abdicará de exigir mais verbas para a Educação, em particular para uma Escola Pública que deverá continuar a afirmar-se pela qualidade e diversidade das suas respostas, por ter lugar para todos os alunos, por procurar respeitar os princípios da inclusão e por dever ser gratuita. É essa a matriz da Escola Democrática.
Viva a Escola Pública.
Vivam todos os Professores e Educadores!

Nada substitui um bom professor, foi hoje aqui repetido! Podem querer subestimar-nos, desvalorizar-nos profissional e socialmente, substituir-nos… podem tentar tudo que nunca conseguirão apagar os professores do mapa das sociedades que se querem desenvolvidas e de progresso, porque as escolas nunca serão apagadas desse mapa. 

São palavras de Mário Nogueira na ponta final dos trabalhos do encontro realizado na passada sexta-feira em Coimbra. Aqui fica a intervenção do Secretário Geral da FENPROF:

O papel dos professores e das suas organizações de classe, de que a FENPROF se orgulha de ser a mais representativa em Portugal, é insubstituível e porque o sabemos, não desistiremos de exigir o respeito que a nossa profissão merece, o reconhecimento que lhe é devido e que aos professores seja dado o valor que, em todos os domínios (profissional, social, laboral ou material) o seu importante papel justifica. 

Este ano, em todo o mundo, o Dia Mundial dos Professores assinalou-se sob o lema “Valorizar os professores; Melhorar a sua condição profissional”, uma consigna de grande importância e atualidade, tendo em conta o tempo que vivemos.

Em Portugal, os professores têm sido bodes-expiatórios do que corre mal no sistema educativo e na vida das escolas. Há insucesso, a culpa é dos professores que não sabem ensinar; há abandono, então, como alguém responsável acusava, é porque, antes, os professores abandonaram os seus alunos; faltam apoios a alunos com NEE, mas diz-se que as suas dificuldades não são superadas porque os professores não desenvolvem estratégias de diferenciação pedagógica no seu desempenho profissional; as escolas dão respostas sociais insuficientes às necessidades dos alunos e suas famílias e logo se culpam os professores por, alegadamente, serem pouco disponíveis; há escolas em que, muitas vezes, faltam professores durante semanas e logo estes são os culpados porque, dizem, mas dizem mal, que estes só querem trabalhar à porta de casa…

Percebe-se a intenção deste discurso que pretende branquear a incompetência, a impreparação, o experimentalismo e também a natureza das opções ideológicas de quem tem a responsabilidade de governar a Educação, mas os professores não podem admitir que a desresponsabilização dos governantes e o branqueamento das suas políticas se façam à custa da injusta culpabilização dos profissionais do setor que são, com toda a certeza, dos menos responsáveis.

O Dia Mundial dos Professores, acontecimento que assinalamos, foi proclamado pela UNESCO em 1993. Frederico Mayor, então Diretor-Geral da organização, declarou que os professores são um grupo profissional fundamental “sem o qual não pode haver nem desenvolvimento durável, nem coesão social, nem paz”. Este reconhecimento continua a constituir um fortíssimo desafio aos professores, pois atribui-lhes elevadíssimas responsabilidades.

A escolha de 5 de outubro não foi um acaso. Foi em 5 de outubro de 1966 que, em Paris, UNESCO e OIT adotaram a Recomendação relativa à condição dos Professores, dando, dessa forma, um passo fundamental para a valorização da profissão docente de uma forma nunca antes assumida. Após 1993, a Recomendação foi consagrada como documento orientador das políticas educativas, no que ao pessoal docente diz respeito, sendo complementada em 1997 por outra Recomendação, esta relativa à situação dos docentes do ensino superior.

A Recomendação aprovada há 50 anos é de uma notável atualidade, parecendo estranho como, há meio século, se falava de um futuro tão distante. A questão, porém, é outra. É que, apesar de reconhecida e alegadamente respeitada pelos diversos estados, na verdade, nestes, mesmo quando o poder político destaca os professores nos discursos oficiais, o que não aconteceu por cá neste Dia Mundial dos Professores, por norma, as práticas não acompanham as palavras ditas. A quantos governantes, membros dos mais diversos governos, não ouvimos dizer que os professores deverão ser respeitados, valorizados, dignificados? Contudo, ao longo dos anos e dos governos não faltaram políticas orientadas precisamente em sentido contrário. Vejamos:

UNESCO e OIT recomendam uma elevada formação de professores; no nosso país, porém, a ausência de políticas nesse sentido levou à criação e aplicação de uma iníqua prova (a PACC) que apenas serviu para afastar alguns milhares do acesso à profissão.

Recomenda-se respeito pela liberdade académica no desempenho profissional dos docentes; o que tem acontecido, contudo, é que a máquina de controlo político, que se estende do ministério ao gabinete de cada diretor, condiciona o exercício dessa liberdade, impondo um modelo único orientado para a estatística e para a promoção de uma escola que favoreça as elites dominantes.

Recomenda-se a criação de boas condições de trabalho aos professores, devendo estes ser libertados das múltiplas tarefas burocráticas a que estão sujeitos; porém, os seus horários são cada vez mais esmagadores, da deliberada confusão entre componente letiva e não letiva resulta uma tremenda sobrecarga de trabalho e as tarefas burocráticas, a par de diversas reuniões de utilidade duvidosa, retiram tempo aos professores para se dedicarem em pleno aos seus alunos.

Recomenda-se, como necessária, a melhoria da situação económica e social dos docentes, para que contribuirão a estabilidade dos vínculos laborais e o acesso a carreiras dignas; ora, os professores sabem bem como lhes tem sido negada esta recomendação, pois, sobre si, continua a abater-se um fortíssimo desemprego, uma elevadíssima taxa de precariedade, na ordem dos 15%, as suas carreiras encontram-se “congeladas” há seis anos, foram-lhes retirados mais de 8 anos de serviço comprovada e zelosamente cumpridos, tendo sido ainda dos grupos profissionais mais castigados pelos cortes salariais e continuando a ser das grandes vítimas da enorme carga fiscal que tarda em ser aliviada.

A existência de medidas de compensação do desgaste profissional é também recomendação que parece esquecida. Um desgaste que resulta do exercício continuado da profissão e se acentuou muito com o reconhecido, mas não resolvido envelhecimento do corpo docente das escolas.

As escolas estão hoje privadas dos mais jovens – são menos de 500 os professores com 30 ou menos anos, isto num universo com mais de cento e dez mil profissionais – e são milhares os que, durante décadas, já deram o melhor de si à escola (e um grande contributo à segurança social), mas continuam impedidos de se aposentar com uma pensão justa e que garanta uma velhice vivida com dignidade. Este é um sério problema de uma profissão que se afirma e consolida na cooperação entre gerações e no encontro das dinâmicas que resultam da criatividade e capacidade inovadora dos jovens com o saber-fazer dos mais experientes; mas é também um problema de uma escola que definha quando não se renova. Um problema cuja resolução a FENPROF manterá no topo das suas exigências junto dos decisores políticos, deixando claro que não irá conter este justo anseio dos professores que, provavelmente, mais cedo do que tarde, voltará a mobilizá-los para voltarem à rua. Refiro-me, obviamente, à indispensável criação de um regime especial de aposentação para os professores.

A realidade da abertura do ano letivo

Estamos ainda no início de um ano letivo em que a colocação de professores foi reconhecidamente mais atempada e limpa de confusões que têm sido habituais. Não houve candidatos desaparecidos, não houve documentos falsificados para favorecer candidatos conhecidos, não houve colocações múltiplas, não se fala de discricionariedade em critérios de seleção fixados por diretores e o ministro não teve de pedir desculpa ao país no dia seguinte a ter garantido estar tudo a correr bem.

Convém assinalar, no entanto, que a falta de problemas maiores nas colocações, não tornou justo o diploma de concursos, pelo que, no processo de revisão que vai iniciar-se este mês seremos firmes na defesa de um concurso único, nacional, em que os candidatos se ordenem pela sua graduação profissional. Queremos acabar com a norma travão para, finalmente, travar uma precariedade que se prolonga anos a fio; não aceitaremos qualquer processo de seleção que se subordine aos interesses e à discricionariedade de quem gostaria de escolher uns e afastar outros, de acordo com as suas preferências, tornando reserva sua uma escola que é de todos.

A já referida ausência de problemas relevantes na colocação de professores não consegue, contudo, disfarçar problemas que continuam a atingir, alguns de forma muito forte, as escolas e os seus profissionais.

Faltam assistentes operacionais, problema grave que continua por resolver e põe em causa a higiene, o acompanhamento, a segurança e todo o apoio que é devido a alunos e professores no espaço escolar.

O 1.º Ciclo continua a ser um mar de problemas, com milhares de turmas onde se misturam alunos de diversos anos de escolaridade, muitas vezes ultrapassando os limites legais de alunos na totalidade e também de alunos com NEE; com AEC a interromperem o normal desenvolvimento da atividade letiva; com uma carga letiva para os docentes que chega a atingir as 27,5 horas semanais; com aulas de inglês que juntam no mesmo espaço, à mesma hora e com o mesmo docente, dois anos de escolaridade em atividade letiva e mais um ou dois em AEC. Estes problemas foram já todos apresentados a responsáveis do ME, antes e agora, mas já se percebeu que continua sem haver vontade política para mudar, pois a mudança tem custos que não se querem suportar. 

A indisciplina na sala de aula é outro problema que está, há muito, sinalizado mas nada que, pelo menos o atenuasse foi ainda feito, nem que fosse, este ano, uma simples e primeira redução do número de alunos por turma. Felizmente, soubemos hoje, a Assembleia da República acaba de dar um passo muito importante para começar a resolver este problema.

Também a insuficiência dos apoios a alunos com necessidades educativas especiais é problema que se mantém, em alguns casos de forma agravada, neste arranque de ano letivo. Manter a atual falta de recursos e continuar a sobrevalorizar, na referenciação, a vertente clínica em detrimento da pedagógica, será pôr em causa o trabalho dos professores, as aprendizagens e o sucesso dos alunos e, ainda, os princípios da educação inclusiva.

Estes são apenas alguns dos problemas que persistem. Escondê-los seria prestar um mau serviço à Escola Pública. A sua resolução exige investimento, é certo, mas essa é opção que o Orçamento do Estado para 2017 não poderá deixar de fazer, depois de anos de corte que depauperaram, e muito, o setor da Educação, sendo que na última Legislatura, o governo do PSD e CDS só teve olhinhos para os colégios privados, como aqui neste concelho de Coimbra nós bem sabemos.

A ausência do PSD e do CDS...

Faltaram ao debate dois partidos: o PSD, que nunca teve agenda; o CDS que deixou ontem de ter agenda. Poderia afirmar que só faz falta quem cá está, mas não é assim. Deveriam vir aqui defender as suas posições junto dos professores e até prestar contas pelos ataques que desferiram à Escola Pública e aos profissionais nos anos em que governaram. Lamento a ausência e não a respeito pois revela um profundo desrespeito pelas centenas de professores aqui presentes e pela maior organização de professores em Portugal, a FENPROF; mas não me surpreendo, pois daqueles de quem não rezará a história não se pode esperar coragem. Esta ausência é a natural forma de agir de quem tem telhados cuja resistência é inferior à do vidro. E será sempre mais simples, nas costas, desferir acusações e ataques à FENPROF e aos seus dirigentes do que, olhos nos olhos, assumir o debate franco, aberto e democrático.

Os dirigentes e delegados, como todos os que se reveem na FENPROF são professores e professoras, homens e mulheres que têm dedicado anos da sua vida à causa da Educação e da Escola Pública e à defesa da profissão, seja ela exercida no público ou privado, resistindo e impedindo uma desvalorização ainda maior, conseguindo, em determinados processos, alguns ganhos que, de outra forma, não seriam obtidos e revelando uma grande entrega à causa que abraçam, não desistindo de reivindicar e lutar mesmo em tempos muito difíceis. 

Foi essa forma de intervir que permitiu, há duas décadas, acabar com a prova de candidatura ao 8.º escalão da carreira, há meia dúzia de anos acabar com a divisão da carreira em professores e titulares e, já este ano, acabar com a PACC, com as BCE ou com o regime de requalificação onde a direita já despejara alguns professores. Será com esta atitude firme e lutadora que obteremos novos resultados, tais como: a aposentação de quantos, ao longo de décadas, deram o melhor de si à escola e aos alunos; a vinculação de quem, há anos, vive uma precariedade que parece não ter fim e a muitos despejou na vala comum do desemprego; a aprovação de um horário de trabalho adequado à vida, profissional e não só, dos professores; o direito à progressão nas carreiras; uma gestão democrática que envolva todos os professores, comprometa toda a comunidade educativa em níveis adequados de participação e assente em princípios como os da elegibilidade, colegialidade democrática e participação. Enquanto a gestão continuar a contemplar a figura do diretor, a autonomia não passará de uma farsa.

Uma última nota para o que ontem aconteceu na Assembleia da República onde foi discutida uma proposta do CDS-PP, visando uma profunda alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo. Tratou-se de uma iniciativa integrada na estratégia da direita de ataque à Escola Pública e defesa de interesses privados que não se resignam com o facto de, finalmente, ter sido posto travão a uma prática que vinha violando a Constituição da República, a Lei de Bases, os direitos de todos os portugueses e os fundamentos de uma Democracia que, apesar de diversas vicissitudes, não perdeu o cheiro a cravo.

É significativo como alguém que diz que a Educação deve viver de consensos avança com uma proposta destas sem antes ter promovido qualquer diálogo, procurando, numa operação relâmpago de menos de uma semana, levar por diante a revisão de uma lei que mereceu um amplo debate e consenso social e político, daí completar 30 anos de hoje a uma semana, mantendo-se em vigor. Podemos até considerar que o debate sobre o Pré-Escolar ou a duração dos ciclos de ensino está atrasado, a questão, porém, é que os principais objetivos da proposta que o CDS apresentou são outros, designadamente considerar público e privado como se fossem uma e a mesma coisa, de prosseguir o processo de municipalização das escolas e dos professores, de abrir as escolas públicas à concessão a privados ou promover a segregação dos que apresentam diferenças relevantes. Não é novo este projeto do CDS, pois os seus aspetos mais negativos já constavam do guião da reforma do Estado aprovado pelo governo anterior. Acontece que, sobre esse governo e os seus guiões já os portugueses se pronunciaram em 4 de outubro do ano passado, daí resultando uma nova maioria que tem assumido a defesa da Escola Pública de matriz democrática.

Neste tempo que continua a ser dos professores, e sem perder de vista a Recomendação que atingiu a bela idade de 50 anos, a FENPROF continuará, firmemente, a defender os direitos e legítimos interesses de todos os professores, e não abdicará de exigir mais verbas para a Educação, em particular para uma Escola Pública que deverá continuar a afirmar-se pela qualidade e diversidade das suas respostas, por ter lugar para todos os alunos, por procurar respeitar os princípios da inclusão e por dever ser gratuita. É essa a matriz da Escola Democrática.

Viva a Escola Pública.

Vivam todos os Professores e Educadores!