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EM FOCO

A luta pela aposentação vai manter-se e ainda mais forte

25 de julho, 2016

A CRIAÇÃO DE UM REGIME EXCECIONAL DE APOSENTAÇÃO É JUSTA 
E DEVERÁ MANTER-SE PRIORIDADE NA AGENDA DE LUTA DO PRÓXIMO ANO

Mário Nogueira
Secretário-Geral da FENPROF

A criação de um regime excecional de aposentação para os docentes não constitui uma reivindicação pela qual se pretende qualquer tipo de privilégio relativamente aos demais trabalhadores do nosso país. Trata-se, isso sim, de uma medida de enorme justiça para estes profissionais e que faz muita falta às escolas e aos alunos.

A geração de professores que hoje está mais próxima da aposentação (o grupo que está prestes a atingir os 60 anos ou já os ultrapassou) entrou no sistema no virar das décadas de 70/80 do século passado. Havendo, então, uma expansão do sistema, estes professores, desde o início, eram colocados em horários completos e para todo o ano. São, por isso, trabalhadores que já atingiram ou estão perto de atingir os 40 anos de serviço e correspondentes descontos para a aposentação.

Se tivermos em conta as legítimas expetativas destes professores, suportadas pelos quadros legais que então vigoravam, alguns milhares de docentes já se teriam aposentado aos 36 anos de serviço, ou mesmo antes, de acordo com regime especiais que existiam. Contudo, chegados aos 40 anos de serviço, à maioria faltam entre 6 e 10 anos se, entretanto, a situação não se agravar.

Este reconhecido envelhecimento do corpo docente das escolas é referenciado em todos os documentos que se elaboram sobre a situação da Educação em Portugal. Em recente recomendação, o Conselho Nacional de Educação reconhece “um elevado índice de envelhecimento” nos profissionais docentes. Essa recomendação recorda que “os professores são obrigados a permanecer durante bastante mais tempo em atividade, devido ao aumento da idade exigida para a aposentação” e da conjugação desse envelhecimento com as condições em que a profissão é exercida, desenvolvem-se “processos de stress e burnout profissional, como evidenciam alguns estudos nacionais e internacionais” (Recomendação “A condição docente e as políticas educativas”, junho de 2016).

O que afirma o CNE nesta Recomendação recolhe consenso na sociedade e, pelo menos ao nível do discurso, também no plano político. Não há quem não fale das vantagens de as crianças e jovens das nossas escolas terem professores mais jovens, da necessidade de não haver ruturas, devendo, nas escolas, jovens (com os seus novos saberes) e mais antigos (com a sua experiência) permanecerem juntos durante alguns anos, fazendo convergir essa experiência com saberes e competências renovados, pois isso empurrará as escolas para dinâmicas que tanta falta lhe fazem.

Não é, porém, o que acontece. Não há jovens nas escolas. Em muitas delas, os mais jovens são apenas os menos antigos que, da juventude, já só carregam a precariedade. O grande grupo de docentes está já na segunda metade dos 50 ou a passar os 60 anos de idade.

O problema não é maior porque muitos saíram com cortes elevados nas suas pensões de aposentação, mas não aguentavam mais, e alguns, ainda, rescindiram o seu vínculo laboral. Mas isso serviu, apenas, para o Estado reduzir a sua despesa com Educação, sobrecarregando com tarefas os que permaneceram. É que, nos últimos cinco anos, à redução de 8% de alunos nas escolas, correspondeu a saída de 22% dos professores existentes. Ou seja, 2/3 dos docentes que saíram faziam falta, mas não foram substituídos o que significa que o seu trabalho recai hoje sobre os que se mantêm.

Com este envelhecimento e esta sobrecarga são vários os problemas que surgem ou se agravam. A dificuldade em manter a qualidade das respostas educativas antes dadas, o aparecimento de situações clínicas que fazem disparar o absentismo ou a desatualização de informação e dificuldade em construir algumas competências hoje muito importantes são apenas alguns desses problemas.

Face a este quadro, é fácil compreender que a criação de um regime excecional de aposentação para os professores é fundamental para que se eleve a qualidade do ato educativo e não se trata, como alguns insinuam, de uma questão corporativa. Mas se quiséssemos ver por esse prisma, também seria legítimo afirmar que os que já descontaram durante 40 anos (o tempo de descontos exigido por lei para a aposentação sem cortes) deveriam poder aposentar-se sem qualquer penalização; ou que é absolutamente legítimo exigir que quem se profissionalizou para a docência e se arrasta há mais de uma década por respostas precárias, como as AEC ou os cursos do IEFP (quando não está no balcão de um qualquer supermercado ou no estrangeiro em trabalhos alheios à sua formação), tem direito a exercer a sua atividade, o que, para alguns, será muito difícil acontecer, já para não falar do futuro dessa geração que nunca reunirá as condições para um dia se aposentar em situação digna.

O problema é que, afirmando conhecer tudo isto, há quem, no momento da verdade, eleve outros “valores” e os faça prevalecer sobre o que, pelo discurso, parecia adquirido. Quem no dia 20 assistiu aos debates parlamentares e à votação dos projetos de resolução apresentados por PCP e PEV, a propósito da petição apresentada pela FENPROF em que se propunha um regime excecional de aposentação para os professores, não pôde deixar de sair indignado. Os deputados levaram muito menos tempo a debater a aposentação dos professores do que, por exemplo, o financiamento de atividades tauromáquicas. Como se isso não bastasse, quando chegou a votação, PS, PSD e CDS votaram contra os projetos de resolução que recomendavam ao governo que ponderasse criar um regime que permitisse, de imediato, a aposentação sem cortes de quem já trabalhou 40 ou mais anos e, para o futuro, o desenvolvimento de um processo negocial que permitisse fixar a aposentação dos docentes aos 36 anos de serviço. Naqueles três grupos parlamentares são muitos os professores que, sem que se ouvisse um protesto, votaram contra o grupo profissional que integram.

Estas posições daqueles partidos não irão esmorecer a nossa luta. Pelo contrário, se para alguma coisa elas deverão servir é para que compreendamos que, apesar de ser justa, a luta pela aposentação tem de crescer ainda mais, bastante mais. Essa é a razão por que, no regresso de férias, a luta por um regime excecional de aposentação para os professores deverá ser inscrita na nossa agenda, a letras gordas e na página das prioridades.