Nacional

Intervenção de Vitor Godinho

30 de abril, 2016

A precariedade assume-se hoje como um dos maiores problemas da profissão docente e, por isso, está – tem de estar – no centro da intervenção sindical consequente.

Dos contratos a termo, certo ou incerto, aos recibos de verde coloridos para disfarçar a sua obscura tonalidade, do ensino público ao privado, da educação pré-escolar ao ensino superior, do ensino profissional às AEC, em Portugal o flagelo da precariedade, de acordo com um levantamento recentemente efetuado pela FENPROF, já atinge um mínimo de 53 mil docentes, o que corresponde a uma taxa de precariedade não inferior a 27%.

Associados à incerteza quanto à continuidade do frágil vínculo laboral que caracteriza as relações contratuais precárias, estão – ou não fossem precisamente esses os seus objetivos – os salários mais baixos, piores condições de trabalho e de horário, uma proteção social mais frágil ou mesmo inexistente e regimes de férias, faltas e licenças e de avaliação mais penalizadores, para citar alguns exemplos. E, pior ainda do que isso, a precariedade, pelas subserviências que gera, constitui porta de entrada para abusos e ilegalidades diversas.

Indo beber à “moderna” e estafada ideia de que não há empregos para toda vida – como se fosse possível, com as específicas exigências profissionais que se colocam, ser-se professor sem o ser toda a vida –, a precariedade e a sua ilegal e imoral eternização, a que nenhuma “norma travão” pôs termo, arrasta também consigo o constante adiamento da concretização de projetos de organização pessoal, familiar e social a que os docentes visados, como seres humanos, têm inalienável direito.

Mas a precariedade não se limita a criar problemas aos nela diretamente implicados: a precariedade dificulta a organização e o normal funcionamento das escolas e implica negativamente com o desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem

A dimensão da precariedade – não só docente – e as consequências negativas a ela associadas são de tal ordem que entre as medidas acordadas entre o partido do atual governo e os que o viabilizaram, surge, assim mesmo, “Um combate decidido à precariedade”. Mas não nos iludamos: ou pressionamos forte no sentido da aprovação de medidas concretas que deem corpo a esse combate ou ele acabará emergido por um qualquer plano B ou C.

O muro erguido, em termos de direitos laborais e sociais, entre os ditos professores precários e os ditos não precários, chega a gerar, entre os primeiros, uma crise de identificação com a profissão que desenvolvem – uma espécie de conflito entre “ser professor” e “estar professor” –, o que é terreno fértil para o seu desvio do palco da luta sindical para outros palcos, os de movimentos mais ou menos erráticos de professores contratados/ desempregados. Temos de rejeitar este caminho de etnização da luta contra a precariedade, não só por estar condenada ao insucesso, mas também pelos contributos que dá à conversão em privilégios dos direitos, arduamente conquistados, acrescente-se, dos segundos – os ditos não precários –, o que constitui uma conhecida estratégia neoliberal adotada no sentido da aceitação pública da sua posterior extinção. Lutar contra a precariedade não se sendo precário não é um ato de solidariedade, é um ato de inteligência.

Assim, à etnização da luta contra a precariedade, o nosso movimento sindical deverá contrapor com uma outra perspetiva, o que não constitui desafio pequeno: a da universalização dessa luta. É que a precariedade não é um problema exclusivo dos e das docentes sem vínculo contratual estável: este é, outrossim, um problema de todos e, por conseguinte, todos teremos de lhe dar o decidido combate.

É, por isso, acertada a ideia, que surge no Projeto de Resolução sobre a Ação Reivindicativa subscrita pelo Secretariado Nacional da FENPROF e pelas Direções dos seus sete sindicatos, que teremos oportunidade de discutir mais adiante, de conjugar, no mesmo instrumento de luta – um abaixo-assinado –, o combate à precariedade com reivindicações tão aparentemente diversas como são as que se relacionam com a aposentação, as carreiras e os horários de trabalho.

É, também, neste quadro que se inscreve a “Campanha Nacional Contra a Precariedade; pelo Emprego com Direitos” decidida pelo XIII Congresso da CGTP, campanha essa a concretizar por toda a estrutura sindical a ela afeta durante o mandato 2016-2020, e que tem como principal ideia força a de que “a posto de trabalho permanente tem de corresponder um contrato de trabalho efetivo”.

Integrado já nesta campanha, a FENPROF apresentou publicamente, por ocasião do Dia Nacional da Juventude, um conjunto de medidas por cuja aprovação se comprometeu a lutar, compromisso que este congresso deverá reafirmar, com as quais pretende atacar a precariedade, das quais aqui destaco as seguintes:

  • Abertura de lugares de quadro de acordo com reais necessidades das escolas;
  • Redução das áreas geográficas dos Quadros de Zona Pedagógica;
  • Revisão da designada “norma travão” no sentido de garantir a vinculação dinâmica de todos os docentes com 3 ou mais anos de serviço docente prestado ao Ministério da Educação;
  • Transposição da Diretiva 1999/70/CE, de 28 de junho, para a lei portuguesa nos subsetores do ensino público onde tal nem de forma insuficiente se concretizou, como são os casos do Ensino Superior, do Ensino Artístico Especializado e do Ensino Português no Estrangeiro;
  • Eliminação dos falsos “recibos verdes”, como os que surgem nos programas de formação do IEFP, nas AEC, nas escolas de ensino profissional e nas de ensino artístico especializado privadas;
  • Suspensão do mecanismo de renovação de contrato: a renovação de contrato confirma que a necessidade que a origina é permanente e não temporária;
  • Aprovação de um Contrato Coletivo de Trabalho (CCT) para o ensino superior privado e reabertura de negociações com vista à aprovação de um novo Contrato Coletivo de Trabalho para o ensino particular e cooperativo (não superior);
  • Criação de um mecanismo interno do Estado Português que garanta o pagamento sem atrasos dos salários dos docentes das escolas cujo financiamento dependa de programas comunitários, designadamente o POCH;
  • Regularização da situação salarial dos docentes que ingressaram nos quadros desde 2013, que se mantêm no índice 167, o vencimento anterior a esse ingresso, por, ilegalmente, não ter sido considerado o tempo de serviço por eles anteriormente prestado.

Estas são algumas das soluções que defendemos. A experiência que acumulámos diz-nos que o caminho para as concretizarmos só pode ser um: o da luta! Este é também o congresso da sua reafirmação.

Viva a FENPROF!

Viva o 12.º Congresso Nacional dos Professores!